Ideias de civismo, educação e cidadania

20/02/2018 às 15:49

Resumo:


  • O civismo está ligado à ideia de devoção ao interesse público e patriotismo, com raízes na palavra "cidadania", que deriva do latim "civitas", significando o conjunto de direitos atribuídos ao cidadão ou a cidade.

  • A educação é vista como um direito fundamental e um dever do Estado e da família, conforme a Constituição Federal de 1988, e tem o objetivo de promover o desenvolvimento integral da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho.

  • Cidadania é um conceito amplo que envolve a participação ativa na vida democrática do Estado, o acesso a direitos e serviços como educação e saúde, e a capacidade de observar e cobrar ações do Estado em áreas de interesse social.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O presente artigo tem como escopo fazer uma introdução dos conceitos que derivam dos termos: Civismo, Educação e Cidadania, ao serem abordados.

Civismo e suas vertentes

O propósito deste subcapítulo é discorrer a respeito de algumas ideias que se tem do “civismo”, fazendo uma relação do real sentido deste termo para o presente trabalho, como um instrumento para a educação para formação do cidadão.

Conceito geral de civismo

Ao abordar a ideia de “civismo”, temos adiante algumas suposições sobre o que essa palavra significa. Sobre em qual aspecto ela deve ser utilizada. Mas, antes de discorrer sobre um possível conceito, primeiramente, vale destacar que, ao mencionar o “civismo”, pode-se fazer confusão morfológica entre ela e “civilismo”, mas, como se verá, são palavras com significados distintos mesmo que estejam ligadas.

De acordo com o minidicionário da língua portuguesa, Silveira Bueno, “civilismo” corresponde a um “Sistema de governo em que predominam os civis” (BUENO, 2007, p. 170). Aqui o termo “sistema de governo” é diverso daquele ao qual estudantes do Direito estão habituados, a ser: a titularidade do exercício dos poderes políticos no âmbito do Estado (LEITE, 2014), ou seja, como exemplo podemos ter o presidencialismo e parlamentarismo.

Ao se consultar na internet, nos deparamos com a ausência de conceitos definindo com profundidade a palavra “civilismo” e ainda encontrando uma relação direta dela com o termo “civismo” como sua origem etimológica, onde ambas derivam da palavra “cidadania”, como se verá mais adiante. Assim não se tem importância uma extenuação de “civilismo”, sobre seu significado, devendo sua citação ser meramente superficial para apenas uma distinção, pela coincidência morfológica.

Quando falamos “civismo” em qualquer ambiente, podemos nos deparar com olhares desconfiados e outros contentes. Isso decorre pela importância ideológica que esse termo foi utilizado durante momentos da vida brasileira, fazendo parte de sua história. Então, mas o que vem a ser o “civismo”?

O “civismo” em sua semântica, também se distingue da palavra “civilismo”, como nos traz o minidicionário da língua portuguesa, Silveira Bueno: devoção pelo interesse público; patriotismo (BUENO, 2007, p. 170). Mas ambos os termos tem origem da palavra “cidadania” que deriva do latim civitas, que significa “conjunto de direitos atribuídos ao cidadão” ou “a cidade”. Por isto, vê-se uma linha tênue que liga a palavra “civismo” ao termo “cidadania”, essencialmente no que diz a formação de um conceito para definição. Como expõe Dalmo Dallari sobre “cidadania”:

A cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo. Quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social. (DALLARI, 1998, p.14). (grifo nosso).

Esse conceito de “cidadania” dado por Dallari pode ser estendido ao termo “civismo”, pois há uma busca comum entre as duas ideias para a integração do indivíduo para o mundo público. A única diferença que se tem aqui é dada em relação ao objeto, que é a ação. No “civismo” há o engajamento do cidadão para a participação nos interesses coletivos. Nos dias atuais, nem todo cidadão possui um engajamento, uma iniciativa, um interesse, uma participação pelo meio que o envolve. Por isso, nem todo indivíduo, nestes termos, é um cidadão, sendo um cidadão aquele em que interesse mútuo social.

