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Do não conhecimento dos aclaratórios meramente protelatórios por falta de adequação

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Reconhecido o caráter meramente protelatório dos embargos, indago: seria a hipótese de conhecer e rejeitar os embargos ou de seu não conhecimento por inadequação?

Sumário: 1. A pretensão resistida: o surgimento da lide; 2. A jurisdição: função estatal compositiva; 3. A adstrição: esgotamento da prestação jurisdicional; 4. A decisão omissa, obscura ou contraditória: adequação dos embargos de declaração e sua função integradora; 5. O uso protelatório dos aclaratórios: necessidade de seu não conhecimento.


1. A pretensão resistida: o surgimento da lide

            O convívio social pressupõe o respeito às normas, "a manifestação da vontade coletiva geral, destinada a regular a atividade dos cidadãos ou dos órgãos públicos", (1) que são legisladas exatamente para garantir os direitos de cada um e, por conseqüência, a harmonia entre os cidadãos em respeito mútuo.

            O Estado, assim, regula a atribuição dos bens da vida aos diversos sujeitos jurídicos, que se concretizam mediante a prestação que uma pessoa é obrigada em relação a outra, de modo que o direito de uma parte corresponde à obrigação da outra, ou seja, "o Estado encomenda, em primeiro lugar, a observância das leis e a civilidade dos cidadãos, e os educa na liberdade confiando que eles as compreendam e as observem sem a necessidade da intervenção do juiz". (2)

            Ocorre que esse convívio social nem sempre é harmônico, surgindo conflitos muitas vezes não solucionados voluntariamente pelos envolvidos, cabendo a estes aspirar, oportunamente, a consecução ou mesmo a conservação desses bens.

            E é exatamente nesse encontro de interesses, que se gera o surgimento da denominada lide, ou, em outras palavras, a controvérsia que decorre do encontro de pretensões de direito material.

            Há pretensões que colidem e, por muitas vezes, cada um dos envolvidos entende estar com a razão, como bem afirma Pontes de Miranda (3), que a pretensão à tutela jurídica não se confunde com a pretensão à sentença favorável, de sorte que vai caber ao Estado tal composição, desde que regularmente provocado.


2. A jurisdição: função estatal compositiva

            Dos três poderes da República, cabe ao Poder Judiciário o monopólio compositivo das lides (4), através de sua função jurisdicional, denominada jurisdição, "atividade que os juízes exercem, em nome do Estado". (5)

            Essa atividade jurisdicional, entretanto, afirma também Calamandrei, "não é exercida sem finalidade: não se julga em abstrato, intransitivamente, mas se julga porque, frente a quem se deve julgar, está delineada, como objeto concreto do julgamento, uma controvérsia a ser definida, um litígio a ser dirimido, uma demanda a ser aceita ou recusada". (6)

            Desde que instado através do ajuizamento de uma ação, segundo Couture, "poder jurídico do autor de provocar a atividade do tribunal", (7) por quem detentor de legítimo interesse e mediante arrazoado dos fatos e fundamentos juridicamente possíveis, pena de carência, que significa a "ausência de um direito legítimo que justifique uma sentença favorável", (8) o Judiciário, por intermédio de um juiz competente, tramitará o procedimento adequado e, ao final, prolatará uma sentença, ou, nas ações originárias, um acórdão, pondo fim à controvérsia.

            Para Calamandrei, "o fim preeminente da jurisdição, é, no sistema da legalidade, o de fazer observar o direito objetivo (material), em seus preceitos individualizados", (9) buscando "resguardar a paz social e o império da norma de direito", (10) ou, por outro ângulo, compor a controvérsia legal, através da jurisdição voluntária, ou a controvérsia pessoal, através da jurisdição contenciosa.

            Agir em juízo, assevera Couture, "constitui uma solução de liberdade e de responsabilidade. O direito atua buscando, sempre, o equilíbrio da conduta humana. Ao lado de uma possibilidade, põe uma limitação, junto à liberdade, que é um poder, coloca a responsabilidade, que é uma forma de dever. Poder e dever buscam, assim, seu equilíbrio necessário", (11) exatamente o equilíbrio a ser garantido com o desfecho justo da controvérsia.


3. A adstrição: esgotamento da prestação jurisdicional

            Pois bem, a ação é o instrumento de acesso à jurisdição e a esta última cabe, ao final do processo, instrumento que possibilita a efetivação da pretensão, a composição da controvérsia. Assim resta evidenciado.

            A provocação do aparelho judiciário, entrementes, deve se verificar de forma precisa, "tem de ser evidente se fora pedida a condenação, declaração, ou constituição, e que teor deve ter. Isto é importante por causa da vinculação do tribunal ao pedido e por causa da extensão do caso julgado", afirma Jauernig (12).

            O que se quer dizer é que o pedido delimita a atuação da jurisdição compositiva. Afirma-se que no julgamento da demanda, o juiz aplicará o direito material ao caso concreto, até mesmo se socorrendo dos bons costumes, da analogia e dos princípios gerais de direito, limitando-se a decidir, a compor a controvérsia dentro do que fora objeto do pedido, regra do art. 286 do CPC, ou pedidos cumulados, permissivo do art. 292 do CPC, que constarão da petição inicial ou, havendo, da reconvenção, do pedido contraposto ou da intervenção de terceiro.

            Excetuando-se os pedidos implícitos, previstos no art. 293 do CPC, tais como juros legais de mora, correção monetária e prestações de trato sucessivo que se vençam no curso da demanda; o mais que pedido, repiso, delimitará restritivamente a atuação jurisdicional quando do julgamento do processo, ou, na via recursal, do recurso.

            Conforme direcionamentos dos arts. 459 e 460 do CPC, o juiz decidirá a controvérsia proferindo sentença, ou acórdão, se no julgamento originário colegiado, desde que superadas questões processuais, acolhendo ou rejeitando, no todo ou em parte, o pedido formulado pelo autor, sendo-lhe defeso deferir pedido de natureza diversa ou condenatório em quantidade superior ao que foi demandado.

            Denomina-se adstrição, portanto, esta obrigação que tem o juiz de decidir nos limites do pedido, respeitados os pedidos implícitos, não provendo mais, menos ou diferente do que demandado, pena de macular aquela prestação jurisdicional, conforme diretiva constante do art. 128 do CPC.

            Nessa linha, colaciono a seguinte lição de jurisprudência:

            À luz do disposto no art. 286 do Código de Processo Civil, o pedido deve ser certo e determinado, cabendo ao magistrado decidir de acordo com tal limite, em estrita observância ao princípio da adstrição do juiz ao pedido, expresso no art. 128 do mesmo diploma legal (Na AC 2001.110110118, TJDFT, 3TC, Rel. Des. Wellington Medeiros, DJ 30/04/2003).

            De resto, toda e qualquer decisão deve respeitar os limites do pedido, seja em relação a uma liminar, seja em relação a determinada questão processual, seja em relação ao mérito, em primeiro ou segundo graus, como também ser precisa e clara, inteligível.


4. A decisão omissa, obscura ou contraditória: adequação dos embargos de declaração e sua função integradora

            Ao decidir, portanto, o magistrado deve se esgotar o que fora objeto do pedido, nos seus limites, seja quando do exame de uma liminar, quando da sentença, quando de terminativa de segundo grau ou de acórdão.

            Verificando-se que a decisão contém obscuridade, contradição ou omissão, adequam-se os embargos de declaração, conforme permissivo do art. 535, I e II do CPC, no prazo de 5 (cinco) dias, em petição dirigida ao juiz, no primeiro grau, ou ao relator, no segundo, devendo ser indicados os pontos obscuros, contraditórios ou omissos.

