Sumário: 1. Introdução; 2. Recursos; 3. Juízo de Admissibilidade e Juízo de Mérito; 4. Requisitos de Admissibilidade dos recursos trabalhistas; 5. Depósito Recursal; 6. O Caso das Micro e Pequenas Empresas; 7. Considerações Finais; 8. Referências
1. Introdução
O assunto objeto do presente estudo, possibilidade de inexigibilidade de depósito recursal às micro e pequenas empresas, é de grande relevância para a disciplina do Direito Processual do Trabalho na prática forense hodierna, porquanto aborda um dos pressupostos de admissibilidade dos recursos nessa seara, e que, como demonstrar-se-á no desenvolvimento do trabalho, revela-se como um obstáculo desnecessário que pode até ser considerado ilegal ao exercício de direitos constitucionais, qual sejam, do acesso à ampla defesa e ao duplo grau de jurisdição por aqueles entes.
A exigência do depósito recursal às micro e pequenas empresas não se coaduna com normas constitucionais (art. 170, IX e 179 da CFRB), bem como com a legislação infraconstitucional, notadamente o Estatuto da Microempresa (Lei 9841/1999).
Demais disso, afigura-se, em nosso modesto entender, ofensa ao princípio constitucional da isonomia de tratamento, obstaculizando a projeção de recursos, instituto deveras importante para a pacificação social.
2. Recursos
O direito, desde sua origem, tem por escopo a promoção da paz social, diminuindo os atritos decorrentes das relações intersubjetivas dos componentes do grupo social. Nesse rumo, o processo objetiva a concatenação dos atos a serem praticados na ação de buscar o direito, respeitando determinada forma – procedimento -, a fim de garantir uma pretensão resistida ou insatisfeita.
No dizer de Rousseau, in O Contrato Social, o cidadão, em troca da paz e segurança proporcionada pelo Estado, aceita se submeter às regras formuladas por este, inclusive aceitando as sanções impostas. Contudo, a interpretação das normas e conseqüente aplicação de punições há de respeitar princípios, de molde que não se fique ao alvedrio do intérprete, resguardando a própria finalidade da vida em sociedade.
Com efeito, a competência jurisdicional do órgão judicante de primeiro grau, via de regra, recai sobre a pessoa de um Juiz, que analisa a questão proposta à luz das provas carreadas ao processo e da legislação pertinente, emitindo um juízo de valor. Tal decisão prolatada, corriqueiramente, desagrada a uma das partes, aquela que sucumbe, ou, em alguns casos, a terceiro estranho à lide primitiva.
Abre-se, com a sentença ou decisão primeira, a possibilidade de encaminhamento da questão à instância superior, mediante o recurso.
Recurso, no dizer do Ministro Fux (2001), é:
o instrumento jurídico processual através do qual a parte ou outrem autorizado por lei pleiteia, voluntariamente, o reexame da decisão, com o fim de modificá-la, cassá-la ou integrá-la. Enquanto há recurso, há possibilidade de modificação da decisão.
O recurso, que tem origem etimológica na expressão re cursus, que quer significar "curso para trás", tem por justificativa a possibilidade de cometimento de erro pelo juiz, error in judicando ou vício de ilegalidade na decisão, incluindo má-fé do prolator do decisum, o que configura error in procedendo.
Revela-se possível a ocorrência dos vícios acima descritos que podem inquinar o provimento jurisdicional, prejudicando uma das partes, quando não todas. Nesse rumo a lição de Wagner Giglio (1997):
O juiz, como todo ser humano, está sujeito a falhas: pode errar, enganar-se, julgar mal. E de fato erra, por vezes. A sociedade não ignora, e por isso ninguém se satisfaz, psicologicamente, com um único julgamento, preferindo acreditar num erro judiciário, para preservar o amor próprio.
Destarte, a justificação dos recursos tem caráter psicológico, na medida em que busca a satisfação íntima do jurisdicionado, e jurídico, buscando um pronunciamento mais justo.