O “civismo” também possui uma ideia polissêmica[1], a depender do contexto em que é utilizado. Por exemplo, na época do Brasil Império, onde se surgia uma ideia de nação brasileira, havendo um debate cívico e moral da formação brasileira no aspecto educacional (ABREU, 2008), assim, nesse período, o “civismo” também tinha como objetivo a criação de um sentimento nacional. Na mesma linha se deu com o advento do Golpe Militar (1964-1985), que também impôs uma educação cívica e moral voltada para conceitos ditos “conservadores”, por alguns, nos dias atuais, a ser relevante para cada época de sua imposição, sendo no Brasil Império ou nos governos militares. Quer dizer, em ambas as situações, o Estado criou uma formação educacional voltada para o controle dos indivíduos, limitando as relações de uns com os outros, não dando liberdade para a consciência de seus atos e assim limitando sua consciência aos interesses do Estado, havendo uma relação por coação[2]. No segundo sentido, pode-se ter um “civismo” voltado para outra ideia de educação moral, proposta por Piaget[3] e que será descrita posteriormente.

            Civismo patriótico

Esse conceito de civismo é ligado diretamente à ideia de “amor pela pátria”[4]. Aqui, o civismo foi utilizado como instrumento de formação do indivíduo por meio da educação com o foco de idolatria, tendo como pilares à “Educação”, “Trabalho” e “Pátria” dentro da lógica da busca pela Segurança Nacional, desenvolvimento econômico e disciplina. (ABREU, 2008).  Também no “Estado Novo”, 1937-1946, se teve uma implementação de um “civismo” ligado diretamente a essa idolatria centralizadora, de imposição pelo Estado para o controle da população. Em ambas as situações a educação foi utilizada como um instrumento de mobilização para os ideais de cada “revolução” estampada por esses governos.

Esse civismo patriótico, na história do Brasil foi utilizado sempre com o mesmo fim, ou seja, uma: educação para controle da população.  

Segundo Abreu, na ditadura militar, por exemplo, esse controle baseou-  se para:

Construir uma mentalidade geral de que os militares não dominavam a sociedade, mas dirigiam todo o país para o desenvolvimento e progresso tão desejado por todos, esforçando-se para que o Estado mantivesse uma “máscara democrática”. Assim, o desenvolvimento pareceria se dar de modo “natural” e para todos.” (ABREU, 2008).

Nisso, acaba por se criar na população um sentimento paternalista. Isto é, tanta intervenção na sociedade, sem a criação de ideal de construção mútua, não se tem uma reciprocidade de obrigações. Somente o Estado, com seu caráter excessivamente impositivo como uma força material[5] que geria em todos os aspectos, tendo a população apenas papel secundário na formação da sociedade.

Mesmo tendo um papel secundário, a população se reergueu em 1983, com as “Diretas já”, mostrando ao governo militar que há uma sociedade civil e que não se governa tão somente com uma sociedade política absolutamente impositiva. Aqui, se teve uma ruptura, uma abertura de consciência dos indivíduos pelos seus direitos e não pela lei. As leis no governo militar não foram criadas por representantes do povo. Então, como indaga Thoreau[6], em seu livro A desobediência civil:

Deve o cidadão, sequer por um momento, ou minimamente, renunciar à sua consciência em favor do legislador? Então por que todo homem tem uma consciência? Penso que devemos ser homens, em primeiro lugar, e depois súditos. Não é desejável cultivar pela lei o mesmo respeito que cultivamos pelo direito. A única obrigação que tenho o direito de assumir é a de fazer a qualquer tempo aquilo que considero direito. (THOREAU, 1997, p.10-11).

