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Creditamento do IPI pelas indústrias optantes pelo Simples federal

11/05/2005 às 00:00
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1. Introdução.

Quando forem contribuintes do IPI, ou seja, realizarem operações de industrialização, nos termos do artigo 3º, parágrafo único, da Lei nº 4.502/64, e do artigo 4º do Decreto nº 4.544/02-RIPI, as microempresas e empresas de pequeno porte inscritas no SIMPLES federal recolhem o IPI com o adicional de 0,5% (meio por cento) sobre sua receita bruta, conforme determina o artigo 5º, §2º, da Lei nº 9.317/96:

"Art. 5º. O valor devido mensalmente pela microempresa e empresa de pequeno porte, inscrita no SIMPLES, será determinado mediante a aplicação, sobre a receita bruta mensal auferida, dos seguintes percentuais:

..................................................

§2º. No caso de pessoa jurídica contribuinte do IPI, os percentuais referidos neste artigo serão acrescidos de 0,5 (meio) ponto percentual".

Entretanto, as ME e EPP que sejam contribuintes do IPI e inscritas no SIMPLES estão proibidas de utilizarem os créditos de IPI, relativamente às operações de entrada (aquisições) tributadas por este imposto federal.

Com efeito, assim aduz o §5º do artigo 5º, da Lei do SIMPLES:

"Art. 5º. omissis

.................................................

§5º. A inscrição no SIMPLES veda, para a microempresa ou a empresa de pequeno porte, a utilização ou destinação de qualquer valor a título de incentivo fiscal, bem assim a apropriação ou a transferência de créditos relativos ao IPI e ao ICMS".

Porém, de acordo com o princípio constitucional da não-cumulatividade do IPI, as microempresas e empresas de pequeno porte que adquirirem matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem tributados pelo IPI devem ter o direito de se creditar desse crédito respectivo, mesmo na condição de optantes pelo regime tributário do SIMPLES.

Pelo presente trabalho, busca-se invocar o princípio constitucional tributário da não-cumulatividade, no sentido de viabilizar, para as ME e EPP inscritas no SIMPLES federal, o total aproveitamento dos créditos de IPI, relativamente às operações anteriores (de entrada) tributadas pelo imposto, mediante a compensação de tais créditos do IPI com o valor devido no SIMPLES.


2. Extensão e natureza constitucional do princípio da não-cumulatividade.

O Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI deve ser não-cumulativo, por força do artigo 153, §3º, inciso II, da Constituição Federal:

"§3º. O Imposto previsto no inciso IV [IPI]:

................................................

II – será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores".

De acordo com o Texto Constitucional, deve-se operar uma compensação entre o montante devido nas operações de saída (venda) e o montante cobrado nas operações de entrada (aquisições de matéria-prima, produto intermediário e material de embalagem), ou seja:

Não-cumulatividade do IPI = IPI devido nas operações de saída – IPI cobrado nas operações de entrada

Neste mesmo sentido, o artigo 49 do Código Tributário Nacional esclarece o princípio da não-cumulatividade, prescrevendo o direito do contribuinte do IPI de abater o valor do imposto pago relativamente aos produtos nele entrados, se não vejamos:

"Art. 49. O imposto é não-cumulativo, dispondo a lei de forma que o montante devido resulte da diferença a maior, em determinado período, entre o imposto referente aos produtos saídos do estabelecimento e o pago relativamente aos produtos nele entrados.

Parágrafo único. O saldo verificado, em determinado período, em favor do contribuinte, transfere-se para o período ou períodos seguintes".

Em seu clássico Direito Tributário Brasileiro, 10ª ed., Forense, Rio de Janeiro, 1987, p. 208, Aliomar Baleeiro explica, em termos econômicos, que este dispositivo do Codex Tributário manda que na base de cálculo do IPI, se deduza do valor do "output" (produto acabado), o quantum do mesmo imposto suportado pelas matérias-primas, que, como "input", o industrial empregou para fabricá-lo.

O artigo 163, do Regulamento do IPI (Decreto nº 4.544/02), auxilia o entendimento acima exposto, ao estipular que a não-cumulatividade do imposto é efetivada pelo sistema de crédito, atribuído ao contribuinte, do imposto relativo a produtos entrados no seu estabelecimento, para ser abatido do que for devido pelos produtos dele saídos, num mesmo período.

O tributarista Sacha Calmon Navarro Coelho, em seu Curso de Direito Tributário Brasileiro, 7ª ed., Forense, Rio de Janeiro, 2004, p. 361, explica a não-cumulatividade com as seguintes palavras:

O imposto pago em operações anteriores é crédito do contribuinte adquirente, que o abaterá no momento de calcular o montante do IPI a pagar (não-cumulatividade). Como, de regra, os produtos industrializados congregam diversas matérias-primas, além de outros produtos já industrializados (inputs), a não-cumulatividade caracteriza-se como técnica de deduzir do imposto devido pelo produto acabado (o output) o imposto incidente sobre os inputs, arcado pelo industrial quando da aquisição dos mesmos.

Inicialmente, deve ser destacado que o princípio em apreço não se trata de uma mera faculdade ou recomendação, mas sim uma imposição constitucional (o IPI será não-cumulativo).

Por conseguinte, lei complementar, lei ordinária, ou medida provisória NÃO podem restringir este princípio, de tal forma que o IPI se apresente cumulativo, como pretendeu o artigo 5º, §5º, da Lei nº 9.317/96, cuja redação é novamente transcrita:

"§5º. A inscrição no SIMPLES veda, para a microempresa ou a empresa de pequeno porte, a utilização ou destinação de qualquer valor a título de incentivo fiscal, bem assim a apropriação ou a transferência de créditos relativos ao IPI e ao ICMS".

A propósito, por ser um princípio constitucional tributário, a não-cumulatividade do IPI caracteriza-se como um direito fundamental do contribuinte ("de direito" – industrial; e "de fato" - consumidor).

Em vários casos, o Supremo Tribunal Federal já decretou a inconstitucionalidade de leis que restringiram ou aboliram o direito do contribuinte do IPI (e do ICMS, que também é um imposto não-cumulativo, conforme artigo 155, §2º, inciso I, da Carta Magna) de se creditar do quantum cobrado (pago) nas operações anteriores, como se depreende dos julgados abaixos:

RE 293511 AgR/RS, Relator: Min. CELSO DE MELLO; Julgamento em 11/02/2003, Segunda Turma, Publicação: DJ de 21-03-2003, p. 63.

Ementa:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO - AQUISIÇÃO DE MATÉRIAS-PRIMAS, INSUMOS E PRODUTOS INTERMEDIÁRIOS SOB REGIME DE ISENÇÃO OU DE ALÍQUOTA ZERO - DIREITO AO CREDITAMENTO DO IPI RECONHECIDO À EMPRESA CONTRIBUINTE - ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA NÃO-CUMULATIVIDADE (CF, ART. 153, § 3º, II) E DA SEPARAÇÃO DE PODERES (CF, ART. 2º) - PRETENDIDO DESRESPEITO AO ART. 150, § 6º DA CONSTITUIÇÃO - INOCORRÊNCIA - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. O Plenário do Supremo Tribunal Federal reconheceu, em favor da empresa contribuinte, a existência do direito ao creditamento do IPI, na hipótese em que a aquisição de matérias-primas, insumos e produtos intermediários tenha sido beneficiada por regime jurídico de exoneração tributária (regime de isenção ou regime de alíquota zero), inocorrendo, em qualquer desses casos, situação de ofensa ao postulado constitucional da não-cumulatividade. Precedentes.

RE nº 350446/PR, Relator Min. NELSON JOBIM, Julgamento:em 18/12/2002, Tribunal Pleno, Publicação no DJ de 06/06/2003, p. 32.

EMENTA:

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IPI. CREDITAMENTO. INSUMOS ISENTOS, SUJEITOS À ALÍQUOTA ZERO. Se o contribuinte do IPI pode creditar o valor dos insumos adquiridos sob o regime de isenção, inexiste razão para deixar de reconhecer-lhe o mesmo direito na aquisição de insumos favorecidos pela alíquota zero, pois nada extrema, na prática, as referidas figuras desonerativas, notadamente quando se trata de aplicar o princípio da não-cumulatividade. A isenção e a alíquota zero em um dos elos da cadeia produtiva desapareceriam quando da operação subseqüente, se não admitido o crédito. Recurso não conhecido.

RE Nº 161031/MG, Relator Min. MARCO AURÉLIO. Julgamento em 24/03/1997, Tribunal Pleno. Publicação no DJ de 06/06/97, p 24.881.

EMENTA

ICMS - PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE - MERCADORIA USADA - BASE DE INCIDÊNCIA MENOR - PROIBIÇÃO DE CRÉDITO - INCONSTITUCIONALIDADE. Conflita com o princípio da não- cumulatividade norma vedadora da compensação do valor recolhido na operação anterior. O fato de ter-se a diminuição valorativa da base de incidência não autoriza, sob o ângulo constitucional, tal proibição. Os preceitos das alíneas "a" e "b" do inciso II do § 2º do artigo 155 da Constituição Federal somente têm pertinência em caso de isenção ou não-incidência, no que voltadas à totalidade do tributo, institutos inconfundíveis com o benefício fiscal em questão.

RE nº 240395AgR/RS, Relator Min. MAURÍCIO CORRÊA, Julgamento em 28/05/2002. Segunda Turma, Publicação no DJ de –02/08/2002, p. 101.

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. LEI ESTADUAL. REDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. BENEFÍCIO FISCAL. CRÉDITO. VEDAÇÃO. PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE. OBSERVÂNCIA. Lei estadual. Benefício fiscal outorgado ao contribuinte. Crédito decorrente da redução da base de cálculo do tributo. Vedação. Impossibilidade. A Constituição Federal somente não admite o lançamento do crédito nas hipóteses de isenção ou não-incidência. Precedente do Tribunal Pleno. Agravo regimental não provido.

RE nº 161.031/MG, Relator Min. MARCO AURÉLIO, Julgamento em 24/03/1997, Tribunal Pleno, Publicação no DJ de-06/06/97, p. 24.881.

Ementa:

ICMS - PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE - MERCADORIA USADA - BASE DE INCIDÊNCIA MENOR - PROIBIÇÃO DE CRÉDITO - INCONSTITUCIONALIDADE. Conflita com o princípio da não- cumulatividade norma vedadora da compensação do valor recolhido na operação anterior. O fato de ter-se a diminuição valorativa da base de incidência não autoriza, sob o ângulo constitucional, tal proibição. Os preceitos das alíneas "a" e "b" do inciso II do § 2º do artigo 155 da Constituição Federal somente têm pertinência em caso de isenção ou não-incidência, no que voltadas à totalidade do tributo, institutos inconfundíveis com o benefício fiscal em questão.

Consoante posicionamento pacificado no Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição Federal, conflita com o princípio da não-cumulatividade do IPI qualquer norma que vede ou restrinja a compensação do valor cobrado (pago) na operação anterior. É o que está lamentavelmente ocorrendo no caso em tela, em virtude do que estatui o artigo 5º, §5º, da Lei do SIMPLES Federal.

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Realmente, a própria Lei Maior cuidou de especificar as únicas hipóteses nas quais o crédito ficaria a critério da legislação estadual, atenuando o princípio da não-cumulatividade. Trata-se do artigo 155, §2º, inciso II, que se refere exclusivamente ao ICMS, portanto, sem aplicação no presente processo.

Aliás, o artigo 155, §2º, II, da Carta Maior apenas corrobora o entendimento do STF, no sentido de vedar a restrição ao crédito decorrente da não-cumulatividade, pois a Lei Maior expressamente definiu as únicas duas hipóteses em poderia haver a cumulatividade do ICMS (sem precedente para o IPI):

Art. 155..........................

............................................

§2º. O imposto previsto no inciso II [ICMS] ATENDERÁ O SEGUINTE:

I – omissis

II – a isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação:

a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes;

b) acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores.

