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A ultratividade das convenções e acordos coletivos

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13/04/2005 às 00:00
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5. A ULTRATIVIDADE NO CENÁRIO ATUAL DE FLEXIBILIZAÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO

A segunda corrente sustenta que, diferentemente da lei, que, em geral, não se destina à vigência temporária, a norma coletiva tem prazo certo de vigência, sendo que as condições ajustadas valem para o respectivo prazo de vigência, conforme os arts. 613, II e IV e o 614, parágrafo 3º:

Art. 613. As convenções ou acordos deverão conter obrigatoriamente:

-------------------------------------

II - prazo de vigência;

-------------------------------------

IV- condições ajustadas para reger as relações individuais de trabalho durante a sua vigência;

Art. 614, parágrafo 3º. Não será possível estipular duração de convenção ou acordo superior a 2 (dois) anos.

O Prof. Dr. Renato Rua de Almeida de Almeida argumenta que a temporalidade e relatividade do conteúdo dos acordos ou convenções coletivas de trabalho estão claramente reconhecidas pelo Decreto nº 908, de 31 de agosto de 1993, que fixa as diretrizes para as negociações coletivas de trabalho das empresas públicas, sociedades de economia mista e demais empresas sob controle direto ou indireto da União, uma vez que o parágrafo único do art. 2º estabelece que: "todas as cláusulas do acordo coletivo vigente deverão ser objeto de negociação a cada nova data-base" e a art. 4º prevê que: "o acordo coletivo vigorará por prazo não superior a 12 (doze) meses".

O Prof. Dr. Renato Rua de Almeida de Almeida argumenta ainda que: "o melhor entendimento sempre foi no sentido da temporalidade das convenções coletivas de trabalho, mesmo em matéria salarial".

Tal fato evidencia-se inclusive pelo incentivo à negociação coletiva direta entre os parceiros sociais, em caso de frustração, pelo socorro à mediação, que pode ser feita através do Ministério do Trabalho e Emprego também, como prevê o art. 11 da Medida Provisória nº 1.079/95 (a última Medida Provisória reedita foi a de nº 2.074-72, que finalmente transformou-se na Lei nº 10.192, de 14.2.2001), conforme abaixo descrito:

 Art. 11. Frustrada a negociação entre as partes, promovidas diretamente ou através de mediador, poderá ser ajuizada a ação de dissídio coletivo.

§ 1º O mediador será designado de comum acordo pelas partes ou, a pedido destas, pelo Ministério do Trabalho e Emprego, na forma da regulamentação de que trata o § 5o deste artigo.

§2º A parte que se considerar sem as condições adequadas para, em situação de equilíbrio, participar da negociação direta, poderá, desde logo, solicitar ao Ministério do Trabalho e Emprego a designação de mediador, que convocará a outra parte.

§3º O mediador designado terá prazo de até trinta dias para a conclusão do processo de negociação, salvo acordo expresso com as partes interessadas.

§4º Não alcançado o entendimento entre as partes, ou recusando-se qualquer delas à mediação, lavrar-se-á ata contendo as causas motivadoras do conflito e as reivindicações de natureza econômica, documento que instruirá a representação para o ajuizamento do dissídio coletivo.

Menciona ainda o referido Mestre como evidência de tal argumento, o Decreto nº 1572/1995 que regulamenta a mediação voluntária na negociação coletiva, inclusive através do Ministério do Trabalho e Emprego, conforme disposto abaixo:

Art. 1º. A mediação na negociação coletiva de natureza trabalhista será exercida de acordo com o disposto neste Decreto.

Art. 2º. Frustrada a negociação direta, na respectiva data-base anual, as partes poderão escolher, de comum acordo, mediador para composição do conflito.

§ 1º Caso não ocorra a escolha na forma do "caput" deste artigo, as partes poderão solicitar, ao Ministério do Trabalho, a designação de mediador.

A segunda corrente contestava os argumentos elencados acima afirmando que:

-o artigo 468 da CLT não serve como argumento, pois se refere a direitos individuais, inclusive por ser tratado no Capítulo da CLT que versa sobre Direito Individual do Trabalho.

O Prof. Renato Rua de Almeida de Almeida acrescenta afirmando que: "A convenção coletiva e o contrato individual de trabalho são fontes de natureza jurídica diferentes. A convenção coletiva é um acordo normativo (Recomendação 91 da OIT), compreendido dentro de um processo de negociação coletiva (Convenção 154 da OIT) sempre aberta às adaptações circunstanciais pela autonomia privada coletiva. Já o contrato individual é um negócio exclusivamente bilateral, de interesses individuais, constituindo obrigações garantidas por lei, que só deixam de existir em caso de extinção contratual. Daí porque não se pode invocar o princípio legal da imodificabilidade das condições contratuais de trabalho previstos no art. 468 da CLT, próprio do contrato individual de trabalho, para analisar a natureza jurídica da convenção coletiva de trabalho".

