Da representação legal nos negócios jurídicos

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03/10/2017 às 11:03
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Demonstração dos aspectos inerentes à representação legal, advindos do seu conceito, espécies, perquirindo sobre as regras legais relativas, bem como os casos de extinção da representação legal nos negócios jurídicos.

RESUMO:DUTRA. Maristela Aparecida. Representação legal NOS NEGÓCIOS JURÍDICOS. O presente artigo cumpre demonstrar os aspectos inerentes à representação legal, advindos do seu conceito, espécies, perquirindo sobre as regras legais relativas, bem como os casos de extinção da representação legal nos negócios jurídicos, através da demonstração do aparato jurisprudencial acerca do tema.

PALAVRAS-CHAVE: negócio jurídico, representação legal

Sumário: Introdução. 1- Conceito. 2- Espécies de representação. 2.1- Representação Legal. 2.2- Representação voluntária. 3- Regras gerais relativas à representação legal e sua jurisprudência correlata. 3.1- A manifestação de vontade do representante. 3.2- Anulabilidade do contrato consigo mesmo ou autocontrato. 3.3- Substabelecimento. 3.4- Obrigatoriedade de provar a condição de representante. 3.5- Anulabilidade dos atos praticados contra o interesse do representado. 3.6- Extinção do poder de representação legal e seus efeitos. Conclusão. Referências Bibliográficas.


INTRODUÇÃO

Geralmente é o próprio interessado, com sua vontade, que atua em negócio jurídico. Dentro da autonomia privada, o interessado contrai pessoalmente obrigações e, assim, pratica seus atos da vida civil. Contudo, há a possibilidade de outro praticar atos da vida no lugar do interessado, por meio da representação.

Ao contrário do que ocorre no Direito moderno, no Direito Romano não se admitia, em regra, a representação direta – onde o representante age em nome e por conta do representado –, caso em que os efeitos do negócio jurídico recairiam exclusivamente sobre a pessoa do representado (dominus negotii). No período clássico, o ius civile somente admitia raras exceções a esse princípio. No ius honorarium[i], em hipóteses excepcionais, encontrava-se a admissão generalizada da representação direta. Justiniano também não aboliu a regra, tendo, no entanto, aumentado o número de exceções a ela [ii]

Em seus artigos 115 a 120, o Código Civil trata da representação legal e convencional no negócio jurídico, disciplinando inclusive o negócio jurídico consigo mesmo e o concluído pelo representante conflitante com os interesses do representado.

Na representação uma pessoa age em nome de outra ou por outra. A noção fundamental, pois, é a de que o representante atue em nome do representando, no lugar do representado. O representante conclui o negócio não em seu próprio nome, mas com pertencente ao representado. O representante é um substituto do representado.

Naturalmente, neste trabalho sobre o negócio jurídico, não vai ser objeto de estudo sobre os elementos e requisitos de cada categoria, pois isso obrigaria a percorrer quase todo o campo do direito civil, ou seja, a ênfase será tratar de forma objetiva apenas sobre a representação legal e seu aparato jurisprudencial.


1-      CONCEITO

A representação é a relação jurídica pela qual certa pessoa se obriga diretamente perante terceiro, por meio de ato praticado em seu nome por um representante.

Para Arnaldo Rizzardo[iii]:

Representar significa estar no lugar de alguém, substituir uma pessoa, fazer o papel que lhe incumbia, projetar a sua vontade em uma relação jurídica. Envolve a noção de substituição da manifestação da vontade. Nesta visão, o ato de vontade de alguém que deve figurar na celebração de um negócio é expressada por uma pessoa distinta da que o celebra.

Adverte Anderson Schreiber[iv]:

[...] a representação existe independentemente de o representante ter, de fato, o poder de agir em nome do representado. Para ocorrer a representação, basta que um negócio jurídico tenha sido declaradamente celebrado em nome de um terceiro com o fim de que sobre tal pessoa recaiam os seus efeitos. ‘Realizar-se ou sair frustrada e inoperante esta intenção ou tendência do negócio, produzirem-se os seus efeitos na órbita deste terceiro, é já uma questão atinente, não ao conceito e portanto à existência da representação, mas à validade ou eficácia’. Portanto, independentemente da efetiva outorga do poder de representar, sempre que alguém vier a atuar em nome de outrem haverá representação.

