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O STF e a imunidade tributária dos álbuns de figurinhas

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05/06/2018 às 12:00
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7 - Entendimento dos Tribunais sobre a imunidade tributária dos livros 

Os Tribunais brasileiros já se posicionaram diversas vezes sobre o tema das imunidades tributárias dos livros.

O Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 102.141 do ano de 1985 apreciou questão sobre o alcance da Imunidade não apenas sobre o livro acabado, mas sobre o conjunto de serviços para a sua realização:

" Imunidade Tributária. Livro. Constituição, artigo 19, III, alínea d. Em se tratando de norma constitucional relativa as imunidades tributárias genéricas, admite-se a interpretação ampla, de modo a transparecerem os princípios e postulados nela consagrado. O livro, como objeto da imunidade tributária, não é apenas o produto acabado, mas o conjunto de serviços que o realiza, desde a redação, até a revisão de obra, sem restrição dos valores que o formam e que a Constituição protege".(21)

E o mesmo Supremo Tribunal Federal julgando o Recurso Extraordinário nº 174.476, já disciplinava o alcance que uma imunidade constitucional deve ter dentro de uma sociedade ao dispor:

"Imunidade - impostos, livros, jornais e periódicos - Artigo 150, inciso VI, alínea d, da Constituição Federal. A razão de ser da imunidade prevista no texto constitucional, e nada surge sem uma causa, uma razão suficiente, uma necessidade, está no interesse da sociedade em ver afastados procedimentos, ainda que normalizados, capazes de inibir a produção material e intelectual de livros, jornais e periódicos. O benefício constitucional alcança não só o papel utilizado diretamente na confecção dos bens referidos, como também insumos nela consumidos como são os filmes e papéis fotográficos" (22) 

E uma apostila. Pode ser alcançada pela regra da imunidade tributária?

Sim, com decisão do Supremo Tribunal Federal: 

"Imunidade. Impostos. Livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão.

Apostilas. O preceito da alínea ´d´ do inciso VI do artigo 150 da Carta da República alcança as chamadas apostilas, veículo de transmissão de cultura simplificado"(23).

No referido julgamento, o Ministro Marco Aurélio interpretou o artigo 150, VI, "d", da seguinte forma:

"Pois bem, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo consignou tratar-se, nos causo dos autos, de manuais técnicos remetidos pela Autora. Fez ver que o preceito constitucional, no que voltado ao implemento da educação e da cultura, alcança tanto o livro quanto a apostila, porquanto têm mesmo objetivo, ou seja, a veiculação da mensagem, a comunicação do pensamento num contexto de obra de cultura. Confira-se a maior eficácia possível ao Texto Constitucional, postura básica quando se vive em um Estado Democrático de Direito. O objetivo maior do preceito constitucional realmente não é outro senão o estímulo, em si, à cultura, pouco importando que, no preceito, não se aluda, de forma expressa a apostilas que, em última análise, podem ser tidas como a simplificação de um livro. Abandone-se a interpretação meramente verbal, gramatical: embora seduzindo, por ser a mais fácil, deve ser observada em conjunto com métodos mais seguros, como é o teleológico. O reconhecimento, pela Corte de origem, do conteúdo, de veiculação de mensagens de comunicação, de pensamento em contexto de cultura, é suficiente a dizer-se da fidelidade do Órgão Julgador de origem à Carta da República."(24) 

Acreditamos, juntamente com grande parte dos Tribunais, que a imunidade deve ser compreendida em seu sentido finalístico, abrangendo inclusive os meios indispensáveis à produção dos objetos imunes, tal como os equipamentos destinados à sua produção.


8 - O Supremo Tribunal Federal e a imunidade tributária para "álbum de figurinhas" A Ministra Ellen Gracie, relatora do Recurso Extraordinário 221.239-6, de São Paulo, analisou a questão da imunidade tributária de álbum de figurinhas.

Eis a ementa do acórdão recorrido:

"Execução fiscal. Imunidade sobre álbum comercializado para fins de divulgação e propaganda de novela, com complementação de figurinhas impressas em separado.

Privilégio desconsiderado, sem violação ao disposto na letra d do inciso VI do artigo 150 da Constituição vigente. Embargos rejeitados. Recursos acolhidos para mencionado fim".

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo havia entendido que o álbum de figurinhas da novela da Rede Globo intitulada "Que Rei Sou Eu" não serviria de mecanismo de divulgação cultural ou educativa, mas apenas de veículo de propaganda, o que afastaria a imunidade tributária constitucional para publicações e periódicos.

