Remição da pena pela leitura

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A remição da pena é um benefício previsto pela Lei de Execução Penal, lei nº 7.210 de 1984. Seu objetivo é proporcionar ao apenado a possibilidade da subtração do tempo de cumprimento da pena por atividades por ele exercida.

RESUMO: A remição da pena é um benefício previsto pela Lei de Execução Penal, lei nº 7.210 de 1984. Seu objetivo constitui proporcionar ao apenado a possibilidade da subtração do tempo de cumprimento da pena por atividades por ele exercida, seja pelo estudo ou pela atividade laboral. A remição por leitura é um instituto até então, considerado novo na legislação brasileira, e apesar de não estar expressamente disciplinado na Lei de Execução Penal, vem sendo utilizado como forma de se remir o tempo de cumprimento da pena pela leitura, através de portarias dos Tribunais dos Estados. Muito se argumenta sobre a constitucionalidade de tal instituto, uma vez que o mesmo não é tratado na Lei Federal de Execução Penal, que versa sobre o instituto da remição. O presente artigo possui como objetivo discorrer sobre o implemento da remição por leitura, abordando seus critérios de aplicabilidade, efetividade, legalidade, peculiaridades, e a finalidade de tal benefício, através da análise de pesquisas doutrinárias e jurisprudências que esclareçam de forma clara e objetiva os questionamentos acerca da remição da leitura.

Palavras-chaves: remição por leitura, execução penal, pena privativa de liberdade, legalidade, constitucionalidade.


INTRODUÇÃO

O presente trabalho possui como escopo discorrer sobre a remição da pena privativa de liberdade através da leitura.

O benefício da remição é disciplinado no ordenamento jurídico brasileiro através da Lei 7.210 de 1984, Lei de Execução Penal, e concedido ao apenado como forma de diminuição do tempo de cumprimento da pena privativa de liberdade através do estudo ou trabalho.

A remição por leitura é um instituto considerado novo na legislação brasileira, bastante discutido quanto a sua constitucionalidade e aplicabilidade em razão da Lei de Execução Penal Brasileira não disciplinar taxativamente sobre tal benefício. A aplicação de tal instituto tem sido implementado nos estabelecimentos prisionais brasileiros através de portarias dos Tribunais dos Estados.

Em sede de discussão sobre tal tema, muito se questiona sobre a finalidade da remição, se teria o mero intuito de ressocializar o condenado ou o preso cautelar mediante a inserção da leitura, ou se teria apenas o papel de desafogar os presídios municipais, estaduais e federais, diante a superlotação dos estabelecimentos prisionais brasileiros e a ineficácia do Estado em dirimir tal situação.

Em razão disso, o trabalho busca analisar pormenorizadamente o tema proposto a fim de elucidar eventuais questionamentos e a importância de tal instituto no panorama da remição da pena no sistema penitenciário brasileiro.

1. CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS DA REMIÇÃO DE PENAS

A remição constitui-se um importante instrumento que proporciona ao condenado a possibilidade de abatimento da pena condenatória.

Tal instituto é encontrado em diferentes legislações penais, e a sua inserção como modelo de abatimento no cumprimento da pena imposta pelo Estado surgiu através do decreto nº281 de 28 de maio de 1937, no Direito Penal Militar Espanhol. À época em que fora editado tal decreto, vivia-se sobre a tensão fascista do Governo Franquista, aplicando-se a remição aos condenados a crimes especiais e aos prisioneiros da Guerra Civil Espanhola, mais tarde o instrumento da remição passou a ser adotado pelo Código Penal Espanhol em 1944.

No entanto, tal instituto não se restringiu a legislação espanhola, passando a ser integrado por diferentes países em suas legislações, que aderiram a tal instituto em vista da possibilidade do desconto de dias no cumprimento da pena, através de requisitos inerentes as atividades exercidas pelo condenado para a concessão do benefício.

A exemplo de países como a Noruega, Canadá e até o estado da Califórnia nos Estados Unidos da América, o Brasil também aderiu ao instituto da remição de pena em seus dispositivos legais através da Lei 7.210 de 1984, Lei de Execução Penal, em seus artigos 126 aos 130.

