8. Das Obrigações do Incorporador em face do patrimônio de afetação
Sem prejuízo das obrigações do incorporador diante de seu papel de empreendedor na edificação, quanto à matéria de afetação incumbe-lhe, na forma do artigo 31-D da Lei 4.591/64:
I - promover todos os atos necessários à boa administração e à preservação do patrimônio de afetação, inclusive mediante adoção de medidas judiciais;
II - manter apartados os bens e direitos objeto de cada incorporação;
III - diligenciar a captação dos recursos necessários à incorporação e aplicá-los na forma prevista nesta Lei, cuidando de preservar os recursos necessários à conclusão da obra;
IV - entregar à Comissão de Representantes, no mínimo a cada três meses, demonstrativo do estado da obra e de sua correspondência com o prazo pactuado ou com os recursos financeiros que integrem o patrimônio de afetação recebidos no período, firmados por profissionais habilitados, ressalvadas eventuais modificações sugeridas pelo incorporador e aprovadas pela Comissão de Representantes;
V - manter e movimentar os recursos financeiros do patrimônio de afetação em conta de depósito aberta especificamente para tal fim;
VI - entregar à Comissão de Representantes balancetes coincidentes com o trimestre civil, relativos a cada patrimônio de afetação;
VII - assegurar à pessoa nomeada nos termos do art. 31-C o livre acesso à obra, bem como aos livros, contratos, movimentação da conta de depósito exclusiva referida no inciso V deste artigo e quaisquer outros documentos relativos ao patrimônio de afetação; e
VIII - manter escrituração contábil completa, ainda que esteja desobrigado pela legislação tributária.
9. Da extinção do patrimônio de afetação
Já analisada a possibilidade de constituição de Comissão de Representantes para comercialização das unidades a terceiros, em caso de quebra ou insolvência do incorporador, quando sob regime de afetação o empreendimento. Da mesma forma, viu-se a possibilidade de os condôminos deliberarem pela continuidade da obra a seu custo e risco.
De última forma, mantendo o princípio da intangibilidade do patrimônio de afetação, em favor dos promitentes-adquirentes, poderão estes deliberar em assembléia geral pelo voto de 2/3 (dois terços) dos adquirentes, a venda do terreno, das acessões e demais bens e direitos integrantes do patrimônio de afetação, mediante leilão ou outra forma que estabelecerem. Qualquer que seja a forma será observada a distribuição, entre si, na proporção dos recursos que comprovadamente tiverem aportado, o resultado líquido da venda, depois de pagas as dívidas do patrimônio de afetação e deduzido e entregue ao proprietário do terreno a quantia que lhe couber. Na hipótese, entretanto, de não ser obtido na venda a reposição dos valores investidos, os adquirentes serão credores privilegiados pelos valores da diferença não reembolsada no patrimônio pessoal do incorporador (inciso sétimo do artigo 43 da Lei 4.591/64), haja vista a natureza de direito real de garantia e seu fim primeiro, a proteção dos promitentes-compradores.
Prevê o artigo 31-E e seus incisos, como procedimentos preliminares e condicionais para o cancelamento, as seguintes medidas de caráter registral e negocial: averbação da construção mediante obtenção de "habite-se"; o registro dos títulos de domínio ou de direito de aquisição em nome dos respectivos adquirentes; e, quando for o caso, a extinção das obrigações do incorporador perante a instituição financiadora do empreendimento. Da mesma forma, será necessária a revogação em razão de denúncia da incorporação, depois de restituídas aos adquirentes as quantias por eles pagas (art. 36), ou de outras hipóteses previstas em lei; e a liquidação deliberada pela assembléia geral nos termos de falência do incorporador, observadas as cautelas analisadas no art. 31-F, § 1º.
Considerando-se, contudo, o meio registral em que encontrará existência, validade e eficácia, perante terceiros, o patrimônio de afetação, da mesma forma que constituído por averbação junto ao Registro de Imóveis, seu cancelamento também, em qualquer hipótese, em nível registral, dependerá da respectiva averbação. Tanto pela conclusão do empreendimento em favor dos adquirentes, seja pela sua frustração em que se veja extinto o patrimônio de afetação.
Notas
1Art. 31-A. A critério do incorporador, a incorporação poderá ser submetida ao regime da afetação, pelo qual o terreno e as acessões objeto de incorporação imobiliária, bem como os demais bens e direitos a ela vinculados, manter-se-ão apartados do patrimônio do incorporador e constituirão patrimônio de afetação, destinado à consecução da incorporação correspondente e à entrega das unidades imobiliárias aos respectivos adquirentes. (Lei 4.591/64)
2 Aqui, como se vê, retorna a fragilidade do sistema criado. Afinal, admitida a ingerência do incorporador e possibilidade de responder com seu patrimônio pessoal, retorna-se a situações conhecidas em que, embora não faltante à consciência legal, doutrinária e jurisprudencial, quanto à responsabilidade pessoal supletiva do incorporador, a sua efetividade, regularmente, se vê afetada.
3 Artigo 31-A, da Lei 4.591/64, com a redação dada pela Lei 10.931/04 "§ 7º O reembolso do preço de aquisição do terreno somente poderá ser feito quando da alienação das unidades autônomas, na proporção das respectivas frações ideais, considerando-se tão-somente os valores efetivamente recebidos pela alienação."
4 AGHIARIAN, Hércules. Da restitutio in integrum. Ed. Lumen Juris. RJ. 4. edição, 2ª tiragem, 2003. página 300 e s.
5 Ver comentários à Lei 9.514/97, na presente obra.
6 A Lei 10.931/04 em nada alterou o conteúdo do artigo 30A, da lei original. Apenas desdobrou o caput em parágrafo.
7 As legislações mencionadas, Lei 4.591/64 e 9.514/97, autorizam o leilão como forma de obter ressarcimento pelos valores devidos.