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Extradição e prisão perpétua.

O novo precedente do STF

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            O chileno Maurício Hernandez Norambuena, acusado de liderar o seqüestro do publicitário Washington Olivetto, teve seu pedido de extradição julgado pelo Supremo Tribunal Federal que, por unanimidade, deferiu o pedido formulado pelo Governo do Chile, para entregar o condenado àquele País sob condição de comutação das penas de prisão perpétua em penas de prisão temporária de no máximo 30 anos, observados, desde que assim o entenda o Senhor Presidente da República.

            No Chile o acusado participou do assassinato do senador Jaime Guzmán, em abril de 1991 e do sequestro de Cristián Del Rio, filho do dono do jornal El Mercúrio, entre setembro de 2001 e fevereiro de 2002 e foi condenado a duas penas de prisão perpétua, pela prática de crimes de extorsão mediante seqüestro, formação de quadrilha e tortura.

            Ocorre que, também aqui no Brasil o extraditando cumpre pena no presídio de Presidente Bernardes por ter sido condenado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo a 30 anos de reclusão.

            São esses os fatos que tornam esse caso interessante, primeiro o Supremo Tribunal Federal ter condicionado a extradição à concordância de o Chile trocar as duas penas de prisão perpétua por uma pena de prisão temporária, com duração máxima de 30 anos, em respeito à vedação constitucional de prisão perpétua no Brasil (Constituição Federal, artigo 5º, XLVII) e, depois, deixar ao arbítrio do Presidente da República a decisão de mandá-lo agora ou aguardar que ele cumpra a pena imposta pelo Brasil.

            No tocante à ressalva da comutação das penas de prisão perpétua, os ministros Carlos Velloso e Nelson Jobim discordaram da maioria, baseados na jurisprudência que se firmou a partir da Extradição nº 426-3, de 1985, quando o Supremo Tribunal Federal decidiu que, por falta de previsão legal ou tratado, não se poderia comutar a prisão perpétua em pena limitativa de liberdade. Entenderam os Ministros vencidos que não se poderiam estabelecer restrições oponíveis à ordem jurídica do País requerente.

            Em contrapartida, o Ministro Celso de Melo, relator do pedido de extradição, cujo voto conduziu o resultado do julgamento (oito votos a dois), expôs que a posição adotada agora pelo Supremo Tribunal Federal se mostra fiel à Constituição do Brasil e reafirma a supremacia do texto constitucional. Segundo dispôs em seu voto, "não há como dar precedência a prescrições de ordem meramente convencional (tratados internacionais) ou de natureza simplesmente lega,l sobre regras inscritas na Constituição que vedam, de modo absoluto, a cominação e a imposição de quaisquer penas de caráter perpétuo (artigo 5º, XLVII, b da CF).

            Com efeito, o Estatuto do Estrangeiro (Lei 6.815/80) somente prevê que não será efetivada a entrega de extraditando sem que o Estado assuma o compromisso em comutar em pena privativa de liberdade a pena corporal ou de morte (artigo 91, III), sem mencionar nada a respeito da prisão perpétua.

            O chileno já cumpriu dois anos e meio da pena de 30 anos em que foi condenado pela Justiça Paulista. De acordo com o Estatuto do Estrangeiro, primeiro o criminoso deve cumprir a pena no Brasil, para somente depois ser extraditado (artigo 88). Há porém uma exceção, para os casos em que o presidente da República autorizar a ida do estrangeiro para o seu país logo após o julgamento no STF, para que cumpra pena lá (artigo 66).

            Portanto, essa é a posição atual do processo de extradição do chileno Mauricio Hernandez Norambuena: caberá ao Presidente Lula a decisão de, se achar conveniente ao interesse nacional, mandar agora o extraditando de volta ao seu País de origem, antes de cumprir a pena no Brasil, fazendo com que se cumpra a ressalva imposta pelo Supremo Tribunal Federal ou se aguardará o cumprimento da pena aqui para, depois, se o Chile ainda quiser, determinar a extradição.

            É aguardar para vermos os capítulos seguintes desse julgamento histórico proferido pelo Supremo Tribunal Federal.

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Sobre a autora
Renata Saraiva de Oliveira Verano

advogada em Brasília (DF)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VERANO, Renata Saraiva Oliveira. Extradição e prisão perpétua.: O novo precedente do STF. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 576, 3 fev. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6263. Acesso em: 2 mai. 2024.

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