RESUMO
O presente trabalho traz como assunto principal o impacto trazidos pela lei 13.467/2017 nos sistemas sindicais com o fim da obrigatoriedade do recolhimento da contribuição sindical. A mudança na legislação se mostrou dos temas mais polêmicos, sendo proliferada a ideia de que seria uma forma de extinção de direitos trabalhista, o que não é verdade, uma vez que muitos direitos, em verdade, são criados ou assegurados. Serão ainda demonstrados os benefícios da atualização no intuito de promover a liberdade sindical de forma plena, contribuir para a redução da carga tributária, além de fortalecer a ideia de que sindicatos devem atuar em defesa dos direitos dos trabalhadores.
Palavras-chave: Reforma Trabalhista, Sindicatos, Contribuição sindical, Obrigatoriedade.
ABSTRACT
The main subject of this paper is the impact of the law 13.467 / 2017 on union systems, with the aim of collecting union contributions. The change in legislation proved to be the most controversial issue, with the idea that it would be a form of termination of labor rights, which is not true, since many rights are actually created or ensured. The benefits of the upgrade will also be demonstrated in order to promote full freedom of association, contribute to the reduction of the tax burden, and strengthen the idea that unions must act in defense of workers' rights.
Keywords: Labor Reform, Trade Unions, union contribution, mandatory
1 INTRODUÇÃO
Não é de hoje que se observa que várias leis em nosso país merecem uma urgente modernização, com o fim de se adaptar às novas mudanças na sociedade brasileira, haja vista a longínqua data em que foram promulgadas.
Recentemente, tivemos uma atualização em nosso Código de Processo Civil, no ano de 2015, que revogou uma lei de 1973, trazendo novos conceitos para o trâmite processual, impactando na atuação dos advogados. Cite-se, ainda, por exemplo, o código penal, que data do ano de 1940, constantemente envolvido em movimentos que buscam a sua reforma. O intuito é promover uma adaptação aos novos tempos, uma vez que os valores da época em que fora promulgado correspondem ao desejos da sociedade daquele período histórico
Não poderia ser diferente com a Lei n° 5.452, que data de 1943, e corresponde à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Uma aperfeiçoada em suas diretrizes já se discutia há certo tempo, mas sempre encontrou grande resistência por tratar de ponto bastante sensível: direitos dos trabalhadores.
E foi assim que o projeto de Lei 6787/2016 fora recebido, com uma grande rejeição e alegações de que se tratava de uma manobra política para a retirada de direitos trabalhistas conquistados ao longo dos anos.
O certo é que o projeto fora aprovado nas duas casas do Congresso e se transformou na Lei 13.467/2017, conhecida como Reforma Trabalhista. É sabido que várias foram as questões abordadas, mas nenhuma modificação nas leis trabalhistas promoveu maior embate de ideias que o fim da contribuição sindical obrigatória. Na visão dos líderes sindicais, estes institutos que tiveram grande importância ao longo da história acabariam enfraquecidos com a perda de receitas. Outro ponto salutar dos que são contra a alteração diz respeito à impossibilidade de modificação por meio de lei ordinária, haja vista a natureza tributária da contribuição, razão pela qual das 17 ações diretas de inconstitucionalidade da reforma trabalhista apresentadas, 13 tratam desse tema.
Ainda que a intenção precípua da modificação não seja o enfraquecimento dos sindicatos, não havendo como esquecer sua importância ao longo da história na defesa dos direitos dos trabalhadores, é certo que houve uma ligeira desvirtuação de suas verdadeiras finalidades.
Não se pode fechar os olhos também para o que realmente prevê o texto legal, tendo-se em vista que em nenhum momento fala em supressão da contribuição, que apenas se tornou facultativa, sendo assim criado um direito ao trabalhador de optar pelo pagamento, situação de grande valia em um país que se discute diariamente sobre a alta carga tributária suportada principalmente pelos trabalhadores. Além disso, grande importância também se mostra em razão das próprias finalidades sindicais, pois acabará por fazer com que os sindicatos mudem seus comportamentos, tornando-se mais atuantes.
2 A CONTRIBUIÇÃO SINDICAL E O FIM DA COMPULSORIDARIEDADE DE SEU RECOLHIMENTO
Uma das mudanças mais combatidas trazida pela reforma trabalhista diz respeito ao “fim da contribuição sindical”. Segundo os críticos, trata-se de uma tentativa do Governo de retirar a força dos grupos sindicais na defesa dos interesses dos trabalhadores.
A contribuição sindical era uma exigência feita a todos os trabalhadores que integram uma categoria profissional, mesmo que estes não sejam filiados ao sindicato correspondente, do recolhimento de um valor equivalente a um dia de trabalho, para o caso dos empregados.
No caso do trabalhadores empregados, destaque-se, é feita diretamente pelo empregador na folha de pagamento, no mês de março de cada ano. Ou seja, não há qualquer participação do empregado na retirada da contribuição, havendo apenas o desconto em sua remuneração.
Sua previsão legal, embora regulada pela CLT, está na Constituição Federal, mais precisamente no art.8°, IV, c/c art. 149, que dispõe que à União, de forma exclusiva, compete a instituição de contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas.
A regulação, como já citada, está na CLT. O antigo art. 579 previa que o desconto era devido por todos os que participassem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou ainda do profissional liberal, em favos do sindicato que o representa. Sendo assim, vislumbra-se que, anteriormente à entrada em vigor da reforma trabalhista, bastava unicamente que o indivíduo exercesse uma atividade para já ser um contribuinte, como uma espécie de fato gerador do tributo, o que, destaca-se, acabava por ferir a liberdade do trabalhador, principalmente da liberdade sindical, como será melhor tratado adiante.
O novo texto, por sua vez, inova, ao estabelecer que não mais bastaria o exercício de uma determinada profissão, mas também uma autorização expressa do trabalhador. Essa atualização no texto legal gerou inúmeras críticas, chegando a ser apontado como a positivação do fim da contribuição.
No entanto, observando-se verdadeiramente – e com imparcialidade – o teor da reforma, percebe-se que em momento algum a contribuição fora suprimida. Acontece que a novel legislação tornou contribuição uma faculdade do trabalhador, como dispõem as redações dos artigos 578 e 579 da CLT, alterados pela Lei 13.467/2017, que dispõe que deverá haver um uma autorização prévia e expressa do empregado para que seja realizado o desconto.
