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Caso fortuito e força maior nos acidentes de trânsito

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24/02/2005 às 00:00

Resumo:


  • Caso fortuito e força maior podem ser excludentes de responsabilidade no direito civil brasileiro, conforme o artigo 393 do Código Civil, se não houver responsabilização expressa pelo devedor.

  • A distinção teórica entre caso fortuito (evento imprevisível e inevitável) e força maior (evento inevitável, ainda que previsível) é importante para entender a aplicação prática desses conceitos.

  • Em situações específicas, como furto ou roubo de veículos, fato de terceiro, defeito mecânico, mal súbito do condutor, derrapagem, ofuscamento, pedra lançada pelas rodas e acidentes naturais, a jurisprudência e doutrina analisam a aplicabilidade de caso fortuito e força maior como excludentes de responsabilidade.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

2.5 OFUSCAMENTO

O ofuscamento, ou deslumbramento, é considerado pela doutrina e pela jurisprudência pátria como fato corriqueiro, plenamente previsível e evitável, pelo que não pode o motorista invocá-lo como motivo de excludente de responsabilidade em acidente de trânsito. Ao motorista cabe agir de forma cautelosa, reduzindo a velocidade do automóvel, de modo a manter o seu controle sobre ele e enfrentar assim o obstáculo.

O fenômeno do ofuscamento pode ser provocado tanto pela luz do sol quanto pela luminosidade irradiada por outros veículos, que trafegam em sentido contrário, principalmente no período noturno.

Assinala Carlos Roberto Gonçalves que "a incapacidade de impedir ou simplesmente reduzir as conseqüências de tal deslumbramento retrata verdadeira ausência de habilidade técnica, que caracteriza a imperícia". [13]

A jurisprudência também adotou esse posicionamento:

Não pode invocar com êxito irresponsabilidade pelo evento motorista que alega que o desastre noturno em que se envolveu foi ocasionado por perturbação visual decorrente de deslumbramento quando do cruzamento com outro veículo. (JTASP 9:64).

Ainda:

Acidente de trânsito – Colisão de automóvel em sua contramão de direção com caminhão que por aquela pista trafegava à noite com faróis acesos – Fato corriqueiro, plenamente previsível e evitável – Inexistência de impedimento a que o motorista do automóvel dirigisse mais à direita quando cruzou com o outro – Culpa, portanto, caracterizada. (RT 625:110).

Apenas em casos muito restritos pode-se vislumbrar uma ação regressiva contra o causador do ofuscamento. Acerca de eventual ação regressiva, Arnaldo Rizzardo destaca que:

Quando muito restritamente apenas a luz alta dos faróis projetada pelo outro carro que demanda em sentido contrário, é permitida a ação regressiva do que indeniza terceiro por acidente, para o qual concorreu a luminosidade dos faróis do veículo que cruzou para o rumo oposto. [14]


2.6 PEDRA LANÇADA PELAS RODAS DO VEÍCULO

Mais uma vez a doutrina defende ser este um caso em que se esta diante de uma responsabilidade objetiva.

Dada a freqüência e previsibilidade do evento a pedra lançada pela roda de um veículo em pessoa ou outro veículo não isenta do dever de reparar o dano o condutor do primeiro.

Para Arnaldo Rizzardo, não é caso para que se discuta acerca de culpa, pois incide nesse caso o fundamento da responsabilidade objetiva. Para o autor, não é justo que a vítima suporte os efeitos de tais incidentes, sob o argumento de ser impossível evitar o fato. Conclui o autor que esse caso serve para ilustrar a insuficiência do princípio da culpa no embasamento do dever de indenizar. (15)

Como explanado anteriormente, quando se tratou do mal súbito, a saída acima se aproxima da noção de responsabilidade objetiva mas com esta não se confunde em razão de carecer de previsão legal expressa.

O que justifica a obrigatoriedade de reparar o dano é, novamente, a necessidade de não deixar sem indenização a parte lesada, que não tenha contribuído para a ocorrência do evento danoso.