O renomado doutrinador processualista Dinamarco (2002), acresce aos fundamentos dos recursos já mencionados, o fundamento político, afirmando que:
nenhum ato estatal pode ficar imune aos necessários controles. O Poder Judiciário, principalmente onde seus membros não são sufragados pelo povo, é, dentre todos, o de menor representatividade. Não o legitimaram as urnas, sendo o controle popular sobre o exercício da função jurisdicional ainda incipiente em muitos ordenamentos, como o nosso. É preciso, portanto, que se exerça ao menos o controle interno sobre a legalidade e a justiça das decisões judiciárias.
Destarte, também se justifica a reapreciação das decisões judiciais em primeira instância pelo fundamento político, vez que, não obstante recentes debates acerca do controle externo do judiciário, apenas poder-se-á averiguar a legalidade e/ou justiça das decisões mediante apreciação do órgão judicante postado hierarquicamente superior àquele primeiro.
3. Juízo de Admissibilidade e Juízo de Mérito
Para que o juízo ad quem adentre ao mérito do recurso, tal qual ocorre na ação, mister que o recorrente atente a requisitos formais, sem os quais não se dará prosseguimento ao apelo, extinguindo-se precocemente o feito, dizendo-se que o órgão não conheceu do recurso, porquanto negativo o juízo de admissibilidade. Ao revés, sendo positivo o juízo de admissibilidade, o recurso é conhecido, podendo o tribunal apreciar o mérito propriamente dito.
4. Requisitos de Admissibilidade dos recursos trabalhistas.
Também na seara trabalhista, para que um recurso seja conhecido, mister atender determinados requisitos, ou pressupostos, os quais a doutrina dividiu em subjetivos, que dizem respeito à pessoa do recorrente, e objetivos, respeitantes aos requisitos formais do apelo.
A doutrina enumera como pressupostos subjetivos aqueles tangentes ao autor do recurso, àquele que detém interesse legítimo na sua interposição a quem a lei concede a possibilidade de impugnar o ato combatido, ou, ainda, àqueles que sofreram alteração negativa na sua esfera jurídica em decorrência do comando sentencial prolatado, conquanto não tenha composto a lide original, v.g., o terceiro interessado, e, ainda, o Ministério Público, quer em processo que tenha atuado como parte, quer naquele que tenha oficiado como custus legis.
Por outro lado, o interesse em recorrer decorre da própria legitimidade. O interesse em recorrer é caracterizado pela necessidade que tem a parte, quando não teve reconhecida a pretensão deduzida em juízo.
Tangentemente aos requisitos objetivos, o primeiro a ser preenchido é a possibilidade de impugnação da decisão, ou seja, a decisão tem que ser recorrível. Os despachos de mero expediente não desafiam recurso e a decisão interlocutória é irrecorrível de imediato.
Como sabido, não se pode, de regra, projetar mais de um recurso para uma mesma decisão, em homenagem ao princípio da unirrecorribilidade, que é a impossibilidade da interposição concomitante de mais de um apelo. Não há dupla e simultânea impugnação recursal.
Outrossim, cada espécie de decisão desafia um tipo de recurso previsto em lei, destarte, mister ser respeitada a adequação do apelo para sua recepção. A jurisprudência vem atenuando esse rigor técnico, aceitando outro recurso, desde que não haja erro grosseiro e seja tempestivo, por aplicação do princípio da fungibilidade.
Deve-se, ainda, respeitar à regularidade formal, conquanto campeie no processo trabalhista certo grau de informalidade, porquanto determinados preceitos como a forma preconizada em lei (forma escrita) e a fundamentação são pressupostos essenciais para a admissibilidade do recurso. Releva mencionar, por útil, acompanhando os ensinamentos de Tostes Malta (2001), que parte da jurisprudência se inclina no rumo da desnecessidade de fundamentação, bastando ao recorrente, mediante simples petição, indicar como entende que deva ser dirimida a controvérsia em que é parte, para que seu apelo seja conhecido.
Contudo, no sentir de Tostes Malta (2001),
A prevalecer uma interpretação sistêmica da lei, o "por simples petição" da lei significa que o recurso não depende de formalidades especiais, mas não dispensa fundamentação. O critério deve ser o mesmo das petições iniciais. A parte deve elucidar o que pretende e quais as razões por que pretende. A falta de fundamentação torna o recurso inepto.
Destarte, para se ter o recurso ao menos conhecido, deve se ater ao mínimo de formalidade, demonstrando as razões e a fundamentação da impugnação.