Torna-se, portanto, facultativo o recolhimento por parte do empregador da contribuição sindical, não podendo se dar de forma tácita, mas apenas quando autorizada pelo trabalhador.
É um direito criado. Ora, não se sabe os motivos ou os interesses por trás de tanto alarme difundindo na imprensa, redes sociais, e nos interiores dos sindicatos, de que haveria o fim da contribuição, quando na verdade agora é direito do trabalhador contribuir, e não mais um dever. Sendo assim, o empregado poderá avaliar se está realmente sendo representado pelo sindicato de sua categoria, ponderando pontos positivos e negativos de recolher a sua contribuição.
Na verdade, o que muito se percebe é uma verdadeira desvirtuação e usurpação do novo texto da CLT por parte dos próprios líderes sindicais, que inflados pelos discursos de que a reforma retira direitos dos trabalhadores, acabam por prejudicar o entendimento do maior beneficiado com o fim da obrigatoriedade do recolhimento da contribuição sindical: o trabalhador brasileiro.
No entanto, embora tenha havido uma atualização da forma como se dará a contribuição, a questão se tornou polêmica no âmbito jurídico, uma vez que, dada a sua natureza, não poderia ter sido alterada por lei ordinária, como 13.467/17, mas sim por lei complementar.
2.1 ALTERNATIVAS À CONTRIBUIÇÃO SINDICAL OBRIGATÓRIA: OUTRAS FONTES DE RECEITAS PARA A ATIVIDADE SINDICAL
É certo, e não se procura negar com o presente trabalho, que para a atuação sindical, logicamente se faz necessário uma fonte de custeio capaz de gerar receitas, e assim viabilizar a atuação da atividade sindical na defesa dos interesses do trabalhador.
Evidentemente, findando-se a obrigação de contribuir, muitos trabalhadores, seja por hipossuficiência financeira, seja por não se sentirem representados, ou apenas pelo exercício ao seu direito máximo garantido pela Constituição Federal, o da liberdade, optarão por não permitir o desconto em sua folha de pagamento.
Ocorre que, embora para o trabalhador o desconto seja quase imperceptível, uma vez que se trata de apenas um dia de trabalho anual, para os sindicatos, em caso de massiva escolha dos trabalhadores pela negativa da autorização do recolhimento, haverá uma enorme redução de suas receitas.
Diz-se redução, e não extinção, pois não se pode olvidar que a contribuição sindical não é a única fonte de receitas dos sindicatos, existindo previsão legal para a instituição de outras contribuição, de caráter facultativo, mas que se destinem ao custeio da atividade sindical.
2.1.1 Da Contribuição Confederativa
A contribuição sindical não deve jamais ser confundida com a contribuição confederativa, haja vista as inúmeras diferenças existentes entre as duas, dentre elas, a ausência de natureza tributária desta última. Tal diferença tem impacto direto em outra diferença entre as duas: por não possuir natureza tributária, torna-se impossível falar em obrigatoriedade de sua contribuição a todos os trabalhadores, sindicalizados ou não.
A contribuição confederativa encontra previsão na Constituição Federal:
Art. 8°, IV - a assembleia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei;
Assim, diferentemente da contribuição sindical, a contribuição confederativa não deriva de lei, mas de uma assembleia geral, o que a desvincula das características tributárias, tornando-se obrigatória apenas para aqueles filiados ao sindicato, podendo esses deixarem de pagá-la, bastando o simples desligamento do sindicato, o que não impedirá o livre exercício de suas atividades.
Na visão de Sabbag (2017, p.579):
A bem da verdade, a contribuição confederativa é exigida dos filiados à entidade sindical respectiva – dir-se-ia “é obrigatória a eles” -, para o exercício eficaz do direito de oposição. Este direito, aliás, é um ponto de relevo, cuja apreciação tem sido feita pelo STF. É que a obrigação de pagamento – defendida por alguns estudiosos – de contribuição confederativa imposta à totalidade da categoria, isto é, aos laboristas em geral, sem distinção entre filiados e não filiados, implica violação à garantia de liberdade de filiação sindical. A imposição indiscriminada do pagamento da contribuição fere o princípio da liberdade de associação e de sindicalização, expresso nos arts. 5°, XX, e 8°, V, da Constituição Federal, tornando passível de devolução os valores descontados ilegalmente.
Sobre o tema, mister se faz ainda destacar súmula 666 do Supremo Tribunal Federal, transformada recentemente em súmula vinculante n° 40, que torna definitivo o entendimento de que apenas os filiados são devedores da contribuição confederativa, quando diz que “a contribuição confederativa de que trata o art. 8°,IV, da Constituição, só é exigível dos filiados ao sindicato respectivo”.
Como se percebe, embora não se revista de natureza tributária, a contribuição confederativa é mais um modo de fomentar as receitas da atividade sindical, destinando-se a custear o sistema confederativo (englobando o sindicato, a federação e a confederação) de representação sindical dos mais diversos setores, como a indústria, o comércio, a cultura, e até mesmo quanto às profissões liberais tornando-se grande fonte de seus respectivos custeios.
Destaque-se o caráter facultativo da contribuição confederativa, sem as garras da obrigatoriedade, sendo louvável a intenção do legislador constituinte de estabelecer um sistema de custeio da atividade sindical que parta da vontade própria do trabalhador.
Ao determinar que apenas os sindicalizados têm o dever de contribuir, a referida contribuição acaba por impedir a injusta cobrança daqueles que simplesmente exercem seu direito à não pagá-la.
2.1.2 Desconto/Contribuição Assistencial
Outro tipo de contribuição do trabalhador para com seu sindicato que merece sumo destaque diz respeito à contribuição assistencial, também conhecida como desconto assistencial, tendo-se em vista que consiste em um desconto na folha de pagamento do trabalhador, desde que aprovado em acordo com convecção coletiva, podendo se dar de uma única vez ou por meio de parcelas, e visa gerar receitas para a cobertura dos serviços prestados pelos sindicatos de forma assistencial, como por exemplo, a própria participação em negociações coletivas.