Segundo Abib Neto[v], entre nós, “a representação é a relação jurídica, pela qual são conferidos poderes por lei ou mandato, a certa pessoa que se obriga, diretamente com um terceiro, por meio de ato que pratica em nome do  representado. Representante convencionado é o que é munido de mandato expresso ou tácito, verbal ou escrito, do representado.”

Entretanto, para que esta situação ocorra, é necessário, primeiramente, que o ordenamento jurídico a permita e, em segundo lugar, que os requisitos desse mesmo ordenamento tenham sido cumpridos.


2-      ESPÉCIES DE REPRESENTAÇÃO

Há duas espécies de representação: a representação legal e a representação voluntária. A representação legal ocorre quando a lei estabelece, para certas situações, uma representação, o que ocorre nos casos dos incapazes, quer seja através dos representantes legais, quer seja através da curatela e da tutela. Nestes casos, o poder de representação decorre diretamente da lei, que estabelece a extensão do âmbito da representação, os casos em que é necessária, o poder de administrar, e, quais as situações em que se permite dispor dos direitos dos representados.

A representação voluntária é baseada, em regra, no contrato de mandato, cujo instrumento é a procuração. A representação pode será exercida por representante que pode ser nomeado pelo juiz, pela lei ou por vontade dos contratantes. A representação legal tem os seus requisitos e efeitos regidos pelos artigos 1.634, V, 1.690, 1.747 e os da representação voluntária pelos artigos 653 a 692, todos do Código Civil.

2.1-      DA REPRESENTAÇÃO LEGAL

O representante legal é aquele a quem a norma jurídica confere poderes para administrar bens alheios, como o pai, ou mãe, em relação a filho menor ( art. 1.690 -CC), quanto o tutor ao pupilo ( art. 1.747, I - CC) e curador, no que concerne ao curatelado ( art 1.774 - CC). A representação legal presta-se para servir aos interesses do incapaz.

Segundo Carlos Roberto Gonçalves[vi]o representante legal é a que decorre da lei, ou seja, aquele que aquém esta confere poderes para administrar bens e interesses alheios, como pais, em relação aos filhos menores, tutores, no que se refere aos tutelados (art. 1.747, I, do CC) e curadores no que concerne aos curatelados (art.1.774, do CC). O representante judicial é aquele nomeado pelo poder judiciário para exercer poderes de representação no processo, como o inventariante, o administrador da falência (art. 21, da Lei 11.101/05).

Segundo Orlando Gomes[vii]:

A representação legal é instituída em razão de relevante interesse jurídico. Diante da impossiblidade jurídica das pessoas incapazes proverem seus próprios interesses, torna-se necessário atribuir a alguém o poder de curá-los. Quando estabelecida para esse fim, a representação adquire o relevo de verdadeiro múnus agindo o representante como se fora titular de um direito de ofício, mas de Direito Privado, no sentido de que exerce uma função ou atividade obrigatória, investido em autêntico e indiscutível poder, na acepção técnica do termo. Contudo, a representação legal, não se circunscreve a essas hipóteses. Ocorre, igualmente, quando não está em jogo a incapacidade dos representados. (...) Atribui-se esse poder de representação de pessoas capazes seja no interesse do grupo, como a família ou a categoria profissional, seja no interesse de terceiros, como na falência.

Nesses casos, o poder de representação decorre diretamente da lei, que estabelece a extensão do âmbito da representação, os casos em que é necessária, e, o poder de administrar e quais as situações em que se permite dispor dos direitos do representado.

2.2-      DA REPRESENTAÇÃO VOLUNTÁRIA

É baseada, em regra, no mandato, cujo instrumento é a procuração. A figura da representação não se confunde com a do mandato. O representante convencionado é o munido de mandato expresso ou tácito, verbal ou escrito, do representante, como o procurador, no contrato de mandato ( arts. 115, art. 120, segunda parte e art. 653 a 692 CC).