Anteriormente à sua previsão pela Lei de Execução Penal, o instituto da remição já era tratado pela Lei Estadual de Minas Gerais nº 7.226, que dispunha sobre os regimes penitenciários do estado mineiro, na forma da Lei Federal nº 6.416, de 24 de maio de 1977:

“Art. 42- Sempre que o sentenciado participe ativamente das atividades educativas do estabelecimento e revela efetiva adaptação social haverá a remição de um dia da prisão, por dois de trabalho, na forma do regulamento.”

Antes mesmo do surgimento do estatuto federal sobre execução, a Lei Estadual de Minas Gerais nº: 7.226 ainda fora revogada pela Lei Estadual nº 8.533 de 1984, que disciplinou a remição da mesma forma procedimental anteriormente estabelecida pela lei mineira, aplicando apenas a mudança da nomenclatura do termo “sentenciado” do artigo sessenta, pelo vocábulo “interno”. Porém, tal lei mais uma vez fora revogada em face da Lei de Execução Penal, uma vez que compete privativamente à União a legitimidade de disciplinar sobre matéria de direito penal e processual.

Diante a legitimidade privativa de a União legislar em âmbito nacional sobre matéria penal e processual, a Lei de Execução Penal Brasileira de 1984 instituiu a remição. O instituto da remição pode ser entendido como a diminuição do tempo de condenação em dias ou horas da pena privativa de liberdade, imposta ao condenado em regime fechado ou semiaberto, através do exercício pelo sentenciado de atividade laboral ou do estudo, conforme artigo 126 da supracitada lei federal:

 “Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou  semiaberto poderá remir por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena.

§1º A contagem e tempo referida no caput será feita à razão de:

  • 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar- atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional-divididas, no mínimo, em 3 (três) dias;
  • 1 (um) dia de pena a cada 3 (três) dias de  trabalho.”

Importante salientar que a remição por estudo não era prevista pela Lei de Execução Penal, apenas com a edição da Lei 12.433 de 2011 que instituiu tal forma de se diminuir o cumprimento da pena, passou a ser utilizada a forma de remição da pena pelo estudo.

Ao admitir o benefício da remição da pena privativa de liberdade, a Lei de Execução Penal possuía como intuito a possibilidade do apenado diminuir sua pena, além de proporcionar a reintegração e ressocialização social através das atividades exercida pelo condenado.

Desde a sua implantação nas leis federais, o instituto da remição é concedido seja pelo estudo ou pela atividade laborativa exercida pelo condenado. Recentemente, os tribunais brasileiros reconheceram através de portarias uma nova forma de remição pelo estudo; alguns dos quais passaram a adotar nos respectivos estabelecimentos prisionais; a remição por leitura.

A remição por leitura no Brasil surgiu através da Lei Estadual nº: 17.392 de 2012 no Estado do Paraná, como forma de complementação da remição por estudo disciplinada pela Lei de Execução Penal. Em 26 de novembro de 2013, o Conselho Nacional de Justiça publicou a Recomendação de nº44, onde propõe aos Tribunais que os mesmos promovam e instituam nos estabelecimentos prisionais projetos e incentivos à remição por leitura, o que já havia sendo adotado pelo Estado de São Paulo em 2013, através da edição da portaria de regulamentação e disposição do instituto da remição do cumprimento da pena pela leitura.

Destarte, o instituto da remição da pena é hoje amplamente difundido como forma de diminuição do cumprimento de parte do tempo de execução da pena pelo trabalho, ou pelo estudo, considerando a leitura para tais feitos.

2. PRINCÍPIOS INERENTES À REMIÇÃO DE PENAS

O direito certamente, não pode ser alcançado, contemplado, concebido e aplicado – mesmo que tenha alguma relação do jusnaturalismo – sem firmar-se aos dados sociológicos, históricos, econômicos e principalmente sob as doutrinas fundamentais expressas em sua carta legitimadora de Estado Democrático de Direito: a Constituição.

Todo e qualquer dispositivo legal deve ser constituído sobre o prisma dos princípios e preceitos fundamentais estabelecidos constitucionalmente, resguardando os direitos de toda e qualquer pessoa para sua validade na aplicação como um direito positivo.

Desta forma, para aplicabilidade e efetividade da remição das penas privativas de liberdade é necessária a observância dos princípios constitucionais, como forma de viabilizar o cumprimento dos direitos e deveres do Estado e do condenado.