2.7 ACIDENTES PROVOCADOS POR FATOS NATURAIS

Ao definir caso fortuito ou de força maior, os doutrinadores discriminam alguns fatos naturais dotados das características de irresistibilidade e imprevisibilidade, como o terremoto, raio, furacão. Assim, se a inexecução de uma obrigação se dá em razão da ocorrência de um desses fenômenos, está o agente diante de uma excludente justificável.

Como os outros casos anteriormente analisados, em regra, nos acidentes de trânsito, não funcionam como justificativa a ocorrência do acidente devido a um fato natural. Se as condições de segurança não forem adequadas, a culpa do motorista se caracteriza ao dirigir o veículo nessas condições.

Também é essa a lição de Arnaldo Rizzardo:

Nos acidentes de trânsito, se danos em outros veículos, ou em pessoas ocorrerem porque o motorista trafega em local onde há inundação, ou durante uma tempestade, ou quando se abate sobre a terra um tufão, não se reconhece a isenção da responsabilidade. A culpa exsurge da conduta imprudente em dirigir sem condições de segurança. (16)

O que ocorre, de modo geral, é que, embora o comportamento muitas vezes seja isento de culpa, o dever de reparar o dano causado surge por força da justiça e da eqüidade.

Porém, em trafegando o motorista em condições normais de segurança, e um fato natural superveniente, como um raio, atinge o automóvel, fazendo com que perca o controle do automóvel e cause um dano a outrem, isento é o condutor de responsabilidade. Basta que se demonstre que o mal causado era imprevisível e inevitável, e que a causa do mal não se relacione com o veículo.

É esse o entendimento de Arnaldo Rizzardo:

[...] um raio que atinge subitamente uma condução, provocando a perda da direção do motorista e danos, não determina qualquer obrigação por parte deste. Percebe-se que o evento natural é uma causa estranha, não se relacionando com o veículo [...] [17]

Saber se o acidente resultou de um caso fortuito ou de força maior é uma questão para ser apurada no caso concreto, através das circunstâncias em que se deu.


NOTAS

1 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 4. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 85.

2 PORTO, Mário Moacyr. Ação de responsabilidade civil e outros estudos. São Paulo: RT, 1966, p. 70-74. apud RIZZARDO, Arnaldo. A reparação nos acidentes de trânsito. 9ª. ed. São Paulo: RT, 2002, p. 122.

3 AGUIAR DIAS, José de. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, v. 2, p. 299.

4 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 7. ed. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 740.

5 MAZEAUD, Henri; MAZEAUD, Léon e TUNC, André. Tratado teórico y práctico de la responsabilidad civil. Ediciones Jurídicas Europa-América: Buenos Aires, 1963, t. II, v. II, p. 215 apud RIZZARDO, Arnaldo. A reparação nos acidentes de trânsito. 9ª. ed. São Paulo: RT, 2002, p. 96.

6 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 7. ed. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 738.

7 RIZZARDO, Arnaldo. op. cit. p. 96.

8 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit. p. 741.

9 MATIELO, Fabrício Zamprogna. Responsabilidade civil em acidentes de trânsito. 2. ed. Porto Alegre: Sagra Luzzato, 2001, p. 253.

10 RIZZARDO, Arnaldo. op. cit. p. 99.

11Ibidem p. 98.

12 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit p. 851.

13Ibidem p. 882.

14 RIZZARDO, Arnaldo. op. cit. p. 99.

15Ibidem loc. cit.

16Ibidem p. 100.

17Ibidem loc. cit.

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Sobre o autor
Rodrigo Binotto Grevetti

Graduado em Direito pela Faculdade de Direito de Curitiba (2004). Especialista em Direito Civil e Empresarial pela PUC-PR (2005). Especialista em Direito Administrativo pelo Instituto de Direito Romeu Felipe Bacellar (2009). Licenciado em Geografia pela Universidade Federal do Paraná - UFPR (2010)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GREVETTI, Rodrigo Binotto. Caso fortuito e força maior nos acidentes de trânsito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 596, 24 fev. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6299. Acesso em: 24 dez. 2024.

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