Assim, como se vê, não havia um consenso entre a sociedade civil e a sociedade política que governava o Brasil, somente coerção. Mas o que fez a sociedade civil se juntar em um interesse mútuo contra o governo militar que já perdurava mais de 20 anos? Simplesmente por motivos econômicos. Ou seja, o governo militar teve seus anos conhecidos como “Milagre Brasileiro”, onde houve uma total reestruturação da economia, buscando um rápido crescimento, e essa busca, teve um fim diverso do buscado, como descreve Paulo Daniel em Carta Capital:

A literatura econômica considera milagre econômico, entre 68 e 73, período mais funesto da ditadura militar brasileira, taxas de crescimento acima de 10% ao ano, isso se deveu a reorganização do sistema financeiro brasileiro bem como a alta liquidez internacional e beneficiou-se do grande crescimento do comércio mundial e sua abertura comercial e financeira em relação ao exterior. Paralelamente, agravaram-se as questões sociais, com o aumento da concentração de renda e deterioração de importantes indicadores de bem-estar social. O milagre aprofundou as contradições estruturais e aprofundou e os problemas decorrentes de sua enorme dependência em relação ao capital internacional. (DANIEL, 2012).

Sendo assim, nota-se que o civismo patriótico é aquele que limita o indivíduo, pois não há uma relação dele com o seu meio. Ele não tem uma participação consciente de seus atos. Criam-se tabus a respeito de ideais, como na ditadura em relação as suas bandeiras, como “Educação”, “Trabalho” e “Pátria”, não havendo uma liberdade para se pensar, não se fazendo uma análise objetiva de sua personalidade, se conhecendo e chegando a ideia de que o “civismo” deve ser usado como instrumento de integração com a comunidade.

            Civismo moral

Primeiramente, antes de discorrer da junção de civismo com moral, vale destacar o significado da palavra moral.

Moral, na maioria das vezes é utilizada como sinônimo de “ética”. Mas, como se verá adiante, são palavras autônomas. Assim, Moral, tem origem do latim, mores, que significa “costumes”. Já Ética, vem do grego ethos que significa “modo de ser”.

 Moral, então é o conjunto de regras que regulam o comportamento do indivíduo na sociedade, adquirida por meio da educação, pela tradição e também pelo cotidiano. Já a ética, traz sua raiz como fundamento de estudo filosófico da moral. Dessa forma, todas as sociedades possuem conduta moral, mas a ética está ligada ao desenvolvimento cultural de grupos específicos.

“Civismo” e moral são palavras utilizadas sempre uma ligada à outra. Seus objetivos são criados e alocados a depender das circunstâncias de cada momento. Como exemplo, temos o Guia de civismo, que foi um manual criado na época do governo militar para moldar a educação brasileira a seu ver, tendo como objetos elementos de imposição a sociedade civil, relação ao civismo patriótico, como exaltações ufanistas, e acabando por colocar as reais necessidades da população de lado e suas mazelas no esquecimento. É dito isso, pois esse “guia” que era uma matéria da base educacional só visava uma limitação aos aspectos educacionais e a criação de um ideal de nação brasileira, sem o real envolvimento da população, sem sua integração.

Esse “guia”, como se vê adiante, tinha como “ideias básicas” termos propostos para ajudar na orientação dos professores ou de quem fosse aplica-la aos estudantes. Assim, como expõe o Guia do civismo:

Para que o guia atinja seus objetivos da ação educacional cívico-democrática e do preparo do brasileiro para o exercício da cidadania, deverá orientar-se pelas seguintes idéias básicas: 2.1 estar de acôrdo com os princípios filosófico religiosos da Constituição do Brasil, evidentemente resultante das aspirações dos brasileiros e dos interêsses nacionais;             2.2 ressaltar os fundamentos democráticos constitucionais, sobretudo os referentes:

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 — ao espírito religioso do brasileiro (evitando o aspecto sectário); — à dignidade da criatura humana; — ao amor à liberdade, em tôdas as suas manifestações; — aos deveres e direitos fundamentais do Homem (Constituição do Brasil; Declaração Universal dos Direitos do Homem, da ONU; e Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, da OEA); — à individualização da Pátria; — à convicção de que o Estado existe para o Homem e não o Homem para o Estado; — ao direito de igualdade de oportunidades na educação e no trabalho para todos os brasileiros; — à caracterização das instituições pátrias: Religião, Família, Justiça, Escola e Fôrças Armadas; — à democracia representativa — todo o poder emana do povo e em seu nome será exercido; — à livre iniciativa na ordem econômica, apenas subordinada à realização da justiça social para o bem comum;

— à valorização do trabalho, como condição da dignidade humana; — ao direito à educação, dada no lar e na escola, inspirada nos ideais de liberdade (com responsabilidade interior, advinda da crença em DEUS — Constituição do Brasil, Preâmbulo) e solidariedade humana e no princípio da unidade nacional; — ao ideal do desenvolvimento integral do homem — espiritual, moral e físico; — à responsabilidade de toda pessoa — natural ou jurídica — para com a Segurança Nacional; 2.3 orientar o brasileiro para o pleno exercício da cidadania, no atual esforço nacional para ultrapassar o estágio de subdesenvolvimento; 2.4 realçar o papel da família e sobretudo da mulher — mãe, esposa, irmã — na formação do caráter e das virtudes cívicas; 2.5 dar ênfase às expressões de civismo: exercicio esclarecido do Voto e prestação digna do Serviço Militar; 2.6 ressaltar a necessidade de a evolução nacional ser fundamentada nas tradições cristãs brasileiras, dando ênfase à lingua, aos símbolos nacionais, às tradições culturais (inclusive folclore), ao papel das etnias formadoras e às biografias sintéticas de brasileiros, já falecidos, cuidadosamente selecionados, que se hajam constituído modêlo de virtudes morais e cívicas; 2.7 realçar o equilíbrio entre o indivíduo e a sociedade, como aspecto característico da democracia brasileira;

2.8 ressaltar a incompatibilidade do bom uso da liberdade com as convicções materialistas, pois que os governos de Nações que se alicerçam em filosofia de base materialista, pela qual a consciência individual não é desenvolvida por valores espirituais e morais (de fundo religioso), não podem abdicar de regime policial; 2.9 projetar os valores espirituais e morais da nacionalidade na educação, tendo em vista conter o egoísmo, a corrupção e a subversão, no trato adequado do bem comum dos brasileiros, e eliminar os privilégios; 2.10 facultar o conhecimento sintético da organização sócio-político-econômica do País; 2.11 fortalecer o sentimento democrático do brasileiro, preservando-o das ideologias exóticas, materialistas e contrárias às aspirações dos brasileiros e aos inte-tesses nacionais; 2.12 realçar o valor da juventude brasileira que trabalha e coopera na construção da Pátria; 2.13 preparar a mocidade brasileira para, alicerçada no amor à Pátria, desenvolver o sentimento de fraternidade universal; 2.14 considerar, em síntese, que o conceito de civismo deve ter em vista os três aspectos fundamentais — CARÁTER, PATRIOTISMO E AÇÃO: Caráter — com base na moral, originária da ética, tendo por fonte DEUS (Constituição do Brasil, Preâmbulo) ; Amor à Pátria — e às suas tradições, com capacidade de renúncia; Ação — intensa e permanente, em benefício do Brasil.

Ao se fazer a leitura desses termos do Guia do civismo pode-se notar uma relação entre o civismo patriótico e o civismo moral. Os dois são extremos cada um com seu ideal. O “civismo” patriótico se funda na frase “Brasil, ame ou deixe-o” e o “civismo” moral, tem como base a ideia da educação do indivíduo na sociedade e ambos utilizados para a coerção do indivíduo. Esse Guia do civismo desenvolvido pela ditadura militar fez uma junção entre essas duas ideias de “civismo”. Através de conceitos como a família, que é interno ao “civismo moral”, e ao ideário de patriotismo, referente ao “civismo patriótico”, criou-se esse “guia” com conceitos que o governo militar queria dar para melhor manipular, sendo ele difundido de maneira pedagógica nas escolas.