Um dos princípios fundamentais na consonância da remição como instituto de benefício no cumprimento das penas, é o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, que visa garantir o Estado Democrático de Direito, resguardando os direitos e deveres inerentes ao apenado, como forma de alcançar os benefícios que legalmente lhe são atribuídos, como o da remição.

Diante disso, a garantia do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana deve ser considerada indubitavelmente ao longo da execução da pena, pois neste momento o apenado encontra-se hipossuficiente, o que é fundamental para propiciar ao sentenciado garantias mínimas, mantendo a dignidade da pessoa humana e o seu direito à ressocialização na sociedade.

Sobre o princípio da Dignidade da Pessoa Humana reforça NUCCI (2014, p.33):

“Há dois prismas para o princípio constitucional regente da dignidade da pessoa humana: objetivo e subjetivo. Sob o aspecto objetivo, significa a garantia de um mínimo existencial ao ser humano, atendendo as suas necessidades básicas, como moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, nos moldes fixados pelo art. 7º, IV, da CF. Sob o aspecto subjetivo, trata-se do sentimento de respeitabilidade e autoestima, inerentes ao ser humano, desde o nascimento, em relação aos quais não cabe qualquer espécie de renúncia ou desistência.”

O benefício da remição é aplicado sobre a pena privativa de liberdade. A pena compreende a função simbólica de imprimir à sociedade o aspecto geral de segurança e de controle, garantindo ao apenado que o mesmo seja punido pelos atos ilícitos cometidos. Pelo Principio Dinâmico, que em seu preceito legal são os fatos interpretados de acordo com o momento em que se vive, observa-se que o direito a remição, seja pelo trabalho ou pelo estudo, constitui uma forma de garantir ao preso seu direito a ressocialização, além de se tratar de um benefício interno que consequentemente traz benefícios externos à sociedade.

Destarte, devem ser observados também os princípios relacionados à Humanidade das Penas, como o Princípio da Intranscendência das Penas, Princípio da Individualização da Pena, Princípio da Não Perpetuação das Penas e por fim o Princípio da Proporcionalidade, a fim de se garantir a efetividade da remição de penas impostas pelo Estado em conformidade com as diligências e preceitos constitucionais.

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Em se tratando do princípio da humanidade das penas, considera o ilustre Desembargador Célio César Paduani (2002, p.17):

“O objetivo da remição penal, segundo os ditames legais, é reduzir, pelo trabalho, a pena privativa de liberdade, além de ser um componente essencial à recuperação do condenado, pois, inegavelmente o trabalho é a melhor terapia existente.”

O princípio da Humanidade das penas quanto à remição, tem seu por objetivo possibilitar ao condenado dentro dos princípios que norteiam a execução penal, o aperfeiçoamento do mesmo a uma melhor convivência social, através dos estudos e a prática de atividade laboral.

O Princípio da Intranscendência das Penas e o Princípio da Individualização da Pena possuem uma relação entre a pena aplicada em decorrência da conduta do sentenciado e a sua própria pessoa. O princípio da Intranscendência alude que a pena não pode ultrapassar da pessoa do condenado, já o Princípio da Individualização da Pena afirma que a mesma deve ser adequada e correspondente ao sentenciado, respaldando que o benefício da remição sempre deverá ser concedido ao sentenciado, única e exclusivamente relacionado à sua situação jurídica-criminal, não se abrangendo aos demais crimes, senão aos cometidos pelo próprio condenado.

O Princípio da Não Perpetuação das Penas adequa de forma impecável a possibilidade dos benefícios que o instituto da remição traz ao sentenciado, pela qual sua tradução principiológica determina que todas as penas não podem ser indeterminadas, ou seja, não podem ser de caráter perpétuo, onde conforme as leis brasileiras a pena não pode ultrapassar aos 30 (trinta) anos de cumprimento pelo sentenciado. Através da análise de tal princípio conclui-se que a delimitação do tempo de cumprimento da pena privativa de liberdade, constitui-se de suma importância para a aplicação do instituto da remição, uma vez que se as penas brasileiras fossem culminadas em caráter perpétuo, o benefício restaria inaplicável a estes casos, já que o condenado estaria ‘para sempre’ privado de sua liberdade.

