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Traços jurídicos, físicos e econômicos da modalidade de negócio chamada shopping center

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01/07/2000 às 00:00
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CASOS CONCRETOS

O caso mais atual que temos notícias é exatamente o Recreio Shopping Center, cuja arquitetura assemelha-se mais a um supermercado com galeria estendida. Tem como loja âncora um supermercado, e o empreendedor é a Construtora SANTA ISABEL S.A.. A imprensa divulgou as dificuldades pelas quais passam os lojistas do Recreio Shopping Center de terem de sustentar seus dispendiosos negócios sem a respectiva contrapartida, pois o que adquiriram como ponto comercial em um "shopping center", segundo os lojistas, não condiz com realidade a eles prometida e vendida, como constataram em realidade. Teme-se que possivelmente não haja nenhum "shopping center" no entendimento objetivo do conceito.

Novamente muitos que pagaram fábulas pelas "luvas" de seus pontos (até R$ 3.500,00 por m2, acima mesmo do custo de construção), custearam obras de finalização de construção e acabamento (lembremo-nos que são entregues no "osso", em afronta à Lei que dispões que o imóvel seja locado em condições de uso ao que se destina), correm o risco de terem de devolver a sua loja ao empreendedor, e este terá mais uma loja para alugar, agora valorizada com as benfeitorias aderidas e não indenizáveis, cobrando outras "luvas", aluguel em dobro em dezembro, etc; o que leva, em verdade, o empreendedor a locupletar-se do esforço alheio.

O Tijuca Shopping Center é outro exemplo. Sem "habite-se" e entregue em precárias condições aos lojistas em dezembro de 1996. Tal empreendimento finalizado pela CIMA, iniciado pela Imobiliária Nova York na década de 70, teve que alterar radicalmente seu projeto original para enquadrar-se na definição da ABRASCE para ser considerado um "shopping center". O atual estágio jurídico é deveras complicado, uma vez que por causa dessas modificações algumas lojas deixaram de existir e seus proprietários as estão reclamando em justiça. Também já houveram reclamações quanto ao aluguel em dobro no mês de dezembro uma vez que já o cobraram em 1996, primeiro mês de funcionamento, embora precário. Além disso alguns lojistas custeassem reclamam da falta de transparência da prestação de contas do condomínio e suspeitam que custearam a finalização das obras, diluídas através da cota condominial. Ainda existem inúmeras lojas vazias, grande parte do estacionamento sem finalização e o ar-condicionado ruidoso, sendo alvo de várias fiscalizações e multas e até ameaça de interdição.

Outro caso que temos conhecimento é o Terra Encantada (!?!?!), parque temático inaugurado em novembro de 1997 também de forma precária, portanto aquém das expectativas pretendidas pelos lojistas ao contratarem as locações. Tais contratos de locação são como se o Terra Encantada fosse um "shopping center", que também rezam o pagamento de "luvas" (res sperata), aluguel em dobro em dezembro e aluguel percentual, auditorias; mesmo o Terra Encantada não sendo um SC, cuja definição é estritamente objetiva.

A BRASCAN, fundadora da ABRASCE e empreendedora de ilibada e reconhecida capacidade é a empreendedora do Shopping Center do Paço do Ouvidor, notável empreendimento sem estacionamento, com apenas 34 lojas, muitas delas voltadas para a rua, sem campanhas de marketing, tendo muitas lojas vazias na atualidade. Seria o caso de experiente empreendedor cometer equívocos ao lançar um empreendimento que em pouco tempo ter quase a totalidade das lojas fechadas e não mais as consegue alugar?

Um lojista ajuizou ação questionando que o Shopping Center do Paço do Ouvidor não seria um SC de fato, alegando exatamente a falta dos elementos caracterizadores. Possivelmente, com o objetivo de não ter uma sentença judicial desfavorável, a Brascan resolver encerrar a lide em um acordo generoso.