O indivíduo sim deve abrir mão de sua liberdade em prol da ordem pública, mas desde que essa liberdade seja fundamentada em convenções e não em imposições.

O que é educação?

Esse subcapítulo tem por objetivo abordar o amplo termo que é a palavra “educação”. Buscando mostrar alguns sentidos diversos que são dados a essa palavra e tentando relacioná-la aos termos do presente trabalho.

A “educação” está presente em nossa carta magna em duas situações. Primeiro no título II, “dos direitos sociais”, no qual discorre art. 6º e art. 205 da Constituição Federal de 1988:

Art. 6º. São direitos sociais a educação, a alimentação [...] e também no título VIII, “da ordem social”, no capítulo III, “da educação, cultura e do desporto”, seção I...

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (grifo nosso).

A “educação” é uma propriedade para o indivíduo. A Constituição de 1988 a coloca em nossa posse como um direito legal. E quando ela é atacada, nos ataca. Esse ataque ocorre pela ausência de uma “educação” voltada para a integração do indivíduo. Essa “educação” vazia voltada para a não integração do indivíduo tem como base a individualização para melhor controle do Estado visando seus interesses, afastando o indivíduo do mundo público, afastando-o do engajamento cívico.

Pelo fato da Constituição trazer em seu rol a palavra “educação”, nota-se a grande importância dela para a nossa formação. Pois a nossa Constituição traz grandes conceitos, sejam eles estritamente jurídicos, ou conceitos mais fáceis de serem vislumbrados pelo indivíduo comum. Dessa forma, se vê sua complexidade para abranger o indivíduo complexo que somos e o meio em que vivemos, tentando ordena-lo de acordo com nossas vontades e limites mutáveis que ela nos provem.

De acordo com o dicionário de etimologiagramática.net.br, a palavra “educação” deriva de: “educar”, a origem desta, por sua vez, é do Latim educare que é uma derivado de ex, que significa “fora” ou “exterior” e ducere, que tem o significado de “guiar”, “instruir”, “conduzir”. Ou seja, em latim, educação tinha o significado literal de “guiar para fora” e pode ser entendido que se conduzia tanto para o mundo exterior quanto para fora de si mesmo.

WERNER JAEGER AO FAZER SEU ESTUDO PROFUNDO SOBRE A EDUCAÇÃO GREGA, DESCREVE ELA COMO:
A NATUREZA DO HOMEM, NA SUA DUPLA ESTRUTURA CORPÓREA E ESPIRITUAL, CRIA CONDIÇÕES ESPECIAIS PARA A MANUTENÇÃO E TRANSMISSÃO DA SUA FORMA PARTICULAR E EXIGE ORGANIZAÇÕES FÍSICAS E ESPIRITUAIS, AO CONJUNTO DAS QUAIS DAMOS O NOME DE EDUCAÇÃO. NA EDUCAÇÃO, COMO O HOMEM A PRATICA, ATUA A MESMA FORÇA VITAL, CRIADORA E PLÁSTICA, QUE ESPONTANEAMENTE IMPELE TODAS AS ESPÉCIES VIVAS À CONSERVAÇÃO E À PROPAGAÇÃO DE SEU TIPO. É NELA, PORÉM, QUE ESSA FORÇA ATINGE O SEU MAIS ALTO GRAU DE INTENSIDADE, ATRAVÉS DO ESFORÇO CONSCIENTE DO CONHECIMENTO E DA VONTADE DIRIGIDA PARA A CONSECUÇÃO DE UM FIM. (JAEGER APUD BRANDÃO, 1981, P.14-15).

