3. A DESORGANIZAÇÃO SOCIAL
De acordo com Shecaira no Brasil a desorganização social é maior na periferia, onde não há presença forte do Estado, a ocupação é recente fazendo com que os laços entre as pessoas não existam, tal situação gera uma sensação de anomia que potencializa o surgimento de justiceiros que substituem o Estado no controle da ordem (SHECAIRA, 2014, p. 152).
Esse fenomeno acontece no Sul de São Paulo, a alta criminalidade pode ser considerada resultado da desorganização social, da ocupação recente, não há uma sociabilidade antiga que uma as pessoas. Na áreas de menor sociabilidade são encontrados mais delitos (SHECAIRA, 2014, p. 152).
Outro conceito da Escola de Chicago importante, segundo Shecaira é o de gradient Tendency, nesse conceito as cidades se organizam em círculos concêntricos, em zonas ou anéis a partir da zona mais central, chada de Loop, que possui os bancos, armazéns, lojas, a administração da cidade. A segunda zona se situa entre a zona residencial e a zona central, está sujeita a invasão do crescimento da primeira zona e por isso pode sofrer a degradação, passa a concentrar uma população mais pobre por ser menos compatível com a habitação humana (SHECAIRA, 2014, p. 152, 153).
Na segunda zona encontram-se os redutos de imigrantes, em Chicago há a Chinatown e a Little Sicily, essa zona facilita a formação de guetos (SHECAIRA, 2014, p. 153).
A terceira zona é a área de moradia da população pobre e dos imigrantes da segunda geração, essas pessoas fugiram da área de decadência mas preferem ficar em um local com fácil acesso ao trabalho. A quarta zona é formada por pessoas de classe média, por sua vez a quinta zona, a mais periférica, é ocupada pela população de nível mais elevado (SHECAIRA, 2014, p. 153).
Os estudos da escola verificaram a existencia de áreas de delinquência, cujos índices elevados de criminalidade estavam ligados a degradação física, doenças, segregação econômica, etnica, racial, constatou-se que 37% dos jovens da região próxima ao loop foram levados a delegacia e menos de 1% dos jovens na área proxima ao limite da cidade. Considerou-se que os crimes tendem a ocorrer em certas áreas mas tais locais não foram considerados causas da criminalidade (SHECAIRA, 2014, p. 154).
Freitas informa que a expansão da zona central leva as atividades industriais e comerciais a invadir a segunda zona, por isso essa zona não é desejada como local de moradia, ao longo do tempo a tendência é a segunda zona perder moradores, quem mora nessa zona está em um constante estado de possibilidade de partida, ainda que não saia dela, por isso o morador dessa zona evita criar vínculos com ela (FREITAS, 2004, p. 75, 76).
A concentração de crimes existente na segunda zona é consequência da desorganização social, que é a forma pela qual a sociedade percebe o “processo pelo qual a autoridade e a influência de uam cultura anterior e sistema de controle são afetadas e eventualmente destruídas” (FREITAS, 2004, p. 77).
A desorganização social possui as seguintes características, “há pouco ou nenhum sentimento de comunidade, relações são transitórias, níveis de vigilância da comunidade são baixos, instituições de controle informal são fracas e as organizações sociais ineficazes” (FREITAS, 2004, p. 77).
A medida em que o comércio e a indústria invadiam a Zona em transição os laços de solidariedade social da comunidade eram destruídos, o que reduzia a resistência à criminalidade (FREITAS, 2004, p. 77).
Uma das resposta à desorganização social é a formação de gangues, que são substitutivos para o que a sociedade nega aos jovens, também são um meio de busca de identidade em razão da modificação da cidade. A norma e valores das gangues são contrários aos valores da macrossociedade (FREITAS, 2004, p. 79).
Como os imigrantes nos Estados Unidos em sua maioria eram originários da zona rural e estavam muito apegados a tradição nem estes nem a macrossociedade possuiam resposta para as necessidades de adaptação dos descendentes de imigrantes estes passaram a buscar as respostas por meio do ingressso em uma gangue (FREITAS, 2004, p. 79).
4. A ESCOLA DE CHICAGO NA REALIDADE BRASILEIRA
Freitas afirma que existem dificuldades na aplicação da teoria das zonas concêntricas em razão, entre outros fatores, da industrialização tardia do Brasil, que somente foi significativa a partir da década de 50 (FREITAS, 2004, p. 117,118).