Outro caso é o do Tijuca Off-Shopping, cujo signatário dessa contratou uma locação em uma loja que não pertencia ao locador com quem foi pactuada a locação, como se fosse um SC de fato, sem "habite-se" e em precárias condições de funcionamento que causou a quebra de boa parte dos lojistas que lá se instalaram. Trata-se de dois condomínios com quatro lâminas de prédios residenciais com dois conjuntos de galerias de lojas separados por uma rua. Os contratos não são padronizados e muitos deles não contém uma única cláusula diferente de uma locação ordinária, apenas os do felizardos lojistas que pactuaram seus contratos em início de 1995, em sua "expansão. A gigantesca inadimplência do condomínio inviabiliza qualquer tentativa de propaganda ou mesmo a manutenção dos já precários prédios.

As dificuldades de tais lojistas em terem que arcar com os custos de aluguel e demais encargos, mesmo não faturando o previsto em função da precariedade dos empreendimentos, já ganharam notoriedade nas páginas dos jornais e revistas diversas vezes, porém sempre com a simplória - e por isso mesmo perigosa - visão que o insucesso é em função dos elevados custos.


A CRISE NO RAMO DE "SHOPPING CENTERS"

Quem pode confirmar e acrescentar inúmeros exemplos que comprovem que a ocorrência sistemática de que isso seja prática corrente é a ALOSERJ, Associação das Empresas Lojistas em Shopping Centers do Estado do Rio de Janeiro, na pessoa do Sr. Cláudio Gordilho, seu atual Presidente, além de Daniel Plá, atual Presidente da ABF, Associação Brasileira de Franshising.

O conselho de alguns empresários de grande sucesso nacional tal como Daniel Plá, professor de Administração na PUC-RJ e Presidente da ABF, que fugir dos "shopping centers" é questão de sobrevivência, reside na constatação de que não existe, em verdade, parceria entre lojistas e empreendedor nesta modalidade de negócio. É um relacionamento desigual, no qual o lojista fica refém daquele que pode procurar extrair o que dele puder, e depois colocar outro em seu lugar.

Vale ressaltar o valoroso empenho do Sr. Daniel em regulamentar o setor de Franshising, uma vez que após o "boom" do setor vários franqueados perceberam que seus negócios de franquia, muitos comprados a peso de ouro, não valiam nada pois se tratavam apenas de negócios "caça níqueis" por parte dos franqueadores, não tendo estes nenhuma responsabilidade quanto à possíveis fracassos e prejuízos. Portanto se fazia necessário uma regulamentação no setor, que foi feita (Lei 8.955/94), onde é definida a responsabilidade do franqueador quanto ao fracasso do franqueado, para se pudesse resgatar a credibilidade do Franshising.

O atual quadro de elevado número de lojas fechadas em muitos "shoppings" pelo Brasil não advém só do fator crise econômica, mas também da crise de credibilidade e desconfiança pela qual passa este tipo de negócio. Bastamos fazer uma simples estimativa: será possível estimar quantas pessoas, empresários de renome, comerciantes, conhecedores e "vítimas" do "golpe do Shopping Center", ou que simploriamente o acham inviável devido aos elevados custos, que fazem campanha boca-a-boca contra aos que a elas inquirem sobre suas desagradáveis experiências? Obviamente são milhares.

Também há o empenho do Presidente do Grupo Multiplan (Barrashopping), José Isaac Peres, em diferenciar os empreendimentos ditos "shopping center", muitos nos quais, segundo ele, nos "shoppings" de lojas vendidas o lojista abre suas portas com sua falência decretada, uma vez que o próprio Barrashopping apresenta elevado números de lojas fechadas e poucos candidatos a lojistas.

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O próprio Daniel Plá realizou, com seus alunos de Administração da PUC-RJ, uma importante pesquisa junto aos lojistas de "shopping center" que buscou retratar a atual situação com exatidão. Ao que tudo indica os resultados causaram a perplexidade desilusão dos que esperavam muito de seus negócios.

O Globo que publicou uma reportagem Domingo, dia 29 de março, página 43, sob o título: "Custos altos afugentam os lojistas dos shoppings". Reconheço que, embora a reportagem tenha sido boa, o discurso em tom simplório não foi de denúncia e continha algumas imperfeições técnicas.