3-      REGRAS GERAIS RELATIVAS À REPRESENTAÇÃO LEGAL E SUA JURISPRUDÊNCIA CORRELATA

Cuida-se o presente artigo demonstrar as principais regras e jurisprudências referentes à representação legal, citando-se em alguns caso a representação voluntária somente à guisa de melhor elucidação do tema.

3.1       A MANIFESTAÇÃO DE VONTADE DO REPRESENTANTE

A manifestação de vontade do representante, no limite de seus poderes, vincula o representado, de tal forma que fica aquele fica vinculado às manifestações de vontade exaradas pelo representante, nos limite dos poderes que lhe foram outorgados (art. 116 - CC).

Segundo Fábio Ulhoa Coelho[viii]:

Os poderes do representante, no caso da representação legal de pessoa absolutamente incapaz, são absolutos, no sentido de não existir negócio jurídico que o representado possa fazer sem a interferência de seu representante. O menor de 16 anos e o amental desprovido de discernimento para o comércio jurídico, por exemplo, não podem praticar atos e negócios jurídicos diretamente, em nenhuma hipótese. Sempre será o representante legal o único sujeito em condições de manifestar a vontade do absolutamente incapaz. Já o caso de representação voluntária, os poderes são relativos, porque o representado, em nenhum momento, mesmo no mandato com cláusula “em causa própria”, fica impedido de praticar o ato diretamente.

A manisfestação da vontade do representante ao efetivar um negócio em nome do representado, nos limites dos poderes que lhe foram conferidos, produz efeitos jurídicos relativamente ao representado, que adquirirá os direitos dele decorrentes ou assumirá as obrigações que dele advierem.[ix]

Segundo a jurisprudência a falta de representação legal, é úníssona ao afirmar que a falta de representação legal nos casos do art.8 do Código de Processo Civil, é tido como nulidade processual absoluta:

Processual Civil. Apelação. Defeito de representação. Ausência de curador legalmente autorizado. Ministério Público. Falta de intervenção. Nulidade do processo. O art. 8º do CPC estabelece que os incapazes serão representados ou assistidos por seus pais, tutores ou curadores, na forma do Código Civil . O art. 1.767 do CC apregoa, por sua vez, que estão sujeitos à curatela aqueles que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para os atos da vida civil. No caso dos autos, foi informado que a autora é interditada, estando, portanto, incapacitada para todos os atos da vida civil, de modo a apresentar-se como obrigatória a sua representação no feito por curador legalmente autorizado, além da intervenção do Ministério Público, o que, certamente, não se observou. Tal capacidade apresenta-se como pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, relacionando-se à regularidade da representação processual, de modo que, a falta ou o vício de representação do incapaz, caso não suprida, pode acarretar a nulidade do próprio processo (art. 267 , IV , do CPC ). Remessa dos autos ao Juízo a quo a fim de ser intimado o advogado do autor para que emende a inicial e supra o defeito de representação, sob pena de extinção do processo. Agravo retido não conhecido por falta de pedido na peça recursal. Atos processuais anulados, a partir da inicial. Apelação prejudicada. TRF-5 - Apelação Civel AC 431319 PE 2007.83.00.009351-3Data de publicação: 28/04/2008)

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Para o caso de pessoas jurídicas e outros casos[x], há inclusive a aplicabilidade da teoria da aparência, outorgando poderes para o representante legal:

PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO - PESSOA JURIDICA - CITAÇÃO -EFETIVAÇÃO NA PESSOA DE UM EMPREGADO -TEORIA DA APARÊNCIA - TEMA NÃO CARACTERIZADO NOS AUTOS - RECURSO NÃO PROVIDO. -A citação da pessoa jurídica se dá na pessoa de seu representante legal. - Descabe a pretensão de citação da empresa diretamente na pessoa de um empregado ou outro, que não tenha poderes para isto, salvo na hipótese de aplicação da teoria da aparência, tema não caracterizado nos autos. ( Recurso conhecido e não provido. Processo: Agravo Interno Cv, 1.0024.11.324627-6/002, Data de Julgamento: 13/06/2013).

