Comentários às orientações normativas da AGU que versam sobre contratação direta, licitações e contratos da Administração Pública

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09/11/2017 às 11:55

Resumo:


  • A Advocacia-Geral da União (AGU) publicou orientações normativas para uniformizar a atuação dos órgãos jurídicos da AGU em temas de licitações e contratos administrativos.

  • Essas orientações são fundamentadas na jurisprudência do Tribunal de Contas da União (TCU), pareceres da AGU e legislação pertinente, visando refletir o posicionamento do TCU e da administração federal.

  • As orientações abordam diversos aspectos, incluindo a vigência de contratos de serviço contínuo, a formação de processos administrativos, a prorrogação de prazo de contratos, entre outros temas relevantes para a administração pública.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Orientação Normativa/AGU nº 5, de 01.04.2009

“Na contratação de obra ou serviço de engenharia, o instrumento convocatório deve estabelecer critérios de aceitabilidade dos preços unitários e global”. 34

A orientação normativa em destaque determina ao administrador público, na ocasião da elaboração do ato convocatório das licitações cujo objeto é a execução de obras e serviços de engenharia, que estabeleça como critério de aceitabilidade de preços, além do preço global para executar o ajustado, os preços unitários.

De conseguinte, fixando-se preços unitários e global máximos, haverá controle objetivo e preventivo, afastando a presença de preços excessivos na ocasião da licitação, na medida em que o particular que apresentar preço superior àquele estabelecido como máximo deverá ter a sua proposta desclassificada com arrimo no inc. I do art. 48 do Estatuto federal Licitatório

Nesse sentido, em caso de eventual acréscimo ou supressão do objeto durante a sua regular execução, a presença dos preços unitários servirá de base para a realização deste expediente, já que foram previamente fixados, inexistindo, neste momento dificuldade para estabelecê-los.35

Com efeito, a ausência de preços unitários pode ser uma brecha para realização de superfaturamento na ocasião em que o objeto é alterado, uma medida em que o indeterminismo pode levar a eleição de preços unitários destacados dos daqueles observados no mercado correlato. Não é de outra forma que se manifesta o TCU, in verbis:

“É preciso ter em mente que, mesmo nas contratações por valor global, o preço unitário servirá de base no caso de eventuais acréscimos contratuais, admitidos nos limites estabelecidos no Estatuto das Licitações. Dessa forma, se não houver a devida cautela com o controle de preços unitários uma proposta aparentemente vantajosa para a administração pode se tornar um mau contrato”.36

Tal orientação já era apontada pela doutrina, melhor lecionada pelo saudoso jurista Diogenes Gasparini37, in verbis:

“Embora seja assim, o instrumento convocatório deve solicitar que a proposta também apresente o preço unitário dos insumos indispensáveis à execução da obra ou do serviço. Essa exigência não descaracteriza o preço global e permite a utilização desses preços em casos de acréscimo e supressões.”

Assim, a adoção do expediente ventilado na orientação em destaque prestigia o princípio da economicidade, que deve ser observado também na ocasião da execução contratual, uma vez que evitará que a Administração aceite preços unitários acima dos preços de mercado, mas vantajosos no seu preço global


Orientação Normativa/AGU nº 6, de 01.04.2009

“A vigência do contrato de locação de imóveis, no qual a Administração Pública é locatária, rege-se pelo art. 51 da Lei nº 8.245, de 1991, não estando sujeita ao limite máximo de sessenta meses, estipulado pelo inc. II do art. 57, da Lei nº 8.666, de 1993”. 38

Tal orientação normativa vem reafirmar o entendimento de que a disciplina da vigência dos contratos administrativos, constante do art. 57 da Lei de Licitações, não se aplica aos contratos cujo objeto refira-se a locações de imóveis, onde a Administração Pública figure como locatária, por conta da determinação constante do art. 62, § 3º, I, da Lei de Licitações, que estabelece:

“Art. 62. ...

...

