Reforma antirrepublicana de direitos

30/01/2018 às 15:28
Leia nesta página:

Reformas (anticapitalistas) de direitos: o retorno à escravidão midiática e no "chão de fábrica".

Na tamancada que está em voga, a reforma da previdência pública será um desastre pior do que a reforma (anti)capitalista de direitos: chamada de reforma trabalhista. Um de seus pontos, o de pior conduta antirrepublicana, está na equiparação entre público e privado. Com indisfarçável cinismo (especialmente na mídia oficial), todo dia mostram como o servidor público “ganha” mais do que o aposentado do INSS.

Os disfarces são tantos que encheriam jornais por inteiro. Porém, vejamos apenas alguns aspectos: o servidor público tem regime de dedicação exclusiva e o trabalhador da iniciativa privada, não; isto significa que o “trabalhador comum” pode replicar seus ganhos; é fato que algumas castas de servidores ganham muitas vezes mais do que os servidores que nos atendem nos balcões do Estado, a começar pelos togados com seus auxílios de paletó e de moradia (mesmo tendo casa própria).

No entanto, os pontos essenciais do engodo publicitário, que a mídia oficial esconde, são outros três: quem arrebenta a previdência é a leniência com setores privados que sonegam, extraviam e evadem divisas, quer dizer, enviam para o exterior o dinheiro que deveriam depositar nas contas do INSS; é a denominada terceirização total das funções de trabalho que abdica da carteira assinada (reforma anticapitalista de direitos) e, assim, faz com que a previdência pública arrecade cada vez menos; as fraudes generalizadas, a corrupção ativa e passiva.

Mas, o pior está por vir e vem dobrado: os servidores públicos, se passar a reforma do governo, só irão se aposentar no limite da idade ou quando mortos. Por quê?

1 ) Porque se alguém ganha dez mil hoje, produzindo ciência e tecnologia em combate às chagas da saúde pública – por exemplo –, não irá aceitar a aposentaria privada de cinco mil reais (teto máximo alcançado pelo trabalhador privado).

2 ) Ninguém fará concurso público, por falta de vagas, durante 15/20 anos. O que implicará na queda vertiginosa da qualidade do serviço público. Seremos atendidos, todos nós, por anciãos. O que um piloto da FAB fará na aeronáutica com 70 anos? E o pesquisador ou laboratorista, especializado em micro-organismos, que mal enxerga as contas a pagar? Professores da universidade pública – se é que vai restar alguma – estarão todos de bengalas. Ocorre que, se hoje não há acessibilidade no espaço público, imagine daqui a 20 anos.

Agora, a pior das mentiras, a mais cruel, hedionda, porque idiotiza o senso comum, está no ocultamento do fato de que a função do servidor público é, exatamente, “serve ao público”: servidor, de servir.

O patrão do trabalhador aposentado do INSS (será ?) é o capitalista que lhe paga, para fazer o que deseja, ou seja, enriquecer mais e mais. O empregador do servidor público é o povo.

Assim, são dimensões opostas – público e privado –, via de regra atuam como negação entre si: veja-se o técnico do Ministério de Trabalho, aos 70 anos, embrenhando-se na mata atrás de esconderijos em que outros trabalhadores (privados) estão mantidos em condição análoga à escravidão. É claro que você não verá. Policial da PM quase-aposentado subirá morros atrás de jovem armado com fuzis e granadas?

É ridículo pensar em tais hipóteses, é nocivo pensar que logo poderão ser realidade. Isto é o que ocorrerá se a reforma da previdência for aprovada, outro acerto de pagamento ao “mercado” por ter financiado o golpe de 2016. Vão pagar com o nosso dinheiro, como sempre. O crime deles sempre prescreve.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Vinício Carrilho Martinez

Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito. Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar. Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Departamento de Educação- Ded/CECH. Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS/UFSCar Head of BRaS Research Group – Constitucional Studies and BRaS Academic Committee Member. Advogado (OAB/108390).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos