Fui preso! E agora?

18/07/2018 às 15:42
Leia nesta página:

Neste artigo tento demonstrar as possíveis situações encontradas por uma pessoa que é presa em flagrante delito, os crimes que cabem prisão em flagrante, o que o juiz pode fazer ao receber o Auto de Prisão em Flagrante e demais análises acerca da prisão.

Bem, caro leitor. Caso você já tenha vivido esse momento delicado ou conhece alguém que já passou pela mesma situação, venha junto comigo desmitificar um pouco a ideia de prisão e se todo tipo de prisão põe em risco a liberdade de locomoção do cidadão.

O nosso ordenamento jurídico em seu artigo 5º, inciso LXI da CR/88, diz o seguinte:

“ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei.”

O Código de Processo Penal complementa a ideia de prisão em flagrante no artigo 301, vejamos:

“Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.”

O que podemos perceber na leitura desses 02 (dois) artigos? Que diferente do que muitos pensam, qualquer cidadão pode dar voz de prisão em flagrante para aquele que está a cometer um ilícito penal. Esta faculdade não é imposta apenas as autoridades policiais.

E é qualquer tipo de crime que cabe prisão em flagrante? Não.

Pois bem!

A lei 9.099/95, trata-se da regulamentação dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Como estamos a falar da matéria penal, vamos apenas nos atentar ao que a lei nos traz de importante para o nosso assunto.

No artigo 60 da lei mencionada, temos a seguinte redação:

“O Juizado Especial Criminal, provido por juízes togados ou togados e leigos, tem competência para a conciliação, o julgamento e a execução das infrações penais de menor potencial ofensivo, respeitadas as regras de conexão e continência.”

Crimes de menor potencial ofensivo. Quais crimes são esses?

São aqueles cuja pena máxima seja superior a 02 (dois) anos, artigo 61 da Lei 9.099/95.

“Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa.”

E no tocante as contravenções penais, pode haver prisão em flagrante? A resposta também é negativa.

Como posso ter a certeza de tudo isso? A Lei 9.099/95 é bastante clara ao dispor no parágrafo único do artigo 69. Olha só:

“Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança...

Ah... nada de dar uma de “nervosinho” em frente da Autoridade Policial, negando a assinar o TCO (Termo Circunstanciado de Ocorrência), pois nesse caso, poderá haver prisão em flagrante.

Então, neste primeiro momento já podemos concluir o seguinte:

Fui preso e o ilícito penal praticado foi uma contravenção penal ou um crime cuja pena máxima não seja superior a 02 (dois) anos, a Autoridade Policial não pode manter o cidadão custodiado na delegacia de polícia. Deve ouvi-lo e liberá-lo.

O mesmo serve para o usuário de drogas, aquele que utiliza da substância para consumo pessoal, sem objetivo de lucro ou compartilhamento.

Sim, Gabriel. E se eu for capturado e conduzido para a delegacia de polícia por praticar um crime cuja pena máxima seja superior aos 02 (dois) anos, como que fica a minha situação?

Vamos nessa! Nesse caso, a lei tende a ser mais rigorosa, porém, ainda há esperança! Primeiro deve-se verificar se o indivíduo foi preso em uma situação de flagrante delito. E como sabemos disso? Vamos de novo buscar auxílio ao nosso Código de Processo Penal:

“Art. 302.  Considera-se em flagrante delito quem:

I - está cometendo a infração penal;

II - acaba de cometê-la;

III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração;

IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.

Havendo cumprido tais exigências, a Autoridade Policial irá lavrar o Auto de Prisão em Flagrante (APF).

O APF nada mais é do que um documento com todas as informações obtidas da prisão em flagrante. Fazendo constar: apresentação do conduzido, a oitiva do condutor, das testemunhas, vítima, interrogatório do conduzido, demais termos, laudos, relatório e assinaturas, competindo, ao final, à Autoridade Policial, sua lavratura.

Não podemos esquecer das garantias constitucionais que devem ser observadas pelo Delegado(a) de polícia e todos os seus subordinados ao capturado, tais como: comunicação da sua prisão aos seus familiares e advogado, o direito de permanecer calado, de não se incriminar, de ser assistido por um defensor caso tenha algum, de não ser torturado, saber os motivos pelos quais está sendo preso, entre outros.