§ 3º Aplica-se o disposto nos arts. 55 e 58 a 61 desta Lei e demais normas gerais, no que couber:

I - aos contratos de seguro, de financiamento, de locação em que o Poder Público seja locatário, e aos demais cujo conteúdo seja regido, predominantemente, por norma de direito privado;”

Por conseguinte, quando a Administração celebra uma contratação com um particular visando locar um bem para determinado uso, figurando-se como locatária,acaba por se submeter, além das normas de direito público, naquilo que couber, às normas de direito privado, sendo uma delas, como expressamente determina a orientação normativa estudada, o art. 51 da Lei de Locações.

Afastando-se a aplicabilidade do art. 57 da Lei de Licitações - muito embora a Administração desatenta tente configurar a locação, que muito embora seja um serviço, por força do inc. II do art. 6º da norma supramencionada, como um serviço continuado, a fim de alcançar a vigência do ajuste no prazo máximo admitido pelo dispositivo supramencionado, ou seja, 60 meses - desengessa-se o contrato, o que permite maior elasticidade do prazo contratual, permitindo-se, por exemplo, que a vigência se estenda além do exercício financeiro e sejam prorrogados com fundamento nas regras pertinentes ao Direito Privado, evitando prejuízo ao interesse público almejado com a locação do imóvel. Sobre o tema em destaque, não é de outra forma que entende o Eg. Tribunal de Contas da União39, a saber, in verbis:

“18. Além disso, é certo que o art. 62, § 3º, inc. I, particularizou alguns dispositivos, sem olvidar as demais normas gerais, obrigando sua incidência sobre os contratos cujo conteúdo seja regido, predominantemente, por norma de direito privado, inclusos aí os contratos de locação em que o Poder Público seja locatário.

19. Isso objetivando que, na participação de entidade administrativa em relação contratual caracteristicamente privada, houvesse sujeição do particular a algumas normas de direito público com vista a assegurar a observância da legalidade e o respeito ao interesse público. Sujeição essa parcial, sob pena de supressão do regime de mercado ou do desequilíbrio econômico que ofenderia a livre concorrência e inviabilizaria a empresa privada.

20. Ocorre que o art. 57 que trata da duração e prorrogação dos contratos administrativos não foi mencionado entre as regras aplicáveis, no que couber (arts. 55 e 58 a 61, e demais normas gerais), aos contratos sob comento. Desse modo, entende-se plausível a argumentação de que o referido artigo possa não ser aplicável a esses contratos.

21. Nesse caso, a norma que disciplina a matéria recairia sobre a Lei nº 8.245/91 (Lei do Inquilinato), a qual prevê para o imóvel urbano a livre convenção no ajuste do prazo no tocante à duração do contrato, com exceção aos que tiverem prazo estipulado igual ou superior a dez anos, por depender de vênia conjugal.

23. Verifica-se, portanto, que ao publicizar os contratos de locação de imóveis celebrados pela Administração, o legislador deixou à aplicação do Direito Privado as questões relativas à duração e prorrogação desses contratos.

(...)

24. Nesse sentido é o entendimento de Maria Sylvia Zanella Di Pietro: ‘A restrição do artigo 57 também não se aplica aos contratos de concessão de obra pública. (...)

E não se aplica ainda aos contratos de direito privado celebrados pela Administração, porque o artigo 62, § 3º, ao determinar a aplicação, aos mesmos, das normas da Lei nº 8.666/93, fala expressamente nos artigos 55 e 58 a 61, pulando, portanto, o artigo 57, pertinente ao prazo’.” 40

Em lição cristalina, preleciona o Procurador-Geral do Ministério Público junto ao Eg. Tribunal de Contas da União, Dr. Lucas Rocha Furtado, o magistério que merece a reprodução, in verbis:

“Feitas essas considerações, observamos, ainda, que a Lei nº 8.666/93, em seu art 62, §3º, I, não determina que os contratos ali mencionados devam submeter-se ao disposto no art. 57, que cuida da fixação dos prazos de vigência dos contratos administrativos. Assim, nada impede, por exemplo, que a Administração alugue imóvel por prazo superior ao do exercício financeiro, não obstante tenha que observar o princípio geral que veda a celebração de contratos por prazo indeterminado.” 41

