Arbitragem de investimento e o cálculo do dano indenizável

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18/07/2018 às 18:30
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4. COMPENSAÇÃO E/OU DANO?

Os conceitos de "compensação" e "danos" podem ser diferentes nas normas legais nacionais e internacionais aplicáveis ​​em litígios internacionais de investimento. Os danos são tradicionalmente entendidos como um recurso legal disponível para assegurar um ato ilegal, incluindo atos antagônicos ao direito internacional (WHITEMAN, 1937). Os danos remetem o "dever de pagar pelas consequências prejudiciais que a vítima sofreu em decorrência de um ato ilícito" (WALDE; SABAHI, 2007). O termo "compensação" havia sido utilizado anteriormente no Direito Internacional para se referir às conseqüências do exercício legal pelos Estados de seus direitos soberanos, especificamente o de expropriar propriedade estrangeira (AMERASINGHE,1992).

Uma severa distinção entre compensação e danos se torna uma missão complexa, pois podemos encontrar diferenças entre os termos legais em razão de dialetos diferentes, sistemas jurídicos diferentes e até mesmo tradições históricas trazem abordagens diferentes. Os mesmos costumam ser usados também como sinônimos e para explicar a terminologia mutuamente. Empenharemos neste trabalho em tentar distinguir a função entre Compensação e Danos, pois com relação ao cálculo as diferentes finalidades dos recursos legais no direito do investimento se afigura necessário. Assim no contexto da expropriação relacionaremos a compensação com o exercício legítimo da soberania de um Estado, um montante em que o Estado deve pagar em caso de expropriação, e o montante devido após uma violação de uma obrigação legal será referido como “dano"(WHITEMAN, 1937-1946). Assim, o critério de cálculo dos danos será diferente.

A função de compensação e danos é definida pelas normas legais aplicáveis. A obrigação de pagar uma indenização por danos pode basear-se nas diferentes reivindicações legais. No Direito Internacional do Investimento, geralmente podem ser identificadas três causas de ação: expropriação, violação do direito internacional e violação de contratos.15

A análise a seguir identificará a função do dano que é o objeto deste estudo no contexto de litígios internacionais de investimento e servirá de base para o desenvolvimento de critérios para o cálculo de indenizações e danos por tribunais internacionais de investimento.


5. AS FUNÇÕES DO DANO

5.1. A Função do Dano

Reparação

O pedido de indenização tem como principal missão a reparação do dano causado por um ato ilícito na maior parte dos sistemas jurídicos nacionais.

O ideal do pagamento de uma quantia em dinheiro, seria ressarcir a parte lesada de tal forma em que ela se encontrasse em um estado tal, como se o ato prejudicial não houvesse ocorrido, mas sem gerar enriquecimento da parte lesada e por esta razão são impostas limitações à concessão de indenizações.

Violações do Direito Internacional.

Nos termos do artigo 31 da Comissão de Direitos Internacionais, o Estado responsável é obrigado a "reparar integralmente o prejuízo causado pelo acto ilícito”. O prejuízo neste contexto denota qualquer dano causado pelo ato internacionalmente ilícito (Art. 31 (2) na parte dos Artigos sobre a responsabilidade dos Estados por atos Internacionalmente Ilícitos da CDI.)

De acordo com o artigo 36 da CDI, o Estado é obrigado a reparar qualquer dano, desde que não seja feito por restituição. O cálculo deve obedecer a critérios meramente compensatórios, pois deve-se atentar cuidadosamente para que não ocorra o enriquecimento da pessoa lesada(SCHWARZENBERGER, 1957). Argumenta-se que o custo de uma violação de uma obrigação pode ser apreciado antecipadamente através do cálculo dos prejuízos com base apenas em critérios de compensação.

Quebras de Contrato

Em caso de incumprimento do contrato, a menos que seja concedida uma execução específica, os requerentes são indenizados por uma indenização que visa colocá-los na mesma situação pecuniária em que teriam estado se o contrato tivesse sido executado. Há uma busca que objetiva a indenização para remediar o prejuízo financeiro que foi causado pela violação do contrato.