O Jornal do Commércio, no dia 25 de maio de 1998, publicou matéria sob o título "A verdadeira guerra do comércio" onde de forma brilhante e corajosa, expôs a verdadeira situação que se passa encoberta atrás das pesadas cortinas que separam público e bastidores.

O mesmo Jornal do Commércio, no dia 2 de maio de 1999 publicou outra matéria aludindo que o empreendedor do SC é um sócio que só quer sócios lucrativos. Atenta para o fato de que se o lojista trabalha com ganho bruto na ordem de 25%, os encargos locatícios consomem até a metade do lucro e alerta para a alta rotatividade desses empreendimentos.

O objetivo é alertar com mais veemência quanto a estes fatos que violam, claramente, a Ordem Econômica, o princípio basilar do Direito que não deve haver enriquecimento sem causa, que é fator de criação de uma nova realidade econômica derradeira para um sem número de pessoas, onde se fazem mais miseráveis do que milionários, e que necessita ser regulamentado em Lei o mais breve possível. Não é excesso, se fizermos um paralelo ao aludido no art. 171 do C.P.B., artigo que trata do crime de estelionato, (do camaleão que se chama estélio), que alguns "shopping centers" são verdadeiros estelionatos .

A própria Justiça tem se mostrado plurívoca e confusa quanto às questões envolvendo tal matéria, comumente com sentenças totalmente disparatadas do que já existe como doutrina e jurisprudência. Muito comumente, os julgadores têm, além da visão deturpada da realidade, dificuldades em examinar os méritos das questões que envolvem essas relações. Covardemente invocam o princípio de pacta sunt servanda para decidir tais questões sem no mínimo examinar o mérito. Em pesquisa à jurisprudência, encontramos cerca de quarenta acórdãos existentes relativos ao tema mas em nenhum deles o lojista logrou sucesso embora fossem pertinentes os pedidos.


FINALIZANDO

Futuramente dissecaremos um contrato de locação em "shopping center" cláusula por cláusula confrontando-as com a realidade, com o direito, com a jurisprudência e com os princípios da economia e da administração. Não o fiz por não ter tido tempo hábil para fazê-lo. Sei que tal análise depois de consolidada a discussão seria de grande valia.

Ter uma empresa consolidada, com posição definida no mercado, bem administrada e eficiente, bom aporte financeiro, são fatores inerentes ao sucesso em um SC, mas sobretudo saber avaliar o empreendedor e o empreendimento, pois existem alguns que trabalham com seriedade e realmente ganham com a criação de mercado e não com golpes.

O setor há de ser regulamentado o mais rapidamente possível pois já apresentam números significativos, não só os econômicos, mas os judiciais também. São milhares ações que envolvem a execução de lojistas e seus fiadores bem como as de despejo. Embora não tenha um dado confiável a esse respeito, creio que esta é uma outra indústria paralela à indústria do SC .

Não tenho a pretensão de ser dono da absoluta verdade por isso agradeceria críticas e sugestões acerca do assunto em tela.

Sua opinião será valiosa para o sucesso desse trabalho.


BIBLIOGRAFIA (sugestão para leitura)

          Livros:

  • Comentários à Nova Lei do Inquilinato, de Nagib Slaibi Filho, Editora Forense, 9ª Edição/1986.
  • Shopping Center visto pelos tribunais de Jaques Bushatsky, editora EDIPRO, 1993
  • Shopping Centers Aspectos Jurídicos e Suas Origens de Maria Elisa Gualandi Verri, 1996
  • Lei de Luva Jurisprudência de Darcy Arruda Miranda Júnior e Alfredo Luiz Kugelmas, editora Revista dos tribunais, 1988

          Internet (sites):

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Sobre o autor
Márcio Pecego Heide

advogado, pós-graduado em Advocacia Criminal pela UCAM/RJ

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HEIDE, Márcio Pecego. Traços jurídicos, físicos e econômicos da modalidade de negócio chamada shopping center. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 43, 1 jul. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/610. Acesso em: 22 nov. 2024.

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