A Editora Globo, por sua vez, alegou que os livros ilustrados com cromos de complementação com figurinhas são elementos da didática moderna, necessários à educação infantil, merecendo, assim, serem contemplados pela imunidade constitucional concedida aos livros, periódicos e jornais, cujo objetivo é incentivar a cultura e garantir a liberdade de pensamento, o direito de crítica e a propaganda partidária.

Eis, pois, o entendimento da Ministra Ellen Gracie:

"Constitucional. Tributário. Imunidade. Artigo 150, VI, d, Constituição Federal. "Álbum de Figurinhas". Admissibilidade.

1. A imunidade tributária sobre livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão tem por escopo evitar embaraços ao exercício da liberdade de expressão intelectual, artística, científica e de comunicação, bem como facilitar o acesso da população à cultura, à informação e à educação.

2. O Constituinte, ao instituir esta benesse, não fez ressalvas quanto ao valor artístico ou didático, à relevância das informações divulgadas ou à qualidade cultural de uma publicação.

3. Não cabe ao aplicador da norma constitucional em tela afastar este benefício fiscal instituído para proteger direito tão importante ao exercício da democracia, por força de um juízo subjetivo acerca da qualidade cultural ou do valor pedagógico de uma publicação destinada ao público infanto-juvenil.

4. Recurso extraordinário conhecido e provido."(25) 

A ministra entendeu que o "álbum de figurinhas"é uma maneira de estimular o público infantil a se familiarizar com meios de comunicação impressos, atendendo, em última análise, à finalidade do benefício tributário.

E, ainda, o voto do Ministro Gilmar Mendes:

"Sr. Presidente, quando a Ministra Ellen Gracie estava relatando, assaltou-me exatamente a dúvida em relação a esse precedente conhecido do Plenário a propósito dos catálogos telefônicos. De fato, a decisão tomada pelo Tribunal de São Paulo contém um risco enorme de onerar o juiz com esse "distinguishing"entre as publicações que devem merecer o favor constitucional e aquelas que não devem ser dotadas de tal favor.

De modo que também acompanho S. Exa." (26)

O voto proferido pelo Ministro Gilmar Mendes refere-se ao RE nº 101.441, que teve como relator o Ministro Sydney Sanches, e voto do Ministro Célio Borja, entendendo estarem os catálogos telefônicos abrangidos pela benesse em análise, assim dispondo:

"Penso que, no nosso sistema juspublicísticos, a imunidade tributária do livro, do jornal e dos periódicos é ancilar da liberdade de opinião e de informação e que esta abrange as formas impressas de transmissão e difusão de qualquer forma de conhecimento.

É possível que o intérprete dos textos constitucionais referidos, se impressione com a superficialidade das informações veiculadas por uma lista telefônica e, assim, predisponhase a excluí-la do rol das publicações merecedoras da proteção do parágrafo 8º, do artigo 153, e, conseqüentemente, da imunidade prescrita no artigo 19, III, d, todos da Constituição.

Tal procedimento afigura-se- me, todavia, incompatível com a natureza proibitória de uma e outra cláusulas, pois ao tolher à autoridade do Estado o poder de submeter à sua licença a transmissão e a veiculação de conhecimento ou informação, o Constituinte retirou- lhe a faculdade de ditar discrimen entre os diferentes tipos de informação, impedindo-o de classificá-las, seja para efeitos civis ou políticos, administrativos ou tributários, a umas impondo contribuições, a outras isentando". (27) 


9 - Conclusão 

Assim, como havíamos questionado no início do texto, perguntamos novamente: agiu corretamente o Supremo Tribunal Federal ao entender que o "álbum de figurinhas" deve ser contemplado pela imunidade tributária do artigo 150, VI, d, da Constituição Federal? Ou agiu de forma equivocada a mais alta Corte do Judiciário brasileiro?

Podemos concluir que sim, o Supremo Tribunal Federal agiu corretamente ao entender que o "álbum de figurinhas" deve ser contemplado pela imunidade tributária do artigo 150, VI, d, da Constituição Federal, facilitando o acesso à cultura e à informação, sendo o álbum mais uma maneira de estimular o público infantil a se familiarizar com meios de comunicação impressos.

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Alguns então poderiam questionar: e um álbum de figurinhas com caráter sexual, também estaria abrangido pela imunidade tributária? Com certeza a resposta seria não, pois sua finalidade não é educativa nem cultural, diferente, por exemplo, de um álbum de figurinhas sobre a Copa do Mundo de Futebol, ou sobre as Olimpíadas, que trazem informações sobre esportes, sedimentando e fortalecendo a personalidade de nossos jovens. 