Por outro lado, conforme consagrado pela jurisprudência pátria, o direito ao crédito do IPI persiste mesmo quando a operação de saída for isenta ou tributada pela alíquota zero. Aliás, após derrota judicial em diversos processos, esse direito foi legalmente reconhecido pelo artigo 11, da Lei nº 9.779, de 19/01/1999, cuja redação segue:

Art. 11. O saldo credor do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, acumulado em cada trimestre-calendário, decorrente de aquisição de matéria-prima, produto intermediário e material de embalagem, aplicados na industrialização, inclusive de produto isento ou tributado à alíquota zero, que o contribuinte não puder compensar com o IPI devido na saída de outros produtos, poderá ser utilizado de conformidade com o disposto nos arts. 73 e 74 da Lei nº 9.430, de 1996, observadas normas expedidas pela Secretaria da receita Federal – SRF, do Ministério da Fazenda.

Ora, se o crédito é admitido pela Receita Federal na hipótese de saída isenta ou sujeita à alíquota zero, com muito mais razão deve ser mantido o crédito do IPI, quando a operação de saída for tributada, como ocorre com as ME e EPP inscritas no SIMPLES (a saída é tributada com alíquota de 0,5% sobre receita bruta, nos termos do artigo 5º, §2º, da Lei nº 9.317/96).

Logo, mais razão ainda assiste às micro e pequenas empresas optantes pelo SIMPLES e contribuintes do IPI, consoante decisões da Corte Suprema, que admitem o crédito do IPI, até mesmo quando as operações de entrada estão amparadas pela isenção ou alíquota zero.

No regime tributário do SIMPLES (artigo 5º, da Lei nº 9.317/96), percebe-se que o contribuinte sofre a tributação normal do imposto nas operações de entrada e, ainda por cima, tem que recolher o IPI no importe de 0,5% sobre sua receita bruta. Em outras palavras, ambas operações (de entrada e de saída) são tributadas pelo imposto.

Neste diapasão, a carga tributária do IPI, para um contribuinte do IPI corresponde à soma cumulativa do IPI devido nas operações anteriores mais 0,5% das operações de saída (receita bruta da empresa), cuja fórmula pode ser assim representada:

IPI/SIMPLES = IPI cobrado nas operações de entrada + IPI devido nas operações de saída (equivalente a 0,5% sobre receita bruta)

Portanto, no regime legal do SIMPLES, o IPI torna-se inegavelmente cumulativo: incide nas operações de entrada e, depois, nas saídas, sem qualquer abatimento do valor pago (cobrado) nas operações anteriores, pois o artigo 5º, §5º, da Lei nº 9.317/96 veda este creditamento.

Acontece que o sistema tributário nacional não permite a cumulatividade do IPI, conforme entendimento da própria Suprema Corte. A propósito, a Constituição Federal não prevê, para o IPI, nenhum exceção ao princípio da não-cumulatividade, diferentemente do que ocorre com o ICMS (artigo 155, §2º, inciso II, da Constituição).

Destarte, é inconstitucional e ilegal o artigo 5º, §5º, da Lei nº 9.317/96, na medida em que veda a utilização de créditos relativos ao IPI, aniquilando o princípio constitucional tributário da não-cumulatividade.


3. Conclusões.

Pelo princípio da não-cumulatividade, a Constituição Federal impõe o creditamento do IPI cobrado nas operações anteriores, sem prever qualquer exceção quanto ao imposto federal.

Assim, é inconstitucional o artigo 5º, §5º, da Lei do SIMPLES federal (Lei nº 9.317/96), que veda às ME e EPP que sejam contribuintes do IPI e inscritas no regime tributário privilegiado o aproveitamento de tais créditos conferidos constitucionalmente, uma vez que torna flagrantemente cumulativo o IPI, em total desrespeito ao Texto Constitucional.

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Sobre o autor
Omar Augusto Leite Melo

advogado em Bauru (SP), pós-graduando em Direito Tributário pelo Centro de Extensão Universitária

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MELO, Omar Augusto Leite. Creditamento do IPI pelas indústrias optantes pelo Simples federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 675, 11 mai. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6709. Acesso em: 23 dez. 2024.

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