6. CONCLUSÃO
Diante do quanto exposto, percebe-se que a discussão e divergências ocorrem em torno do princípio da Presunção de Inocência, e se esse princípio elencado no artigo art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal veda ou não o início de cumprimento de pena após a decisão de segunda instância mantendo a condenação de acusado na esfera penal, ainda que haja recursos aos Tribunais Superiores pendentes de julgamento.
Com todo respeito aos nobres Ministros da Suprema Corte que usaram das mais distintas razões e argumentos para justificar seus posicionamentos a favor da execução provisória da pena antes da final decretação de culpa do acusado, com citações até mesmo de legislações estrangeiras em seus votos, não é crível concordar com tais posicionamentos, pois estamos em um país onde o ordenamento jurídico é positivo, ou seja, amparado por leis aprovadas por rigorosos critérios legislativos, e em consonância aos ditames da Constituição Federal, que rege todo esse ordenamento.
Transgredir ou usar de interpretações que dão, sem dúvida, entendimentos diversos daqueles que estão expressos nos textos das leis, é andar na contramão da justiça, trazendo inseguranças e desrespeitos aos mais básicos direitos do cidadão, que não pode confiar na própria lei, ficando a mercê dos entendimentos do Tribunal Final, que, simplesmente “legislará” através de suas jurisprudências em contrário a uma norma que, como dito anteriormente, passou por rigorosos debates e discussões para serem aprovadas pelo Congresso Nacional.
O inciso da Constituição Federal ora debatido é expresso em mencionar que ninguém é considerado culpado até decisão definitiva, e nesse contexto combina-se com o artigo 283 do Código de Processo Penal, atualmente em vigor no ordenamento jurídico brasileiro. Não observá-los é no mínimo desrespeitar o devido processo legal e ampla defesa, que engloba todas as fases do processo, inclusive a de recursos especial e extraordinário.
A despeito dos entendimentos dos ilustres Ministros do Supremo Tribunal Federal que entendem pela legalidade e necessidade da prisão após o julgamento em segunda instância, fato é que não se pode a pretexto de “fazer justiça” ignorar o quanto determina o ordenamento jurídico, que além de provocar insegurança jurídica viola direitos e garantias individuais tanto difundido nos tratados internacionais que inclusive o Brasil é signatário, dentre eles a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, que em seu artigo 11[17], declara a não culpabilidade antes do julgamento definitivo.
Não se pode aceitar o argumento de que o efetivo cumprimento da lei ou os fins que se destina o processo penal é extremamente prejudicado pelo excesso de recursos procrastinatórios levando a ineficácia do cumprimento da Lei Penal e permitindo recursos intermináveis, para amparar uma clara transgressão à Lei Maior e à normal em vigor. Como bem dito pelo Jurista José Afonso da Silva “...a ineficiência do sistema não é culpa do cidadão... Reforme-se o sistema de recursos”, e continuou, “...buscando meios de acelerar os julgamentos criminais e não desvirtuando direitos fundamentos.”
Tampouco não se pode, a pretexto de fazer uma “Justiça Social”, movida pelo clamor populacional ou por juízos pessoais de valores em busca de punições, que o Tribunal se declare combatente das injustiças (que não é sua função), determinando que alguém seja excluído do meio social sem esgotar todos os meios para a confirmação definitiva de sua culpa, destroçando princípios básicos de direitos humanos e garantias democráticas constitucionais.
Oportuno observar a Excelente a colocação do advogado penalista, Douglas Rodrigues da Silva[18] em publicação pelo site Justificando a respeito da decisão do Supremo Tribunal. Resumiu o entendimento da seguinte forma:
“Como se vê, portanto, o que se tem hoje, no seio da Suprema Corte, é um movimento populista de afastamento da lei para fins próprios e ideológicos, em completo desrespeito à própria função do judiciário dentro do sistema de repartição dos poderes (...)”.
“(...) Ora, o ativismo judicial pode até ser bom, desde que lhe seja favorável, mas e quando ele deixar de ser? A quem recorrerá? Admitindo-se hoje o ativismo para nos favorecer, admitiremos, no futuro, o ativismo que nos prejudica – aí já não teremos mais o direito de reclamar”.
Pertinente também asseverar que a proibição da execução provisória da pena não impede que haja prisões no curso do processo para aqueles que continuam cometendo crimes ou embaraçando a persecução penal de qualquer forma, para isso a lei prevê a possibilidade do cerceamento da liberdade de forma extremamente legal. O que não se pode admitir é início do cumprimento de pena sem estar o acusado com um decreto final de sua culpa, transgredindo assim o Estado Democrático de Direito adotado pelo Brasil.
Que há, atualmente, um problema com condenados que ainda não estão cumprindo penas, não se nega. Porém, não é usando interpretações subjetivas da norma, como um “tapa buracos”, que irão resolvê-los. Se realmente querem solucionar tais disfunções, que seja pelo meio legal, pelo legislativo. Se este é ruim?? Que se eleja bons representantes, que lutem por uma reforma legislativa. O que não se pode, e que é totalmente inadmissível, são interpretações errôneas ou em nome da justiça social que se ignore a Constituição Federal e Leis que obedeceram todos os trâmites legais para serem aprovadas, substituindo-as por jurisprudências baseadas no entendimento pessoal e interpretativo dos membros de um órgão que não tem a competência para legislar, mas sim, que tem como função precípua a guarda da Constituição Federal.
REFERENCIAS:
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