Arrematando o tema, esclareça-se que a premissa apontada na orientação normativa estudada não é recente, já sendo salientada à época da edição da Lei fed. Nº 8.666/93 pela Professora Alice Gonzalez Borges,42 cujo trecho merece reprodução, in verbis:

“f) é de se notar que, nessa enumeração de dispositivos sobre os contratos, a Lei não inclui alguns muitos importantes, quais sejam o art. 56, relativo às garantias contratuais, e o art. 57, que diz respeito à duração do ajuste, parecendo querer, deliberadamente, submetê-los à égide da legislação civil”

Neste caso, as regras para a prorrogação do ajuste, observando a disciplina fixada no art. 51 da Lei de Locações, deverão estar assentes no instrumento convocatório - caso a contratação precedeu a regular licitação - e no competente contrato de locação, que estabelecerá as regras para a dilação do prazo da avença, sob pena de restar inviabilizado a realização de tal expediente.


Orientação Normativa/AGU nº 7, de 01.04.2009

“O tratamento favorecido de que tratam os arts. 43 a 45 da Lei Complementar nº 123, de 2006, deverá ser concedido às microempresas e empresas de pequeno porte independentemente de previsão editalícia”. 43

A orientação normativa nº 7 vem impor interpretação à redação constante dos arts. 43 a 45 da Lei Complementar nº 123, de 2006, cujos dispositivos carregam benesses às microempresas e empresas de pequeno, bem como às cooperativas, por força do preconizado no art. 34 da Lei nº 11.488/04 44.

Conforme exegese imposta, entende-se que a disciplina legal é impositiva, dada a forma como foi grafada na lei. Lá se estabelece condutas vinculativas e não discricionárias ao administrador público quando do manuseio da disciplina insculpida no referido dispositivo. Desta feita, não há como agir de outra forma, a não ser aquela propositalmente positivada. Assim, vejamos:

“Art. 43. As microempresas e empresas de pequeno porte, por ocasião da participação em certames licitatórios, deverão apresentar toda a documentação exigida para efeito de comprovação de regularidade fiscal, 45 mesmo que esta apresente alguma restrição.” (destacamos)

“Art. 44. Nas licitações será assegurada, como critério de desempate, preferência de contratação para as microempresas e empresas de pequeno porte.” (destacamos)

“Art. 45. Para efeito do disposto no art. 44 desta Lei Complementar, ocorrendo o empate, proceder-se-á da seguinte forma:” (destacamos)

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Ressalte-se, por ser oportuno, que não é de outra forma que entende o e. TCU bem como a melhor doutrina:

"REPRESENTAÇÃO DE LICITANTE. PRIVILÉGIOS ESTABELECIDOS PELO ESTATUTO DA MICROEMPRESA E EMPRESA DE PEQUENO PORTE. LEI COMPLEMENTAR 123/2006. REVOGAÇÃO DE CAUTELAR. DETERMINAÇÕES. 1. Os privilégios concedidos às microempresas e empresas de pequeno porte pelos arts. 44 e 45 da Lei Complementar 123/2006 independem da existência de previsão editalícia." 46 47

Nesse sentido, merece destaque à lição discorrida pelo Jurista Marçal Justen Filho,48 in verbis:

“Os arts. 42 a 45 da LC nº 123 prevêem dois benefícios, aplicáveis em toda e qualquer licitação, em favor das ME e das EPP. Trata-se da possibilidade de regularização fiscal tardia e da formulação de lance suplementar em caso de empate ficto - benefícios esses que serão objetos de melhor análise em capítulos específicos, abaixo.

Os referidos benefícios são de observância obrigatória por todas as entidades administrativas que promoverem licitação. A fruição dos benefícios por parte das ME e das EPP não se subordina a alguma decisão discricionária da Administração Pública. Trata-se de determinação legal imperativa, derivada do exercício pela União de sua competência legislativa privativa para edital norma gerais sobre licitação (CF/88, art. 22, XXVII).

