Discute-se a questão da competência da Justiça Militar à luz da Constituição de 1988.
A Justiça Militar nos Estados, por sua vez, é constituída pelos juízes de direito e pelos Conselhos de Justiça e, em segundo grau, pelo Tribunal de Justiça ou pelo Tribunal de Justiça Militar nos Estados, em que o efetivo seja superior a vinte mil integrantes (artigo 125, § 3º, da Constituição), tendo como competência apreciar os crimes militares praticados por policiais militares e bombeiros militares.
A Justiça Castrense Federal tem competência para julgar os membros das Forças Armadas.
A Justiça Militar Federal é composta pelos Conselhos de Justiça, especial e permanente.
Por sua vez, o Superior Tribunal Militar tem competência para julgar as apelações e os recursos das decisões dos juízes de primeiro grau da Justiça Militar da União, à luz do artigo 123 da Constituição, sendo composto por quinze ministros vitalícios, nomeados pelo Presidente da República e depois aprovados pelo Senado Federal. Por sua vez, o diagnóstico propõe reduzir o número de ministros para onze, nomeados pelo Presidente da República com indicações aprovadas pelo Senado Federal.
Em síntese, a Justiça Militar julga, tão somente, os crimes militares, a teor do artigo 9º do Código Penal Militar, em tempo de paz, e do artigo 10 do mesmo diploma legal com relação aos crimes praticados em tempo de guerra. Não se aplica a Lei 9.099/95 com relação a Justiça Especializada aqui envocada. Os crimes dolosos contra a vida praticados por militar contra civil, tentados ou consumados, foram retirados da Justiça Militar, como se lê do artigo 9º, parágrafo único, do Código Penal Militar.
Advertiu Renato Brasileiro de Lima que, estaduais ou federais, os militares vão à Júri Popular quando invistam de forma dolosa contra a vida de um civil. Ainda leciona Renato Brasileiro de Lima, na hipótese de aplicação do instituto da aberratio ictus, que se um militar, desejando matar outro militar, erra o alvo e acerta um civil, na fixação da competência o importante é definir a pessoa realmente atingida. Se há um erro na pontaria, sendo um civil o atingido, o militar vai à Júri Popular. Nesse sentido, é a posição do Superior Tribunal de Justiça.
Por certo, não se pode esquecer, em sede de direito positivo, a redação dada pela Lei 12.432/2011, que fixa a competência para julgar o homicídio doloso contra a vida de civil, por parte da Justiça Militar, quando a ação for realizada contra aeronave que se encontre no contexto descrito no artigo 303 do Código Brasileiro da Aeronáutica, Lei 7.565/1986.
Por outro lado, o delito de abuso de autoridade é crime comum e, se praticado por militar, não será julgado na justiça especializada. É o que se lê do teor da Súmula 172 do Superior Tribunal de Justiça.
Da mesma forma, o crime de tortura não deve ser apreciado pela Justiça Militar.
Lembre-se a Súmula n. 75 do Superior Tribunal de Justiça, onde se lê que compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar o policial militar por crime de promover ou facilitar a fuga de preso de estabelecimento penal. Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula n. 6, que indica que compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar delito decorrente de acidente de trânsito envolvendo viatura da polícia Militar, salvo se o autor do crime e vítima forem policiais militares em situação de atividade.
Apenas a função de natureza militar tem a força de atrair a incidência do artigo 9º, III, d, do Código Penal Militar, onde se diz que há delito penal inserido no Código Penal Militar quando se fala em crime praticado por militar da reserva, ou reformado, civil, contra militar em função de natureza militar.
Recorde-se a distinção de militares em serviço e a função de natureza militar. Função de natureza militar é a atribuição específica conferida por lei ao militar, como integrante das Forças Armadas, exercitada com características próprias da instituição militar. Haverá outro serviço ao qual é incumbido o militar, que não é próprio de integrante de organização militar, conquanto indispensável ao funcionamento e manutenção. É o caso de serviço de limpeza, de manutenção de repartição militar, a aquisição de gêneros alimentícios, preparo de refeições, recuperação e manutenção de meios de transportes, tarefas que não são propriamente inerentes à vida militar, sendo ainda da vida civil.