O Tribunal do CIRDI no processo Amco Asia contra Indonésia procedeu a uma análise comparativa do direito nacional dos contratos e das iniciativas de codificação internacionais que reforçam essa ideia.16 A jurisprudência dos EUA também perseguiu o objetivo de deixar a parte em uma situação como se o contrato tivesse sido executado.

O artigo 74 da Convenção sobre Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias (CISG) dispõe:

“Os danos por quebra de contrato por uma das partes consistem num montante igual ao prejuízo, incluindo o lucro cessante, sofrido pela outra parte em consequência da violação. Esses danos não podem exceder ao valor do prejuízo que a parte em infração causou ou possa ter causado em relação ao futuro (…)”17

O Artigo 7.4.2 do UNIDROIT também enfatiza os princípios da plena reparação e o mesmo vale para o Artigo 9: 502 dos Princípios do Direito Europeu dos Contratos.

Porém, não serão concedidos danos que não sejam previsíveis ou que sejam demasiado remotos. Como afirmado por Edward Hall Alderson no famoso caso de Hadley contra Baxendale:18

"Se duas partes tiverem celebrado um contrato que um deles tenha quebrado, os danos que a outra parte deve receber em relação a tal quebra de contrato devem ser tais que possam consideravelmente e razoavelmente serem considerados originários naturalmente, isto é, de acordo com o curso normal das coisas, a partir de tal quebra de contrato próprio, ou que possa razoavelmente ser suposto ter sido na contemplação de ambas as partes, no momento em que eles fizeram o contrato, como o provável resultado da violação do mesmo”.

Entre os danos diretos que podem ser recuperados e os danos remotos, imprevisíveis ou especulativos, que não podem, deve existir uma observância meticulosa.

Por conseguinte, pode concluir-se que a função de indenização em processos contratuais é também a reparação integral dos danos reais e concretos sofridos. Por conseguinte, de acordo com a opinião geral, o objeto da indenização consiste em colocar a parte a quem é concedida, na mesma situação pecuniária que ela estaria se o contrato tivesse sido executado da forma prevista pelas partes no momento da conclusão.19

(b) Punição

Às vezes têm-se a visão de que a função da reparação dos danos não é somente a reparação do dano causado, mas também uma forma de punição do perpetrador. No entanto, na maioria dos países o conceito de "danos punitivos" não é aceite. Porém a nível acadêmico, devido à ausência de sanções penais no direito internacional público a aceitação de danos punitivos tem sido algumas vezes considerada.

A prática internacional20 não apóia as respectivas considerações, a Lei de Responsabilidade do Estado adota como parte da obrigação de reparação integral o conceito de “satisfação.”

Já houveram concessões de indenizações superiores aos danos efetivamente sofridos pelos tribunais internacionais, mas como compensação por danos imateriais e não sendo considerados como danos punitivos ( MARBOE, 2012).


6. AVALIAÇÃO

Ao se falar de avaliação voltada para arbitragem de investimento, se faz necessário entender que essa não é uma ciência exata, logo, essa pode conter incertezas e imprecisões no exercício do julgamento, podendo obter como resultado, na maioria das vezes, resultados por aproximação, aumentando a responsabilidade dos tribunais internacionais.

6.1. Avaliação Objetiva ou Abstrata

Na avaliação objetiva ou abstrata, o Estado que expropriou substitui o “valor” do objeto expropriado sem a precaução ou o compromisso de ressarcir adequadamente o prejuízo financeiro real sofrido pelo indivíduo, assim a avaliação objetiva ou abstrata pode levar a um montante de indenização inferior ao prejuízo real sofrido pelo proprietário expropriado. No entanto, este é aceite como um compromisso no direito internacional público.