Portanto, não caberá negar a uma ME ou a uma EPP a possibilidade de beneficiar-se das regras previstas nos arts. 42 a 45 da LC 123, nem mesmo sob o argumento de regulamentação. Também não caberá afirmar que o ato convocatório não forneceu a solução cabível para o exercício e para o deferimento dos benefícios. Ainda que não haja regulamentação e não obstante o silencia do edital, os benefícios previstos na LC nº 123 deverão ser reconhecidos. O único fundamento apropriado para denegar a fruição dos referidos benefícios será a ausência de preenchimento dos requisitos previstos no art. 3º da LC nº 123.

Alias, esse entendimento já exposto pelo próprio TCU. Existe decisão em que se firmou que as regras de preferência contidas na LC nº 123 ‘ainda que não previstas no instrumento convocatório, devem ser seguidas, vez que previstas em lei. Cometerá ilegalidade o Sr. Pregoeiro caso, no decorrer do certame, recuse-se a aplicá-las, se cabíveis’”

Acórdão 7702/200 - Plenário

Por conseguinte, haja vista a impositividade verificada, o qual vincula o agente público, a ausência de regulamento editalício não afasta a observância de tal regramento. Assim, tais dispositivos legais são auto-aplicáveis, subsistindo-se ante a ausência previsão nas regras do torneio.

Ressalte-se, ainda, que como nos dispositivos estudados não foi consignada nenhuma condição para a sua efetiva aplicação, como, de fato, ocorreu nos demais que versam sobre as outras benesses, como a emissão cédula de crédito microempresarial além da concessão de tratamento diferenciado e simplificado (licitações diferenciadas, subcontratação necessária e cota de 25% de bens e serviços de natureza divisível ME e EPP), conclui-se que os artigos em destaque na orientação em relevo são inequivocamente auto-aplicáveis.

Alias essa e a exegese realizada pelo Tribunal de Contas da União. Nesse sentido, observe excerto extraído do Voto do Ministro Aroldo Certas, em acórdão emanado pelo retrocitada Corte de Contas, in verbis:

“2. É certo que para maior esclarecimento dos participantes as regras editalícias deveriam deixar claro o procedimento adotado para concessão da preferência legal, inclusive no que concerne ao disciplinamento da forma de comprovação da licitante para identificar-se como microempresa ou empresa de pequeno porte.

3. Entendo, contudo, conforme consignei no despacho concessivo da cautelar, que tal requisito não se fazia obrigatório. De fato, em uma análise mais ampla da lei, observo que seu art. 49 explicita que os critérios de tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte previstos em seus arts. 47 e 48 não poderão ser aplicados quando “não forem expressamente previstos no instrumento convocatório”. A lei já ressalvou, portanto, as situações em que seriam necessárias expressas previsões editalícias. Dentre tais ressalvas, não se encontra o critério de desempate com preferência para a contratação para as microempresas e empresas de pequeno porte, conforme definido em seus arts. 44 e 45 acima transcritos.

4. A existência da regra restringido a aplicação dos arts. 47 e 48 e ausência de restrição no mesmo sentido em relação aos arts. 44 e 45 conduzem à conclusão inequívoca de que esses últimos são aplicáveis em qualquer situação, independentemente de se encontrarem previstos nos editais de convocação.

5. Vê-se, portanto, que não houve mera omissão involuntária da lei. Ao contrário, caracterizou-se o silêncio eloqüente definido pela doutrina.49

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Sobre o autor
Aniello dos Reis Parziale

Graduado em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Advogado, consultor em Direito Público e gerente jurídico da Editora NDJ. Mestre em Direito Econômico e Político pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Autor de dezenas de artigos sobre Direito Administrativo, com ênfase em contratações públicas, servidores e direito municipal. Visite o site do autor: www.anielloparziale.com.br

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Artigo publicado no BLC – Boletim de Licitações e Contratos em duas partes no ano de 2011, sendo a primeira no mês de fevereiro (pp. 121-137) e a segunda em março (pp. 244-264)

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