            Com propriedade, Renata Figueirêdo Alves assinala que os embargos de declaração "se constituem forma de impugnação de pronunciamento judicial e objetivam a não produção de efeitos jurídicos da decisão que apresenta defeito específico, visando, dessa forma, suprir omissão ou eliminar contrariedade, sendo, inclusive, interrompido o prazo para interposição de outro recurso". (13)

            Segundo o ilustre Pontes de Miranda (14), os embargos de declaração "afirmam e têm de provar que a sentença, como está, não satisfaz as exigências de prestação jurisdicional, pois não se sabe, ao certo, de que consta", e completa, "quem vence uma demanda pode, às vezes, encontrar na sentença qualquer obscuridade ou ambigüidade capaz de, futuramente, empecer a execução do julgado", não sendo razoável se admitir a apelação, recurso de regra cabível contra aquela decisão, tão somente para que o tribunal esclareça o pensamento do juiz inferior.

            Busca-se, desse modo, uma análise revisional, constituindo os aclaratórios, sim, uma espécie de recurso, dirigido ao magistrado, ou ao órgão do tribunal, prolator da decisão para que ele esclareça o seu pensamento, nas hipóteses de obscuridade, expurgue a dúvida entre o fundamento e o dispositivo, havendo contradição, ou faça aquilo a que estava obrigado, completando o julgamento, havendo omissão, ou seja, busca-se, havendo adequação, a integração da nova decisão à decisão originária, exatamente na parte obscura, contraditória ou omissa.

            Os aclaratórios dispensam preparo, já que sua função, ao menos em tese, é corretiva, e, conforme acima já afirmado, fica interrompido o prazo para os recursos adequados supervenientes, a depender do tipo de decisão que se pretende aclarar.

            Quanto à interrupção do prazo, elemento essencial conclusivo deste arrazoado, tal efeito exsurge com eficácia erga omnes dentro do processo, ou seja, pouco importa quem interpôs os embargos declaratórios, o autor, o réu, um dos litisconsortes, o terceiro ou o Ministério Público.

            A interrupção terá eficácia para todos, de modo que enquanto não proferida decisão pondo termo aos embargos, todos os prazos estão interrompidos, significando que, publicada a decisão aclareadora, daí fluirá todo o prazo recursal novamente, não se subtraindo o prazo eventualmente gasto com a interposição dos embargos.

            Conforme Alexandre Freitas Câmara, "interpostos os embargos de declaração, deixa de fluir o prazo para outros recursos, devendo tal prazo voltar a correr, por inteiro (afinal trata-se de interrupção, e não de suspensão), após a intimação das partes do resultado do julgamento". (15)

            Constata-se, nesse último aspecto, o perigo que decorre do uso indiscriminado dos embargos aclaratórios, já que se interrompem os prazos para os recursos subseqüentes, podem ser utilizados e reiterados com finalidade meramente protelatória, diferentemente da inteligência integrativa para o qual foi elaborado pelo legislador, em aparente e ardiloso procedimento contrário à dignidade da Justiça e à sua nobre função de definir a controvérsia de forma justa e em espaço razoável de tempo.

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5. O uso protelatório dos aclaratórios: necessidade de seu não conhecimento

            Observamos, portanto, que toda e qualquer decisão omissa, obscura ou contraditória, desafia a interposição do recurso de embargos declaratórios, cuja função maior é corretiva e integradora, é fazer com que o próprio prolator da decisão exerça sua função jurisdicional com acerto, suprimindo a omissão, esclarecendo a obscuridade ou a controvérsia no comando decisório atacado, integrando as decisões uma à outra.

            Ocorre que, conforme já especificado, é bastante comum a utilização protelatória dos aclaratórios, interpostos de forma indiscriminada como um verdadeiro freio processual, havendo previsão, no parágrafo único do art. 538 do CPC, da aplicação de multa não excedente a 1% (um por cento) sobre o valor da causa, multa esta que pode chegar a 10% (dez por cento), na hipótese de reiteração, condicionada a interposição do recurso cabível superveniente ao depósito do valor respectivo.