De acordo com este preceito, a existência de circunstâncias objetivas que fundem uma aparência de representação, aliada à condição subjetiva da atuação do representado, justificam a tutela da confiança da contraparte e a eficácia do negócio perante o representado-principal.

Logo, uma vez realizado o negócio pelo representante, os direitos serão adquiridos pelo representado, incorporando-se em seu patrimônio; igualmente os deveres contraídos em nome do representado devem ser por ele cumpridos , e por eles responde o seu acervo patrimonial.

3.2-      ANULABILIDADE DO CONTRATO CONSIGO MESMO OU AUTOCONTRATO

Ocorre o chamado contrato consigo mesmo ou autocontrato em duas situações:

a) as duas partes têm o mesmo representante;

b) o representante de uma das partes é a outra parte.

Como o contrato, por definição, é um acordo de vontades, não se admite a existência de contrato consigo mesmo, sendo este anulável, salvo se o permitir a lei (ex.: mandato em causa própria art. 685 - CC) ou o representado (art. 117 - CC).

Na observação de MAIRAN GONÇALVES MAIA JÚNIOR:

O legislador brasileiro buscou inspiração nos diplomas italiano e português, optando por admitir abstratamente situação jurídica já consolidada na prática. Todavia, melhor seguiria se, ao admitir a possibilidade da celebração do contrato consigo mesmo, condicionasse sua realização à ausência de conflitos de interesses, à semelhança dos Códigos português e italiano.[xi]

O contrato consigo mesmo ou autocontrato, ocorre quando alguém figure em um contrato como representante do representado e também como a outra parte do contrato, ou seja, figure como representante do outorgante diretamente ou através de interposta pessoa indiretamente, e também figure no contrato de per si como outorgado. Havendo então, duas partes no negócio jurídico, porém um único emitente de vontade que regulará dois interesses contrapostos.

O Código Civil regulou este instituto no art. 117, a saber:

Salvo se o permitir a lei ou o representado, é anulável o negócio jurídico que o representante, no seu interesse ou por conta de outrem, celebrar contrato consigo mesmo. Parágrafo único. Para esse efeito, tem-se como celebrado pelo representante o negócio realizado por aquele em quem os poderes houverem sidos substabelecidos.

O contrato consigo mesmo, é vedado em nosso direito nos termos do art.117 do Código Civil, senão vejamos:

APELAÇÃO CÍVEL - EMBARGOS DE TERCEIRO - CONSTRIÇÃO IMOBILIÁRIA EM AÇÃO EXECUTÓRIA - APESAR DO ESFORÇO DO APELANTE, NÃO RESTOU EFETIVAMENTE COMPROVADA A PROPRIEDADE DA FRAÇÃO IDEAL DO IMÓVEL EM SEU FAVOR - VEDAÇÃO À CELEBRAÇÃO DO CONTRATO CONSIGO MESMO - ART. 117 , CC - PROVA TESTEMUNHAL NÃO CONFIRMOU A VERSÃO DO RECORRENTE - APELO IMPROVIDO - UNÂNIME. I - Na mesma data da feitura do instrumento procuratório suso mencionado. (TJ-SE - APELAÇÃO CÍVEL AC 2005208974 SE Data de publicação: 28/08/2007)

PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO CAUTELAR - LETRA DE CAMBIO -CONTRATO CONSIGO MESMO. I - E NULA A CLAUSULA CONTRATUAL EM QUE O DEVEDOR AUTORIZA OCREDOR A SACAR, PARA COBRANÇA, LETRA DE CAMBIO REPRESENTATIVA DEQUALQUER QUANTIA EM ATRASO. II - O PRINCIPIO, ASSIM, CONSUBSTANCIADO NO VERBETE 60, DO STJ EREVIGORADO PELO LEGISLADOR QUE, COM A VIGENCIA DO CÓDIGO DOCONSUMIDOR, PASSOU A COIBIR CLAUSULAS, CUJA PACTUAÇÃO IMPORTENO CERCEIO DA LIVRE MANIFESTAÇÃO DA VONTADE DO CONSUMIDOR. III - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. STJ - RECURSO ESPECIAL REsp 95625 MG 1996/0030567-6 Data de publicação: 09/06/1997).

