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A eficácia dos instrumentos econômicos para o desenvolvimento sustentável

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17/02/2005 às 00:00
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          V – Modelos internacionais e brasileiros na aplicação dos mecanismos econômicos em matéria ambiental.

          Para podermos ter uma panorâmica global da evolução, aplicabilidade e eficácia das denominadas "green taxes" na comunidade européia, apresentamos um relatório de 1995, elaborado pela Agência Européia do Ambiente – AEA, sob encomenda da Comissão do Ambiente da Saúde Pública e da Defesa do Consumidor do Parlamento Europeu: (9)

Quadro 1: Resumo de uma avaliação de taxas ambientais seleccionadas

Instrumento Efeito ambiental Efeito de incentivo Observações sobre a eficácia global

Taxas fiscais ambientais

Imposto sobre enxofre (Suécia)

+++

+++

O teor médio de enxofre dos carburantes baixou consideravelmente (40%), em 2 anos, obtendo-se reduções significativas das respectivas emissões. Embora sendo uma taxa fiscal ambiental, teve um forte efeito de incentivo, provavelmente devido ao seu elevado valor.
Imposto sobre o CO2 (Suécia)

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Substituição dos combustíveis fósseis por bio-combustíveis no aquecimento urbano, em 2 anos; maior competitividade da produção combinada de calor e electricidade.
Imposto sobre o CO2 (Noruega)

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Análises parciais apontam para efeitos como a redução de 3 a 4% nas emissões totais de CO2, em 2 a 3 anos, a partir de uma tendência ascendente.
Imposto sobre voos domésticos (Suécia)

+

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Algum impacte na aceleração da substituição das câmaras de combustão, por uma companhia aérea, e nas emissões em geral, em 1 a 3 anos.
Imposto sobre os resíduos (Dinamarca)

++

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Avaliação em curso; forte aumento da reutilização do entulho de 12 para 82% em 6 a 8 anos e redução da produção de resíduos. O valor da taxa J quase o dobro do custo do tratamento dos resíduos.
Taxas de incentivo
Diferenciação fiscal da gasolina sem chumbo (Suécia)

+++

+++

A diferenciação fiscal contribuiu substancialmente para a erradicação do chumbo em 5 a 7 anos. O diferencial parece ter coberto os custos adicionais da produção de gasolina sem chumbo: forte efeito incentivador.
Diferenciação fiscal do gasóleo menos poluente (Suécia)

+++

+++

A diferenciação fiscal induziu um forte aumento da quota de mercado do combustível menos poluente, cumprindo as normas ambientais mais rigorosas em 3 a 4 anos. A redução das taxas desses combustíveis proporciona fortes incentivos pois reduz os custos de produção para um nível inferior aos dos combustíveis tradicionais.
Taxa sobre os resíduos tóxicos (Alemanha.)

++

++

Redução de pelo menos 15% na produção de resíduos, em 2 a 3 anos. A capacidade de incineração planeada foi consequentemente reduzida.
Taxa sobre os NOx (Suécia)

+++

+++

A concepção e o valor da taxa incentivaram as medidas de monitorização e atenuação nas fábricas responsáveis, contribuindo para reduzir em 35% as emissões de NOx, em 2 anos. Reforço bem-sucedido da política de concessão de licenças.
Taxa sobre os adubos (Suécia)

+

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Um dos factores, no quadro da política de reforma agrícola, que contribuiu para a diminuição do uso de adubos artificiais em 5 a 10 anos.
Taxa sobre a poluição dos recursos hídricos (França)

+

+

O sistema de recompensas fiscais e de contratos sectoriais pode ter tido alguns impactes ambientais positivos em 10 a 12 anos. As verbas geradas por esta taxa são modestas.
Taxa sobre a poluição dos recursos hídricos (Alemanha)

+

+

Impacte positivo na solicitação e concessão de licenças para tecnologias mais "limpas". O seu anúncio precoce contribuiu para o fomento da construção de unidades de tratamento das águas residuais.
Taxas por serviço prestado: taxas de utilização
Taxa de descarga em meio aquático (Holanda)

+++

+

A taxa gerou verbas para o rápido aumento da capacidade de tratamento. Embora o incentivo fiscal fosse baixo, o uso das receitas para esse fim contribuiu para melhorar substancialmente a qualidade da água em 10 a 15 anos.
Taxa sobre os resíduos domésticos (Holanda)

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Divisão mais justa dos custos de gestão dos resíduos domésticos; os valores variáveis podem ter incentivado a redução dos resíduos (10 a 20% menos de resíduos per capita).
Taxas por serviço prestado: taxas reservadas
Taxas sobre as pilhas (Suécia)

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0

Esta taxa viabiliza a reciclagem de pilhas-Pb. O nível de recolha, em 1993, era de 95% (60% em 1989). No caso de outras pilhas, o impacte ainda não J bem conhecido.
Taxas sobre o ruído dos aviões (Holanda)

+

0

Satisfatórias, em termos de geração de receitas. Visam cobrir o custo das medidas de insonorizarão em redor dos aeroportos.

          Legenda:
+/++/+++ = efeito pequeno/médio/elevado
0 = efeito nulo ou insignificante
? = efeito desconhecido

          No caso do Brasil, não se tem conhecimento de um estudo similar, até porque, como foi comentado, a tributação resume-se à aplicação de taxas de fiscalização, geralmente estaduais e municipais e algumas iniciativas estaduais de imposto (ICMS) e compensações financeiras como mostram os exemplos a seguir:

          - Cobrança pelo Uso da Água em Bacias Hidrográficas por Volume e Conteúdo Poluente: Já existe Lei Federal em fase de regulamentação.

          - Tarifa de Esgoto Industrial, baseada no conteúdo de poluentes: Parcialmente implementada desde 1981, no Estado de São Paulo, foi implementada em 1986.

          - Compensação Financeira a Estados e Municípios devido à exploração dos recursos naturais (Hidroelétrica, Produção de Óleo, Exploração Mineral): Totalmente implementada desde 1991, na forma de royalties.

          - ICMS ecológico: Paraná, Minas Gerais e São Paulo implementaram.

          - Preço de Análise de Estudos Ambientais: Implementada em São Paulo desde 2003.

          Infelizmente, como não há uma política de controle da aplicação dos instrumentos existentes no Brasil, ainda é cedo para analisar a sua eficácia.


          VI – Conclusão

          Com esta pequena exposição, tentamos abordar, mesmo que de forma perfunctória, as implicações da aplicação econômica nas soluções ambientais.

          As declarações internacionais deixam claro o hibridismo existente na concepção de meio ambiente ecologicamente equilibrado, pois o considera como fonte precípua de recursos para a vida e bem-estar do homem, ao mesmo tempo em que se preocupa com a harmonia que deve existir entre este e seu habitat, incumbido do dever de proteger a fauna e a flora.

          Desta forma, a aplicação dos mecanismos econômicos ao meio ambiente encontram um elemento complicador ao atribuir valor econômico a bens que aparentemente, não se caracterizam por sua utilidade ao homem em si considerado.

          Entretanto, ao se ampliar o denominado princípio do poluidor-usuário/pagador, agregando-lhe (sub) princípios, a sua aplicação pode passar a abranger os bens naturais em si considerados e enriquecer as negociações de implantação de atividades.

          Trata-se, em suma, de compreende todas as formas de distribuição de custos que visem ao estímulo ou desetímulo de determinadas atividades em busca de um ótimo social.

          Quando a política informa o modelo indutivo, não se exige a atividade sancionatória do Estado, mas requer a conscientização em adotar determinadas condutas que sejam mais benéficas ao meio ambiente. Primeiro, para amenizar as relações entre os vários setores da sociedade e, ainda, como uma forma de implementar a própria educação ambiental.

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          Aparentemente, ao menos na experiência européia, apresenta altos níveis de eficácia, sendo suas distorções pouco sentidas. O Brasil demonstra grande deficiência na implantação dessas políticas que, esbarra na vontade do Poder Executivo, pois, como se sabe, nossa legislação ambiental, além de vanguardeira, é bastante abrangente e dá o suporte necessário para a ação política necessária.

          Não se tem conhecimento de estudos de eficácia e estatística na aplicação desses mecanismos, porém,como orienta o processo democrático, é bom que se criem tais mecanismos dentro um conjunto de negociações entre os vários agentes envolvidos para que se evitem o minimizem os desvios ou desigualdades impostas pelo poder econômico, aumentando, ainda mais, os custos sociais e as falhas de mercado.


Notas

  1. O fenômeno denominado "smog" foi o surgimento de uma imensa nuvem negra carregada com poluições industriais que vitimou milhares de ingleses.
  2. O "Mal de Minamata" ocorreu na cidade de Minamata e foi um episódio em que inúmeros recém-nascidos apresentaram anomalias genéticas, dentre elas, a anencefalia. Foi constatado que os pais foram contaminados ao ingerir pescados contaminados pelo despejo excessivo de dejetos qímico-industriais nas águas, dentre eles, o mercúrio.
  3. BENJAMIN, Antônio Herman V. O princípio poluidor-pagador e a reparação do dano ambiental. In Dano ambiental: Prevenção, reparação e repressão. Antônio Herman V. Benjamin ( coord.). São Paulo: Ed. RT, 1993.
  4. Esta observação é importante para os casos em que se defenda a indenização independente da ilicitude da atividade poluente, objeto de ampla controvérsia, que não será tratada neste trabalho.
  5. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 3ª ed. São Paulo: Ed. RT, 1991.
  6. Op. Cit.
  7. MARTINS, António Carvalho. A política de ambiente da Comunidade Económica Europeia. Coimbra: Coimbra Editora, 1990.
  8. No Brasil, foi criada uma taxa de fiscalização ambiental posteriormente impugnada pelo STF, com fundamento na imprecisão da base de cálculo.
  9. - Relatório extraído do site: http://reports.pt.eea.eu.int/92-9167-000-6sum/pt/page001.html

Bibliografia

          BENJAMIN, Antônio Herman V. O princípio poluidor-pagador e a reparação do dano ambiental. In Dano ambiental: Prevenção, reparação e repressão. São Paulo: Ed. RT, 1993.

          Coase, Ronald. The problem of social cost. Chicago:Journal of Law and Economics 3. 1960

          DOMINGUES DE OLIVEIRA, José Marcos. Direito Tributário e meio ambiente, 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1999

          MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 3ª ed. São Paulo: Ed. RT, 1991.

          MARTINS, António Carvalho. A política de ambiente da Comunidade Económica Europeia. Coimbra: Coimbra Editora, 1990.

          SEROA DA MOTTA, Ronaldo. Manual para valoração econômica de recursos ambientais. Brasília: Ministério do Meio Ambiente, 1998

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Sobre o autor
Rodrigo Fernandes

Advogado, Mestre em Direito e Professor da Universidade Católica de Santos

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERNANDES, Rodrigo. A eficácia dos instrumentos econômicos para o desenvolvimento sustentável. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 589, 17 fev. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6342. Acesso em: 17 nov. 2024.

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