É certo que a doutrina, pela voz abalizada de Eugênio Pacelli, concluiu que a Justiça Militar Federal julga tanto civis como militares. Mas a competência da Justiça Militar somente aprecia delitos militares, impondo-se a separação obrigatória dos processos em caso de concurso de crimes (comuns e militares), diante da absoluta especialização e especialidade dessa jurisdição.
Para Eugênio Pacelli, é exatamente a motivação do agente que afastaria a aplicação do tipo penal previsto no CPM. Disse ele: “Para que se possa admitir um crime como de natureza militar, parece-nos indispensável, ou uma ação dirigida contra a instituição, ou uma ação praticada pelo militar, do mesmo modo que se exige, para os chamados crimes políticos a motivação política da conduta (Lei nº 7.170/83, artigo 2º). Ora, tampouco é suficiente a condição de militar, como, aliás, se ressaltou na decisão do Supremo Tribunal Federal”.
Há crimes propriamente militares e crimes impropriamente militares. Os propriamente militares dizem respeito à vida militar, vista globalmente na qualidade funcional do sujeito do delito, na materialidade especial da infração e na natureza peculiar do objeto da ofensa penal, como disciplina, a administração, o serviço ou a economia militar. Os crimes impropriamente militares, que podem ser cometidos por militares e, ainda, excepcionalmente, por civis, abrangem os crimes definidos de modo diverso ou com igual definição na legislação penal comum.
Sendo assim, crimes impropriamente militares são os que, comuns em sua natureza, podem ser praticados por qualquer cidadão, civil ou militar, mas que, quando praticados por militar, em certas condições, a lei considera militares, como se tem dos crimes de homicídio e lesão corporal, os crimes contra a honra, os crimes contra o patrimônio, os crimes de tráfico ou posse de entorpecentes, o peculato, a corrupção, os crimes de falsidade, dentre outros. São ainda impropriamente militares, os crimes praticados por civis, que a lei define como militares, como a violência contra sentinela, previsto no artigo 158 do CPM.
Recentemente, o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o HC 112.932, impetrado contra acórdão do Superior Tribunal Militar, por sua Primeira Turma, decidiu, no dia 13 de maio de 2014, que à Justiça Militar cabe processar e julgar uma civil acusada de desacato contra militares das Forças Armadas que atuavam no processo de pacificação dos Complexos do Alemão e da Penha, no Rio de Janeiro. Era um caso em que uma moradora do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, recusou-se a obedecer determinada ordem durante operação no local. Naquele julgamento apontado, o Ministro Luis Roberto Barroso destacou que a submissão de civil à Justiça Militar, em tempos de paz, é prevista no Código Penal Militar (CPM) em algumas hipóteses, entre as quais o crime praticado contra militar no desempenho de serviço de preservação da ordem pública.
Todavia, como já acentuado, a Segunda Turma tem posição contrária.
De toda sorte, em situação específica em que os militares das Forças Armadas exercem função policial, como a de policial ostensivo, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 112.936, julgamento de 29 de junho de 2012, DJe de 1º de agosto de 2012, concedeu writ para invalidar, deste o início, procedimento anteriormente produzido na Justiça Militar, sem prejuízo do suposto crime pela Justiça Federal. O entendimento foi de que o desacato de um civil a um militar que exercia essa atividade no Complexo do Alemão e da Penha, no Rio de Janeiro, dentro do programa de ocupação e pacificação dos morros cariocas, constitui crime civil, e não militar, enquadrado no artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal (crimes em detrimento de bens, serviços ou interesses da União).
Fica cristalino da lição do Ministro Celso de Mello, Relator do último acórdão apontado, que não se pode deixar de acentuar o caráter anômalo da submissão de civis, notadamente em tempos de paz, à jurisdição dos Tribunais e órgãos integrantes da Justiça Militar da União, por suposta prática de crime militar, especialmente se tiver em consideração que tal situação, porque revestida de excepcionalidade, só se legitima se e quando configuradas, quanto aos réus civis, as hipóteses delineadas em sede legal e cujo reconhecimento seja recebido pelo Supremo Tribunal Federal em uma estrita interpretação.
