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Imposto de Renda sobre verbas trabalhistas.

Uma visão liberal

01/03/2005 às 00:00
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O liame entre o empregado e o empregador traduz-se pela fixação jurídica do primeiro ao segundo, com obrigação intuito persona de prestação do trabalho e recebendo a justa remuneração por esse trabalho. Consoante a Doutrina, é a teoria da fixação jurídica a uma fonte de trabalho. A contraprestação remuneratória do trabalho aproveitado pelo empregador é o salário, pago ao empregado periodicamente durante toda a duração do vínculo de emprego. Nesse contexto, as verbas recebidas em decorrência do trabalho realizado têm natureza salarial sempre que habituais e decorrentes da contraprestação devida por aproveitamento do trabalho realizado.

Situação diversa é a verba paga no concerto de uma relação de emprego, porém não como contraprestação remuneratória pelo trabalho aproveitado. Se, por mera liberalidade e adoção de estratégia de motivação, o empregador instituir um prêmio para atender a uma demanda isolada de serviço, o pagamento dessa verba (repise-se: isolada) não integrará o salário do empregado. Será, pois, uma verba não-salarial paga naquele mês apenas. Como regra geral do Direito Trabalhista, se a oferta e pagamento da verba sofrer seguidas repetições, é de se reconhecer sua habitualidade, passando a integrar o salário do empregado.

Do ponto de vista tributário, tanto a verba integrante do salário como a verba não-salarial paga entram no conceito de renda. O dinheiro que é pago ao empregado efetivamente é uma disponibilidade financeira por ele adquirida. Eis que sobre o salário e sobre as verbas não-salariais eventuais incidem o imposto de renda.

Desfecho diferente advém de circunstâncias que caracterizem o pagamento da verba como indenização por danos. De efeito, a relação de emprego recebe intensa proteção estatal diante do óbvio interesse social que existe na manutenção do indivíduo empregado. A dignidade humana em muito se compõe do trabalho que o ser realiza perante a sociedade em que vive. Dessarte, a perda do emprego sem a concorrência de uma justa causa para a despedida lança o indivíduo em uma situação de dano que o Ordenamento Jurídico, inclusive constitucional, pura e simplesmente presume. É pedra básica do sistema jurídico que o emprego deve manter-se, somente devendo desfazer-se o vínculo diante da vontade do próprio empregado, quando pede demissão, ou em face de falta grave que justifique ao empregador dispensá-lo. Mas a despedida imotivada não é crime, não existindo conduta alguma tipificada em norma penal que tenha por fundamento a dispensa do empregado sem justa causa. Conquanto pareça comezinha, tal constatação é importante para destacar que a despedida sem justa causa é um ilícito exclusivamente de natureza civil, comportando, portanto, indenização por perdas e danos.

O Ordenamento Jurídico presume que o cidadão que perde o seu emprego imotivadamente sofre dano e merece reparação civil. Daí porque as normas trabalhistas e a Carta Magna exibirem tantos dispositivos que protegem o empregado e fixam em seu benefício a obrigação do empregador em indenizá-lo sempre que houver a dispensa sem justa causa. Não parece acertado, nesse contexto, distinguir-se exatamente quais as verbas que o ex-empregado recebe sob natureza indenizatória. Ora, seja qual for a verba paga em decorrência da perda do emprego, será indenizatória. Não importa se houve plano de demissão voluntária, programa de incentivo à demissão ou quaisquer formas de sobrepaga. De relevo, apenas, que as verbas são pagas em decorrência da perda de emprego pelo cidadão. Merece ser repisado, mesmo que o empregador pague, sob o nome que quiser, um valor a mais, além do quanto devido por força da lei, ainda assim estará pagando em razão da despedida sem justa causa, que é o fenômeno jurídico bastante, consoante o Ordenamento vigente, à caracterização de dano ao dispensado.

Ninguém cogitaria de considerar não-indenizatório o pagamento feito por uma empresa que causa danos, digamos, a um particular em decorrência de acidente provocado por um de seus prepostos. Imagine-se que a vítima do acidente tenha ficado com seqüelas. Mesmo que a empresa dê-lhe dez milhões de reais, será em decorrência dos danos, ainda que o pagamento ocorra voluntariamente, sem coação judicial. Vale dizer, tal verba será indenizatória. É, no mínimo, de alguma prepotência buscar-se em juízos próprios a partir de quanto aquela vítima já estará indenizada e, consequentemente, a partir de quanto deve ser considerada uma felizarda pelo que ganhou a mais.

Ora, o cidadão que perde o seu emprego certamente preferiria continuar empregado do que receber esse ou aquele valor a mais, em "incentivo" à sua saída. Nem se diga que, afinal de contas, ele "aceitou" o plano de demissão voluntária. Por certo não é preciso muita capacidade de previsão para chegar-se à conclusão de que, tendo sido "convidado" à demissão incentivada, certamente já estava nos planos de corte do empregador, podendo, quando muito, adiar por mais algum tempo o desfecho danoso ou aceitá-lo desde logo com um pouco mais de "vantagem".

Ainda por outra, esse cidadão, agora desempregado, independentemente de ter ou não ocorrido plano de demissão incentivada, não tem culpa se suas férias, ou a gratificação natalina, estão sendo pagas em proporção. São verbas indenizatórias, de qualquer forma. O que causa o pagamento, mesmo sob proporcionalidade, não é o fato de o indivíduo não ter conquistado integralmente o período aquisitivo, mas sim a perda do emprego, ou seja, a circunstância de que o período aquisitivo foi-lhe tolhido antes do término.

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No entanto, vários são os julgados das Cortes Pátrias que apontam essa ou aquela rubrica como não-indenizatórias conquanto tocantes a verbas oriundas de despedida sem justa causa. É claro que há longos fundamentos expostos nas respectivas decisões colegiadas. Mas, concessa venia, pecam vários passos antes da escolha do caminho tomado. É na origem do fenômeno que está o erro, como já apontado. Esquecem os julgadores que seja o que for que seja pago em decorrência e por força de um dano causado, será indenização. Numa palavra, o que se recebe quando da rescisão imotivada do contrato de trabalho não tem natureza salarial, é indenização. Não é justo, nem lícito, diferenciar se esta ou aquela verba tem ou não caráter indenizatório. Tudo o que se recebe em decorrência da despedida imotivada, recebe-se em indenização.

Não por outra razão, todas as verbas recebidas em decorrência da despedida imotivada estão fora da área de incidência do imposto de renda. Não se cuida de isenção ou de imunidade. É fenômeno não-tributável. Em suma, não há nas verbas recebidas por força de despedida imotivada a natureza de renda.

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Sobre o autor
Marco Aurélio Leite da Silva

analista judiciário da Justiça Federal

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Marco Aurélio Leite. Imposto de Renda sobre verbas trabalhistas.: Uma visão liberal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 601, 1 mar. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6337. Acesso em: 23 dez. 2024.

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