O artigo em questão prescreve uma condição para validar o autocontrato, assim, caso o representante venha a efetivar negócio jurídico consigo mesmo no seu interesse ou por conta de outrem anulável será tal ato, exceto se houver permissão legal ou autorização do representado.

3.3-      SUBSTABELECIMENTO

A lei cuida da hipótese em que os poderes tenham sido substabelecidos pelo representante a um terceiro, aduzindo no parágrafo único do art. 117 - CC que: “tem-se como celebrado pelo representante o negócio realizado por aquele em que os poderes houverem sido substabelecidos”.

Importante ressaltar que a lei não permite o substabelecimento dos poderes recebidos na chamada representação legal. Assim, quem detém o poder familiar não pode substabelecer quaisquer poderes que lhe tenham sido conferidos por lei, por ser considerado um múnus instransferível.

Conforme se extrai das jurisprudências abaixo:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DESTITUIÇÃO DE PODER FAMILIAR. ACEITAÇÃO EXPRESSA DO COMANDO SENTENCIAL QUE DESTITUIU DO PODER INERENTE AOS GENITORES. PRECLUSÃO LÓGICA. FALTA DE INTERESSE RECURSAL. INTELIGÊNCIA DO ART. 503 DO CPC . PEDIDO DE TRANSFERÊNCIA DO PODER FAMILIAR PARA A AVÓ DAS MENORES. IMPOSSIBILIDADE. MUNUS INTRANSFERÍVEL. VIA INADEQUADA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO NÃO CONHECIDO. Carece de interesse recursal a litigante que concorda com a decisão, implicando preclusão do direito de recorrer e, por consequência, o não conhecimento do recurso interposto. TJ-SC - Apelação / Estatuto da Criança e do Adolescente APL 262810 SC 2009.026281-0 Data de publicação: 26/01/2010).

Se, em caso de representação voluntária, houve substabelecimento de poderes, o ato praticado pelo substabelecido reputar-se-á como tendo sido celebrado pelo substabelecente, pois não houve transmissão do poder, mas mera outorga do poder de representação.

3.4-      OBRIGATORIEDADE DE PROVAR A CONDIÇÃO DE REPRESENTANTE

Como os negócios jurídicos realizados pelo representante são assumidos pelo representado, aquele terá o dever de provar àqueles, com quem vier a tratar em nome do representado, não só a sua qualidade, mas também a extensão dos poderes que lhe foram conferidos.

Neste sentido:

CADERNETA DE POUPANÇA COBRANÇA - ILEGITIMIDADE ATIVA "AD CAUSAM" - REPRESENTAÇÃO LEGAL -AUSÊNCIA - EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO - ART. 267 IV e VI , § 3o DO CPC -RECONHECIMENTO, DE OFÍCIO. Ação aforada pelo autor, em nome próprio, visando o recebimento de valor,referente a conta de titularidade de terceiros. Ausência de comprovação de representação legal. Impossibilidade de questionar direito alheio como sendo próprio (art. 6", CPC ). Ilegitimidade ativa" ad causam ". Logo, estando ausentes as condições da ação, bem como os pressupostos para o desenvolvimento regular do processo, de rigor a extinção do processo sem resolução de mérito, com base no art. 267 , IVe VI , § 3ºdo CPC .( TJ-SP - Apelação APL 990101290464 SP (TJ-SP) .

Segundo dispõe o art. 118 – CC: “o representante é obrigado a provar às pessoas com quem tratar em nome do representado, a sua qualidade e a extensão de seus poderes, sob pena de, não o fazendo, responder pelos atos que a estes excederam”.

Assim, sem que o terceiro tenha plena ciência da representação, sua extensão e qualidade seja ela voluntária ou legal, o dito representante responderá perante este terceiro pela prática de atos que excederem os poderes.