Todo recurso deve ser interposto dentro do prazo fixado em lei, sendo a tempestividade outro requisito essencial ao conhecimento do apelo. Consoante a lição de Isis de Almeida (1995), "o prazo para interposição de recursos é sempre fatal, salvo obstáculo judicial". A interposição do recurso antes ou depois do prazo aberto aos possíveis recorrentes esvazia um dos pressupostos de recebimento e de conhecimento. No processo trabalhista os prazos são uniformizados em oito dias, sendo exceção o Pedido de Revisão de Valor de Alçada, que é de 48 horas, por determinação da Lei nº 5.584/70, Art. 2º, § 1º e os Embargos de Declaração, que é de cinco dias, ex vi determinação do artigo 897-A da Consolidação.
Para a interposição de alguns recursos se faz mister o pagamento de custas e emolumentos, bem como, na hipótese de recurso do empregador contra condenação em pecúnia, efetivação do depósito recursal. A falta do preparo gera a deserção, que importa no não seguimento ou não conhecimento do recurso, embora alguns apelos independam de preparo, como o Agravo de Instrumento e os Embargos de Declaração.
5. Depósito Recursal
O depósito recursal, previsto no § 1º do artigo 899 da CLT, é exigência legal para interposição de determinados recursos, notadamente aqueles que visam reapreciação de matéria debatida em fase de cognição. No que tange aos recursos em sede de processo executório se torna despiciendo, porquanto tais apelos pressupõem que o juízo esteja garantido por penhora de bens ou depósito em dinheiro.
O instituto em comento passou a fazer parte da Consolidação por força do Decreto-Lei 75 de 1966, que alterou o parágrafo primeiro do artigo 899 e inseriu mais dois parágrafos ao dispositivo. A justificativa do Decreto-Lei em referência, fundou-se na interposição sistemática de recursos protelatórios por parte dos empregadores, postergando indefinidamente o cumprimento das sentenças, em detrimento da necessidade de impor efetividade ao processo, face o caráter alimentar das verbas discutidas.
De notar, ainda, que o texto original não impunha limites, sendo necessário que o recorrente efetuasse o depósito da quantia indicada na condenação. A Lei 5.442/1968 alterou o texto do § 2º para limitar o depósito a 10 vezes o salário mínimo regional, situação que perdurou durante décadas, até a promulgação da Constituição de 1988 que unificou nacionalmente o salário mínimo.
A celeuma criada com o advento da nova ordem constitucional residia na hipótese de se entender que o depósito recursal teria natureza jurídica de taxa, ofendendo as garantias insculpidas no artigo 5º da Lex Legum. A questão foi objeto de Ações Diretas de Inconstitucionalidade, interpostas pelas Federações da Indústria (ADIn 836/93), Comércio (ADIn 884/93) e Agricultura (ADIn 1173/94), cujo pedido liminar de suspensividade do dispositivo foi rejeitado pelo Ministro Francisco Rezek, relator das ADIn’s.
A latere o Tribunal Superior do Trabalho, antecipando-se ao julgamento do mérito das Ações Constitucionais, que certamente suscitaria debates acalorados, interpretou o dispositivo, através da Instrução Normativa 03 de 1993, como tendo o depósito recursal natureza jurídica de "garantia de execução futura".
Destarte, restou afastada naquele momento a inconstitucionalidade da aplicação de exigência do depósito recursal, para fins de recurso, regra geral.
6. O Caso das Micro e Pequenas Empresas
Os anos oitenta foi época de forte turbulência na economia nacional, em função de grandes mudanças políticas. A transição operada em grande parte da América Latina, fortemente apoiada pelos Estados Unidos - que, paradoxalmente, outrora fomentara as ditaduras regionais - de sistemas ditatoriais para democracias, afetou e influenciou o desenvolvimento econômico do País. A experiência dos governos militares que, inicialmente, apresentou-se como a solução para todos os problemas econômicos do País, prometendo um milagre que levaria o Brasil para o primeiro mundo, embora tenha, durante a década de setenta, permitido alcançar índices recordes de desenvolvimento, resultara desastrosa, principalmente porquanto forte endividamento externo, tendo por conseqüência o crescimento negativo do PIB e agravamento dos indicadores sociais, mormente quanto aos índices de desemprego.