O desconto é realizado pelo empregador, que pode ser de forma tácita, ou seja, basta a não oposição do empregado quanto a realização de tais descontos para que o mesmo venha a ser realizado.
Em verdade, a jurisprudência pátria se posicionou contra a referida contribuição, chegando o Tribunal Superior do Trabalho a editar Precedente Normativo número 119, no qual explicita seu entendimento de que haveria uma afronta ao princípio da liberdade de associação e sindicalização a elaboração de cláusula em acordo ou convenção coletiva que estabelecesse a obrigatoriedade a todos os trabalhadores de pagamento de “taxa” visando o fortalecimento sindical, uma vez que o acordo que autoriza o desconto não poderia englobar trabalhadores que não fossem filiados ao sindicato profissional.
No entanto, prudente é entendermos tal contribuição como um puro e simples exercício da vontade do trabalhador, além de ser um direito dos sindicatos, previsto no art. 513, e, que disciplina que “são prerrogativas dos sindicatos impor contribuições a todos aqueles que participam das categorias econômicas ou profissionais, ou das profissões liberais representadas”.
2.1.3 Mensalidades
Outra fonte de receitas dos sindicatos consiste nas chamadas mensalidades, outra contribuição paga apenas pelos trabalhadores que são sindicalizados, não possuindo, assim como a contribuição confederativa e a assistencial, o caráter compulsório.
Tal contribuição funciona como uma espécie de “troca”, haja vista que os que a pagam são sindicalizados beneficiados por diversos serviços prestados pelos sindicatos, como assistência judiciária, médica, dentre outras.
2.1.4 Contribuição sindical facultativa
Não se pode olvidar ainda quanto à contribuição sindical que, como já amplamente afirmada, deixará de ser obrigatória, mas continuará existindo, mas de forma facultativa. Ou seja, mesmo com as alterações promovidas pela reforma trabalhista a contribuição sindical continuará a ser uma fonte de receitas pagas trabalhadores aos sindicatos, mediante prévia autorização.
2.1.5 Outras fontes de receitas que podem ser instituídas.
Além das inúmeras formas de se custear a atuação sindical mencionadas, faz-se necessária a observação de que novas contribuições podem ser criadas pelos sindicatos. Destaque-se recente contribuição criada através de uma assembleia, no intuito de substituir a contribuição sindical obrigatória, já adotada pelos sindicatos dos metalúrgicos de São Paulo, bem como dos metalúrgicos de São Leopoldo, no Rio Grande do Sul. A referida contribuição consiste no pagamento de 1% do total ganho pelo trabalhador em um ano.
Assim, percebe-se que o direito adquirido pelo trabalhador, de optar pelo pagamento (ou não) de um valor anual referente a uma dia de trabalho acabará ocasionado a extinção da atividade sindical, tendo-se em vista os vários outros meios de arrecadação.
2.2 DO COMBATE AO EXCESSIVO NÚMERO DE SINDICATOS NO BRASIL
A reforma trabalhista, como já mencionado, em nenhum momento fala em retirar as contribuições recebidas pelos sindicatos, mantendo sua previsão na CLT. No entanto, há de ser observado que, sendo facultativa, inicialmente se dará uma debandada de trabalhadores, tendo-se em vista que os mesmos optarão pelo não recolhimento – um livre exercício de seu direito.
Com isso, em um primeiro momento haverá uma redução nas receitas dos sindicatos, já que a contribuição obrigatória eram a principal fonte de receitas, o que ocasionará a extinção de sindicatos menores.
Há de ser observado que o Brasil é um país sindicalizado. Isso porque possui quase dezessete mil sindicatos. O número se mostra excessivo ao observarmos que em países como os Estados Unidos, com população e número de trabalhadores superiores às do Brasil, a quantidade de associações gira em torno de cento e noventa. Ou seja, nosso país tem mais ou menos cem vezes mais sindicatos que os Estados Unidos.
Isso ocorre sobretudo pela facilidade para sua criação, pois, embora haja necessidade de registro no Ministério do Trabalho, para a abertura do sindicato basta o registro em Cartório, já vindo, após este ato, a existir.
Ocorre que a existência de um número surreal de sindicatos não indica maior proteção ao trabalhador, uma vez que muitas vezes a criação se dá para fins alheios às atribuições dos sindicatos, como celebração de contratos coletivos, representação perante autoridades administrativas e judiciárias dos interesses gerais da respectiva categoria ou profissão liberal ou interesses individuais dos associados relativos à atividade ou profissão exercida, ou colaborar os poderes públicos no desenvolvimento da solidariedade social (CLT, Art.514).
Deve-se levar em consideração que a criação de um sindicato já lhe dá direito ao recebimento da contribuição sindical, o que não se mostra muito criterioso, e estimula a criação de entidades, no mínimo, estranhas, como o Sindicato Das Industrias de Camisas Para Homem e Roupas Brancas e de Confecção de Roupas e de Chapéus de Senhora do Município do Rio de Janeiro.
Em sendo a contribuição apenas uma faculdade, sindicatos que não se mostrem atuantes perderão suas receitas, tendo-se em vista que, ao perceberem a pouca representatividade de interesses, ou menos nenhuma, poder-se-á optar pelo não colhimento, e assim contribuir para inibição de sindicatos que não visem o bem comum do trabalhador.
2.3 DA EXCESSIVA CARGA TRIBUTÁRIA SUPORTADA
O Brasil é um dos países com maior carga tributária do mundo. Observe-se que apenas impostos totalizam 13 (Imposto sobre Importação, sobre Exportação, de Renda, sobre produtos industrializados, sobre operações financeiras, sobre a propriedade territorial rural, sobre grandes fortunas, sobre transmissão causa mortis e doação, sobre circulação de mercadorias e prestação de serviços, sobre a propriedade de veículos automotores, sobre a propriedade predial e territorial urbana, sobre a transmissão de bens imóveis, e sobre serviços de qualquer natureza). A estes agregam-se as taxas, as contribuições de melhoria, as demais contribuições, e os empréstimos compulsórios.
Com o fim da obrigatoriedade poderão os trabalhadores, os que mais sofrem com a alta carga tributária no Brasil, caso entendam necessário, impossibilitarem o recolhimento de mais uma quantia. Não se procura, obviamente, afirmar que um não recolhimento da contribuição afetará fortemente na redução da carga tributária, no entanto, não há como negar uma ânsia do brasileiro por uma diminuição dos seus tributos, além de uma amargura por não ver a devida retribuição.