O Princípio da Proporcionalidade expressa que a pena há de ser compatível com o prejuízo ou dano causado, e a remição possibilita ao sentenciado a percepção de ilicitude do ato praticado e sua ressocialização através da construção de valores éticos e morais proporcionados pelo estudo, leitura ou através do trabalho.

Desta forma, a aplicabilidade dos princípios mencionados serve como parâmetros de interpretação das normas, direitos e as garantias inerentes aos sentenciados, integrando os benefícios como o da remição, à sua prática legal, dentre os critérios de admissibilidade constitucional.

3. PROGRESSÃO DE REGIME

Em face de entendimento do instituto da remição, torna-se necessário o entendimento da progressão de regime no sistema de execução penal brasileiro.

A progressão de regime nada mais é do que a progressão do regime do cumprimento da pena privativa de liberdade para um regime menos rigoroso do que o outrora estabelecido. No Brasil são adotados três tipos de progressão de regime de cumprimento da pena privativa de liberdade; o regime fechado, semiaberto e aberto. Tais regimes progressivos da execução penal brasileira surgiram através da análise de três sistemas clássicos, adotados por diferentes países que objetivavam disciplinar a progressão de regime.

Discorre sobre a progressão de regime AVENA( 2015, p.254)

“Sistema da Filadélfia ou Pensilvânico: Baseia-se no isolamento. O preso, com efeito, permanece isolado na sua cela saindo apenas esporadicamente, para passeios em pátios fechado. Sistema de Auburn: O condenado, em absoluto silêncio, trabalha durante o dia com outros presos e sujeita-se ao isolamento no período noturno. Sistema progressivo: Há um período inicial de isolamento absoluto. Após, segue-se a fase em que o apenado trabalha durante o dia na companhia de outros presos. No estágio final, é colocado em liberdade condicional.”

O Brasil adotou o sistema de execução progressiva nas penas privativas de liberdade em seu ordenamento processual, e para sua admissibilidade é necessário que o sentenciado cumpra requisitos objetivos e subjetivos para alcançar o benefício da progressão de regime.

Constituem requisitos objetivos para a concessão da progressão de regime o cumprimento de 1/6 (um sexto) da pena nos crimes comuns; nos crimes hediondos os condenados devem cumprir 2/5 (dois quintos) da pena se réu primário, se reincidente 3/5 (três quintos) da pena. Já os requisitos subjetivos para todas as infrações consubstanciam-se na conduta carcerária do sentenciado de bom comportamento, comprovado pelo diretor do estabelecimento prisional; e ouvindo o Ministério Público e os argumentos da defesa sobre a possibilidade da concessão da transferência para regime menos rigoroso.

Dessa forma, atingindo o lapso temporal para a concessão do benefício da progressão de regime, cumprindo os requisitos objetivos e subjetivos, o sentenciado será considerado apto para que o Juiz da Vara de Execuções Penais, ou na falta deste o juiz comum, conceda-lhe o benefício da progressão de regime.

Destarte, o sistema de progressão de regimes da execução penal é importante ao instituto da remição, uma vez que o benefício da remição da pena por trabalho ou por estudo permite ao sentenciado a progressão de regime mais célere. Ressaltando que a remição da pena contempla apenas o regime fechado e o regime semiaberto, pois ao regime aberto constitui critério objetivo que o condenado trabalhe e estude.

4. REMIÇÃO

A remição é um instituto de benefício de abreviação do lapso temporal do cumprimento da pena privativa de liberdade, concedido ao sentenciado ou preso cautelar que cumpre pena em regime fechado ou semiaberto.

A Lei nº 7.210 de 1984, Lei de Execução Penal, disciplina o instituto da remição nos artigos 126 aos 130, constituindo critérios para a sua concessão o exercício durante a execução da pena privativa de liberdade, de atividade laboral ou atividade de estudo pelo sentenciado.

Desta forma a LEP, Lei de Execução Penal, instituiu duas formas de se remir o cumprimento da pena; a Remição pelo Trabalho e a Remição pelo estudo.