O valor objectivo pode servir de ponto de partida para a apreciação dos danos, uma vez que representa, à primeira vista, a perda dos danos efetivamente incorridos.21

6.2. Avaliação Subjetiva ou Concreta

A PCJI explicou os princípios de cálculo em caso de violação do direito internacional em Factory at Chorzów da seguinte maneira:

“O princípio essencial do conceito de acção de um acto ilegal - um princípio que parece ser estabelecido pela prática internacional e, em particular, pelas decisões dos tribunais arbitrais - é que a reparação deve, na medida do possível, eliminar todas as consequências do acto ilegal e restabelecer a situação que, com toda a probabilidade, teria existido se esse acto não tivesse sido cometido. Restituição em espécie ou, se tal não for possível, o pagamento de uma quantia correspondente ao valor de uma restituição em espécie; uma indenização, se preciso for, dos danos e perdas sofridas que não sejam cobertos pela restituição em espécie ou pelo pagamento em seu lugar - são os princípios que devem servir para determinar o montante da indemnização devida por um acto contrário ao direito internacional”.22

A avaliação subjetiva ou concreta, se preocupa em colocar o investidor lesado em uma posição hipotética como se o ato prejudicial nunca houvesse ocorrido, na tentativa de antever a situação financeira do indivíduo com toda a probabilidade no caso da ausência do ilícito. Para que seja uma avaliação adequada é necessário comparar a situação hipotética com a situação real do indivíduo, sem deixar de levar em conta certas condições necessárias para que essa reparação seja limitada ao ponto de não gerar enriquecimento improcedente da parte lesada.

Pode ocorrer situações em que o ato ilícito possa ter causado uma melhoria na situação financeira da vítima, e nesse caso, contrariando uma avaliação objetiva ou abstrata, esse aumento deve ser levado em consideração em que através de uma avaliação subjetiva ou concreta ocorreria uma diminuição no montante prevenindo o enriquecimento injusto. Esta é a consequência do princípio da plena reparação no seu efeito limitador.

Os artigos da CDI sobre a responsabilidade do Estado referem-se à importância dos danos concretos incorridos dizendo que embora a obrigação de restituição permaneça intacta, o pedido de indemnização nos termos do artigo 36 (1) refere-se ao dano causado pelo ato, "na medida em que esse dano não é compensado pela restituição". O parágrafo (2) acrescenta que isso também inclui "perda de lucros na medida em que é estabelecida" ( MARBOE, 2012).

Nos casos de danos resultantes de violações do contrato, o princípio da plena reparação tem de ser respeitado para que a pessoa lesada seja colocada na posição em que teria estado, se o contrato tivesse sido devidamente executado, a posição do objeto em relação a seus outros ativos deve ser levada em conta, bem como suas necessidades individuais, planos e competências.

A professora Irmgard Marboe com relação à avaliação subjectiva diz que:

“A avaliação subjetivapor uma questão de princípio, exige métodos que reflictam a perda concreta sofrida pela pessoa em causa. Além disso, e não necessariamente ligado a qualquer método de avaliação, os danos consequenciais devem ser levados em conta; nesses podem incluir perda de oportunidades comerciais, perda de condições de crédito ou outros benefícios, estas observações podem ser necessárias para colocar a pessoa lesionada na mesma posição financeira em que se encontrava se o acto ilegal nunca tivesse sido cometido” ( MARBOE, 2012, p. 39).

As avaliações objetivas e subjetiva podem ser reciprocamente úteis, pois a avaliação objetiva pode servir como um mecanismo de controle ou como base para a avaliação subjetiva. Também é possível, no caso em que a pessoa lesada fundamente seu pedido em uma avaliação objetiva, certos elementos individuais podem ser adicionados ou deduzidos através da avaliação subjetiva.

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No caso de não haver mercado para o objeto em questão, e por alguma razão não for possível avaliar um valor de mercado justo para o mesmo, ainda que em uma situação de uma norma aplicável exigindo uma avaliação objetiva, uma avaliação subjetiva poderá ser a solução. Dessa forma questiona-se que o dano subjetivo-concreto causado, possa representar uma valoração objetiva-abstrata.