Correto é que não se tem por configurada a competência da Justiça Militar da União, em tempo de paz, tratando-se de réus civis, se a ação eventualmente delituosa, por eles praticada, não afetar, de modo real ou potencial, a integridade, a dignidade, o funcionamento e a respeitabilidade das instituições militares que constituem, em essência, os bens jurídicos penalmente tutelados.
O entendimento do Ministro Celso de Mello é de que se mostra grave a instauração, em tempo de paz, de ação penal militar contra civil, com o objetivo de submetê-lo, fora dos casos autorizados em lei, a julgamento perante a Justiça Militar da União. Isso porque deve-se respeitar o princípio do juiz natural, uma das mais importantes matrizes político-ideológicas que conformam a própria atividade legislativa do Estado e que condicionam o desempenho, por parte do Poder Público, das funções de caráter penal-persecutório.
Naquele julgamento o Ministro Celso de Mello trouxe a advertência de José Frederico Marques (O Processo Penal na atualidade, in Processo Penal e Constituição Federal, pág. 19, item n.7, 1993), no sentido de que, ao rol dos postulados básicos, deve acrescer-se aquele do Juiz natural, contido no item nº LIII, do artigo 5º, da Constituição Federal, que declara que ninguém será processado nem sentenciado senão por autoridade competente. A autoridade competente será aquela que a Constituição tiver previsto, explícita ou implicitamente, pois, se assim não fosse, a lei poderia burlar as garantias derivadas do princípio do Juiz independente e imparcial, criando outros órgãos para o processo e julgamento de determinadas infrações. Sendo assim, impõe-se ao Estado o dever de respeitar essa garantia básica que predetermina, em abstrato, os órgãos judiciários investidos de competência funcional para a apreciação dos litígios penais. Como tal, o princípio da naturalidade do juízo, que encerra uma garantia constitucional, limita, de um lado, os poderes do Estado, na medida em que impossibilita a instituição de juízos ad hoc ou de criar tribunais de exceção, assegura ao acusado, de outro, o direito ao processo perante autoridade competente, abstratamente designada na forma de lei anterior, vedados os chamados juízes ex post facto. Assim, somente serão órgãos jurisdicionais aqueles que são reconhecidos pela Constituição; ninguém pode ser julgado por órgão constituído após a ocorrência do fato; entre os juízes pré-constituídos vigora uma ordem taxativa de competências, que exclui qualquer alternativa deferida à discricionariedade de quem quer que seja, como alude Ada Pellegrini Grinover com apoio no magistério de Jorge Figueiredo Dias (Direito Processual Penal, volume 1/322-323 – 1974, Coimbra).
Na contramão de apelos de entidades de classe, o presidente Michel Temer (PMDB) sancionou a lei que confere competência para a Justiça Militar julgar militares acusados de crimes dolosos contra civis. A lei 13.491/2017 foi publicada no Diário Oficial da União, daí porque já tem existência(sanção), validade(promulgação) e tem plena eficácia com a publicação.
De acordo com a nova lei, os crimes cometidos por militares contra civis deixarão de ser julgados pelo Tribunal do Júri em casos que envolvam operações de paz e de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), como quando governadores de estado solicitam o envio de tropas do Exército, Marinha e Aeronáutica para o controle de situações emergenciais. Além disso, a Justiça Militar deverá julgar os crimes praticados durante o cumprimento de tarefas estabelecidas pelo governo ou pelo ministro da Defesa.
Serão julgados pela Justiça especializada as mortes de civis causadas por militares nas chamadas missões de "garantia da lei e da ordem", como quando governadores de estado solicitam o envio de efetivos do Exército, Marinha e Aeronáutica para o controle de situações emergenciais.
É o que acontece atualmente na cidade do Rio de Janeiro.
De fato, várias condutas praticadas por militares das Forças Armadas (FFAA), que eram da competência da Justiça Federal, foram transferidas à jurisdição militar. Além disso, certas infrações penais comuns, quando praticadas nas condições previstas nas alíneas do inciso II do art. 9º do CPM, passaram a ser também consideradas crimes militares, estando portanto submetidas à jurisdição castrense.