Na remição pelo trabalho, ao condenado que cumpre pena em regime fechado ou semiaberto, é concedida a possibilidade de se remir um dia de sua pena a cada três dias trabalhados. A concessão de tal benefício só é dada mediante apresentação no juízo da execução dos comprovantes dos dias trabalhados.  Conforme elucidação das doutrinas, o trabalho do condenado pode ser entendido como qualquer atividade física ou intelectual a fim de se alcançar a realização de alguma tarefa ou serviço, desde que haja o entendimento como atividade laboral.

A remição pelo estudo é destinada aos presos sob a égide do regime fechado, semiaberto, aberto ou em liberdade condicional, pela qual, a cada doze horas de frequência escolar computadas em três dias de estudo, são remidas um dia de pena cumprida. No entanto o limite máximo para o estudo do preso é de 4 horas por dia.  A Lei de Execução Penal admite ainda para fins de atividades de estudo, a aprendizagem em instituições educacionais de ensino presencial ou à distância, desde que a frequência e o aproveitamento escolar sejam atestados pelas autoridades educacionais, acrescentando a fração de um terço do tempo a se remir pelo estudo, caso o sentenciado conclua o ensino a qual esteja cursando.

Como já consolidado em relação à remição de pena pelo estudo, a ementa da decisão da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais disciplina:

Ementa: Lei de Execução Penal. Remição da pena. Frequência a curso de suplência. Possibilidade. Deve ser concedida a remição da pena do condenado que comprove frequência a curso de suplência, oferecido pelo estabelecimento prisional, desde que aferido o aproveitamento do condenado-estudante e de acordo com a carga horária do curso, seguindo-se os mesmos critérios da remição por dia trabalhado, pois a tanto não se opõe o sistema de execução penal pátrio. Súmula: Deram provimento ao agravo ( Número do processo 1.0000.00.174312-9/000(1)-Numeração Única: 1743129-63.2000.8.13.0000-Data do Julgamento: 18.05.2000-Data da Publicação 02.06.2000).

De acordo com Silvia (2012, p. 251):

“Trata-se, portanto, de um direito do recuperando em amortizar, pelo exercício de digna atividade laborativa, e agora por estudo, o tempo de duração de sua pena privativa de liberdade, estimulando-o a corrigir-se, abreviando o tempo de seu cumprimento, a fim de que possa obter progressão para o regime menos grave, ou livramento condicional, ou liberdade definitiva com a extinção da pena”.

 A remição sempre será concedida pelo Juiz da Vara de Execução, ou na falta deste pelo juiz comum, ouvindo-se o parecer do Ministério Público e as alegações da defesa quanto à instituição do benefício ao sentenciado.

5. REMIÇÃO POR LEITURA

A remição por leitura é um instituto até então, considerado novo na legislação brasileira, como forma de se remir o tempo de cumprimento da pena pela leitura.

Conforme já demonstrado, a remição por leitura surgiu no ordenamento brasileiro em 2012 através de uma lei estadual do estado do Paraná, como forma de complementação da remição por estudo. Após sua insurgência nos presídios paranaenses, o Conselho Nacional de Justiça publicou a Recomendação de nº44 disciplinando a forma procedimental e o incentivo da adoção de tal instituto nos estabelecimentos prisionais, o que já vinha sendo adotado por diferentes estados.

O artigo primeiro da Recomendação nº 44 do Conselho Nacional de Justiça orienta aos tribunais:

“I - para fins de remição pelo estudo (Lei nº 12.433/2011), sejam valoradas e consideradas as atividades de caráter complementar, assim entendidas aquelas que ampliam as possibilidades de educação nas prisões, tais como as de natureza cultural, esportiva, de capacitação profissional, de saúde, entre outras, conquanto integradas ao projeto político-pedagógico (PPP) da unidade ou do sistema prisional local e sejam oferecidas por instituição devidamente autorizada ou conveniada com o poder público para esse fim;

II - para serem reconhecidos como atividades de caráter complementar e, assim, possibilitar a remição pelo estudo, os projetos desenvolvidos pelas autoridades competentes podem conter, sempre que possível:

a) disposições a respeito do tipo de modalidade de oferta (presencial ou a distância);

b) indicação da instituição responsável por sua execução e dos educadores e/ou tutores, que acompanharão as atividades desenvolvidas;

c) fixação dos objetivos a serem perseguidos;

d) referenciais teóricos e metodológicos a serem observados;

e) carga horária a ser ministrada e respectivo conteúdo programático;

f) forma de realização dos processos avaliativos;

III - considerem, para fins de remição pelo estudo, o número de horas correspondente à efetiva participação do apenado nas atividades educacionais, independentemente de aproveitamento, exceto, neste último aspecto (aproveitamento), quando o condenado for autorizado a estudar fora do estabelecimento penal (LEP, art. 129, § 1º), ocasião em que terá de comprovar, mensalmente, por meio de autoridade educacional competente, tanto a frequência, como o aproveitamento escolar.