3.5- ANULABILIDADE DOS ATOS PRATICADOS CONTRA O INTERESSE DO REPRESENTADO

Nesta hipótese, são levados em conta os atos praticados pelo representante contra o interesse do representado. São atos praticados pelo representante, em nome do representado, objetivamente legais, mas que prejudicam este último.

O legislador teve o cuidado de enfatizar tal resultado jurídico ao prescrever no art. 116, do CC, que “a manifestação de vontade pelo representante, nos limites de seus poderes, produz efeitos em relação ao representado”.

É possível ao representante, desde que não extrapole o poder de que se acha investido, emitir confissão, vinculando o representado. Será ineficaz a confissão que tiver por objeto algum tema não constante nos poderes conferidos pelo representado (art. 213, do CC).

Segundo o art. 119 – CC: “É anulável o negócio jurídico concluído pelo representante em conflito de interesses com o representado, se tal fato era ou devia ser do conhecimento de quem com aquele tratou”.

A hipótese versada pelo art. 119, do CC é o conflito entre o representado e o representante. A lei distingue duas situações para o ato negocial que realiza não obstante o impedimento: a) se a situação conflitiva era do conhecimento da pessoa com que o representante praticou o negócio jurídico, o ato será anulável por iniciativa do representado; b) se o agente que praticou se encontrava de boa-fé, o ato será válido, resolvendo-se a pendência entre as partes da representação segundo os princípios da responsabilidade civil.[xii]

Neste sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO - ATO JUDICIAL - GRAVAME - DECISÃO INTERLOCUTÓRIA - RECORRIBILIDADE - INCAPAZ - CONFLITO DE INTERESSES COM REPRESENTANTE LEGAL - CURADOR ESPECIAL - JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA - COISA JULGADA MATERIAL - AUSÊNCIA - MODIFICAÇÃO DE OFÍCIO PELO JUIZ - MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA - EFEITO TRANSLATIVO. 1- O ato judicial que acarreta gravame às partes não pode ser enquadrado como despacho de mero expediente, sendo portanto suscetível à insurgência por meio de recurso. 2 - É nulo o processo no qual não foi nomeado curador especial a incapaz, evidenciado notório conflito de interesses entre o menor e seu representante legal. 3 - A sentença proferida em procedimento de jurisdição voluntária não possui aptidão para formar coisa julgada material, podendo ser modificada até mesmo de ofício, mormente em se tratando de matérias de ordem pública. 4 - As matérias de ordem pública são cognoscíveis em sede de agravo até mesmo de ofício pelo Tribunal, ocorrendo sua devolução através do efeito translativo do recurso. (TJ-MG - 104390504573650011 MG 1.0439.05.045736-5/001(1) Data de publicação: 09/02/2009).

E, também, neste sentido:

INVENTÁRIO - HERDEIROS MENORES - REPRESENTAÇÃO IRREGULAR - CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS - NULIDADE. Os poderes conferidos a tutores e curadores não lhes dão permissão para alienar bens, nem direitos, sendo nula a escritura pública lavrada para tal finalidade, ainda mais se não comprovada a regularidade da representação dos menores, os quais, ainda que hoje tenham alcançado a maioridade, não puderam aquilatar da lesão a seus direitos e interesses quando da lavratura da referida escritura, não podendo prevalecer a partilha homologada a partir dela, eis que evidentemente ineficaz, com reflexos lesivos aos interesses dos incapazes chamados à sucessão. (Processo: Apelação Cível 1.0456.98.000863-9/001, Data de Julgamento: 02/02/2006, TJMG).

Estamos, na hipótese, na presença de dois interesses possivelmente antagônicos: de um lado, o interesse do representado, que se almeja proteger, pois a ideia é de que o representante deva atuar na defesa do interesse do representado; de outro, o interesse do terceiro de boa-fé, que contratou com o representante, na persuasão de que este atuava de acordo com as suas instruções.

