Resumo: O artigo se propõe a descrever, inicialmente, os principais pontos relacionados ao instituto da ação civil pública. Destacando-se o surgimento da ação civil pública como instrumento de tutela de interesses coletivos, a partir da dissecação de seu conceito. Diante disso, buscou-se através deste trabalho, apresentar o tema de forma clara e resumida, trazendo ao alcance do leitor o conceito de tal instituto/ferramenta e detalhes da configuração e do objeto dos direitos materiais tuteláveis pela ação civil pública; além de destacar a legitimação ativa e passiva para a ação civil pública . Para tal desiderato, será utilizado o método indutivo, precipuamente por meio de análise referencial.
Palavras-chave: Ação coletiva, Ação civil pública, Direitos transindividuais, Interesses difusos e coletivos.
Introdução
O surgimento das ações coletivas é fruto da superação, no plano jurídico-institucional, do individualismo exacerbado pela concepção liberal que o iluminismo e as grandes revoluções do final do século XVIII impuseram à civilização ocidental. As ações coletivas caracterizam-se pelas circunstâncias de atuar o autor não em defesa de um direito próprio, mas em busca de uma tutela que beneficia toda a comunidade ou grandes grupos, aos quais compete realmente à titularidade do direito material invocado.
A ampliação da tutela jurisdicional, para introduzir as autênticas ações coletivas, ou de grupo, no direito processual pátrio, ocorreu com a instituição da ação civil pública por meio da Lei Complementar nº40, de 14.12.1981, e da Lei nº 7.347, de 24.07.1985. A partir de então, o campo de manifestação dos direitos coletivos ou difusos deixou de ser apenas o de atuação dos agentes do Poder Público, como se passava ao tempo da ação popular. A defesa coletiva tornou-se possível contra quem quer que cometesse ofensa aos interesses coletivos ou difusos, fosse um administrador público ou algum particular.
O presente artigo tem como finalidade demonstrar porque a ação civil pública vem se tornando um dos maiores mecanismos de efetivação da justiça social previsto no ordenamento jurídico brasileiro e descrever, de forma sucinta, o surgimento e o conceito da ação civil pública, bem como dos direitos tuteláveis por este tipo de ação, demostrando, assim, que um dos objetivos da ação civil pública é o direito de postular a tutela jurisdicional dos interesses metaindividuais. De buscar soluções para os conflitos de interesse de um número indeterminado de pessoas com diversos interesses, mas que, dentre estes, se encontra um que é indivisível a todos deste grupo.
Objetivo geral deste trabalho é demonstrar que a ação civil pública é um meio processual hábil a punir aqueles que ferem os direitos difusos e coletivos, ou seja, uma ação que apresenta como propósito a proteção dos interesses da coletividade, e a responsabilização do infrator pelo dano causado a determinados bens jurídicos.
A metodologia de pesquisa utilizada neste trabalho foram os estudos bibliográficos, por meio de doutrinas, artigos, jurisprudências e sites especializados no assunto. O método se dá de maneira descritiva e explicativa, pois pretende identificar as características de um determinado assunto (problema) e objetiva identificar os fatores que interferem ou condicionam a ocorrência desse fenômeno.
O artigo foi organizado em três seções: na primeira seção será comentado o contexto/surgimento e o conceito da ação civil pública, demonstrando ser o principal instrumento existente no ordenamento jurídico brasileiro para a tutela de direitos transindividuais. Na segunda seção, será abordado o objeto da ação civil pública, indicando a defesa dos seguintes bens e interesses deste tipo de ação. Já na terceira Seção será expressada a legitimação ativa e passiva para ação civil pública
I Surgimento e conceito da ação civil pública
A Ação Civil Pública (ACP) é originária do anteprojeto do Ministério Público de São Paulo que criou a Lei Federal n.º 7.347/85, com alterações realizadas pela Lei n.º 8.078/90 (CDC). A Lei n.º 7.347, de 24 de julho de 1985, disciplina a Ação Civil Pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico, paisagístico e outros interesses difusos e coletivos.
Trata-se de instituto legal previsto no art. 129, III, da Constituição de 1988, de acordo com o qual uma das funções institucionais do Ministério Público é a promoção da ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos. Além disso, também encontra guarida legislativa no Código de Defesa do Consumidor, mais precisamente no Título III, que cuida da defesa do consumidor em juízo.