Diga-se, ainda, que uma necessária reforma tributária é tema de diversos debates, inclusive com o trâmite de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC 233/2008) que visa modificar o sistema de arrecadação tributária no país. A forma utilizada atualmente em nada contribui para se reduzir a desigualdade social existente em nosso país, uma vez que aquele que ganha menos acaba sendo o que mais paga tributos.
O Brasil necessita com urgência de um novo modelo tributário pautado na dignidade da pessoa humana, que garanta os princípios já estabelecidos na Constituição Federal, como o da capacidade contributiva, que determina a arrecadação conforme a possibilidade de rendimentos do indivíduo.
Finalizando, pode-se afirmar que acaba sendo benéfica para o trabalhador a mudança trazida pela reforma trabalhista, tendo-se em vista que afeta diretamente no poder econômico do brasileiro, já saturado com tantos tributos sem que os mesmos possuam o devido retorno, podendo não mais dedicar o valor referente a um dia de trabalho à contribuição.
3 O FIM DA OBRIGATORIEDADE DO RECOLHIMENTO COMO FORMA DE COMBATER DESVIRTUAÇÃO DAS FINALIDADES DOS SINDICATOS E GARANTIR A LIBERDADE DE SINDICALIZAÇÃO
Sujeitos do direito coletivo do trabalho, os sindicatos são um dos mais afetados com as alterações trazidas pela Reforma Trabalhista, principalmente com o fim da obrigatoriedade do recolhimento da contribuição sindical. No entanto, assim com a legislação trabalhista, tais entidades devem acompanhar a evolução dos tempos, e, consequentemente, das leis, razão pela qual o alarde perpetrado por muitas dessas entidades não se mostra eivado de razão.
Isto porque os sindicatos, desde o seu surgimento, objetivam exclusivamente a defesa do trabalhador, de seus interesses. No entanto, muito se vê ultimamente sindicatos mais ligados a razões políticas, desvirtuando-se assim de seus reais objetivos.
Imperioso se faz observarmos os contexto de seu surgimento, que embora não exista uma data exata para fixar com precisão o seu marco inicial, tem o nascimento estritamente ligado ao desenvolvimento da humanidade, bem como da evolução das relações de trabalho. Sobre os primórdios das organizações sindicais, disciplina Vianna (2005, p.1.099):
Apenas pela sua semelhança com alguns sistemas sindicais e com as corporações, poderemos ir buscar na Antiguidade as origens do sindicalismo nas instituições romanas, distribuindo o povo segundo artes e ofícios, numa organização com certos pontos formais semelhantes aos sindicatos modernos. Mas, enquanto eles foram consequência do individualismo liberal, levando os trabalhadores, em face da abstenção do Estado, a se unir para a defesa de seus direitos e reivindicações, os colégios romanos nasceram por uma determinação da autoridade.
Em uma visão histórica simplificada, é de conhecimento comum que sempre houve uma disparidade entre governantes e governados, uma verdadeira luta dos trabalhadores contra seus mestres. Sem dúvidas, com a chegada a Revolução Industrial, com início na Inglaterra durante o século XVII, e com rápida expansão para outras cidades da Europa, o sentimento de revolta dos trabalhadores começou a ganhar força.
Sem a afirmação de leis que protegessem os trabalhadores ante os abusos sofridos, e as péssimas condições de trabalhos nas fábricas, o sentimento do explorado acaba por se tornar comum, gerando nos trabalhadores uma revolta quanto ao sistema de trabalho vigente, baseado em intensas horas de trabalho cujo objetivo era apenas a produção, em claro detrimento ao humano, inclusive com a irrisória contrapartida que os trabalhadores recebiam como salário.
Ausente uma proteção positivada, os trabalhadores viram uma necessidade de união cujo principal objetivo era a luta e a defesa de seus interesses. O trabalhador viu que com este agrupamento haveria um maior fortalecimento. Em contrapartida, aqueles que não optassem por se associarem à maioria, acabam por ter dificuldades de melhoria no trabalho, e até mesmo de encontrar um emprego. Daí a primeira problematização quanto à liberdade de filiação, que será melhor abordada adiante.
Sem muita força perante os governantes, sofrendo as mais diversas represálias perante a extrema resistência ao reconhecimento de melhores condições de trabalho apresentada pelos soberanos, bem como indiferenças do próprio grupo que se reunia, os trabalhadores perceberam que não restaria outro caminho senão a associação e o fortalecimento desta
Obviamente, tais agrupamentos de trabalhadores, visando dar maiores direitos à classe trabalhadora, tida ao longo dos anos como menos favorecida, principalmente ante o sistema monarquista da época, enfrentaram grande resistência por parte dos governantes, que não viam com bons olhos o amadurecimento dos direitos trabalhistas:
Como assinalou Sussekind, a sindicalização foi proibida a partir de 1791, na França; considerada delito de conspiração em 1799, na Grã-Bretanha e suas possessões (no mesmo sentido dispôs o Código Penal francês, em 1810). (VIANNA, 2005, p. 1104).
Ante as inúmeras represálias por parte dos governantes soberanos, que não viam interesse cooperar com o movimento, os trabalhadores viam como um caminho para o progresso do próprio trabalho a reunião com outros trabalhadores da mesma classe, que cooptavam com os mesmos interesses.
Surgiu aí o quase dever de sindicalização, de se juntar ao grupo para um bem maior, de fazer parte daqueles que lutavam pelos direitos sob pena de ser desprezado pela própria classe e sobretudo pelos grandes donos de fábricas e o Estado. É possível afirmar que essa coalizão deu surgimento um grande problema presente nos dias atuais: a liberdade de sindicalização, que será mais explorada adiante.
No Brasil, no ano de 1931, sob o Governo de Getúlio Vargas, fora editado decreto lei n° 19.770 para dispunha sob a sindicalização, tanto da classe patronal como a da de operários. O referido decreto, embora revogado no ano de 1991, disciplinava o direito de pleito por parte dos sindicatos perante o Ministério do Trabalho, que poderiam defender a regularização de horas de trabalho, medidas de proteção, auxílios, melhoria de salários, igualdade de condições para ambos os sexos,
Nota-se uma positivação na legislação brasileira, já naquela época, de ideias que lembram aquelas iniciadas pelos primeiros modelos de sindicatos, já citados, sempre em apoio da defesa de direitos, autorizando-se a essas entidades o poder de pleito perante os órgãos públicos de melhores condições de trabalho.