Além disso, o citado Mestre apresenta um novo argumento quanto à não-aplicabilidade do art. 468 da CLT: a Lei nº 4.923, de 23/12/1965, que trata da hipótese de celebração de acordo coletivo para redução de jornada de trabalho e do salário para evitar a dispensa de empregados e o desemprego face à conjuntura adversa que afeta a vida da empresa, prevê expressamente em seu artigo 2º, parágrafo 3º:

Art. 2º. A empresa que, em face de conjuntura econômica, devidamente comprovada, se encontrar em condições que recomendem, transitoriamente, a redução da jornada normal ou do número de dias do trabalho, poderá fazê-lo, mediante prévio acordo com a entidade sindical representativa dos seus empregados, homologado pela Delegacia Regional do Trabalho, por prazo certo, não excedente de 3 (três) meses, prorrogável, nas mesmas condições, se ainda indispensável, e sempre de modo que a redução do salário mensal resultante não seja superior a 25% (vinte e cinco por cento) do salário contratual, respeitado o salário mínimo regional e reduzidas proporcionalmente à remuneração e as gratificações de gerentes e diretores.

§ 1º Para o fim de deliberar sobre o acordo, a entidade sindical profissional convocará assembléia geral dos empregados diretamente interessados, sindicalizados ou não, que decidirão por maioria de votos, obedecidas às normas estatutárias.

§ 2º Não havendo acordo, poderá a empresa submeter o caso à Justiça do Trabalho, por intermédio da Junta de Conciliação ou, em sua falta, do Juiz de Direito, com jurisdição na localidade. Da decisão de primeira instância caberá recurso ordinário, no prazo de 10 (dez) dias, para o Tribunal Regional do Trabalho da correspondente Região, sem efeito suspensivo.

§ 3º A redução de que trata o artigo não é considerada alteração unilateral do contrato individual de Trabalho para os efeitos do disposto no art. 468 da CLT.

-a aplicação analógica do Enunciado 51 do TST também não é válida, visto que o regulamento, ao contrário da norma coletiva, normalmente não tem prazo de validade.

-não se poderia falar em direito adquirido, uma vez que a norma coletiva tem vigência temporária e a Constituição Federal, no art. 5º, trata o direito adquirido em relação à lei.

A expressão "direito adquirido" utilizada para indicar as vantagens que os empregados acumularam ao longo de diversas negociações coletivas ou por mera liberalidade do empregador, é deslocada e imprópria.

De acordo com Arion Romita: "se a questão em debate é de natureza contratual, portanto, de Direito Privado, descabe a alusão ao direito adquirido, pois este conceito é de garantia no campo individual, de feição negativa, como limitação à interferência estatal na esfera dos direitos de cada um".

O ilustre Professor Pontes de Miranda, afirma que: "a irretroatividade defende o povo; a retroatividade expõe-no à prepotência".

Para Carlos Maximiliano: "chama-se adquirido o direito que se constituiu regular e definitivamente e a cujo respeito se completaram os requisitos legais e de fato, para se integrar no patrimônio do respectivo titular, quer tenha sido feito valer, quer não, antes de advir norma posterior em contrário".

Este é um princípio universal: a lei se destina a ser normalmente prospectiva, isto é, suas normas se aplicam ao futuro; o passado não mais lhe pertence. Se a retroatividade da lei fosse admitida, a segurança não existiria.

Mário Antônio Lobato de Paiva afirma que: "A carta Magna de 88 não inseriu em seu texto o significado de direito adquirido somente fazendo alusão em seu artigo 5, inciso XXXVI, assim encontramos a definição legal na esfera infraconstitucianal no artigo 6 do Código Civil (Dec. Lei 4657/42)".

O direito adquirido é derivado de acquisitus do verbo latim acquisere, este direito entende-se como aquele em que é o estado de direito que uma lei traz a alguém e que pode ser exercido atualmente uma vez que sua força foi tirada do texto passado e que não pode desaparecer diante de leis posteriores que lhe neguem este mesmo direito.

João Régis Teixeira Júnior entende que: "quando se fala em direito adquirido em sede de direito coletivo do Trabalho, fala-se em direito adquirido dos" grupos contratantes ", jamais das pessoas físicas representadas na relação por suas entidades sindicais. Logo, os reflexos das cláusulas convencionadas, embora reflitam nos contratos individuais de trabalho, aos mesmos não se aderem, não sendo o empregado o titular do direito, mas sim, à categoria a que pertencem".

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O próprio STF - Supremo Tribunal Federal já entendeu neste sentido, inclusive quanto à sentença normativa, como abaixo descrito:

 "Dissídio coletivo. Qüinqüênios ajustados em anterior convenção coletiva do trabalho e mantidos na nova convenção. Clausula que exorbita dos lindes do art. 142, parágrafo 1, da constituição federal. Direito adquirido inexistente. Recurso extraordinário não conhecido". (Origem: RS - RIO GRANDE DO SUL. Publicação: DJ DATA-27/08/82 PG-12979 EMENT VOL-01264-02 PG-0055. RTJ VOL-00104-02 PG-00865. Nome do Relator: SOARES MUNOZ.).