Toda essa turbulência econômica desaguou em desequilíbrio fiscal, monetário e cambial, havendo o governo que implementar várias tentativas de controlar a principal seqüela desse desequilíbrio, a inflação com forte desemprego nos diversos setores da economia.
O resultado imediato desse cenário foi, como já dito, um dos maiores índices de desemprego que a história recente registra. Não poucos profissionais, até mesmo qualificados, se viram enfrentando a situação de serem dispensados de seus postos de trabalho, quando não viam o encerramento das atividades de seu empregador sem sequer receber os seus direitos trabalhistas.
Na esteira desses acontecimentos, muitos buscaram a atividade "empresarial" como alternativa à própria sobrevivência. De notar que a grande maioria desses ex-empregados e novos "empregadores" se equivaliam aos empregados, não sendo razoável, in casu, a clássica diferenciação dos pólos da relação trabalhista, que aponta o empregado como único hipossuficiente, surgindo, então, as microempresas da forma como conhecemos atualmente.
Sensível ao novo contexto decorrente da conjuntura sócio-econômica, coincidente com a elaboração da nova ordem constitucional, o legislador constituinte fez inserir na Carta Magna o artigo 179 que assegura tratamento diferenciado às pequenas e microempresas.
A esta garantia determinada pela CFBR/1988 em seu texto originário foi acrescida, por força da Emenda Constitucional 06 de 1995, à preconizada pelo inciso IX do artigo 170.
Tratando-se de norma programática, necessitou de regulamentação infraconstitucional, a qual veio a se perfectibilizar pela promulgação da Lei 9.841, de 05 de outubro de 1999, que instituiu o Estatuto da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte. A norma citada, já em seu primeiro artigo assevera:
Art. 1º Nos termos dos artigos 170 e 179 da Constituição Federal, é assegurado às microempresas e às empresas de pequeno porte tratamento jurídico diferenciado e simplificado nos campos administrativo, tributário, previdenciário, trabalhista, creditício e de desenvolvimento empresarial, em conformidade com o que dispõe esta Lei e a Lei nº 9.317, de 05 de dezembro de 1996, e alterações posteriores.
Parágrafo único. O tratamento jurídico simplificado e favorecido, estabelecido nesta Lei, visa facilitar a constituição e o funcionamento da microempresa e da empresa de pequeno porte, de modo a assegurar o fortalecimento de sua participação no processo de desenvolvimento econômico e social.
Os citados dispositivos deixam claro que o ordenamento jurídico pátrio concede às microempresa e empresa de pequeno porte tratamentos diferenciado e simplificado, no que se refere às áreas administrativa, tributária, previdenciária e trabalhista, além de determinar a facilitação da concessão de créditos e outras modalidades de fomento.
Como afirmado alhures, a Constituição de 1988, ao elencar os Princípios Gerais da Atividade Econômica em seu artigo 170, incluiu, por força da Emenda Constitucional 06 de 1995, no inciso IX o princípio do "tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sobre as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País".
Segundo dados do IBGE (2002), as micro e pequenas empresas respondem por 29% do PIB brasileiro, sendo que apenas as formais produzem 23% de toda a riqueza nacional. O segmento das Micro e Pequenas Empresas ocupa 44% de toda a força de trabalho formal e outros 12,7 milhões de empreendedores e trabalhadores informais nos 27 estados da Federação, correspondendo a 63% dos postos de emprego do País.
Demais disso, o já mencionado artigo 179 da Lex Legum obriga que os entes federativos dispensem tratamento jurídico diferenciado às micro e pequenas empresas, com vistas ao incentivo de suas atividades.
A Constituição Federal, evidentemente, não contém dispositivos inócuos. Suas regras, mesmo as programáticas, não podem ser contrariadas pela legislação infraconstitucional. Como o depósito recursal prescrito no art. 899 da CLT, é anterior à CFRB/1988, segue-se que deve ser interpretado à luz da nova ordem constitucional. Nesse rumo, alguns pontuais pronunciamentos judiciais vêm entendendo pela possibilidade de dispensa do depósito recursal às micro e pequenas empresas, a exemplo do seguinte aresto proveniente do Tribunal Regional do Trabalho da 20 Região, Juiz relator Pedreira Cardoso:
JUSTIÇA GRATUITA - POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO AO EMPREGADOR. A realidade sócio-econômica do País deve ser levada em consideração na análise dos fatos, pelo que o microempresário em dificuldades financeiras não deve ser privado da defesa de seus direitos em razão de não ter condições de efetivar o depósito recursal.