Com a promulgação da CLT, houve uma ampliação das prerrogativas dos sindicatos, bem como dos deveres, dedicando a legislação trabalhista dois artigos para tratar do tema.
Segundo a CLT:
Art. 513. São prerrogativas dos sindicatos:
a) representar, perante as autoridades administrativas e judiciárias os interesses gerais da respectiva categoria ou profissão liberal ou interesses individuais dos associados relativos à atividade ou profissão exercida;
b) celebrar contratos coletivos de trabalho;
c) eleger ou designar os representantes da respectiva categoria ou profissão liberal;
d) colaborar com o Estado, como órgãos técnicos e consultivos, na estudo e solução dos problemas que se relacionam com a respectiva categoria ou profissão liberal;
e) impor contribuições a todos aqueles que participam das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas.
Parágrafo Único. Os sindicatos de empregados terão, outrossim, a prerrogativa de fundar e manter agências de colocação.
Art. 514. São deveres dos sindicatos :
a) colaborar com os poderes públicos no desenvolvimento da solidariedade social;
b) manter serviços de assistência judiciária para os associados;
c) promover a conciliação nos dissídios de trabalho.
d) sempre que possível, e de acordo com as suas possibilidades, manter no seu quadro de pessoal, em convênio com entidades assistenciais ou por conta própria, um assistente social com as atribuições específicas de promover a cooperação operacional na empresa e a integração profissional na Classe.
Parágrafo único. Os sindicatos de empregados terão, outrossim, o dever de :
a) promover a fundação de cooperativas de consumo e de crédito;
b) fundar e manter escolas do alfabetização e pré-vocacionais
Quando da promulgação da Constituição de 1988, foi ainda previsto como finalidade primordial dos sindicatos a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas (Art.8°, III, CF).
Simplificando, é possível resumir a finalidade das entidades sindicais em cinco grandes grupos: de representação dos trabalhadores; negocial; de finalidades econômicas; de assistência; e finalidade política, a qual merecerá um especial destaque.
Quanto à função representativa, é possível afirmar que esta corresponde ao poder que os sindicatos possuem de observar os anseios da classe e denunciá-los, na tentativa de solucionar os problemas existentes, inclusive podendo atuar como substituto processual.
A função negocial diz respeito à atribuição dos sindicatos de manter um diálogo entre os atores. Na visão de Delgado (2010, P.1.248)
Através dela, esses entes buscam diálogo com os empregadores e/ou sindicatos empresariais com vistas à celebração dos diplomas negociais coletivos, compostos por regras jurídicas que irão reger os contratos de trabalho das respectivas bases representadas. A função negocial coletiva, do ponto de vista dos trabalhadores, é exclusiva das entidades sindicais, no sistema jurídico brasileiro (art.8°, VI, CF/88). O fato de a função negocial gerar regras jurídicas, dando origem a importante universo de fontes jus trabalhistas (os diplomas coletivos negociais), confere especial destaque ao presente papel dos sindicatos.
Em relação à função econômica, em apertada síntese, refere-se à prerrogativa de desenvolvimento de atividades comerciais, ou mesmo de estipular a arrecadação da contribuição sindical.
A assistencial, por sua vez, corresponde a uma das mais importantes principalmente para os sindicalizados. É que prerrogativa que é dada aos sindicatos para fornecer assistência, como a médica, ou mesmo jurídica, fundar clubes que objetivem os lazer, dentre outros.
3.1 A CRIAÇÃO DE SINDICATOS PARA FINS POLÍTICOS
Sem dúvidas a mais polêmica atuação dos sindicatos diz respeito à sua finalidade política. Como já afirmado, a facilidade de criação de sindicados proporciona a fundação de muitas associações que não buscam verdadeiramente atuar na defesa das prerrogativas dos trabalhadores, mas sim, infelizmente, ao recebimento da contribuição apenas, e à atuação no meio político.
Quanto a esta, grande problematização diz respeito à expressa proibição contida na CLT de que é condição para o funcionamento do sindicato, dentre outras, que o mesmo não promova qualquer propaganda de doutrinas incompatíveis com as instituições e os interesses da nação, bem como de candidaturas a cargos eletivos estranhos ao sindicato, além de exercer atividades que se mostrem incompatíveis com os anseios da associação, inclusive de caráter político ideológico (Art.521, CLT).
No entanto, a vedação ao atrelamento do sindicato à política é texto considerado não recepcionado pela Constituição Federal de 1988, por força de seu art. 8°, uma vez que a redação do art.521 representaria uma intervenção do Estado nos sindicatos, o que é expressamente defeso de acordo com a Carta Magna. Analisando a redação, pode parecer, a priori, que se trata de uma abordagem um tanto quanto fascista, ao dispor expressamente sobre interesses da nação sem contudo objetivar quais são esses, deixando margem para a discricionariedade.
No entanto, o real objetivo do texto é que o sindicato seja constituído para promover ações relacionadas com os interesses dos trabalhadores, e não de supressão de garantias destas associações. Vislumbra-se em nosso país uma inteira movimentação dos sindicatos em direcionamento a apoio ou reprovação a certos partidos.
Com a facilitação de criação dos sindicatos, estes são formados sem qualquer vislumbre de interesse para trabalhadores, às vezes apenas de apoio a partidos políticos, financiados pela contribuição sindical. É que se cria um sindicato e logo lhe é dado o direito ao recebimento dos valores referentes à contribuição. Formado, e com recursos, os líderes sindicais, sem nenhum propósito com seus membros, acabam por mobilizar diversas ações em apoio ou repúdio a partidos.
Ora, não havendo o sindicato seu interesse primordial, por que deverá ser beneficiado com a contribuição sindical? Certamente não se pode atrelar o labor do trabalhadores à opinião política massificada.