Preliminarmente, tem-se que conceituar a ação civil pública para demonstrar a importância desta, que é considerado o meio processual hábil a punir aqueles que ferem os direitos difusos e coletivos, tais como os prefeitos que utilizam o patrimônio público de forma a enriquecer o seu.
A ação é um direito inerente à pessoa, tanto física como jurídica, para que a mesma que se sinta ofendida busque de forma a solucionar litígios e punir aquele que violou direito de outrem.
A relevância do conceito encontra-se na publicidade, que segundo Nelson Nery Júnior [...] está ligada à parte legitimada a agir e não ao direito de ação em si [...] Logo, se o legitimado a propor a ação for órgão do poder público dizer-se-á que a ação é pública[...].
O conceito de ação civil pública apresentado por Kalleo Castilho Costa deixa claro até mesmo a finalidade desta ação, qual seja:
[...] A ação civil pública é o instrumento processual adequado para o exercício do controle popular sobre os atos dos poderes públicos, o instrumento processual adequado para reprimir ou impedir danos ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico e por infrações de ordem econômica, protegendo, assim, interesses difusos da sociedade.
Destaca-se que esse instrumento processual de defesa dos direitos difusos e coletivos visa a coibir atos que atentem contra o meio ambiente, já que se trata de bem de uso comum do povo e que é declarado na própria Carta Magna em seu art. 225, contra a Administração Pública, e todos aqueles previstos no art. 1º da Lei 7347/85. Apresentando Lei de Ação Civil Pública destaca-se a competência para o seu processar, que se encontra previsto no próprio texto legal, em seu art. 2º, “in verbis”:
(...) Art. 2º As ações previstas nesta Lei serão propostas no foro do local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa.
Parágrafo único: A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas as ações posteriormente intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto.
Analisando a Constituição Federal de 1988, vê-se que a mesma previu a competência para a propositura da presente ação, quando ao apresentar o Ministério Público como uma instituição de caráter permanente e essencial à função jurisdicional delegou a ele a competência para a propositura de determinada ação para o Órgão Ministerial. Cabe ressaltar aqui que os sujeitos competentes para a propositura deste processo, bem como quem poderá ser o sujeito passivo.
II Objeto da ação civil pública
Pode constituir objeto da ação civil pública ou coletiva a defesa dos seguintes bens e interesses: a) meio ambiente; b) consumidor; c) patrimônio cultural (bens e valores artísticos, estéticos, históricos, turísticos, paisagísticos etc.); d) ordem econômica e economia popular; e) ordem urbanística; f) qualquer outro interesse difuso, coletivo ou individual homogêneo (LACP, art. 1º). A esse rol, podemos acrescentar a defesa coletiva das pessoas portadoras de deficiência (Lei n. 7.853/89), dos investidores do mercado de valores mobiliários (Lei n. 7.913/89), das crianças e adolescentes (ECA, art. 210, V), dos idosos (Lei n. 10.741/03), entre outros.
Entre os direitos coletivos, difusos ou individuais homogêneos, tuteláveis por meio da ação civil pública, instalou-se controvérsia em torno de alguns, cujo objeto seria incompatível com a função processual da ação regulada pela Lei nº 7.347/1985.
O primeiro deles seria o que versa sobre obrigações tributárias. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tomou posição no sentido de não ser cabível ao Ministério Público defender interesses individuais homogêneos relacionados com matéria tributária¹, no que foi seguido pelo Superior Tribunal de Justiça². Tampouco as associações de defesa do consumidor poderiam fazê-lo³. O tema acha-se superado pela introdução do parágrafo único do art. Da Lei 7.347, levada a efeito pela Medida Provisória nº2.180-35, cuja disposição tem o seguinte teor: Não será cabível ação civil pública para veicular pretensões que envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS ou outros fundos de natureza institucional cujos beneficiários podem ser individualmente determinados.