IV - na hipótese de o apenado não estar, circunstancialmente, vinculado a atividades regulares de ensino no interior do estabelecimento penal e realizar estudos por conta própria, ou com simples acompanhamento pedagógico, logrando, com isso, obter aprovação nos exames nacionais que certificam a conclusão do ensino fundamental Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (ENCCEJA) ou médio Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), a fim de se dar plena aplicação ao disposto no § 5º do art. 126 da LEP (Lei n. 7.210/84), considerar, como base de cálculo para fins de cômputo das horas, visando à remição da pena pelo estudo, 50% (cinquenta por cento) da carga horária definida legalmente para cada nível de ensino [fundamental ou médio - art. 4º, incisos II, III e seu parágrafo único, todos da Resolução n. 03/2010, do CNE], isto é, 1600 (mil e seiscentas) horas para os anos finais do ensino fundamental e 1200 (mil e duzentas) horas para o ensino médio ou educação profissional técnica de nível médio;

V - estimular, no âmbito das unidades prisionais estaduais e federais, como forma de atividade complementar, a remição pela leitura, notadamente para apenados aos quais não sejam assegurados os direitos ao trabalho, educação e qualificação profissional, nos termos da Lei n. 7.210/84 (LEP - arts. 17, 28, 31, 36 e 41, incisos II, VI e VII), observando-se os seguintes aspectos:

a) necessidade de constituição, por parte da autoridade penitenciária estadual ou federal, de projeto específico visando à remição pela leitura, atendendo a pressupostos de ordem objetiva e outros de ordem subjetiva;

b) assegurar que a participação do preso se dê de forma voluntária, disponibilizando-se ao participante 1 (um) exemplar de obra literária, clássica, científica ou filosófica, dentre outras, de acordo com o acervo disponível na unidade, adquiridas pelo Poder Judiciário, pelo DEPEN, Secretarias Estaduais/Superintendências de Administração Penitenciária dos Estados ou outros órgãos de execução penal e doadas aos respectivos estabelecimentos prisionais;

c) assegurar, o quanto possível, a participação no projeto de presos nacionais e estrangeiros submetidos à prisão cautelar;

d) para que haja a efetivação dos projetos, garantir que nos acervos das bibliotecas existam, no mínimo, 20 (vinte) exemplares de cada obra a ser trabalhada no desenvolvimento de atividades;

e) procurar estabelecer, como critério objetivo, que o preso terá o prazo de 21 (vinte e um) a 30 (trinta) dias para a leitura da obra, apresentando ao final do período resenha a respeito do assunto, possibilitando, segundo critério legal de avaliação, a remição de 4 (quatro) dias de sua pena e ao final de até 12 (doze) obras efetivamente lidas e avaliadas, a possibilidade de remir 48 (quarenta e oito) dias, no prazo de 12 (doze) meses, de acordo com a capacidade gerencial da unidade prisional;

f) assegurar que a comissão organizadora do projeto analise, em prazo razoável, os trabalhos produzidos, observando aspectos relacionados à compreensão e compatibilidade do texto com o livro trabalhado. O resultado da avaliação deverá ser enviado, por ofício, ao Juiz de Execução Penal competente, a fim de que este decida sobre o aproveitamento da leitura realizada, contabilizando-se 4 (quatro) dias de remição de pena para os que alcançarem os objetivos propostos;

g) cientificar, sempre que necessário, os integrantes da comissão referida na alínea anterior, nos termos do art. 130 da Lei n. 7.210/84, acerca da possibilidade de constituir crime a conduta de atestar falsamente pedido de remição de pena;

h) a remição deverá ser aferida e declarada pelo juízo da execução penal competente, ouvidos o Ministério Público e a defesa;

i) fazer com que o diretor do estabelecimento penal, estadual ou federal, encaminhe mensalmente ao juízo da execução cópia do registro de todos os presos participantes do projeto, com informações sobre o item de leitura de cada um deles, conforme indicado acima;

j) fornecer ao apenado a relação dos dias remidos por meio da leitura.”