Assim, “educar” significa viabilizar que o indivíduo encontre de maneira mais rápida sua condição de humano. Pode se dizer que “educar” vai além da educação proposta em ambientes escolares dos quais estamos ambientados. Como a nossa própria Constituição descreve em seu Art. 205. “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família”. Ou seja, a educação deriva também de situações pedagógicas interpessoais. Essas relações interpessoais decorrem das relações familiares, como: das mulheres, dos homens, das crianças, dos adolescentes, em conjunto, para transmitir o saber e fazer jus ao seu dever imposto pela própria Constituição; que impõe as famílias o dever de educar os seus componentes. Dessa forma, se vê que essa transmissão, são formas vivas de educar para além a estrutura escolar, derivadas desse laço familiar que se dá para a comunidade. Através disso, se notam os vários aspectos dados à iniciativa de ensinar para aprender ou aprender para ensinar e sempre tendo o mesmo fim, como é o caso aqui, para a socialização[7] do indivíduo para o meio em que ele vive.

A “educação” é ligada diretamente a ideia de ensinar, como dito acima. A ideia de educação é por demais abrangente, sendo fomentadora de diversas etapas do desenvolvimento do indivíduo, seja para lidar com momentos da vida cotidiana em sociedade, com respeito ao próximo, as regras morais e também as regras jurídicas.

A educação, também é o “arranco” de um processo de desenvolvimento do indivíduo para desenvolver o seu ideal de integração cívico. Essa integração é ligada a ideia de interação do indivíduo com o seu meio. Outro termo que possui um significado abrangente é o “meio” quando utilizado para localizar o indivíduo em sua relação com os instrumentos da sociedade. O “meio”, por exemplo, pode ser aquele em que o indivíduo se porta diante de determinado momento em sala de aula perante o professor. O indivíduo, no caso, um aluno que se mantem calado quando o professor está transmitindo algum conhecimento. Aqui o aluno possui uma “educação” que é o respeito pelo professor, seja por sua autoridade, ou pelo conhecimento que ele passa. Um respeito que se funda e que se deve fundar na reciprocidade.

Posto isso, a “educação” é um termo amplo, com responsabilidade para todos, tanto para as famílias, para a sociedade, dos adolescentes para com as crianças, delas com os mais velhos; também das nossas instituições, sendo as escolares ou qualquer outra que se preste ao serviço público sempre com respaldo recíproco.

De toda essa amplitude que visa elucidar a respeito do conceito educação, temos Durkheim que compreende a educação como:

O conjunto de ações exercidas das gerações adultas sobre as que ainda não alcançaram o estatuto de maturidade para a vida socialEla tem como objetivo suscitar e desenvolver na criança certo número de estados físicos, intelectuais e morais exigidos tanto pelo conjunto da sociedade política quanto pelo meio específico ao qual ela está destinada em particular(DURKHEIM apud MATOUSEK, 2013, p.53).

Por fim, vale destacar de quão grande é o termo “educação” que essa palavra foi incluída em uma declaração convencionada por diversos países. Essa declaração é a “declaração universal de direitos humanos” e em seu preâmbulo no seu inciso XXVII, expõe:

Agora, portanto a Assembleia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade tendo sempre em mente esta Declaração, esforce-se, por meio do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universais e efetivos, tanto entre os povos dos próprios Países-Membros quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição.

E no inciso XXVI da mesma declaração:

Todo ser humano tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, está baseada no mérito.

Cidadania

Quando se fala em “cidadania” a primeira coisa que vem em mente é a ideia de que é um direito político para que o indivíduo possa participar ou intervir na vida democrática do Estado e assim afetando seus poder decisório; ou “cidadania” pode ser dita como aquela em que dá respaldo ao indivíduo para buscar direitos postos a sua disposição, como a educação e a saúde; e também é aquela posição alcançada pelo indivíduo para que ele possa observar os atos do Estado, seja em relação a investimentos públicos, ou sua atuação em área de interesses sociais e por aí vai.

A palavra “cidadania” é muito ampla, como “civismo” e “educação”, também o são, sendo possível destaca-las no contexto em que são utilizadas.