Objeto de grande controvérsia tem sido o uso da ação civil pública como instrumento de intervenção do Poder Judiciário no desempenho de políticas públicas. O tema foi enfrentado, com seriedade, pelo STJ, no julgamento de ação da espécie em que o Ministério Público pleiteara interdição da circulação de máquinas agrícolas e veículos pesados pelo perímetro urbano de uma pequena cidade de Goiás. Em síntese, o aresto assentou o seguinte:
“(...) O STJ tem orientação no sentido de que ao Poder Judiciário não é vedado debater o mérito administrativo. Se a Administração deixar de se valer da regulação para promover políticas públicas, proteger hipossuficientes, garantir a otimização do funcionamento do serviço concedido ou mesmo assegurar o funcionamento em condições de excelência tanto para o fornecedor/produtor como principalmente para o consumidor/usuário, haverá vício ou flagrante ilegalidade a justificar a intervenção judicial. (REsp. 1.176.552/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin. Segunda Turma, Julgado em 22/2/2011, DJe 14/9/2011).
Com os argumentos acima, o STJ afastou a arguição de carência de ação, determinando o prosseguimento da ação civil pública rumo ao julgamento de mérito. Levou em conta a notícia constante de que “as investigações ministeriais a respeito do problema se iniciaram a partir de abaixo-assinado subscrito por 2.094 ( dois mil e noventa e quatro) cidadãos residentes naquele Município, o que representa um universo de mais de 15% da população local, consoante pesquisa efetivada no sítio oficial do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (12.513 habitantes no ano de 2013)”. A relevância da ação proposta pelo Ministério Público foi deduzida da indicação feita na petição inicial de que, na pequena cidade, “o intenso trânsito de caminhões e máquinas agrícolas no perímetro urbano tem causado inúmeros acidentes fatais, além de problemas de saúde decorrentes de poeira e poluição sonora, por exemplo”. Invocou-se o precedente do REsp 725.257/MG, no qual aquela Corte já tinha reconhecido a adequação da ação civil pública para veicular tema afeto à segurança no transito. (STJ, 1º T., REsp 725/257/MG, Rel. Min. José Delgado, ac 10.04.2007, DJU 14.052007, p.252).
III LEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA
A legitimidade ativa constitui-se do interesse para a propositura da ação, desde que atendidos os requisitos essenciais para tal ato. Segundo Luiz Rodrigues, a legitimidade ativa consiste na “ligação entre o autor e o objeto do direito afirmado em juízo”, ou seja, se a parte é titular do direito a ser discutido no processo. Pode se dizer que o legitimado ativo é aquele que exerce o direito de ação (WAMBIER, 2003).
Na Lei nº 7342/1985 é apresentado um rol taxativo dos legitimados ativamente para a propositura da ação estando previsto no art. 5º, veja-se:
Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:
I - o Ministério Público;
II - a Defensoria Pública;
III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;
IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista;
V - a associação que, concomitantemente:
a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil;
b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.
Não foi somente a Lei da Ação Civil Pública que previu a legitimidade para a propositura de determinada ação, o poder constituinte de 1988, no momento da elaboração da CF88 apresentou no art. 129, inciso III, a função do Ministério Público em propor a Ação Civil, conforme se demonstra:
Art. 129 – São funções institucionais do Ministério Público:
[...]
III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;
Observa-se que tal função, por mais que seja constitucional, não é privativa, como apresentado anteriormente; porém, demonstrar-ae-á, sucintamente, todos os legitimados do art. 5 da Lei 7247/85, destacando que são somente pessoas jurídicas, e não pessoas físicas como nas demais ações existentes.
Para se compreender a legitimidade passiva na ação civil pública faz-se mister conceituá-la para que assim fique mais inteligível, bem como demonstrar que, diferentemente da legitimidade ativa, a Lei de Ação Civil Pública não define quem são eles. Conforme entendimento de Humberto Theodoro Júnior (2015), a legitimidade passiva consiste em ser o titular do interesse que se opõe ou resiste à pretensão.
Com esse simples conceito de legitimidade passiva, passar-se-á para a analise da lei de Ação Civil Pública, a qual não apresentou um rol taxativo para os sujeitos passivos como assim fez para os sujeitos ativos, portanto, como assim apresenta André Luiz Lopes na Obra Ação Civil Pública, “a parte Passiva será aquele que causar o dano, podendo ser legitimado passivo qualquer um que causar dano àqueles interesses tutelados”.
A legitimidade passiva se estende a todos os responsáveis pelos atos que originaram a ação, podendo ser pessoas físicas, jurídicas, de direito público ou privado. Enfim, todos aqueles que de algum modo concorreram para o ato que gerou a ação. (MARINELA, 2017).