O Código Civil protege os interesse do terceiro de boa-fé, tornando anulável o negócio apenas se o fato era ou devia ser do conhecimento do terceiro, pois nesta hipótese não existe mais a figura do terceiro de boa-fé.

Neste diapasão, o art. 119 do CC. prevê a causa subjetiva de anulabilidade que é o conflito de interesses entre representante e representado. No entanto, na ignorância do terceiro, prevalecerá o negócio praticado, por prestígio da boa fé, mas o representante responderá perante o representado, ou seus herdeiros, pelos danos que daí provier.

O prazo para se intentar a anulação é de 180 dias, conforme parágrafo único do art. 119, do CC, conforme Maria Helena Diniz[xiii]:

E se porventura, o representante em conflito de interesses (p.ex., oriundo de abuso sou de falta de poder) com o representado celebrar negócio com pessoa que devia ter conhecimento do fato, ele poderá ser declarado anulável, dentro do prazo decadencial de 180 dias, contado da conclusão do ato negocial ou da cessação da incapacidade do representado.

Assim se, porventura, o representante concluir o negócio jurídico, havendo conflito de interesses com o representado, com pessoa que devia ter conhecimento desse fato, aquele ato negocial deverá ser declarado anulável.

3.6-      EXTINÇÃO DO PODER DE REPRESENTAÇÃO LEGAL E SEUS EFEITOS

A extinção da representação pode se dar pelas seguintes maneiras:

a)  Como consequência do exaurimento de seu conteúdo (já fez o que tinha que se feito: resultante do poder de representação que ele se extinga com o exercício, obtendo-se o ato jurídico que se desejava obter com ele.

b)  Se resulta de seu conteúdo: quando ele se extinguirá quando se realizar a condição resolutória, ou se atinge o termo, salvo se diversamente se dispôs.

c) Se sobrevém impossibilidade de seu exercício, como por exemplo, se fora para o ato de casamento de A e com B e B se casou com outrem,

d)  Na dúvida, com a incapacidade do investido do poder de representação,

e)  Pela morte de um dos dois (exceto quando o representante não sabe da morte de seu representado), como por exemplo no caso do mandato (1316, II, CC). Para Pontes de Miranda, a representação não se extingue pela morte de quem outorgou, somente com a morte do investido do poder de representação, porque a questão a solução se cingirá, se a morte extingue ou não o negócio jurídico em que se funda.[xiv]

f)  Por revogação por parte do representado, ou renúncia do representante (somente na convencional), sendo que a revogação pública só é eficaz se chega ao conhecimento da pessoa que a contesta.

g)   Quando o menor atinge a maioridade (somente na legal).

Quanto à morte do representante legal e extinção da representação, temos as seguintes jurisprudências, uma dando nulidade relativa e outra nulidade absoluta aos casos:

PROCESSO CIVIL - RECURSO ESPECIAL - VIOLAÇÃO AO ART. 134 DO CPC - FALTA DE PREQUESTIONAMENTO - SÚMULA Nº 356/STF - FALECIMENTO DA REPRESENTANTE LEGAL DO ESPÓLIO - PROCESSO NÃO SUSPENSO - NULIDADE RELATIVA - VALIDADE DOS ATOS PROCESSUAIS PRATICADOS - FINALIDADE ATINGIDA E AUSÊNCIA DE PREJUÍZO - PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. 1 - Não enseja interposição de Recurso Especial matéria (art. 134 do CPC ) não ventilada no v. julgado atacado e sobre a qual a parte não opôs Embargos Declaratórios, estando ausente o devido prequestionamento. Aplicação da Súmula 356/STF. 2 - Precedentes (REsp nº 575.576/PR e AgRg AG nº 589.999/DF). 3 - O fato do processo relativo à Ação de Extinção de Condomínio em questão não ter sido suspenso após o falecimento, em 24.12.89, da representante legal do espólio enseja nulidade relativa. Isto porque a norma prevista no art. 265 , I , do CPC objetiva preservar o interesse particular do espólio e, conseqüentemente, dos herdeiros do falecido. In casu, o processo ficou paralisado de abril/87 a abril/96, houve a nomeação de novo inventariante, todos os herdeiros participaram do leilão realizado no ano de 1997, inexistindo, assim, qualquer prejuízo aos interessados. Incide, à hipótese, o Princípio da Instrumentalidade das Formas, segundo o qual o ato deve ser mantido mesmo quando praticado de maneira diversa à prevista em lei, desde que atingida a finalidade e inexistente prejuízo. 4 - Precedentes (REsp nºs 203.929/PR e 169.176/DF). 5 - Recurso não conhecido.(STJ - RECURSO ESPECIAL REsp 416251 RJ 2002/0020056-8).