Reflexamente, foi ampliada a competência da Justiça Militar da União (JMU) para julgar civis por crimes militares, com base no art. 9º, inciso III, do CPM. Considerando que, força do art. 125, §4º, da CF, a Justiça Militar dos Estados só julga militares estaduais, este tópico não interfere em sua competência.
As razões para tal mudança legislativa deitam raiz na polêmica ampliação do papel das Forças Armadas na segurança pública urbana e das fronteiras, em tempos de recrudescimento da violência e do aumento do poderio de organizações criminosas. Por falta de alternativas de segurança pública civil militares têm sido utilizados pelo governo federal em operações de garantia da lei e da ordem, o que vem acentuando situações potencialmente conflitivas com civis, criminosos ou não.
A Lei tem dois artigos e seu dispositivo principal só teve em mira o art. 9º do CPM.
O art. 2º da Lei, que previa vigência temporária, foi vetado pela presidência da República.
O art. 3º determina a vigência imediata da Lei, isto é, sem vacância.
No que diz respeito às normas de competência, a Lei aplica-se aos inquéritos e às ações penais em curso. No que tange à nova definição de crimes militares, vale a regra da irretroatividade, especificamente no tocante à inovação do inciso II do art. 9º do CPM.
O §1º do art. 9º do CPM (antigo parágrafo único) manteve na competência do tribunal do júri os crimes dolosos contra a vida de civis praticados por policiais militares ou por bombeiros militares e, eventualmente, também os cometidos por integrantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica em atividades não especificadas no parágrafo seguinte. Assim, em regra, militares estaduais que cometam homicídio continuam a ser julgados pelo tribunal do júri. Por sua vez, militares federais só serão julgados pelo júri federal, se suas condutas não forem praticadas nas condições delimitadas no §2º do art. 9º.
O §2º do art. 9º do CPM, introduzido por essa lei, mexe em hipóteses que até agora eram (ou deveriam ser) de competência do tribunal do júri federal (art. 5º, XXXVIII, alínea ‘d’, CF). Essas condutas passam a ser julgadas pela JMU, se se enquadrarem nas situações previstas nos três incisos do novo §2º. Se aí não se amoldarem, vale a regra geral do §1º, e também os militares das FFAA serão julgados pelo júri presidido por um juiz federal nos crimes dolosos contra a vida de civis. Assim, se um crime de homicídio for praticado por um militar contra civil durante uma operação de paz, ou no curso de uma operação de garantia da lei e da ordem (GLO), a competência para o julgamento será, por esta lei, da Justiça Militar da União, e não da Justiça Federal (júri).
Além disso, a nova redação do inciso II do art. 9º do CPM atribuiu à JMU e à Justiça Militar dos Estados a competência para julgar crimes, agora considerados “militares”, que estão previstos na legislação comum, como tortura, abuso de autoridade, cibercrimes, associação em organização criminosa, formação de milícia privada etc. É ampliado o conceito de “crime militar” impróprio ou impropriamente militar ou acidentalmente militar para abranger também infrações penais previstas apenas na legislação penal comum, o que antes não ocorria.
Tem-se então o artigo 9º do CPM:
Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz:
I - os crimes de que trata êste Código, quando definidos de modo diverso na lei penal comum, ou nela não previstos, qualquer que seja o agente, salvo disposição especial;
II – os crimes previstos neste Código e os previstos na legislação penal, quando praticados: (Redação dada pela Lei nº 13.491, de 2017)
a) por militar em situação de atividade ou assemelhado, contra militar na mesma situação ou assemelhado;
b) por militar em situação de atividade ou assemelhado, em lugar sujeito à administração militar, contra militar da reserva, ou reformado, ou assemelhado, ou civil;
c) por militar em serviço ou atuando em razão da função, em comissão de natureza militar, ou em formatura, ainda que fora do lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva, ou reformado, ou civil; (Redação dada pela Lei nº 9.299, de 8.8.1996)
d) por militar durante o período de manobras ou exercício, contra militar da reserva, ou reformado, ou assemelhado, ou civil;
e) por militar em situação de atividade, ou assemelhado, contra o patrimônio sob a administração militar, ou a ordem administrativa militar;
f) revogada. (Redação dada pela Lei nº 9.299, de 8.8.1996)
III - os crimes praticados por militar da reserva, ou reformado, ou por civil, contra as instituições militares, considerando-se como tais não só os compreendidos no inciso I, como os do inciso II, nos seguintes casos:
a) contra o patrimônio sob a administração militar, ou contra a ordem administrativa militar;
b) em lugar sujeito à administração militar contra militar em situação de atividade ou assemelhado, ou contra funcionário de Ministério militar ou da Justiça Militar, no exercício de função inerente ao seu cargo;
c) contra militar em formatura, ou durante o período de prontidão, vigilância, observação, exploração, exercício, acampamento, acantonamento ou manobras;
d) ainda que fora do lugar sujeito à administração militar, contra militar em função de natureza militar, ou no desempenho de serviço de vigilância, garantia e preservação da ordem pública, administrativa ou judiciária, quando legalmente requisitado para aquêle fim, ou em obediência a determinação legal superior.
