RESUMO: O presente artigo tem como objetivo discorrer sobre o primado da responsabilidade civil na operação Lava Jato, uma das mais importantes operações já deflagradas pertinentes aos crimes contra a ordem e a moral da Administração Pública. Para tal, a pesquisa concentra-se na análise jurídica e processual dos crimes buscando a individualização da responsabilidade civil na prática de infração de crimes contra a Administração Pública, a sistemática da reparação do dano ao erário e as consequências jurídicas de tal prática delitiva.
PALAVRAS-CHAVE: responsabilidade civil, erário, administração pública, reparação, ressarcimento, indenização.
ABSTRACT: The purpose of this article is to discuss the primacy of civil liability in the Lava Jato operation, one of the most important operations that have already been carried out in relation to crimes against the order and morality of public administration. To this end, the research focuses on the legal and procedural analysis of crimes, seeking the individualization of civil responsibility in the practice of crimes against public administration, the systematic reparation of damage to the treasury and the legal consequences of such criminal practice.
KEYWORDS: civil liability, treasury, public administration, reparation, compensation, indemnification.
INTRODUÇÃO
A prática de qualquer ato ilícito ao ordenamento jurídico enseja que a responsabilidade da mesma seja imputada a alguém, para que o mesmo responda em todas as sanções legais cabíveis quanto ao descumprimento de disposição legal de harmonização da sociedade do Estado Democrático de Direito. Além da pretensão punitiva de caráter penal, o crime também pode gerar responsabilidades civis e administrativas.
Os crimes contra a Administração Pública importam em diferentes consequências punitivas, seja de caráter penal, civil ou administrativo. A exemplo, tem-se a operação Lava Jato, hoje uma das maiores e importantes operações já deflagradas em sede de interesse ao combate à corrupção no Brasil. Os efeitos que a mesma resultou vai além do viés dos escândalos políticos, mas sim na aplicação de sanções aos transgressores, sobretudo as condenações civis, no tocante à reparação dos danos causados ao erário e à sociedade.
Comumente evoca-se as condenações penais de tais crimes, ou das responsabilidades administrativas dos servidores públicos envolvidos, e olvida-se em primar pela responsabilidade civil do ato ilícito, uma vez que a mesma é de suma importância, pois implica na recuperação do dinheiro público, bem como a reparação integral do dano causado, ressarcimento e indenização do erário em relação ao maior interessado, o povo.
RESPONSABILIDADE CIVIL DECORRENTE DA CONDENAÇÃO CRIMINAL: A RECUPERAÇÃO DO DINHEIRO DA OPERAÇÃO “LAVA-JATO”
Em 2009, as autoridades policiais iniciaram a apuração da prática de crimes financeiros praticados por doleiros ligados à Alberto Youssef, tais investigações resultaram na descoberta de um grande sistema de corrupção e desvio de dinheiro público. Diante da complexidade do que fora apurado pela polícia federal, as investigações foram inicialmente dividas em ações, afim de se obter um resultado satisfatório.
Em 2014, essas ações resultaram na descoberta de uma rede de postos de combustíveis e lava jato de veículos em Brasília, utilizadas para movimentação de dinheiro ilícito, culminando na apuração de um vasto esquema de desvio de bilhões dos cofres públicos em obras da estatal Petrobras. Tal operação passou a ser intitulada de “OPERAÇÃO LAVA JATO”, gerando grande repercussão nos meios sociais e midiáticos, dado o envolvimento da Petrobras.
Atualmente, a Lava Jato configura-se como uma das mais importantes investigações de crimes contra a Administração Pública, denunciando um ciclo vicioso e ardil de lavagem de dinheiro e enriquecimento ilícito.
Os desdobramentos das investigações relataram o envolvimento não só da estatal Petrobras, como também de construtoras, grandes empreiteiras, empresas públicas e privadas, além de políticos de vários partidos que se beneficiavam dos contratos superfaturados, que garantiam o desvio de dinheiro dos cofres da Petrobras para os integrantes do esquema.
A operação Lava Jato resultou em consequências jurídicas inerentes aos atos ilícitos praticados; os diferentes crimes praticados contra a sistemática da ordem e moralidade pública sobrepujaram os princípios inerentes ao Estado Democrático de Direito, ferindo princípios basilares do ordenamento jurídico, ensejando na aplicação de penalidades administrativas, civis e penais ao envolvidos.
Durante as investigações inúmeros processos foram instaurados afim de se delimitar as responsabilidades dos transgressores, além das prisões decretadas, acordos de delações premiadas celebrados; indenização, ressarcimento e reparação culminados quanto aos prejuízos ao erário.
No tocante às formas de penalização dos envolvidos, muito se fala da responsabilidade penal e administrativa dos atos ilícitos praticados, enquanto a responsabilidade civil constitui-se o importante instrumento de recuperação dos prejuízos causados aos cofres públicos, dada a possibilidade de restituição e reparação do erário e a indenização ao mesmo, garantindo ao patrimônio público e ao interesse do povo, a satisfação e segurança jurídica.
A responsabilidade civil advém da prática delituosa, ou seja, da violação de um dever jurídico que importe em prejuízo a terceiro. Segundo Maria Helena Diniz (2007, p.34):
“Com base nessas considerações poder-se-á definir a responsabilidade civil como a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda ou, ainda, de simples imposição legal. Definição esta que guarda, em sua estrutura, a ideia da culpa quando se cogita a existência de ilícito (responsabilidade subjetiva), e a do risco, ou seja, da responsabilidade sem culpa (responsabilidade objetiva)”.
Desta forma, o primado da responsabilidade civil é a violação de um dever estabelecido em lei ou entre as partes, gerando a premissa de compor o prejuízo causado pelo não cumprimento da obrigação, seja ela decorrente de lei ou contrato. O ilustre doutrinador Sergio Cavalieri Filho (2010, p.3/4) alude:
“A responsabilidade civil opera a partir do ato ilícito, com o nascimento da obrigação de indenizar, que tem por finalidade de tornar indemne o lesado, colocar a vítima na situação em que estaria sem a ocorrência do fato danoso”.
Assim, a responsabilidade civil difere da penal pois enquanto esta ocupa-se de um dano social determinado pela violação de norma penal em que se busca ressocializar o indivíduo, aquela preocupa-se em ressarcir, reparar e/ou indenizar o prejuízo do ato ilícito praticado.
O próprio ordenamento jurídico trata da reparação civil no artigo 927 do Código Civil:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Destarte, a importância de se firmar pelas condenações civis na prática dos crimes contra a administração pública referente à Operação Lava-Jato, se traduz na eficácia da sanção punitiva civilista, uma vez que reintegra ao erário o que foi lesado, além da restituição integral sobre a perda dos bens e valores recebidos ilicitamente e a indenização pela violação de dever jurídico, preservando o patrimônio público, a moralidade administrativa, a ordem jurídica, além das garantias do interesse público, restaurando o equilíbrio moral e patrimonial desfeito.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Cavalieri Filho, Sergio. Programa de responsabilidade civil/ Sergio Cavalieri Filho.- 9.ed.-São Paulo: Atlas,2010.
Diniz, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, 7° volume: responsabilidade civil/ Maria Helena Diniz. - 21.ed.rev. e atual. de acordo com a Reforma do CPC.-São Paulo: Saraiva, 2007.
VADE MECUM ACADÊMICO DE DIREITO RIDEEL/ Anne Joyce Angher, organização.-23.ed.- São Paulo,:Rideel, 2016. (Série Vade Mecum).