Cansaço político

02/02/2018 às 05:51
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Cansado sim, mas não arredo.

Cansado de falar, escrever como o povo está cansado de governos podres.
Cansei de tratar assuntos que tanto nos maltratam.
Cansei de escrever sobre sentenças sem provas.
Cansado de falar sobre a leniência dos poderes com o governo dos piores.
Cansei de escrever sobre o trabalho escravo, os crimes ambientais, o racismo, a violência contra as mulheres, os indígenas, os pobres e os negros.
Cansado de ver como a Constituição virou papel de embrulhar peixe.
Cansado de escrever sobre as mentiras da reforma da previdência pública.
Cansei de ler, escrever, falar de juízes tendenciosos - pra dizer o mínimo.
Cansado de ver tanta miséria humana.
Cansei de ouvir tanta gente dizer que quer mudar de país – e não mais “o” país.
Cansado, extremamente cansado, de ler sobre corrupção.
Também cansei de ouvir aqueles que defendem usar a democracia contra a liberdade.
Cansado de ler que temos milhões de analfabetos funcionais (e políticos).
Cansei de sentir que o país se tornou uma droga gigante - porque não posso escrever de outro modo, nem usar animações específicas.
Muito mais cansado, ainda, de ver os fascistas defenderem golpe militar em nome da democracia.
Tão cansado, esgotado, que não suporto ouvir possíveis democratas defenderem o direito do fascismo se manifestar.
Cansado de ler que o povo é vampirizado pelo poder.
Cansei de pregar o óbvio ululante, que precisamos de escolas e não de cadeias.
Cansado, ainda insisto que precisamos de Política, urgentemente, e não de mais polícia.
Cansado de me irritar porque o ídolo nacional é um jogador de futebol (com sua atriz de novela) - e não o professor.
Cansei muito, todo dia, de saber que a maioria não sabe que precisamos preservar nossa natureza, a ciência, a cultura livre, a educação libertária, uma saúde pública que não mate na espera, o trabalho com carteira assinada, a isonomia entre o homem e a mulher, que a fila dá preferência ao idoso ou aos necessitados.
Cansado também desse cansaço político, da atuação dos políticos profissionais que não se elegeram com o meu voto.
Cansado de ver crescer o voto nulo.
Quase cansei de sonhar algo melhor para nós.
Quase não escrevi que você deve resistir ao cansaço político.
Mas não esqueci. Por isso escrevo, pra você saber que sinto o mesmo.
Cansado de ter vergonha de ser brasileiro.
Cansei de falar disso, mais que tudo.
Mas não cansei de mim.
E nunca cansarei de lutar por algo melhor, mais honesto, sem medo à liberdade, sem a espreita do fascismo de toga, beca, jaleco ou coturno. 
Mesmo cansado não descansarei no combate ao fanatismo religioso e seu parceiro, o fundamentalismo jurídico.
Cansado. Só isso. Não abatido.

Vinício Carrilho Martinez (Pós-Doutor em Ciência Política)
Professor Associado da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar
Departamento de Educação- Ded/CECH

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Sobre o autor
Vinício Carrilho Martinez

Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito. Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar. Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Departamento de Educação- Ded/CECH. Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS/UFSCar Head of BRaS Research Group – Constitucional Studies and BRaS Academic Committee Member. Advogado (OAB/108390).

Informações sobre o texto

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