Outro fator apontado por Freitas é o fato de no Brasil, usualmente o subúrbio é uma área pobre em razão da falta de investimento em transportes e rodovia, as áreas mais distantes, que são de difícil acesso são mais baratas, a classe média ocupa áreas próximas ao centro, pois um percurso entre local de trabalho e moradia longo prejudica a qualidade de vida (FREITAS, 2004, p. 118).
Freitas aponta que as cidades brasileiras que passaram pelo mesmo processo de industrialização, imigração e crescimento acelerado da população e do espaço físico foram São Paulo e Rio de Janeiro, sendo São Paulo a cidade que mais se aproxima do modelo de desenvolvimento da Escola de Chicago (FREITAS, 2004, p. 118, 119).
Penteado filho aponta que a principal contribuição da Escola de Chicago se deu no campo da metodologia e da política criminal com destaque na prevencão (PENTEADO FILHO, 2014, p. 68).
Shecaira aponta a aplicabilidade e importância da metodologia da Escola de Chicago tendo com um exemplo um estudo do “Centro de Estudos de Cultura contemporânea”, que elaborou um mapa relacionando dados quantitativos da violência urbana com as condições sociais em São Paulo, a cidades foi dividida em bairros nos quais se avaliou o risco das pessoa sofrerem homicídio considerando a taxa por 100 mil habitantes (SHECAIRA, 2014, p. 137).
Para avaliar as condições sociais foi criada uma nota socioeconômica com vários indicadores sociais como renda, escolaridade, desemprego, acesso a saneamento básico, os bairros com as menores notas socioeconômicas são os mais violentos enquanto os bairros com as maiores notas são os menos violentos com índices comparáveis à Europa (SHECAIRA, 2014, p. 137, 138).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Escola de Chicago é uma das escolas sociológicas pertencentes à categoria das teorias do consenso, que parte do pressuposto da possibilidade de haver um consenso sobre os valores sociais. As teorias do conflito em oposição não acreditam nessa possibilidade entendendo que a coesão social ocorre por meio da força.
Ela surgiu no departamento de sociologia da Universidade de Chicago e estudou a criminalidade daquela cidade por métodos empíricos e práticos, valorizando muito a observação da realidade.
Este método de investigação é uma das mais importantes contribuições da Escola de Chicago, sendo importante para o entendimento da criminalidade em todas as cidades.
A Escola de Chicago apontou como algumas das causas da criminalidade a desorganização social e a consequente redução do controle social informal surgida em razão do crescimento das cidades, especialmente em cidades que passaram por intensa urbanização causada por migrações internas e imigrações, que resultam no enfraquecimento do Controle Social Informal. Esse fenômeno das migrações ocorreu nas cidades do Estados Unidos e no Brasil, nas cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro.
Estudos realizados no Brasil, seguindo a metodologia da Escola de Chicago, concluíram que a criminalidade é mais elevada nos bairros onde há maior desorganização social causada pela ausência do Estado e pela ocupação recente do espaço urbano, o que resulta em laços sociais fracos entre os habitantes e consequentemente na redução do controle social informal.
A teoria das zonas não pode ser integralmente aplicada ao Brasil, pois nos Estados Unidos a segunda zona é a que possui desorganização social enquanto nos subúrbios vive a população mais rica, mas no Brasil a desorganização social ocorre na periferia, onde mora a população mais pobre, enquanto a população com melhor poder aquisitivo vive próxima ao centro.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FERNANDES, Valter; FERNANDES, Newton. Criminologia Integrada. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.
FREITAS, Wagner Cinelli de Paula. Espaço Urbano e Criminalidade: Lições da Escola de Chicago. São Paulo: Editora Método, 2004.
GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, Antonio. O que é Criminologia. Trad. Danilo Cymrot. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.
GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, Antonio. Introdução aos Fundamentos Teóricos da Criminologia (Primeira Parte). In: GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, Antonio; GOMES, Luiz Flávio. Criminologia. 8. ed. Trad. Luiz Flávio Gomes, Yellbin Morote García, Davi Tangerino. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012, p. 29-484.
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LIMA JÚNIOR, José César Naves de. Manual de Criminologia. 10. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014.
PENTEADO FILHO, Nestor Sampaio. Manual Esquemático de Criminologia. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.