1. Introdução
Para manter sua existência, competitividade e lucros, as empresas exercem atividade contínua de planejar, no âmbito comercial, organizacional, logística e também nos aspectos societário e tributário. Considerando ainda a sempre crescente edição de normas tributárias, temos que essa atividade é legítima e saudável.
Desta forma o Planejamento Tributário, sobre o qual discorreremos brevemente neste artigo, se apresenta como ferramenta de grande importância para manutenção da rentabilidade e do crescimento sustentável de qualquer sociedade, a fim de que ela continue no mercado, distribuindo lucros para os sócios e também cumprindo sua função social.
Conforme se verá a seguir, não há qualquer vedação legal à realização e execução de um planejamento tributário.
2. O Planejamento Tributário
Como dito, essencial ferramenta de manutenção da rentabilidade e crescimento sustentável da empresa, o planejamento tributário, segundo a doutrina de Francisco Coutinho Chaves: “Planejamento Tributário é o processo de escolha de ação, não simuladas, anterior à ocorrência do fato gerador, visando direta ou indiretamente à economia de tributos.”[i].
Valioso é o conceito de José Eduardo Soares de Melo:
“O planejamento tributário deve constituir constante e natural preocupação das pessoas naturais e jurídicas de direito privado, que se sentem sufocadas pelos inúmeros encargos tributários afetos aos seus patrimônios, que impedem o desenvolvimento (ate mesmo a sobrevivência) pessoal, empresarial, econômica e a livre iniciativa (CF, arts. 3º, II e 170, IV e parágrafo único), comprometendo a capacidade contributiva (CF, art. 145, §1º) e a dignidade humana (CF, arts. 1º, III e 170, caput).”[ii]
Extrai-se das breves lições acima que o planejamento acontece antes da ocorrência do fato gerador, não ultrapassando as margens da legalidade, para que não seja comprometida a existência, ou ao menos a capacidade contributiva, da empresa.
Embora rechaçado pela doutrina fiscal, não há qualquer óbice legal em nosso ordenamento para que o planejamento tributário seja realizado, pelo contrário, o princípio constitucional da livre iniciativa é permissivo desta conduta já que deixa sob responsabilidade do empresário organizar-se econômica e societariamente, vejamos:
“art. 170: ...
....
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.”.
Desta forma, o contribuinte é livre para decidir como se apresentará para explorar a atividade (formas societárias possíveis) e como se organizará economicamente para isso (o que inclui planejamento comercial, organizacional, logístico e também nos aspectos societário e tributário).
Vale frisar que, não estamos no campo da evasão fiscal, pelo contrário, o planejamento tributário se vale da legislação e ocorre dentro de seus ditames e não à sua margem.
3. O Fisco e a Teoria do Propósito Negocial
O CTN, em seu art. 116, parágrafo único, estabeleceu regra que, pela subjetividade exacerbada, torna quase letra morta todo e qualquer planejamento tributário realizado cuidadosamente pelo contribuinte. Vejamos o que diz o referido artigo:
Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:
I - ...;
II - ...;.
Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.
Essa regra, na forma como posta, dá legitimidade a qualquer conduta do Fisco tendente a desconstituir ou desconsiderar qualquer planejamento tributário, com base em interpretações subjetivas, sem o crivo do contraditório etc.
É dessa possibilidade prevista na legislação que o Fisco passou a aplicar a Teoria do Propósito Negocial como arrimo para análise da legalidade dos atos praticados em sede de planejamento tributário.
A Teoria do Propósito Negocial busca exigir do contribuinte que realizou planejamento tributário uma finalidade maior do que unicamente economia tributária. É necessário demonstrar que aquela manobra jurídica, de alguma forma, contribuiu para a rentabilidade do negócio, para sua sustentabilidade, competitividade etc.
O Fisco, munido destes fatores, poderá ter como simulado o negócio jurídico entabulado tão somente para promover economia tributária, ainda que realizado em obediência da legislação. Isso porque, não raro, aplica conceitos da legislação civil, notadamente o art. 167 do CC/02:
Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma.
§ 1o Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:
I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem;
II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;
III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.
O que vale destacar desse entendimento é que, para se chegar à conclusão de que o negócio foi simulado, fraudulento, devem existir fatores indicativos dessa ilegalidade e a ausência de elementos legitimadores do Planejamento Tributário.
4. Conclusão
O Planejamento Tributário seguro, no atual cenário, exige mais que apenas cumprir a legislação, deve apresentar, aos olhos do Fisco, uma finalidade maior voltada ao negócio.
Por outro lado, como vimos, a legislação prestigia a livre iniciativa econômica, podendo ocorrer planejamento tributário legítimo desde que observe a anterioridade à ocorrência dos fatos geradores dos tributos e respeite a legislação.
É necessário aportar em um denominador comum, pois que as empresas são a alavanca da economia e da evolução econômica, são geradoras de riqueza para os sócios, funcionários e, claro, para o próprio fisco. A voracidade do Fisco deve respeitar a necessidade de sobrevivência das empresas, sob pena de desencorajar empresários e empreendedores de abrir ou manter seus negócios.
Notas
[i] CHAVES, Francisco Coutinho. Planejamento Tributário na Prática. São Paulo: Atlas, 2008.
[ii]José Eduardo Soares de Melo, Planejamento Tributário, in Hygo de Brito Machado (coord.), Planejamento Tributário, São Paulo: Malheiros: ICET, 2016, p. 360.