A Recomendação nº44 de 2013 do Conselho Nacional de Justiça explicita que “deve ser estimulada a remição pela leitura como forma de atividade complementar, especialmente para apenados aos quais não sejam assegurados os direitos ao trabalho, educação e qualificação profissional”.

Ainda conforme essa recomendação do Conselho Nacional de Justiça, para que o sentenciado possa usufruir do benefício da remição da pena pela leitura, é necessária a criação do projeto nas unidades prisionais através de portarias dos tribunais estaduais e aplicabilidade pelo diretor do estabelecimento prisional. Esta aplicabilidade do projeto de remição da pena pela leitura segue critérios objetivos e subjetivos, estabelecidos no projeto para o alcance do benefício.

Desta forma, a recomendação do Conselho Nacional de Justiça instituiu como critério objetivo a inscrição do sentenciado no projeto da remição da pena pela leitura, onde o mesmo dispõe de vinte e um a trinta dias para completar a leitura da obra, que ao final deverá ser elaborada, pelo apenado, resenha sobre a leitura feita e apresentada à comissão organizadora do projeto, que avaliará a atividade conforme compreensão e compatibilidade com o livro que o sentenciado escolheu para desenvolver o trabalho. O Conselho Nacional de Justiça ainda estabelece que seja necessária uma quantidade de acervos na biblioteca do estabelecimento prisional, na proporção de no mínimo 20 exemplares de cada obra, para ser trabalhado durante a execução do projeto.

A remição da pena privativa de liberdade pela leitura será de quatro dias remidos na pena do sentenciado por cada obra lida, limitando ao sentenciado a leitura de doze exemplares por ano, totalizando quarenta e oito dias remidos anualmente de sua pena. Portanto, o sentenciado terá durante o cumprimento de sua pena, a possibilidade de diminuir o tempo de sua pena privativa de liberdade tanto pela remição por trabalho, estudo ou pela leitura.

Porém há quem considere que o instituto da remição pela leitura seja inconstitucional, uma vez que a mesma não se encontra disciplinada expressamente pela Lei de Execução Penal, e em razão disso o seu uso constituiria violação a princípios constitucionais como o da Legalidade e o Princípio da Isonomia, já que os sentenciados a usufruírem do benefício seriam os alfabetizados, o que resultaria numa distinção social entre os condenados não alfabetizados. Outros ainda afirmam que instituir tal forma de remição, banalizaria a leitura, o que seria um ato voluntário de conhecimento e melhoria social se transformaria em requisito vinculatório e obrigatório de concessão de benefício.

Acerca disso, o Superior Tribunal de Justiça discutiu em julgamento do HC 312.486-SP:

“EMENTA HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO. FALTA DE CABIMENTO. EXECUÇÃO PENAL. REMIÇÃO DA PENA PELA LEITURA. ART. 126 DA LEP. PORTARIA CONJUNTA N. 276/2012, DO DEPEN/MJ E DO CJF. RECOMENDAÇÃO N. 44/2013 DO CNJ. 1.Conquanto seja inadmissível o ajuizamento de habeas corpus em substituição ao meio próprio cabível, estando evidente o constrangimento ilegal, cumpre ao tribunal, de ofício, saná-lo. 2.A norma do art. 126 da LEP, ao possibilitar a abreviação da pena, tem por objetivo a ressocialização do condenado, sendo possível o uso da analogia in bonam partem, que admita o benefício em comento, em razão de atividades que não estejam expressas no texto legal (REsp n. 744.032/SP, Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJe 5/6/2006).3. O estudo está estreitamente ligado à leitura e à produção de textos, atividades que exigem dos indivíduos a participação efetiva enquanto sujeitos ativos desse processo, levando-os à construção do conhecimento. A leitura em si tem função de propiciar a cultura e possui caráter ressocializador, até mesmo por contribuir na restauração da autoestima. Além disso, a leitura diminui consideravelmente a ociosidade dos presos e reduz a reincidência criminal. 4. Sendo um dos objetivos da Lei de Execução Penal, ao instituir a remição, incentivar o bom comportamento do sentenciado e sua readaptação ao convívio social, a interpretação extensiva do mencionado dispositivo impõe-se n o presente caso, o que revela, inclusive, a crença do Poder Judiciário na leitura como método factível para o alcance da harmônica reintegração à vida em sociedade. 5. Com olhos postos nesse entendimento, foram editadas a Portaria conjunta n. 276/2012, do Departamento Penitenciário Nacional/MJ e do Conselho da Justiça Federal, bem como a Recomendação n. 44/2013 do Conselho Nacional de Justiça.6. Writ não conhecido. Ordem expedida de ofício, para restabelecer a decisão do Juízo da execução que remiu 4 dias de pena do paciente, conforme os termos da Recomendação n. 44/2013 o Conselho Nacional de Justiça( HABEAS CORPUS Nº 312.486 -SP -2014/0339078-1).”