Também:

RECURSO DE APELAÇÃO DE TERCEIRO INTERESSADO. SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE TRANSAÇÃO ENTRE O EXEQÜENTE E A EXECUTADA OLARIA SÃO FRANCISCO. MORTE DA REPRESENTANTE LEGAL DA EXECUTADA ANTES DA CELEBRAÇÃO DA TRANSAÇÃO. PEDITÓRIO SUBSCRITO PELO PROCURADOR. EXTINÇÃO DOS PODERES COM O FALECIMENTO DA REPRESENTANTE LEGAL. PRECEDENTE DA COLENDA CORTE. NULIDADE DA SENTENÇA DECRETADA. ACÓRDÃO Acordam os Magistrados integrantes da DÉCIMA QUARTA CÂMARA CÍVEL do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, J. S. FAGUNDES CUNHA - Relator, Desembargador GUIDO DÖBELI - Revisor e GIL GUERRA - Vogal, sob a Presidência do Desembargador EDSON VIDAL PINTO, por unanimidade de Votos, em CONHECER e DAR PROVIMENTO ao Recurso de Apelação, para anular a sentença, nos termos do Voto do Relator e de acordo com o que consta na Ata de Julgamento. Curitiba, 05 de novembro de 2008. J. S. FAGUNDES CUNHA RELATOR. (TJ-PR - Apelação Cível AC 2705719 PR 0270571-9).

Quanto à eficácia após a extinção do poder de representação, Pontes de Miranda[xv], adverte:

que a terminação do poder de representação opera-se ipso iure. Não se dizendo que é preciso chegar ao conhecimento de terceiro, ou do outorgado, que foi revogada a outorga, porque a revogação entra no mundo jurídico ao ser suficiente o seu suporte fático, o que depende da recepção pelo destinatário é a eficácia, em duas direções (ao outorgado, ao terceiro, ou terceiros). Exatamente no se determinar quando e a respeito de quem começa a eficácia. (...) A tutela do terceiro supõe que a outorga lhe tenha chegado ao conhecimento e não a revogação.

Conclui o autor que a tutela do terceiro supõe a outorga que lhe tenha chegado ao conhecimento e não a revogação. Tratando-se de outorga de poder de representação, que se tenha lançado ao público, a revogação há de ser com a mesma extensão. Se a outorga foi em instrumento público, não há divulgação, e a revogação há de ser com a averbação à escritura de outorga, e, no registro de imóveis, se aí foi registrada. Se a outorga foi em instrumento particular, o outorgante tem que providenciar para que lhe seja devolvido, ou promoverá a publicação da revogação, o que se pode obter por decisão do juiz, com o edital, â semelhança da citação, sendo que a revogação de outorga irrevogável de poder representação é ineficaz.[xvi]

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Sobre a autora
Maristela Aparecida Dutra

Doutoranda em Direito Civil Comparado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo- PUC-SP, Mestre em Direito das Relações Econômico-Empresarias pela Universidade de Franca-UNIFRAN, `Pós- Graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade de Franca- UNIFRAN, Professora de Direito Civil, Processo Civil e Direito do Consumidor no Centro Universitário do Planalto de Araxá- UNIARAXA, advogada militante na Comarca de Araxá-MG.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Artigo realizado durante o curso de Doutorado em Direito Civil Comparado na PUC-SP, na matéria Teoria do negócio jurídico, ministrada pela Dra. Maria Helena Diniz.

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