O direito à vida do nascituro e a dignidade da gestante

01/07/2018 às 22:47
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Direito à vida e a Dignidade Humana são princípios constitucionais que devem ser observados em equilíbrio, para que não deturpe o direito à vida bem como os direitos da mulher.

O Direito a vida para fim de proteção jurídica consiste no direito de todos os seres humanos viverem, traduzindo assim na própria existência corporal e fisiológica do ser humano, devendo se afastar a concepção moral, social, política, religiosa ou racial acerca da vida humana.

 Existe, pois, uma diferença entre a dignidade da pessoa humana e o direito à vida, onde um não se pode confundir com o outro, em um lado o direito à vida possui um caráter uno de garantia fundamental, enquanto que a dignidade da pessoa humana é, além de uma garantia fundamental, um valor-fonte que conforma e inspira todo o ordenamento constitucional, sendo assim um dos requisitos para o direito a vida, é que a tenha com dignidade.

Observa-se que a dignidade humana é um fundamento do estado democrático de direito, sendo assim, é esse princípio que dará fundamentação aos demais princípios, portanto, como fonte dos demais princípios, os demais princípios/direitos não podem o ferir.

A vida é assegurada a qualquer pessoa natural, e a proteção consiste do seu início até seu fim, um dos pontos que tem absorvido bastante discussão é sobre quando se inicia a vida? É inegável a controvérsia existente acerca do início da vida, entretanto existem algumas teorias que aduzem o momento do início da vida:  a) A partir da concepção; b) a partir do início da vida viável, ou seja, quando o embrião consegue viver fora do útero; c) com a formação do sistema nervoso central. Atualmente nosso novel Penal tem utilizado a Teoria da Nidação, na qual afirma ter seu início com a fixação do embrião na parede uterina.

A medicina diz que o fim da vida se caracteriza pelo fim total de sua atividade cerebral, ou seja, um indivíduo é considerado morto com o fim da sua atividade cerebral, dessa forma, por analogia, o início da vida se dá ao feto quando se inicia a atividade cerebral e neste sentido é que se observa que a teoria que acredita que o início da vida se dá pelo desenvolvimento do sistema nervoso central é o mais lógico a se acreditar.

O CFM (Conselho Federal de Medicina), se posiciona dizendo que o aborto deve ser descriminalizado, além do aborto necessário e aborto de gravidez em caso de estupro, deve haver uma alteração legislativa para que também seja permitido o aborto nos casos em que comprovada a anencefalia ou quando o feto padecer de graves e incuráveis anomalias que inviabilizem a vida independente, em ambos os casos atestado por dois médicos; e por vontade da gestante até a 12º semana de gestação, pois após esse momento o feto já estará desenvolvendo o sistema nervoso central, além domais, a partir daí o risco de vida a gestante é maior. Dessa forma o CFM resguarda a dignidade da pessoa humana da gestante bem como o direito à vida do feto, e novamente, de maneira tácita, demonstra sobre o início da vida.

Frente ao posicionamento da Medicina tecnicamente falando podemos questionar se não seria o direito evolutivo ao ponto de reconhecer tal posicionamento resguardando a dignidade da mulher bem como sua integridade física e psíquica.

Observa-se que a dignidade da pessoa humana é um princípio que se encontra amplamente presente em decisões judiciais, sobretudo no âmbito das jurisprudências do Supremo Tribunal Federal, pois este princípio tem atuado como critério de interpretação e aplicação do direito. (HC 94163, rel. Min. Carlos Britto, j. 02-12-2008).