            Como bem observa Garcia Medina, em exaustivo trabalho acerca do prequestionamento para admissão dos recursos especial e extraordinário, "não havendo obscuridade, contradição ou omissão, não há lugar para a interposição dos embargos de declaração", e acrescenta, "diante disso, poderiam referidos embargos ser considerados protelatórios, dando ensejo à aplicação da multa disposta no parágrafo único do art. 538 do CPC". (16)

            Aplicar a multa prevista no parágrafo único do art. 538 do CPC seria, então, a penalidade máxima a ser imputada ao litigante de má-fé que fizera uso protelatório dos embargos, o que, por questões até óbvias, não parece suficiente, especialmente porque nem toda causa tem conteúdo patrimonial, e nem toda que tem esse conteúdo é de valor elevado.

            Faz-se necessário encontrar "uma forma efetiva de sancionar o abuso de direito", afirma Vieira de Vincenzi, acrescentando que a punição pecuniária da parte por eventual litigância de má-fé processual traz "dificuldades na comprovação da vontade de causar o dano, ou a consciência da prática do abuso", e que, "tais circunstâncias não só dificultam a tutela imediata e inibitória do ato abusivo, como também impõem grande fardo probatório e desestímulo ao prejudicado". (17)

            É cediço, entretanto, que a ausência de efetiva apreciação do litígio infra e/ou constitucional, por parte do Tribunal de que emanou o acórdão impugnado, não autoriza - ante a falta de prequestionamento explícito da controvérsia jurídica - a utilização dos recursos especial e/ou extraordinário, sob pena de negativa de seguimento.

            Por prequestionamento, leciona também Garcia Medina,

            como sendo a atividade postulatória das partes, decorrente da manifestação do princípio dispositivo, tendente a provocar a manifestação do órgão julgador (juiz ou Tribunal) acerca de questão constitucional ou federal determinada em suas razões, em virtude do qual fica o órgão julgador vinculado, devendo manifestar-se sobre a questão prequestionada. (18)

            Neste sentido, as Súmulas 282 do STF e 98 do STJ exigem o prequestionamento explícito como pressuposto de admissão dos recursos extremos, em única ou última instância, argüição que comumente se faz através dos embargos de declaração, antes mesmo de interposição do recurso meritório subseqüente.

            Configura-se o prequestionamento, portanto e no sentido posto, quando a causa tenha sido decidida à luz da legislação federal ou do texto constitucional indicado, com emissão de juízo de valor acerca dos respectivos dispositivos legais, interpretando-se sua aplicação ou não ao caso concreto, não bastando a simples menção a tais dispositivos.

            Se na formação do convencimento o magistrado fundamenta regularmente a motivação de sua decisão, mas não faz referência expressa à não incidência de determinado dispositivo legal infra ou constitucional, necessário se faz interpor embargos de declaração, em cuja sede se deve arrazoar o ferimento ou negativa de vigência ao eventual dispositivo questionado.

            Admite-se, ainda, o denominado prequestionamento implícito, embora apenas na hipótese de negativa de vigência (arts. 102 e 105, ambos inc. III, "a", da CF), desde que a tese defendida no recurso especial ou no extraordinário, respeitadas suas respectivas admissões, tenha sido explicitada na peça recursal originária à luz da legislação indicada como preterida, dispensando referência expressa, conforme arestos seguintes do STJ, ambos com reiterados precedentes e sucessivos:

            O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que em se tratando de recurso especial - interposto com fundamento na alínea "a" do permissivo constitucional - admite-se a figura do prequestionamento em sua forma "implícita", o que torna desnecessária a expressa menção do dispositivo legal tido por violado. Em contrapartida, torna-se imprescindível que a matéria em comento tenha sido objeto de discussão na instância a quo, configurando-se, assim, a existência do prequestionamento implícito (RESP 419187/PR, T5, Rel. p/ acórdão Min. Gilson Dipp, DJ 08/09/2003).

            Deliberando o acórdão recorrido sobre a questão debatida na apelação, ainda que não faça referência expressa aos dispositivos indicados pela parte, tem-se como configurado o prequestionamento da matéria (RESP 520827/RS, T2, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ 25/08/2003).