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REAJUSTE DE SALÁRIOS. CLÁUSULA FIXADA EM ACORDO COLETIVO. NORMA SUPERVENIENTE QUE ALTERA O PADRÃO MONETÁRIO E FIXA NOVA POLÍTICA SALARIAL. DIREITO ADQUIRIDO. INEXISTÊNCIA. 1. A sentença homologatória de acordo coletivo tem natureza singular e projeta no mundo jurídico uma norma de caráter genérico e abstrato, embora nela se reconheça a existência de eficácia da coisa julgada formal no período de vigência mínima definida em lei, e, no âmbito do direito substancial, coisa julgada material em relação à eficácia concreta já produzida. 2. Firmada ante os pressupostos legais autorizadores então vigentes, a sentença normativa pode ser derrogada por disposições legais que venham a imprimir nova política econômico-monetária, por ser de ordem pública, de aplicação imediata e geral, sendo demasiado extremismo afirmar-se à existência de ato jurídico perfeito, direito adquirido e coisa julgada, para infirmar preceito legal que veio dispor contrariamente ao que avençado em acordo ou dissídio coletivo. Recurso extraordinário conhecido e provido. (Por maioria, vencidos os Min. Carlos Velloso e Marco Aurélio. Origem: SP - SÃO PAULO, RE, Publicação: DJ DATA-26/05/2000 PP-00032 EMENT VOL-1992-02 PP-0034, Nome do Relator: MAURÍCIO CORRÊA.).

Cibele Cristiane Schuelter salienta que: "a tese do direito adquirido não prevalece no direito coletivo, uma vez que quando se fala em direito adquirido neste campo seguramente não está se referindo ao direito de cada indivíduo individualmente considerado, mas da coletividade, ou seja, do direito adquirido pela categoria. E continua:" O Direito do Trabalho adota o direito adquirido como forma de manter o princípio protecionista que o norteia. Não há que se falar em proteção ao trabalhador no Direito Coletivo do Trabalho; a negociação pelas partes de determinadas vantagens não causará prejuízo à categoria laboral, logo, não há que se falar em direito adquirido."".

-a própria Lei Maior prevê a possibilidade de alteração "in pejus" das condições de trabalho, com fulcro na negociação coletiva, principalmente pelo reconhecimento do conteúdo das convenções ou acordos coletivos, prestigiando a autonomia privada coletiva dos convenientes.

A primeira corrente é que vinha prevalecendo na jurisprudência, no entanto foi editado o Enunciado nº 277 do TST mencionado acima. Embora tal Enunciado se referia apenas às sentenças normativas, passou a ser aplicado analogicamente aos acordos e convenções coletivas.

Dessa forma, e segundo a lição de Campos Batalha, lembrando Javillier, "é momentânea a substituição das cláusulas dos contratos individuais pelas regras das convenções coletivas apenas durante a vigência destas".

O Prof. Amauri Mascaro do Nascimento entende que: "as cláusulas de natureza obrigacional não se incorporam nos contratos individuais de trabalho porque não têm essa finalidade e, dentre as cláusulas normativas há de se distinguir, em razão do prazo estabelecido e da natureza da cláusula, aqueles que sobrevivem e as que desaparecem.

Exemplos citados pelo mestre: um adicional por tempo de serviço é, por sua natureza, algo que se insere nos contratos individuais de trabalho, se as partes não estipularam condições ou limitações à sua vigência. Um adicional de horas extras é obrigação que, tendo em vista a sua natureza, vigora pelo prazo em que a convenção coletiva perdurou. Desse modo, a resposta depende da verificação, em cada caso concreto, da cláusula em questão."

Francisco Antonio de Oliveira entende que: "a regra que se extinguindo a convenção, as suas cláusulas também perdem a eficácia normativa".

Valentin Carrion, outro partidário desta corrente, argumenta que: "a posição defendida de que todas as vantagens se integram definitivamente ao patrimônio do empregado é verdadeira apenas em parte, pois, tratando-se de norma provisória (a termo) e de alteração promovida pela fonte de direito que a institui e não mero capricho do empregador, o princípio de enfraquece".

Indalécio Gomes Neto afirma que: "se o salário, que visa atender as necessidades vitais básicas do trabalhador, pode ser reduzido pela via da convenção coletiva, torna-se frágil o argumento de que por essa via não possa ser extinta vantagem anteriormente concedida, sobretudo se em troca é concedido outro benefício".

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Sobre a autora
Adriana Carrera Calvo

coordenadora pedagógica e professora do Instituto de Ensino Jurídico Luiz Flávio Gomes (IELF, Curso Preparatório para Carreiras Públicas), mestranda em Direito do Trabalho pela PUC/SP, advogada trabalhista com experiência em escritórios de advocacia de São Paulo (Trench Rossi & Watanabe, Mattos Filho, Felsberg e Stuber Advogados)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CALVO, Adriana Carrera. A ultratividade das convenções e acordos coletivos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 644, 13 abr. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6449. Acesso em: 22 nov. 2024.

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