Aqui, essas palavras são engajadas com intuito de promover uma capacidade do indivíduo em se transformar em cidadão para o interesse mútuo de transformação para a sociedade.

Vale destacar que a palavra “cidadania” tem sua origem na Grécia antiga e posteriormente utilizada na Roma antiga, do qual era cidadão aquele que possui uma soma de direitos e mais privilégios. Assim, “cidadania” era utilizada para afastar os mais abastados, dos mais pobres, do nacional, do estrangeiro ou bárbaro, do homem livre do escravo.

A “cidadania” nos dias atuais, como nos traz a nossa própria constituição federal, que é conhecida como “constituição cidadã”, é utilizada relacionada com alguns termos, sejam eles utilizados como sinônimos ou antônimos dela.

Vale destacar primeiramente a diferença “cidadania” de palavras como “nacionalidade” e “naturalidade” e depois discorrer ainda mais sobre o diverso conceito que pode ser dado a palavra “cidadania”.

A palavra “nacionalidade” deriva da palavra “nação”, que tem seu conceito difundido a partir do século XVIII na Europa, com intuito de elevar uma nova classe social que surgia, burguesia, para a conquista do poder político (DALLARI, 2013). O termo “nação” é mais limitado, surgindo apenas de uma necessidade oriunda de um sentimento de integração que os estados europeus verificavam no início do século XVIII, como na integração que ocorreu na Alemanha, promovida por Bismarck[8].

“Assim, se tornou indispensável tornar mais extensivo o conceito de “nação”, pois ele surgiu apenas como um artifício para envolver o povo em conflitos de interesses alheios” (DALLARI, 2013). E qual era a necessidade então, se já havia um envolvimento dos indivíduos? A necessidade era é de criação de vínculos jurídicos que não eram propostos pelo ideário de “nação” e sim de “nacionalidade” que por sua vez estava ligado à ideia de Estado e este, por sua vez, ligado a ideia de sociedade.

Então, da “nacionalidade” se tem um vínculo jurídico do indivíduo com o Estado, sendo esse conceito muito mais amplo do que “nação”. Já sobre “naturalidade” pode ser dito que este é um conceito que é envolvido pela ideia de “nacionalidade”.

O termo “naturalidade” é desenvolvido na nossa Constituição de 1988 que a divide em duas, o brasileiro nato e o brasileiro naturalizado. Essa divisão acaba por limitar os direitos dos indivíduos no que diz respeito à cidadania. Dessa forma, esses conceitos devem ser tratados de maneira separada mesmo estando relacionados, dependentes uns dos outros para sua aplicação. No caso do brasileiro naturalizado, ao contrário do brasileiro nato, há limitações para o exercício de sua “cidadania”, como exemplo o naturalizado pode se eleger deputado federal, mas não pode ocupar o cargo de presidente da câmara dos deputados. Assim, também se pode fazer limitações ao que diz respeito à “nacionalidade” e a “cidadania”. Ou seja, todo cidadão é nacional, mas nem todo nacional é cidadão. Aqui, é feita a referência clássica aos direitos políticos do cidadão que é a sua capacidade de votar e ser votado. Essa ideia do votar é a primeira explicação que se dá quando se pergunta: o que é cidadania?

Mas cidadania possui um conceito muito mais amplo do que o simples ato de votar, como descreve José Afonso da Silva: “qualifica os participantes da vida do estado, o reconhecimento do indivíduo como pessoa integrada a sociedade estatal”. (FERREIRA, 2004, apud SILVA, 2015, p.125).

Para se ter uma noção ainda maior da dimensão do conceito de “cidadania”, pode ser dizer que ela se construiu, se formou ao longo da história, tendo conceitos cumulados para se chegar ao o que ela é hoje. Essa explanação é feita ao se observar das dimensões ou gerações de direitos. Essas gerações são descritas como a de primeira, segunda e terceira e surgiram da necessidade de transformação que as sociedades de cada época enfrentavam, criando uma nova compreensão de relacionamento entre o Estado e a sociedade.