Notas 

(1) http://www.klickescritores.com.br/pag_capas/acervo.htm

(2) Carvalho, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 11ª edição, São Paulo, Saraiva, 1999, p. 69.

(3) Ob. Cit, p. 69

(4) Carvalho, Paulo de Barros. Curso de direito Tributário. 11ª edição, São Paulo, 1999, p. 122.

(5) Machado, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 14ª edição, São Paulo, Malheiros, 1998, p. 199.

(6) Falcão, Amílcar apud Nogueira, Ruy Barbosa. Curso de Direito Tributário. 14ª edição, São Paulo, Saraiva, 1995, p. 167.

(7) Carrazza, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 14ª edição, São Paulo, Malheiros, 2000, p. 468-469.

(8) Machado, Hugo de Brito. Aspectos Fundamentais do ICMS, Ed. Dialética, São Paulo, 1997, p. 196.

(9) Silva, de Plácido e. Vocabulário Jurídico. 14ª edição, Rio de Janeiro, Forense, 1998, p. 499.

(10) Baleeiro, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar, Editora Forense, 7ª edição, 1997, p. 339.

(11) Pacheco, Angela Maria. Imunidade Tributária do Livro, in "Imunidade Tributária do Livro Eletrônico", IOB, Coordenação Geral de Hugo de Brito Machado, p. 15.

(12) Machado, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, Ed. Malheiros, 14ª edição, 1998, p. 205.

(13) Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Apelação Cível 1996.001.01801.

(14 )Tribunal Regional Federal da 4º Região, Processo nº 1998.04.01.090888-5, Relator: Juiz João Pedro Gebran Neto.

(15) Tributação na Internet. Coordenador - Ives Gandra da Silva Martins, Editora RT, 2001, p. 99

(16) Miranda, Pontes de. Comentários à Constituição Federal de 1946. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1947.vol. 1, p. 510

(17) Ob. Cit, p. 366-367

(18) Ob. Cit., p. 396

(19) Ob. Cit., p. 400

(20) Ob. Cit., p. 416

(21) Recurso Extraordinário 102.141/RJ, de 18.10.1985, Relator: Ministro Carlos Madeira

(22) Recurso Extraordinário 174.476/ SP, de 26.9.1996, Relator: Maurício Corrêa

(23) Recurso Extraordinário 183.403/SP. Julgamento em 7/11/2002. Relator: Ministro Marco Aurélio

(24) Voto do Ministro Marco Aurélio no Recurso Extraordinário nº 183.403/SP.

(25) Recurso Extraordinário 221.239/ SP, de 25.5.2004, Relatora: Ellen Gracie

(26) Recurso Extraordinário 221.239/ SP, de 25.5.2004, Relatora: Ellen Gracie

(27) Recurso Extraordinário 101.441, DJU de 19.8.1988, Relatora: Sydney Sanches 


10 - Bibliografia 

Baleeiro, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar, Editora Forense, 7ª edição, 1997

Carrazza, Roque Antônio. Curso de Direito Consitucional Tributário. 14ª edição, São Paulo, Malheiros, 2000

Carvalho, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 11ª edição, São Paulo, Saraiva, 1999

Falcão, Amílcar apud Nogueria, Ruy Barbosa. Curso de Direito Tributário. 14ª edição, São Paulo, Saraiva, 1995

Machado, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 14ª edição, São Paulo, Malheiros, 1998

Miranda, Pontes de. Comentários à Constituição Federal de 1946. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1947. vol. 1, p. 510

Pacheco, Angela Maria. Imunidade Tributária do Livro, in "Imunidade Tributária do Livro Eletrônico", IOB, Coordenação Geral de Hugo de Brito Machado Silva, de Plácido e. Vocabulário Jurídico. 14ª edição, Rio de Janeiro, Forense, 1998

Tributação na Internet. Coordenador - Ives Gandra da Silva Martins, Editora RT, 2001

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Sobre o autor
Alexandre Pontieri

Advogado com atuação nos Tribunais Superiores (STF, STJ, TST e TSE), no Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado Federal) e, especialmente, no Conselho Nacional de Justiça (CNJ); Consultor da área tributária com foco principalmente no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF); Pós-Graduado em Direito Tributário pelo CPPG – Centro de Pesquisas e Pós-Graduação da UniFMU, em São Paulo; Pós- Graduado em Direito Penal pela ESMP-SP – Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo. Aluno Especial do Mestrado em Direito da UNB – Universidade de Brasília.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PONTIERI, Alexandre. O STF e a imunidade tributária dos álbuns de figurinhas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5452, 5 jun. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/66674. Acesso em: 21 nov. 2024.

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