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Olga:

a Justiça falhou

02/01/2005 às 00:00
Leia nesta página:

A expulsão de Olga Prestes foi chancelada pela Justiça.

O advogado Heitor Lima impetrou um habeas corpus perante a Corte Suprema, que era o mais alto órgão do Poder Judiciário, na época.

O apelo judicial destinava-se a impedir que Olga fosse expulsa do território nacional.

A impetração tinha pleno fundamento na Constituição Federal de 16 de julho de 1934, vigente no Brasil de então.

O Regime Vargas, sob o aspecto jurídico, não foi igual de 1930 a 1945.

A Constituição de 1934 pretendeu compatibilizar o regime com certo grau de civilização jurídica. Resultou, indiretamente, da Revolução Paulista de 1932 que cobrava do Governo Central seu compromisso democrático. Desencadeada para corrigir os males da "República Velha", a Revolução de 1930 não podia perpetuar uma ditadura. A revolta de São Paulo foi esmagada pelo poder central mas o sangue dos heróis paulistas obrigou o Regime Vargas a constitucionalizar o Brasil em 1934. Esses ares liberais duraram pouco: em 1937 desabou sobre o país o Estado Novo.

Conforme se lê no art. 113, inciso 31, da Constituição de 1934:

"Não será concedida a Estado estrangeiro extradição por crime político ou de opinião, nem, em caso algum, de brasileiro."

E ainda conforme está expresso no art. 5º, inc. XIX:

"compete à União legislar sobre a expulsão de estrangeiros", não se cogitando, em parte alguma da Constituição de 1934, da expulsão de brasileiro.

Olga estava amparada pelos preceitos constitucionais:

a) se crime lhe era imputado, tinha esse natureza política e de opinião;

b) ela estava grávida de uma criança brasileira e a expulsão ou extradição seria dela e da criança guardada no seu seio.

O habeas corpus tomou o número 26.155 e foi julgado em 17 de junho de 1936.

A maioria dos ministros não conheceu do pedido. E os que conheceram, indefiram-no. Foi, portanto, unânime a rejeição à súplica de Olga.

O mais grave é que os ministros, como está literalmente expresso na decisão do habeas corpus:

a) indeferiram a requisição do processo administrativo que determinava a expulsão;

b) indeferiram o comparecimento da paciente ao tribunal;

e, pasmem:

c) indeferiram a "perícia médica a fim de constatar o seu alegado estado de gravidez".

Esse julgamento não honra a Justiça brasileira. Mas o debate do caso contribui para o avanço da cidadania porque a partir do erro podemos buscar diretrizes para o acerto.

Conquistamos, no país, a plena liberdade de opinião. Podemos hoje ter acesso pela internet a esse habeas corpus. Podemos denunciar a iniqüidade do que foi feito e lutar para que uma Justiça honrada e digna, sob vigilância e censura pública, decida com retidão as causas que lhe sejam submetidas, não se dobrando à prepotência, não se amesquinhando no servilismo, não se prostituindo na corrupção.

É um caminho a caminhar.

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Sobre o autor
João Baptista Herkenhoff

Magistrado aposentado (ES), professor, escritor, palestrante. Autor, dentre outros livros, de: Direito e Utopia (Livraria do Advogado Editora, Porto Alegre).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HERKENHOFF, João Baptista. Olga:: a Justiça falhou. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 544, 2 jan. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6122. Acesso em: 22 nov. 2024.

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