Vide a recente manifestação do sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo ao inflar seus representados e fomentar um verdadeiro espetáculo de descumprimento de ordem judicial. Sem dúvidas toda aquela atribulação se mostrou ação diversa do real objetivo dos sindicatos, não representando qualquer luta por garantia de direito aos trabalhadores, patrocinada em grande maioria pela contribuição obrigatória paga por estes, sem qualquer discricionariedade.
Destaque-se ainda que em muitas ocasiões há ainda a participação de partidos na própria eleição dos diretores dos sindicatos, com partido A apoiando tal candidato, e partido B apoiando outro.
Desta forma, mostra-se gratificante a alteração no texto legal para tornar a contribuição sindical para que o trabalhador possa escolher não dedicar um dia de seu trabalho para financiar sindicatos que perpetrem ações que não pactuem com seus interesses.
3.2 DA GARANTIA DA LIBERDADE SINDICAL
Como citado alhures, a alteração trazida pela reforma trabalhista no tocante a tornar facultativa a contribuição sindical constitui a criação de uma liberdade ao trabalhador, à atribuição de um poder de escolha. A liberdade infelizmente continua sendo ponto sensível, e não alcança os seus devidos objetivos quando se trata de sindicatos.
Dentre as inúmeras garantias trazidas pela Carta Magna de 1988 está o direito que o trabalhador possuir de se filiar ou não. O art.8° expressamente garante que “É livre a associação profissional ou sindical”, o que positiva na esfera constitucional a liberdade de agrupamento com fins de fundação de um sindicato para representação de uma determinada classe. No inciso V do mesmo artigo o legislador constituinte estabelece que “ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato”, uma bela expressão da liberdade individual de cada um.
Sendo assim, cria-se as seguintes indagações: terá o trabalhador o direito ao louros conquistados pelos sindicatos ainda que não seja filiado? Deve ser obrigado a contribuir, retirando parte de seu salário, ainda que não mantenha um vínculo direto? Sem dúvidas deve-se remontar ao direito mais importância inerente ao ser humano, fruto de vários confrontos ao longo da história, mas sem dúvidas o que mais recompensou o sangue derramado, uma vez que se está falando da liberdade do ser humano.
Ora, estamos diante de situações que acabam por ocasionar um choque de normas: a garantia da liberdade do ser humano, aqui incluída, evidentemente, a do trabalhador, versus a unicidade sindical, prevista também na Constituição Federal.
Primeiramente, importa destacar o que é este precioso princípio da liberdade. Sem dúvidas este princípio não veio a preço baixo, razão pela qual é um direito que deve ser preservado. Fruto da revolução industrial, consolidado como de primeira geração, é tido com um direito negativo, aqueles em que há uma abstenção do Estado na vida do indivíduo.
No entendimento de Paulo e Alexandrino (2013, p.121):
Já se ressaltou que, do lema da Revolução Francesa – liberdade, igualdade e fraternidade -, foi sem dúvida a liberdade o axioma mais encarecido originalmente pelo liberalismo. Como ideologia da classe burguesa triunfante sobre o absolutismo, interessava mais aos capitalistas de então a defesa da liberdade negocial do que uma atenuação tendente à obtenção de uma igualdade material, efetiva, no seio da sociedade. A liberdade assegurada no caput do art. 5° deve ser tomada em sua mais ampla acepção. Compreende não só a liberdade física, de locomoção, mas também a liberdade de crença, de convicções, de expressão de pensamento, de reunião, de associação, etc.
Obviamente no ramo do direito do trabalho a liberdade também está presente, e deve ser garantida. Há, contudo, uma mitigação de tal princípio no corpo da própria carta da República. Ao mesmo tempo que garante a liberdade de associação profissional ou sindical (Art.8°, CF), estabelece que, dentro de uma mesma base territorial, é vedada a criação de mais de uma organização sindical representativa de categoria profissional ou econômica (Art. 8°, II, CF).
Ora, segundo a Constituição, acontece o seguinte: o trabalhador tem o direito de se sindicalizar, de formar sua associação, no entanto, tem que obrigatoriamente se limitar a associar-se ao sindicato já existente, não podendo constituir novo sindicato. Nessa esteira, tanto faz ser sindicalizado ou não, terá de recolher a contribuição para aquele sindicato ao qual não vê representatividade, mas que já existe para a sua categoria, independente de desejar participar do mesmo. Sem dúvidas esta situação é uma inteira afronta ao direito à liberdade sindical.
Como se percebe, há uma verdadeira limitação do direito de liberdade sindical. Para que este direito seja verdadeiramente empregado, a meu ver, deveria primeiramente ser efetivada a pluralidade sindical em nosso país. A partir daí, e com a alteração da obrigatoriedade da contribuição sindical, poderia ser dado direito ao trabalhador de escolher a qual sindicato seria destinada sua contribuição.
É que a liberdade sindical, em sua forma pura e mais democrática, não deve se limitar a positivar a livre associação, mas também à liberdade do trabalhar de se filiar ou não, de se organizar, administrar, e também se irá contribuir ou não. Só assim haverá o alcance da liberdade sindical em maiores proporções, sempre visando a garantia de direitos do trabalhador.
Nesse ponto, exerce papel importantíssimo a novel redação do art. 578 da CLT, alterado com a reforma, uma vez que dá novos rumos à limitada liberdade sindical existente em nosso país, podendo a mesma inaugurar uma nova vertente deste princípio: a liberdade de contribuir para o sindicato.
3.2.1 Unicidade x Pluralidade sindical
A liberdade de sindicalização em nosso país colonizado encontrou grande resistência para a sua instauração. Visto a europalização do Brasil, com consequências diretas nos costumes e nas leis, o tema fora tratado pela primeira vez apenas na Constituição de 1891, após a abolição da escravatura e promulgação da República.
Quando da promulgação da Constituição de 1891, houve inovação por parte do legislador constituinte ao dispor que a todos seria lícito associarem-se e reunirem-se livremente e sem armas, não podendo haver intervenção da polícia senão para manter a ordem pública (Art. 72, § 8°, CF/1981).
A Constituição que a esta se seguiu, promulgada em 1934, mais um avanço fora dado quanto ao direito à sindicalização. O legislador constituinte previu no art. 120 que os sindicatos e associações profissionais seriam reconhecidos de conformidade com a lei, prevendo, que a haveria uma segurança estabelecida em lei que garantiria a pluralidade sindical e sua autonomia (Art.120, §1°, CF/1934).