            Inobstante, "a parte não pode, a pretexto de obter uma declaração do exato sentido do julgado, valer-se dos embargos para novo pronunciamento jurisdicional, reformando o anterior, nem para prequestionar matéria não discutida, com vistas a recurso à instância superior". (19)

            Pois bem, não sendo a hipótese de prequestionamento explícito, e inocorrendo obscuridade, contradição ou omissão na decisão atacada, reconhecido o caráter meramente protelatório dos embargos, indago, seria a hipótese de conhecer e rejeitar os embargos ou de seu não conhecimento por inadequação?

            Conforme José Carlos Barbosa Moreira, o "objeto do juízo de admissibilidade são os requisitos necessários para que se possa legitimamente apreciar o mérito do recurso, dando-lhe ou negando-lhe provimento", (20) e ao proferí-lo, afirma, "o que faz o órgão judicial é certificar se estão satisfeitos os requisitos indispensáveis à legítima apreciação do mérito do recurso". (21)

            Dentre os diversos pressupostos recursais, aqueles essenciais à recepção e ao desenvolvimento válido e regular dos recursos, temos a adequação, que significa haver "um recurso próprio para cada espécie de decisão", dizendo-se que "o recurso é cabível, próprio e adequado quando corresponda à previsão legal para a espécie de decisão impugnada". (22)

            A adequação dos embargos aclaratórios, conforme cristalinamente delineado no art. 535 do CPC, é exatamente atacar decisão obscura, contraditória ou omissa, com função integradora e, por vezes, embora excepcionalmente, pode resultar "a infringência do julgado, se, em decorrência do acolhimento dos embargos, a decisão recorrida não mais puder ser mantida, hipótese em que os embargos se dizem modificativos". (23)

            Refaço agora a mesma indagação anterior: não sendo a hipótese de prequestionamento explícito, e inocorrendo obscuridade, contradição ou omissão na decisão guerreada, reconhecido o caráter meramente protelatório dos embargos, caberia seu conhecimento para, no mérito, decretar seu improvimento meritório, com aplicação tão somente da multa legal?

            Penso que não. Tenho a firme convicção de que não seria a hipótese de conhecer e negar provimento aos aclaratórios, mas deveria sim se negar conhecimento ao recurso protelatório, exatamente por inadequação, pois não há nada a esclarecer.

            E se não se conhece do recurso, por falta de pressuposto admissional, não há que se cogitar de interrupção do prazo para interposição do recurso adequado superveniente, de forma que a decisão guerreada passaria em julgado e poderia desde logo ser executada.

            A aplicação pura e simples da multa legal, conforme temos observado na prática, não tem obtido o intento talvez desejado de banir o uso indiscriminado dos aclaratórios, e vem ferindo de morte o sagrado instituto recursal, exatamente por seu efeito interruptivo.

            Ademais, é obrigação das partes, e de seus procuradores, agir com plena boa-fé na prática dos atos processuais (24), como também é obrigação do julgador cônscio tomar as medidas necessárias, evidentemente dentro dos parâmetros legais, como o aqui sugerido, evitando as denominadas decisões surpresas, estas ainda mais danosas aos jurisdicionados como um todo.

            O não conhecimento do recurso por inadequação é, ao meu sentir, a única maneira eficaz de se livrar, então, das conseqüências da manifesta protelatoriedade no uso dos embargos de declaração, posição que encontra conforto na jurisprudência dos tribunais inferiores, como no STJ, e também no STF, conforme arestos seguintes:

            PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. Alegação de acórdão ser omisso por não ter apreciado matéria constante de recurso voluntário, acarretando cerceamento de direito de o embargante ver a decisão ser reexaminada pela Corte Superior de Justiça, por falta de prequestionamento. Recurso a que se refere o embargante, todavia, sequer conhecido, vez que foi tido como prejudicado ante o improvimento do recurso necessário. Embargos, assim, meramente protelatórios, inexistindo omissão, contradição ou obscuridade. Aplicação de multa com fundamento no § único do art. 538 do CPC. Não conhecimento dos Embargos. Maioria (ED 69073-7/01, TJPE, 4CC, Rel. Des. Napoleão Tavares, DJ 14/03/03).

            EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CARÁTER PROTELATÓRIO. AUSÊNCIAS DE DEFEITOS NO JULGADO. NÃO CONHECIMENTO. Não se conhece de embargos de declaração quando evidenciam caráter meramente protelatório, ante a ausência de defeitos no julgado. Embargos não conhecidos. Unânime (EDAI 23282-1/180, TJGO, 1CC, Rel. Des. Leobino Valente Chaves, DJ 10/09/2001).

            PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AUSENCIA DOS PRESSUPOSTOS DEFINIDOS EM LEI. ACORDÃO ASSENTADO EM MAIS DE UM FUNDAMENTO SUFICIENTE. RECURSO MANIFESTAMENTE PROTELATORIO. APLICAÇÃO DE MULTA. Os embargos declaratórios constituem recurso de natureza excepcional, com os seus lindes demarcados expressamente em lei, não tendo, como objetivo, discutir de novo a lide, nem o rejulgamento da causa. Se o embargante (TCE) carece de legitimidade para interpor o especial, de igual modo não a tem para manifestar qualquer outro recurso. Admitindo, por absurdo, fosse o embargante legitimado para o pedido de esclarecimentos, o acórdão embargado permaneceria integro, eis que se assentou em outros fundamentos suficientes para mantê-lo, quais sejam: a) a ausência de prequestionamento das questões jurídicas em que se embasou o especial; b) julgamento na instancia ordinária mediante a interpretação de lei local (Regimento Interno), a impedir o conhecimento do recurso nobre. Embargos declaratórios manifestamente protelatórios. Condenação, do embargante, ao pagamento da multa prevista no art. 538, par. único do CPC, no percentual de 1% sobre o valor atribuído à causa, eis que, ao invés de cumprir o julgado (do Tribunal de Justiça), utiliza-se de recurso anódino, com o intuito de postergar o andamento do feito. Embargos não conhecidos. Decisão unânime (EDRESP 121053/PB, STJ, T1, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, DJ 02/03/1998).

            A utilização dos embargos declaratórios com a finalidade ilícita e manifesta de adiar a efetividade de decisão proferida pelo Tribunal, em aberta tentativa de fraude processual, enseja o não conhecimento desses embargos e a concessão excepcional de eficácia imediata àquela decisão, independentemente de seu trânsito em julgado. Unânime (RE 179502-6/SP/ED/ED/ED, STF, Pleno, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 08/09/2000).

            Embargos de declarações. Alegações de grosseira impertinência, a evidenciar o intuito protelatório: determinação de imediato cumprimento da decisão recorrida, independentemente da publicação do acórdão e de eventual interposição de novos embargos de declaração ou qualquer outro recurso. Unânime (AI 260266/PB/ED/ED, STF, T1, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 16/06/2000).

            Concluímos, portanto, ser necessária uma reformulação na legislação processual para que fique bem clara tal conseqüência, de não conhecimento dos aclaratórios quando reconhecidamente inadequados e protelatórios, implicando no imediato trânsito em julgado da decisão originária, porém antes mesmo, é de suma importância que seja solidificada a construção jurisprudencial acima citada, em homenagem aos princípios da efetividade e da instrumentalidade do processo.

            Por fim, se por hipótese estivermos diante da possibilidade da ocorrência de grave dano ou de difícil reparação em face da imediata execução do julgado, contra a decisão de não conhecimento cabe recurso adequado de agravo, em primeiro ou segundo graus, devendo a parte eventualmente prejudicada requerer ao competente relator os benefícios suspensivos do art. 558 do CPC.

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Sobre o autor
Ricardo de Oliveira Paes Barreto

Juiz de Direito Titular da 3ª Vara da Comarca do Recife –PE, Mestre em Direito Público pela UFPE, Professor da graduação e da pós-graduação da UNICAP e da ESMAPE, de Direito Processual Civil

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARRETO, Ricardo Oliveira Paes. Do não conhecimento dos aclaratórios meramente protelatórios por falta de adequação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 672, 8 mai. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6688. Acesso em: 17 nov. 2024.

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