3. TENDÊNCIAS DA NOVA ORDEM MUNDIAL
Para resolver seus desacordos, a sociedade internacional contemporânea tem desenvolvido formas pacíficas, que vem se multiplicando no correr do tempo.
Ao lembrar que há oitenta anos atrás a simples referência aos meios diplomáticos e à arbitragem esgotava o rol das vias possíveis de solução pacífica dos litígios entre os Estados, José Francisco Rezek, afirma que "a era das organizações internacionais trouxe consigo alguma coisa nova" [7].
Hoje contamos sim com os meios diplomáticos, mas também com os meios políticos e jurisdicionais, que se subdividem numa série de mecanismos capazes de promover a pacificação do litígio sem guerras.
A ampliação dessas vias não representa o desejo pela instituição de um "Governo Mundial". Ao contrário, está voltada à garantia da soberania dos Estados, do respeito aos costumes internacionais e à valorização de cada país, ideologia ou cultura.
É muito mais provável que no plano internacional as soluções para os conflitos (econômicos, políticos e jurídicos) mantenham-se na busca constante da construção e do aperfeiçoamento de organismos multilaterais que representem os interessas da sociedade internacional, com esforço diplomático, objetivando a consolidação legal e o consenso dos sujeitos internacionais.
E assim o é porque a tendência manifestada pelos Estados atualmente é no sentido de manter o Estado Nacional como forma mais elevada de vida social, aumentando seu potencial e influência, expandindo sua economia e valorizando sua gente e sua tradições, de modo a promover um equilibro de forças entre os países.
Não se vislumbra um interesse compartilhado, senão por todos, ao menos pela maioria dos sujeitos internacionais, no sentido de instituir um "Governo Mundial" ou uma constituição de amplitude internacional.
Nem mesmo sob a alegação de que é preciso resgatar o mundo do caos social, uma vez que para isso, não é preciso instituir um "Governo Mundial".
Inobstante a ausência do poder de coação similar ao do Estado nacional, as regras de direito internacional tem sua força e validade, sendo imperioso destacar que segundo os críticos do direito internacional, "o direito não se resume ao ilícito, aliás, a sua magnitude está no campo da licitude. Neste caso, no estabelecimento de mecanismos – tratados internacionais – que garantam a sustentabilidade do planeta" [8].
A adesão por parte dos entes internacionais aos tratados estabelecidos, por si só, dá força ao direito firmado e deságua num segunda vertente, qual seja, a imposição de sanções.
Ao alvedrio das indagações acerca da ineficácia do Direito Internacional devido a impossibilidade de aplicar-se sanções internacionais àqueles que não aderem aos tratados, sustento que os organismos multilaterais com estrutura democrática e autoridade internacional, estarão revestidos de poder para aplicar sanções, ainda que de peso moral, àqueles que descumprirem as regras estabelecidas, sem a necessidade de intervirem na soberania de Estados nacionais.
Como dito, as tendências da nova ordem mundial tem se manifestado favoravelmente à solução dos seus conflitos mediante instrumentalização jurídica e solidificação de organismos multilaterais que garantam aos Estados e demais sujeitos internacionais a liberdade e o respeito às garantias humanas fundamentais.
Ao contrário daqueles que postulam pelo fim do Estado Nacional, com processos de ampliação de espaço para um "Governo Mundial", defendendo a idéia de que o Estado Nacional organizado de forma descentralizada perdurará ainda por muito tempo, e que os mecanismos multilaterais de solução dos conflitos tendem a se solidificar e se aperfeiçoar, de modo a se tornarem mais eficazes e equânimes, sem a necessidade de instituir-se um contrato social tão amplo que não consiga abarcar as minúcias que os organismos multilaterais alcançam.
4. CONCLUSÃO
Nota-se que dentre as formas de solução para os conflitos internacionais desenvolvidas pela sociedade internacional, buscando cada vez mais o equilíbrio de poder entre os Estados e suas relações internacionais não há espaço para o pretenso "Governo Mundial", porque um contrato social tão abrangente acabaria por sobrepujar as civilizações e sua essência, massacrando a soberania dos Estados, indo contra os ideais de liberdade e autodeterminação dos povos.
Por tais razões a tese do "Governo Mundial" e de uma "Constituição Internacional", aparenta-se desbotada e enfraquecida, mais afastada ainda, pelo fato de que após tantas lutas entre os povos para se verem reconhecidos como países soberanos e livres da dominação de outrem, é pouco provável, que estes mesmos países, alienem essa liberdade duramente conquistada ou admitam retrocessos e arbitrariedades, em troca de uma suposta certeza e segurança internacional, que se analisadas a fundo, não são tão certas nem tão seguras quanto se intitulam.
Como não há consenso por este "Governo Mundial", dificilmente haverá um contrato social internacional, nem supremacia de um órgão sobre os Estados Nacionais e demais sujeitos internacionais.
Ao terminar este artigo, lembro que o conceito de comunidade internacional merece uma acurada reflexão, pois embora não seja um tema novo, se apresenta com um renovado frescor, face a uma onda cada vez mais crescente de interesse pelo Direito Internacional e suas nuanças, dentre as quais está o tema do "Governo Mundial".
Me proponho então a levar adiante pesquisas que tragam respostas às indagações sobre a possibilidade e viabilidade de um contrato social tão amplo, e em que medida a tentativa de substituição do Estado Nacional por um Estado Global representa a possibilidade de solução de conflitos, ou a instauração de uma guerra mundial provocada pelos antagonismos dos povos e sua insubmissão a regras e a um governo que não reconheçam como legítimos.
Notas
1 CAMINHA, V. A nova ordem mundial. Jusnavigandi. Teresina. a. 7, n. 66, jun. 2003. Disponível em <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=4123>. Acesso em: 29 ab. 2004.
2 ROUSSEAU, J. J. Do contrato Social. Editora Martim Claret, p..31, São Paulo, 2002.
3 PINTO, A. E. Solução pacífica de conflitos internacionais. Jusnavigandi. Teresina. a. 6, n. 59, out. 2002. Disponível em <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=3338>. Acesso em: 29 ab. 2004.
4 REZEK, J. F. Direito Internacional Público: curso elementar. 8ª ed., São Paulo, p. 153, Editora Saraiva, 2000.
5 MELLO, C. D. de A. Curso de Direito Internacional Público. 12ª edição, Rio de Janeiro, I Vol., p. 47, Editora Renovar, 2000.
6 AGGELEN, J. V. A guerra e o Direito Internacional em xeque. Revista Consulex, ano VII, n. 150, p. 14-18, 15 abr. 2003.
7 REZEK, J. F. Direito Internacional Público: curso elementar. 8ª ed., São Paulo, p. 330, Editora Saraiva, 2000.
8 PINTO, A. E. Solução pacífica de conflitos internacionais. Jusnavigandi. Teresina. a. 6, n. 59, out. 2002. Disponível em <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=3338>. Acesso em: 29 ab. 2004.