Acompanhando a evolução constitucional, quando da promulgação da Constituição de 1937, estabeleceu-se que associação profissional e sindical seria livre, e deu ao sindicato reconhecido pelo Estado o privilégio de representar a todos os que integram e correspondem à categoria, de estipular contratos bem como o poder de impor contribuições (SUSSEKIND, 2005). Mais uma vez na história, como se percebe, toca-se no tema de liberdade ou não para se associar, constituindo, na idealização, um direito, e não um dever, embora o que vigorasse fosse a unicidade sindical.
A Constituição de 1946 continuou a dar seguimento à série de previsões constitucionais que vinha tomando força. Estabeleceu:
Art. 159.É livre a associação profissional ou sindical, sendo regulado por lei a forma de sua constituição, a sua representação legal nas convenções coletivas do trabalho e o exercício de funções delegadas pelo Poder Público.
Com a chegada dos tenebrosos anos em que o Brasil viveu uma ditadura militar, houve a promulgação da Constituição de 1967, que basicamente manteve o disposto na constituição passada, mas inovou em tornar obrigatória as eleições dentro do próprio sindicato, além da delegação de arrecadação de contribuições no intuito de se custear as suas atividades e seus programas.
Com a promulgação da Constituição de 1988, a mais democrática da história brasileira, chamada de constituição cidadã, o direito de liberdade de associação sindical fora mais uma vez garantido, mais uma vez inovando o legislador constituindo ao estabelecer, pela primeira vez a não intervenção do Estado nas organizações sindicais. Dispõe (art.8°, I) que “a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical”, o que acabou por dar uma maior força e autonomia aos sindicatos, reduzindo então soberania de direitos dos patrões sobre os empregados.
Delgado (2010, p. 118) disciplina:
A superação do velho modelo corporativista sindical brasileiro é, desse modo, desafio inaudível à construção de uma sólida e consistente experiência democrática no país. Contudo, não se trata, singelamente, de suprimir os pontos retrógrados do velho sistema já exaustivamente debatidos. Trata-se, também, ao mesmo tempo e na mesma medida, de se elaborar um conjunto de garantias judiciais à efetivação, à organização e fortalecimento dos sindicatos, para que os princípios da liberdade associativa, da autonomia sindical e da real equivalência entre os contratantes coletivos trabalhistas não sejam mero simulacro, uma vez mais, na história do Brasil.
Sem dúvidas, a Constituição cidadã trouxe uma série de avanços ao modelo sindical brasileiro, fortalecendo o poder dos sindicatos e consequentemente dos trabalhadores daquela classe. Contudo, destaque-se a previsão constitucional de que não é um dever do trabalhador se filiar ou manter-se filiado ao sindicato, representado o princípio da liberdade sindical, já prevista nos primórdios da instituição dos sindicatos pelo mundo, como mencionado alhures.
Ocorre que como já discorrido este princípio é mitigado pela própria Constituição, já que mantém a unicidade sindical. Esta corresponde à previsão normativa obrigatória de existência de um único sindicato que represente os correspondentes obreiros, seja por empresa, profissão, por categoria profissional ou ramo empresarial de atividades. Trata-se da definição legal imperativa do tipo de sindicato na sociedade, vedando-se a existência de entidades sindicais concorrentes ou de outros tipos sindicais. É um sistema de sindicato único, com monopólio de representação sindical dos sujeitos trabalhistas (DELGADO, 2005). Infelizmente no Brasil, ao contrário de países europeus, bem como os Estados Unidos, é este o modelo utilizado, por força da lei.
Ao contrário do modelo brasileiro, e mais garantidor da liberdade sindical, está o sistema de pluralidade sindical consiste na possibilidade de criação de vários sindicatos dentro de uma mesma base territorial. Por exemplo, caso fosse esse o modelo adotado em nosso país, no município de Sobral poderia haver dois sindicatos de uma mesma classe profissional, o que acarretaria na geração de um direito de escolha do trabalhador à qual sindicato iria se filiar, bem como dispender suas contribuições, dentre elas, dada a mutação legal, a contribuição sindical.
Sobre esta vertente da liberdade individual e coletiva, a Organização Mundial do Trabalho (OIT) editou a Convenção n° 87, em vigor desde a década de 1950, que dispõe em seu artigo segundo que “Os trabalhadores e os empregadores, sem nenhuma distinção e sem autorização prévia, têm o direito de constituir as organizações que estimem convenientes, assim como o de filiar-se a estas organizações, com a única condição de observar os estatutos das mesmas”
Ainda que de máxima importância para uma garantia democrática da liberdade sindical, a Convenção n° 87 da OIT não foi ratificada pelo Brasil. Isso se deve ao fato de, principalmente, uma vez que existem outros, haver previsão Constitucional, o já mencionado Art.8°, II, que acaba por se mostrar prejudicial à liberdade de associação, razão pela qual, a meu ver, merece ser alvo de urgente emenda constitucional.
Mencione-se ainda o desinteresse dos próprios líderes das classes sindicais, sob alegativa de que a instalação da pluralidade sindical em nosso país causaria uma total desestruturação dos movimentos sindicais. No entanto, tais afirmativas não merecem prospero, tendo-se em vista que um dos principais interesses é com relação à contribuição sindical.
Ora, como já citado, basta que se crie um sindicato para que o mesmo já se faça beneficiário do valor oriundo da contribuição sindical. Apenas isto. Ou seja, tanto faz se o sindicato é atuante ou não, ou se nasceu com objetivos lutar pelo direito dos trabalhadores ou de algum partido político, ele irá receber a contribuição. Além, disso, por esta mesma prerrogativa, não há qualquer interesse dos dirigentes de trazer para os sindicatos novos filiados, uma vez que mesmo sem exercer atividades de cunho representativo, assistencial, negocial ou econômico, terá garantido o recebimento da contribuição, sendo esta obrigatória. Ora, nada mais absolutista e contrário aos valores da liberdade que uma imposição, tolhendo-se qualquer direito de escolha do trabalhador.
Sussekind (2005, p. 1134) enfatiza:
Relativamente à Contribuição sindical compulsória, parece certo que ela afronta igualmente o princípio da liberdade sindical, tal qual consagrado na Convenção em foco. A vinculação indireta do não associado é flagrantemente incompatível com a liberdade sindical a pluralidade sindical.