A alegação do Superior Tribunal de Justiça de São Paulo, assim como daqueles que defendem a utilização da remição pela leitura como forma de diminuição da pena privativa de liberdade, é que a remição instituída pela Lei de Execução Penal, mais do que diminuir o lapso temporal da pena é essencialmente construída no primado da possibilidade da reinserção e ressocialização do sentenciado, em razão desse caráter se aplicaria uma interpretação extensiva ao instituto da remição por leitura, pela sua contribuição social ao sentenciado e por estar atrelada ao instituto da remição por estudo.

CONCLUSÃO

A remição é um instituto importante para a ressocialização do individuo na sociedade, no entanto, nem todo o sentenciado tem acesso a estes projetos, limitando-se a uma pequena porcentagem dos beneficiados. 

Considerado os critérios desfavoráveis à inserção da remição por leitura nos estabelecimentos prisionais, mais do que uma questão de inconstitucionalidade pela sua não disposição legal na Lei de Execução Penal, ou violação do princípio da Isonomia e banalização da leitura, poderia ser considerado ainda que tal instituto constitua um permissivo de alívio quanto às superlotações dos estabelecimentos prisionais brasileiros, eximindo o Estado de sua responsabilidade para com o condenado de oferecer mínimas condições básicas para o cumprimento de sua pena e o caráter social do mesmo.

No entanto, ao valorar os critérios favoráveis à inserção da remição por leitura nos estabelecimentos prisionais, percebe-se com mais veemência a necessidade de se instituir instrumentos que permitam que o Estado cumpra o seu papel quanto à finalidade da pena ao sentenciado, e em razão disso acolher tal instituto de finalidade de remição.

O objetivo da pena não é o de infligir sofrimento físico ou psíquico ao sentenciado; além de possuir a função de retribuir o mal que foi causado à sociedade através da imposição de pena privativa de liberdade ou de penas alternativas; a pena objetiva a coibição de demais delitos através da ressocialização do apenado. Essa reinserção social do sentenciado é hoje, nos moldes do sistema de execução penal brasileiro, atingido através de benefícios que instituam atividades que promovam o social do sentenciado, como a remição pelo trabalho, estudo ou mesmo pela leitura.

O instituto da remição além de possuir o caráter de diminuir o tempo ocioso no estabelecimento prisional promove a ressocialização do preso ao concatenar as atividades de qualificação, aprendizado e conhecimento.

Destarte, a inconstitucionalidade do benefício da remição por leitura, mediante o seu caráter fundamentador de ressocialização, pode ser suprimido em face da interpretação extensiva do instituto da remição, considerando-a como atividade complementar da remição por estudo.

Desta forma, é importante viabilizar o instrumento da remição pela leitura nos estabelecimentos prisionais, pois através da leitura o cautelado pode alcançar pontos importantes, que não só a remição da pena, mas a possibilidade de compactar conhecimentos e cultura através da leitura, o que implicaria na sua ressocialização. O benefício constitui um direito do preso e dever do Estado.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Sobre os autores
Mirele Natiele da Cunha

Estudante de Direito do 8º período da Faculdade Pitágoras.

Cristina Aparecida Ferreira da Silva

Acadêmica de Direito 10º Período

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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