§ 1o Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos por militares contra civil, serão da competência do Tribunal do Júri. (Redação dada pela Lei nº 13.491, de 2017)
§ 2o Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos por militares das Forças Armadas contra civil, serão da competência da Justiça Militar da União, se praticados no contexto: (Incluído pela Lei nº 13.491, de 2017)
I – do cumprimento de atribuições que lhes forem estabelecidas pelo Presidente da República ou pelo Ministro de Estado da Defesa; (Incluído pela Lei nº 13.491, de 2017)
II – de ação que envolva a segurança de instituição militar ou de missão militar, mesmo que não beligerante; ou (Incluído pela Lei nº 13.491, de 2017)
III – de atividade de natureza militar, de operação de paz, de garantia da lei e da ordem ou de atribuição subsidiária, realizadas em conformidade com o disposto no art. 142 da Constituição Federal e na forma dos seguintes diplomas legais: (Incluído pela Lei nº 13.491, de 2017)
a) Lei no 7.565, de 19 de dezembro de 1986 - Código Brasileiro de Aeronáutica; (Incluída pela Lei nº 13.491, de 2017)
b) Lei Complementar no 97, de 9 de junho de 1999; (Incluída pela Lei nº 13.491, de 2017)
c) Decreto-Lei no 1.002, de 21 de outubro de 1969 - Código de Processo Penal Militar; e (Incluída pela Lei nº 13.491, de 2017)
d) Lei no 4.737, de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral. (Incluída pela Lei nº 13.491, de 2017)
Crimes militares em tempo de guerra
ART. 9º, II, CPM |
COMO ERA |
COMO PASSOU A SER |
---|---|---|
Crimes militares impróprios |
II – os crimes previstos neste Código, embora também o sejam com igual definição na lei penal comum, quando praticados: |
II – os crimes previstos neste Código e os previstos na legislação penal, quando praticados: |
Abrangência |
Crimes do CPM |
Crimes do CPM e os crimes da lei penal comum |
Esta alteração provocará novos e intensos debates sobre o conceito de crimes militares, sobre a repercussão desse dispositivo nas regras de competência e sobre a separação de processos prevista no art. 79, inciso I, do CPP e no art. 102, alínea ‘a’ do CPPM.
A partir de agora, militar que cometer crime doloso contra civil será julgado por tribunais militares, não mais civis.
Também caberá à Justiça Militar julgar os crimes praticados durante o cumprimento de atribuições estabelecidas pelo governo ou quando envolver a segurança de instituição ou missão militar, mesmo que não beligerante.
Já há um conflito de competência formalizado no STJ em razão da nova lei. Os crimes são tráfico de drogas e de desobediência. No primeiro parecer que se tem notícia sobre esse tipo de conflito, a PGR foi a favor de que o tráfico permanecesse na Justiça comum. “Essa Corte tem entendimento de que o policial militar não pode ser enquadrado na definição de militar prevista no Código Penal Militar, pois o próprio Código de Processo Penal traz definição que não contempla os militares estaduais”, escreveu a suprocuradora-geral da República Luiza Frischeisen, que atua no STJ. Para ela, a lei 13.491 só alterou a situação dos militares federais. “O tráfico de drogas cometido fora do horário de serviço em local não submetido à administração militar não se enquadra em nenhum desses incisos.” Já o crime de desobediência deve ir à Justiça Militar.