Pelo fato dessas gerações de direitos serem cumulativos, se chegou à formação do indivíduo como qual é hoje. Ou seja, os indivíduos em cada época lutaram pelos seus direitos, pela abrangência deles e por limitações aos poderes do Estado. E esses direitos, como sociais, a liberdade, a propriedade, ao papel ativo de cobrar do Estado o cumprimento de suas obrigações, são ações adquiridas pelo fato de o indivíduo buscar a cidadania.


[1] De acordo com o minidicionário da língua português, Silveira Bueno, polissemia é um fenômenos que consiste na reunião de vários sentidos em uma palavra.

[2] Termo utilizado por Jean Piaget que descreve uma “coação inevitável do superior sobre o inferior”.

[3] Jean Piaget, suíço, educador, biólogo, psicólogo e epistemológo, viveu na Suíça entre 1896 e 1980.

[4] Essa frase “amor pela pátria” pode-se dizer que é ligada a emblemática publicidade criada pelo governo militar “Brasil, ame ou deixe-o”, ou seja, a ideia que se passa aqui é a de submissão ao regime militar para se “viver” na sua própria pátria. Esse conceito de “amor pela pátria” do governo ditadorial se difere daquela ideia criada por Jean-Jaccques Rousseau que diz que “a pátria está nas relações entre o Estado e seus membros, quando esta relação muda ou fenece, o Estado não existe mais”. (ROUSSEAU,1820, p.303 apud MOSCATEL, 2009, p. 99), Como se vê, no governo militar havia uma “democracia mascarada”, não se tendo reciprocidade nas relações entre o Estado e seus membros, somente uma relação por coação.

[5] Dalmo Dallari (2013, p.51) em seu livro Teoria Geral do Estado, expõe seu pensamento a respeito sobre sociedades mais prósperas e as mais primitivas. Ou seja, “as mais prósperas e bem ordenadas são aquelas em que ocorrem conflitos entre os indivíduos ou grupos sociais, tornando necessária a intervenção de uma vontade preponderante, para preservar a unidade ordenada em função dos fins sociais”. E a respeito das “mais primitivas”, diz que “a ideia de vontade preponderante, ou de poder, quase se confunde com a ideia de força material”. E ainda complementa “que se encontram exemplos de homens que tiveram o poder porque eram reconhecidos como os mais aptos...” Assim, a “força material” pode-se dizer que foi a estrutura militar que o Governo militar impôs como instrumento para o golpe; e ainda “tiveram o poder reconhecido” pela população, pois na época, criou-se a ameaça do golpe comunista, do qual haveria ameaça, a família, pátria e a religião, que foram as bandeiras do golpe militar. Desse modo, o Governo militar pregava aos membros da sociedade a defesa contra essas ameaças. E assim, se faz uma analogia, das sociedades primitivas com o governo militar, onde sua estrutura era baseada na força material e em ameaças, somente com a intervenção de sua vontade preponderante, mas sem conflitos essenciais para o movimento da sociedade entre indivíduos e grupos sociais, tendo a população mero papel complementar na sua construção.

[6] THOREAU foi um autor estadunidense, poeta, naturalista, anti-imperalista e escreveu o livro A desobediência civil do qual relatava suas vontades e indignações ao modo de governar da recente democracia que era os Estados Unidos.

[7] Carlos Henrique Brandão, em seu livro O que educação, 49ª, p.23 descreve que “a socialização do indivíduo é aquela em que ele realiza em sua esfera as necessidades e projetos da sociedade, e realiza, em cada um de seus membros, grande parte daquilo que eles precisam para serem reconhecidos como "seus" e para existirem dentro dela”.

[8] De acordo com o site Bibliografia Otto von Bismarck (1815-1898) foi um estadista prussiano e primeiro chanceler do Império Alemão. O preparo e eficiência do exército prussiano e a habilidade e diplomacia de Bismarck foram decisivos para a unificação dos territórios germânicos.

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