7. DATA DE AVALIAÇÃO

A data da avaliação é um fator muito importante, uma vez que pode alterar expressivamente o cálculo do valor justo de mercado. A data de avaliação para a expropriação ilegal ou outras ilicitudes a diretriz vem da doutrina Factory at Chórzow. De acordo com essa doutrina é importante que a pessoa lesada seja colocada em uma posição hipotética como se o dano não houvesse ocorrido, assim, a data de avaliação não pode ser necessariamente na data da expropriação entende-se então que a mesma deve ser determinada caso a caso.

Em ADC contra Hungria, o tribunal reconheceu que o valor do investimento, após a data da expropriação aumentou consideravelmente naquele caso23, citando Texaco contra a República Árabe, declarou:

“Em consequência da depreciação das moedas e dos atrasos na administração da justiça, o valor de um bem confiscado pode ser maior no momento da decisão judicial do que no momento do acto ilícito. Uma vez que a compensação monetária deve, na medida do possível, assemelhar-se à restituição, o valor na data em que a indemnização é paga deve ser o critério”.24

Neste caso o tribunal considerou que, a data de avaliação arrazoada seria a do momento da adjudicação e não no momento do ato prejudicial, pois se o mesmo não tivesse ocorrido, o requerente teria o investimento ao valor mais elevado no momento da adjudicação.

Existem, em alguns casos, a chamadas “expropriações progressivas”25 em que a expropriação ou a interferência não acontece em uma única data, mas progressivamente como o próprio termo faz menção. No caso Azurix contra Argentina, Azurix, em razão da dificuldade em discernir a data da interferência do Estado-anfitrião no direito do investidor, propôs quatro datas26 possíveis, uma vez que as interferências se deram progressivamente. O tribunal discordou das datas fornecidas pelo demandante e escolheu datas posteriores das datas sugeridas, assumindo que os atos nas datas posteriores em conjunto com as outras violações do BIT, atingiram um divisor de águas.

Em decorrência dos anos que podem se passar entre o momento da expropriação e a sentença a ser proferida em um caso, a diferença resultante entre a escolha das datas de avaliação pode ser astronômica. Pois em certos casos, os eventos que ocorrem durante esse tempo, pode contabilizar um montante considerável a mais ou a menos.

Montante esse acima considerando método diferencial aplicável, que é realizado na expropriação ilegal e que tem como objetivo avaliar a diferença existente entre a situação financeira da pessoa afetada e qual situação ela se encontraria se não houvesse ocorrido a interferência que causou o dano. No momento do julgamento ou sentença é que comparativamente se avalia esta situação, tomando por decisiva a avaliação na data da sentença.

O referido processo também pode ocorrer por expropriação indireta que, determinada a data calculada, muito utilizada em casos tardios pela prática internacional, ou seja, a privação de direitos de propriedade se revelou irreversível. Podemos aqui citar o Tribunal de Reclamação Irã-EUA, realizado em International Technical Products v Irã,

“que determinou que quando a alegada expropriação é realizada por meio de uma série de interferências no gozo do imóvel, considera-se que a violação da causa da ação ocorre no dia em que a interferência amadureceu em uma privação mais ou menos irreversível da propriedade ao invés das datas iniciais dos eventos”27

O exemplo acima tem sido aceito por vários outros tribunais, mesmo que a ação do Estado reduza de forma considerável o valor da propriedade através de suas próprias ações, com ressalva em casos em que a nomeação pelo governo de administradores temporários resulte em uma expropriação, a data de sua nomeação inicial será escolhida como a data da expropriação.

Ainda, para assegurar que seja feita a plena reparação no caso de violação de leis internacionais a data para a avaliação é escolhida o mais tarde possível.

A ressalva também está voltada para os casos de quebra de contrato internacional de investimento, e em casos de responsabilidade do Estado, passa a avaliação, a ser realizada no dia da sentença, com calculo de restituição de dano, em que o valor é o resultado de uma comparação entre os rendimentos da quebra ou a não quebra do contrato, o que é válido é que sejam respeitadas as normas.

Sobre a autora
Valquíria Pereira

Mestranda em Ciências Jurídico Econômicas. Universidade de Lisboa

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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