Qualquer irregularidade no procedimento ou havendo ilegalidade ao entendimento de prisão em flagrante constante no artigo 302 do Código de Processo Penal, enseja ao indiciado o direito de ter sua prisão relaxada e consequentemente ser posto em liberdade.

“Art. 5º, LXV, da CRF/88 - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária.”

E se minha prisão não foi ilegal, nem sequer uma contravenção penal ou crime de menor potencial ofensivo, mesmo assim vou continuar preso? DEPENDE!

Sabemos que a liberdade deve ser a regra e a prisão a exceção. Porém, devemos observar caso a caso.

Em 24 horas após a captura do conduzido, a Autoridade Policial deverá terminar/lavrar o APF e encaminhar imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada. pós a realização da prisão, se o ato não tiver sido acompanhado por advogado ou caso o autuado não indique o seu defensor, cópia integral do APF será encaminhada à Defensoria Pública.

Se o crime for afiançável, e desde que a pena privativa de liberdade máxima, do crime praticado, não seja superior a 04 (quatro) anos, o Delegado de Polícia poderá arbitrar fiança, artigo 322 do Código de Processo Penal (CPP). Se paga, o preso será colocado imediatamente em liberdade.

No mesmo prazo, será entregue ao preso, a nota de culpa, assinada pela autoridade, com o motivo da prisão, o nome do(s) condutor(es) e os das testemunhas. Também em 24 (vinte e quatro) horas, o APF será encaminhado ao juiz competente, que poderá adotar os seguintes procedimentos do artigo 310 do CPP. Vejamos:

“I - relaxar a prisão ilegal;

II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão;

III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.

É muito difícil precisar o que acontecerá com o conduzido após a sua prisão em flagrante. Não tem como saber se será imediatamente posto em liberdade ou se terá que que aguardar o cumprimento dos requisitos exigidos em lei.

Após a lavratura do APF e o seu encaminhamento ao juiz criminal, inexistindo fiança a ser arbitrada pela Autoridade Policial, o futuro do agora indiciado vai está nas mãos de um magistrado e este, poderá aplicar algumas das medidas do artigo anterior.

Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23, quer sejam, legítima defesa, estado de necessidade, cumprimento do dever legal ou exercício regular do direito, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação.

Sobre o relaxamento de prisão, já expliquei anteriormente o seu cabimento.

Converter a prisão em preventiva é uma situação excepcional. É em prol de um bem maior que se restringe a liberdade de locomoção do indiciado. A decretação da prisão preventiva se torna necessária nas seguintes hipóteses: à garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. Ou seja, basta existirem os requisitos do artigo 312 do CPP.

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A prisão preventiva só será imposta quando o cerceamento da liberdade for realmente necessário. Caso contrário, o indivíduo pode receber uma das medidas cautelares previstas nos artigos 319/320 do CPP, a prisão não poderá ser imposta.

Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;

II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;

III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante;

IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;

V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;

VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais;

VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;

VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;

IX - monitoração eletrônica.

Lembrando que a prisão preventiva não tem prazo, e pode ser mantida enquanto houver motivo para a sua manutenção.

Com o advento da Lei 12.403/11, a decretação da prisão preventiva ficou reservada a casos excepcionalíssimos. No art. 313 do CPP, há um rol taxativo de hipóteses em que ela é permitida. Jamais haverá a decretação de preventiva se demonstrado que o crime se deu em hipótese de exclusão da ilicitude (CP, art. 23).

Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva:

I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos;

II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal;

III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência;

IV - (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).

Parágrafo único. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.

Por fim, não sendo hipóteses de relaxamento de prisão e nem de prisão preventiva, o Magistrado poderá conceder liberdade provisória ao indiciado para que futuramente, havendo uma ação penal, o agora réu possa responder ao processo em liberdade.

Bem, galera, espero ter sido didático e de alguma forma ter ajudado vocês que tem dúvida acerca do que vai ou pode acontecer quando alguém está preso ou na iminência de ser.

Claro que o procedimento é extenso, existem outras variáveis, mas acredito que o básico foi possível oferecer.

Um grande abraço a todos!

Referências Bibliográficas:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9099.htm - Acesso em 03 de julho de 2018

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689.htm - Acesso em 03 de julho de 2018

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm - Acesso em 03 de julho de 2018

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Sobre o autor
Gabriel Mascarenhas

Gabriel Mascarenhas Carvalho, Advogado, pós-graduado em direito penal e processual penal. Atuação com o direito criminal, cível, consumidor e previdenciário.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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