Idêntico entendimento foi esposado pelo Tribunal Regional da 13ª Região, em Acórdão redigido pelo Desembargador Neves de Melo (2002) literis:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DEPÓSITO RECURSAL. EMPREGADOR QUE NÃO POSSUI CONDIÇÕES DE EFETIVÁ-LO. POSSIBILIDADE DE DISPENSA EM CASOS EXTRAORDINÁRIOS. A assistência judiciária gratuita é assegurada constitucionalmente a todo aquele que comprove sua hipossuficiência (CF/88, art. 5º, LXXIV). Ao intérprete é vedado restringir ou distinguir onde a norma não faz. Agravo de Instrumento provido para desobstruir o Recurso Ordinário interposto.
Entretanto, ainda não se pode constatar a generalização da aplicação das normas aqui citadas, no sentido de resguardar o direito afirmado pela Constituição.
Por outro lado, a exigência do depósito recursal às micro e pequenas empresas revela-se também agressivo ao caput do artigo 5º da Lei Fundamental, porque o princípio constitucional da igualdade importa, também, em dar tratamento diferente aos desiguais.
É que, tratando de forma igualitária as empresas de portes diferentes, discriminadas estão sendo as micro, pequenas e médias empresas, que não têm os meios para desembolsar os exagerados valores para proceder aos depósitos, ficando inviabilizadas de produzir ampla defesa nas reclamações trabalhistas contra elas propostas, já que ficarão impedidas de utilizar os recursos previstos em lei.
7. Considerações Finais
Após a análise da matéria abordada no presente estudo, percebe-se que o depósito recursal, instituto criado com o objetivo de reprimir o uso indiscriminado dos recursos trabalhistas com o fito de postergar a satisfação dos créditos deferidos judicialmente aos trabalhadores, naturalmente hipossuficientes na relação, pode e deve ser inexigido das pequenas e microempresas, porquanto tais entes, em sua grande maioria, não dispõem do valor necessário para sua efetivação – situação que, por vezes, alcança até empresas de porte superior -, redundando em renúncia ao direito de recorrer, sucumbindo em muitos casos de forma injusta a sentenças teratológicas.
O duplo grau de jurisdição, embora muitos afirmem sua relatividade, porquanto o legislador infraconstitucional tem o poder de regulamentar o acesso a ele, é instrumento de pacificação social. A sentença monocrática pode conter erros de procedimento ou mesmo judicial, de maneira que o pronunciamento por um órgão colegiado permite maior tranqüilidade, mesmo para o vencido. Exsurgindo afronta ao princípio acima descrito, com a vedação do acesso ao duplo grau de jurisdição, por ente privado que não tenha condições financeiras de recolher o valor indicado na sentença ou no dispositivo legal.
Outro princípio basilar assegurado pela Norma Ápice, diz respeito à isonomia de tratamento. Princípio este que, ao se exigir o depósito recursal das micro e pequenas empresas, é vulnerado. Bastando para constatar o afirmado, verificar que o valor do compulsório exigido é o mesmo para uma grande multinacional ou mesmo um banco, que faturam bilhões, daquele exigido do microempresário que retira do estabelecimento apenas seu sustento.
De outro ângulo, temos que o escopo do instituto em descortino revela-se distorcido. O desestímulo aos recursos protelatórios não alcança aquelas empresas de médio e grande porte, que detêm condições financeiras favoráveis, podendo dispor do valor para realização do depósito e procrastinar indefinidamente o pagamento das obrigações determinadas em sentença. A corroborar tal assertiva, temos os registros do Tribunal Superior do Trabalho que apontam para as grandes empresas como as que mais interpõem recursos nos tribunais regionais e no próprio TST.
Concluímos que se faz mister a aplicação da legislação já existente, como já ocorre em alguns julgados, interpretando-a no sentido de isentar as micro e pequenas empresa do pagamento do depósito recursal, de maneira a permitir o livre acesso ao duplo grau de jurisdição, como forma de distribuir justiça de forma equânime.
8. REFERÊNCIAS
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