No pronunciamento foi pedido ao STJ a “declaração incidental de inconstitucionalidade” da lei sancionada pelo presidente Michel Temer. “O veto que excluiu somente a cláusula de temporariedade da lei adulterou, por completo, a vontade do Congresso Nacional. O procedimento correto seria o veto total, sob pena de o presidente da República usurpar a função do Congresso Nacional”, afirmou.
Competência constitucional do júri não pode ser objeto de restrição por lei.
A competência constitucional do júri não pode ser restringida por lei, já que a CF estabeleceu um conjunto mínimo de infrações penais que lhe devem ser submetidas. A lição é de Sepúlveda Pertence:
Garantia constitucional, o julgamento pelo tribunal popular dos crimes dolosos contra a vida reclama entendimento restritivo das exceções que lhe impõe, na Constituição, a esfera das jurisdições especiais (Maximiliano, Coment. à Const. Brasileira, 1954, §462, 2/397). Particularmente, a da Justiça Militar, na medida em que se delegou à lei ordinária a sua demarcação. Permitir que a discrição, na concretização do conceito indeterminado de crime militar, redunde no arbítrio, na extensão desproporcionada aos fins legítimos da Justiça Militar, é remeter ao legislador ordinário a demarcação de uma garantia constitucional, a do júri, cujo raio mínimo de ação a Constituição mesma pretendeu dimensionar(Voto do ministro Sepúlveda Pertence no RE 122.706/RJ).
Conclui o ministro que, ao definir “crimes militares contra a vida e, consequentemente, subtraí-los do júri, não pode a lei ordinária desbordar dos limites da noção de crime militar ditado pelo sistema constitucional, sob pena de esvaziar-se a garantia afetada”.
De novo é oportuno mencionar a jurisprudência da Corte IDH, que tem assinalado de maneira reiterada que a jurisdição militar não é o foro competente para investigar e, se for o caso, julgar e condenar os autores de violações de direito humanos, senão que o processo dos responsáveis é sempre competência da justiça ordinária(Caso Arguelles e outros vs. Argentina, § 148).
Vale lembrar que a Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas, concluída em Belém, em 10 de junho de 1994 e promulgada pelo Decreto 8.766/2016, em seu artigo IX exclui expressamente à jurisdição militar em casos desta natureza, que normalmente têm civis como vítimas:
Os suspeitos dos atos constitutivos do delito do desaparecimento forçado de pessoas só poderão ser julgados pelas jurisdições de direito comum competentes, em cada Estado, com exclusão de qualquer outra jurisdição especial, particularmente a militar.
Os atos constitutivos do desaparecimento forçado não poderão ser considerados como cometidos no exercício das funções militares.
Não serão admitidos privilégios, imunidades nem dispensas especiais nesses processos, sem prejuízo das disposições que figuram na Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas(Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas).
Para os fins de tal Convenção, que se incorpora ao conjunto de garantias fundamentais de quase todos os cidadãos que vivem no continente americano,
[…] entende-se por desaparecimento forçado a privação de liberdade de uma pessoa ou mais pessoas, seja de que forma for, praticada por agentes do Estado ou por pessoas ou grupos de pessoas que atuem com autorização, apoio ou consentimento do Estado, seguida de falta de informação ou da recusa a reconhecer a privação de liberdade ou a informar sobre o paradeiro da pessoa, impedindo assim o exercício dos recursos legais e das garantias processuais pertinentes
Por essa razão e nas hipóteses traçadas, na medida em que extrapolam a Constituição a lei recentemente editada revela inconstitucionalidade e deve ser objeto de apreciação judicial pelas vias difusas e concentrada.
Bem concluiu Vladimir Aras (As novas competências da Justiça Militar após a Lei 13.491/17):
"Para os crimes em geral, a jurisdição comum; para crimes estritamente militares, a jurisdição especial; para os crimes de homicídio, o júri. Esta equação constitucional deve ser especialmente observada quando funcionários públicos militares cometam crimes dolosos contra a vida de cidadãos civis. É o que se espera num Estado de Direito, lembrando que, no campo da Justiça criminal, nenhuma instituição civil representa melhor o princípio democrático do que o tribunal do júri".