Analisando, também, a tutela estatal acerca do direito a vida do feto o Ilustríssimo ministro Luís Alberto Barroso dispõe em julgamento de HC :

De outro lado, também se verificou que a criminalização do aborto promove um grau reduzido (se algum) de proteção dos direitos do feto, uma vez que não tem sido capaz de reduzir o índice de abortos. É preciso reconhecer, porém, que o peso concreto do direito à vida do nascituro varia de acordo com o estágio de seu desenvolvimento na gestação. O grau de proteção constitucional ao feto é, assim, ampliado na medida em que a gestação avança e que o feto adquire viabilidade extrauterina, adquirindo progressivamente maior peso concreto. Sopesando-se os custos e benefícios da criminalização, torna-se evidente a ilegitimidade constitucional da tipificação penal da interrupção voluntária da gestação, por violar os direitos fundamentais das mulheres e gerar custos sociais (e.g., problema de saúde pública e mortes) muito superiores aos benefícios da criminalização. (hc barrso)

A dignidade humana é um fundamento do estado democrático de direito, sendo assim, é esse princípio que dará fundamentação aos demais princípios, portanto, como fonte dos demais princípios, e os demais princípios/direitos não podem o ferir. O crime de aborto, nessa visão poderá ferir, o princípio da dignidade da pessoa humana da mulher, sob a perspectiva do direito à vida do embrião.

Novelino (2017) enumera alguns direitos fundamentais da mulher que são atingidos com a criminalização do aborto: a) a autonomia reprodutiva da mulher, e sua liberdade de escolha, bem como a dignidade da pessoa humana, que confere ao indivíduo uma capacidade de autodeterminação sem a interferência do Estado; b) o direito a igualdade de gêneros, pois a criminalização do aborto causa um impacto desproporcional nas mulheres em relação aos homens; c) o direito à privacidade que deveria ser amplo e suficiente para compreender o direito da mulher de interromper ou não sua gravidez.

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Dessa forma temos que a ninguém pode ser imposta pena ofensiva à dignidade da pessoa humana, vedando-se reprimenda indigna, cruel, desumana ou degradante. Este mandamento guia o Estado na criação, aplicação e execução das leis penais. (Sanches p. 97)

O Direito Penal, é praticado em obediência ao Direito Constitucional, sendo assim, conforme evolui a sociedade, a adaptação da interpretação constitucional, também deve recair sobre o Direito penal.

Conclui-se assim seguindo a premissa de que a descriminalização no aborto até a 12ª semana de gestação teria como base de sustentação o direito constitucional inserido no artigo 226, § 7º, do princípio da intervenção mínima do estado, e ainda para resguardar os direitos fundamentais da mulher como o direito a integridade física e psíquica, e o basilar princípio da dignidade da pessoa humana, não feriando a vida intrauterina e nem tão pouco aos direitos da mulher.

Insta observar que o abortamento não deve ser visto como forma anticoncepcional, ao Estado cabe a efetivação de Políticas Públicas, em especial a mulheres de baixa renda onde é observado maior índice de abortos clandestinos aos quais aumentam substancialmente o número de mortes entre mulheres.

Infelizmente o aborto é um fato que não vai deixar de ser realizado por quem já tomou a decisão de seguir em frente com o procedimento.

Bibliografia

Capez, FERNANDO, Curso de Direito Penal, volume 1, Parte Geral: (arts. 1º a 120) / Fernando Capez. — 15. ed. — São Paulo: Saraiva, 2011

Mendes, GILMAR FERREIRA, Curso De Direito Constitucional / Gilmar Ferreira Mendes, Paulo Gustavo Gonet Branco. – 12. ed. rev. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2017. – (Série IDP)

Novelino, MARCELO. Curso De Direito Constitucional/ Marcelo Novelino. - 12 ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017 p. 329)

Sanches, ROGÉRIO, Curso de Direito Penal, Ed. JusPodivm, 2015

Sarlet, INGO WOLFGANG, Curso De Direito Constitucional / Ingo Wolfgang Sarlet, Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero. – 6. ed. – São Paulo : Saraiva, 2017.

(https://portal.cfm.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=23663:cfm-esclarece-posicao-a-favor-da-autonomia-da-mulher-no-caso-de-interrupcao-da-gestacao&catid=3)

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Sobre a autora
Ana Paula Araújo Moura

PROFESSORA DE DIREITO PENAL E PROCESSO PENAL

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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