O mesmo autor ainda assevera, citando resolução do Comitê de Liberdade Sindical:
A faculdade de impor obrigatoriamente a todos os trabalhadores da categoria profissional interessada o pagamento de contribuição ao único sindicato (...) não é compatível com o princípio de que os trabalhadores devem ter o direito de filiar-se às organizações que estimem convenientes. Em tais circunstâncias, a obrigação legal de pagar cotizações ao monopólio sindical, estejam ou não os trabalhadores filiados a ele, representa uma nova consagração e consolidação do dito monopólio (VERBETE N.227 DO COMITÊ).
Desta forma, a liberdade sindical em sua forma plena encontra resistência tanto do texto constitucional como dos próprios atores diretamente envolvidos nos sindicatos. Faz-se necessária, portanto, uma profunda revisão de valores e normas para que seja garantido o direito do trabalhador à liberdade de associação. Nesta seara, a modificação do texto legal da lei trabalhista se vislumbra positiva.
Não basta que haja textos prevendo a liberdade se a mesma é mitigada. Deve ter o trabalhador a liberdade para se filiar ou não, bem como de criar mais de um sindicato dentro do mesmo território, e sobretudo de optar por contribuir ou não, fato que com o tempo extinguiria, ou ao menos reduziria significativamente, sindicatos sem a menor representatividade.
Assim, a modificação das leis do trabalho, no tocante à alteração no art.578, que torna facultativa a contribuição, corresponde ao início de uma verdadeira implantação da liberdade sindical de forma plena em nosso país.
4 CONCLUSÃO
Evidentemente, uma reforma nas leis trabalhistas se mostravam necessárias já há um bom tempo. As alterações trazidas com a Lei 13.467/2017, em sua maioria, embora realizadas sem uma prévia consulta às classes afetadas, mostram-se um avanço na mentalidade do legislador e uma adaptação à novas formas de trabalho. Mudanças como a positivação de uma multa para o caso de dispensa por discriminação, seja por sexo ou “raça”, bem como a possibilidade de divisão das férias dos trabalhadores não inovações bem vindas.
Mas sem dúvidas o maior avanço trazido pela novel legislação diz respeito ao fim da obrigatoriedade do recolhimento da contribuição sindical, demonstrando-se uma forma de se estabelecer a liberdade sindical de forma plena.
Tal modernização da legislação passa longe de ser uma “volta à escravatura”, como muito vem se falando. Não prosperam tais argumentos apocalípticos que encobrem mantos políticos, proferidos no intuito de inflamar os trabalhadores, principalmente aqueles com menos acesso à informação, muitas vezes até desconhecendo a norma legal.
A contribuição sindical não acabou. Ela continua em vigor. Apenas se tornou facultativa, podendo o trabalhador, maior beneficiário, escolher se irá contribuir ou não, certamente se configurando em um direito criado.
O grande temor dos líderes sindicais é que os trabalhadores exerçam esse direito, e percam sua principal fonte de renda. Diga-se principal pois há inúmeras outras, como a contribuição confederativa, assistencial, dentre outras que podem ser criadas. Desta forma, não prospera afirmações alarmantes do fim dos sindicatos, que ainda receberão a contribuição sindical, desde que autorizada pelos trabalhadores, o que fará com que haja um maior empenho dos sindicatos, mostrando serviço e explanando vantagens do recolhimento, consequentemente fazendo com que desapareçam sindicatos anões, criados com vieses alheios ao real objetivo dos sindicatos, que é a luta pelos direitos dos trabalhadores.
É que infelizmente a quantidade de sindicatos no Brasil não corresponde ao número associações atuantes. Já supera os dezessete mil o número de sindicatos em nosso país, um verdadeiro absurdo que faz com que nosso país seja conhecido como um país sindicalizado. Isto se deve em razão da facilidade de criação, mas sobretudo em razão de, independentemente de ser o sindicato atuante ou não, de promover ou não ações que estimulem a sindicalização, será o mesmo beneficiário da contribuição sindical.
Sendo a contribuição uma faculdade, o trabalhador poderá analisar, e ponderar, se realmente valerá a pena retirar o valor referente a um dia de seu trabalho para recolher ao sindicato, diminuindo consideravelmente as receitas daqueles sindicatos com pouca ou nenhuma representação.
Além disso, haverá ainda o combate à práticas verdadeiramente anti sindicais exercidas muitas vezes por seus líderes, que fundam associações com intuitos políticos, defendendo muito mais um partido político do que seus associados.
Mas o avanço mais significativo alcançado com a facultatividade do recolhimento será a liberdade do trabalhador, mais precisamente na liberdade sindical, que não deve ser compreendida unicamente como uma liberdade de se associar, mas também a liberdade de se filiar ou não, e de contribuir para o sindicato, ou não, de acordo com suas convicções.
A implementação da liberdade sindical em todas as suas vertentes ainda se mostra pouco compromissada na legislação brasileira. Prova disso é a não ratificação da Convenção n° 87 da OIT, que garante o direito à liberdade ao não prever limitação de que haja apenas um sindicato de uma determinada categoria dentro dos limites de um mesmo município, a chamada pluralidade sindical, havendo interesses na manutenção de um único sindicato, conforme modelo de unicidade adotado, sob alegações de que haveria uma desestruturação.
No entanto, a liberdade sindical não pode sofrer tais limitações, razão pela qual se mostra um avanço jurídico de grande importância o novo texto da reforma trabalhista, correspondendo a um grande passo na conquista da liberdade sindical plena.
Ora, a contribuição sindical era algo imposto, obrigatório, que tolhia direitos individuais do trabalhador. Neste cenário, não havia como se falar em liberdade. A mudança, é, sem dúvidas, a conquista de um direito.
Desta forma, embora não haja uma unanimidade quanto as alterações trazidas pela reforma, é possível afirmar que em muitos momentos ela beneficia o trabalhador, principalmente no tocante à garantia de sua liberdade, mostrando-se um avanço na legislação, uma atualização aos novos tempos, bem como a garantia de direitos que anteriormente se apresentavam em abstrato, como é o caso da liberdade sindical.
REFERÊNCIAS
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