Prequestionamento:Conflitos doutrinários e jurisprudenciais acerca do tema

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25/08/2018 às 15:40
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7 O PREQUESTINAMENTO NO STJ

No que tange ao entendimento do STJ, esta corte exige, não só a interposição dos embargos declaratórios, como, exige que a omissão seja sanada antes que seja interposto o Recurso Especial. No entanto, caso a decisão dos declaratórios seja de que não há omissão a ser sanada, a corte superior entende ser necessária a interposição do Recurso Especial pela violação ao inc. II do Art. 535, do CPC, que trata de omissão da qual se deve pronunciar o juiz.

Desta forma, o STJ trata o prequestionamento com mais frieza e rigor, fazendo interpretação literal da lei por entender que, se há omissão, não pode a corte se pronunciar sobre o assunto, como se extrai da leitura do Art. 105, III, CR/88.

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

(...) III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Território (...) (grifo nosso).


8 O POSICIONAMENTO DO NOVO CPC A RESPEITO DO PREQUESTINAMENTO

O PL 166/10, ao contrário do atual CPC, adota posicionamento em relação ao prequestionamento, sanando, portanto, a insegurança de sua ‘não previsão’ no ordenamento jurídico interno, além de adotar o entendimento do STF, acolhendo, portanto, o prequestionamento ficto.

Além da questão da mera interposição dos embargos declaratórios, o NCPC também propõe que o voto vencido integre o acórdão para fins de prequestionamento. É do que trata o § 3º do Art. 861, NCPC:

“Art. 861 – Proferidos os votos, o presidente anunciará o resultado do julgamento, designando para redigir o acórdão o relator ou, se vencido este, o autor do primeiro voto vencedor”. (...)

“§ 3º - O voto vencido será necessariamente declarado e considerado parte integrante do acórdão para todos os fins legais, inclusive de prequestionamento.”

Com relação ao voto vencido, explica-se:

Atualmente, predomina o entendimento de que o julgamento e o acórdão são coisas distintas, sendo que o julgamento antecede o acórdão. Sobre o tema, explica o Mestre Leonardo José Carneiro da Cunha em seu artigo O PREQUESTIONAMENTO E O VOTO VENCIDO:

“Colhidos os votos dos integrantes do órgão julgador, haverá o julgamento, que será, posteriormente, reduzido a escrito, recebendo, então, a denominação de acórdão. Em outras palavras, acórdão é a materialização do julgamento, consistindo na redução a escrito da solução dada pelos integrantes do colegiado. Na verdade, o termo acórdão provém do verbo acordar, que significa resolver de comum acordo, concordar, chegar a um acordo. O acórdão nada mais é do que a concordância de várias pessoas sobre determinada questão. Vale dizer que acórdão é o conjunto dos votos vencedores. Nesse sentido, é lícito concluir que o voto-vencido não integra o acórdão; ele está fora do acordo, do consenso a que chegou a maioria.”

Destarte, conclui-se que, se a matéria que se busca reformar apenas foi abordada no voto-vencido, não restou, portanto, configurado o prequestionamento.

Para que tal problema seja sanado, há que se recorrer, mais uma vez, aos embargos declaratórios, de modo a solicitar que a matéria seja tratada no voto vencedor, para que, então, possa se caracterizar o prequestionamento.

É, neste caso, pacífico o entendimento jurisprudencial do STJ, a saber:

"Agravo regimental em agravo de instrumento. Processual civil. Ausência de pre-questionamento. Fundamentação existente apenas no voto-vencido. 1 - Em sede de recurso especial é vedado o conhecimento de matéria que não constituiu em objeto de decisão pelo Tribunal a quo. Incidência dos enunciados das Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal. 2 - Não se conhece de Recurso Especial pela letra 'a' se os dispositivos apontados como violados não constam do corpo do voto-vencedor do Aresto impugnado. Os fundamentos utilizados no voto-vencido não se prestam à impugnação mediante Recurso Especial. (...)' (AgRgAg 193.978/ES, Relator Ministro José Delgado, in DJ 10.05.99). 3 - Agravo regimental improvido. Acórdão unânime da 6ª Turma do STJ, AGA 439.863/SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 10.02.04, DJ de 15.03.04, p. 308.”

E, ainda:

STJ - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL: AgRg no REsp 663811 RJ 2004/0073250-4

Relator(a):        Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA

Julgamento:      04/08/2009

Órgão Julgador:               T6 - SEXTA TURMA

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. VOTO-VENCIDO. SÚMULA 320/STJ. JULGAMENTO EXTRA PETITA. NÃO OCORRÊNCIA.

1. "A questão federal somente ventilada no voto vencido não atende ao requisito do prequestionamento" (Súmula 320/STJ). Grifos nossos.

2. Não incorre em julgamento extra petita o aresto recorrido que não concede mais do que o pleiteado pelo autor em sua inicial.

3. Agravo regimental improvido.

E, no STF:

Processo:           AI 647409 RJ

Relator(a):        Min. DIAS TOFFOLI

Julgamento:      30/08/2011

Órgão Julgador:               Primeira Turma

EMENTA Agravo regimental no agravo de instrumento. Processual civil. Prequestionamento. Ausência. Voto vencido. Necessidade de oposição de embargos de declaração. Precedentes.

1. Não se admite o recurso extraordinário quando os dispositivos constitucionais que nele se alegam violados não estão devidamente prequestionados. Incidência das Súmulas 282 e 356/STF.

2. Não atende o requisito do prequestionamento se somente o voto vencido suscita o debate constitucional trazido no recurso extraordinário (grifos nossos).

3. Agravo regimental não provido.

Portanto, com a previsão expressa no novo código de processo civil, caso seja promulgado, a questão do voto-vencido estará superada, uma vez que, ao integrar o acórdão, será tida, a matéria, como prequestionada, não sendo necessária a interposição de embargos declaratórios para que conste no voto vencedor.

Não há dúvidas, também, quanto ao entendimento da doutrina majoritária de que, havendo o novo CPC adotado o cabimento do prequestionamento ficto, conforme ocorre na Suprema Corte, logo, haverá uniformização de ambos os tribunais superiores com relação ao assunto, uma vez que, estando expresso em Lei Federal de que basta a interposição dos Embargos Declaratórios para que seja caracterizado o requisito, assim, prequestionada estará a matéria.


9 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Embora ainda haja muitas dúvidas doutrinárias a respeito do tema, até mesmo quanto ao que, efetivamente, se trata o prequestionamento, conforme expressa o prof. Eduardo Ribeiro de Oliveira, em seu Prequestionamento, p. 245:

 “Dificuldade que se coloca, quando se trata do prequestionamento como condição para viabilizar os recursos extraordinário e especial, além da própria grafia, está no sentido em que empregada a expressão. É utilizada na doutrina e mesmo na jurisprudência traduzindo a necessidade de que a matéria tenha sido suscitada antes do julgamento recorrido. Para outros, entretanto, considera-se presente quando a questão, não apenas é objeto de arguição pela parte, mas decidida pelo acórdão a ser impugnado. Por fim, uma terceira corrente estima que a exigência prende-se tão só a essa última hipótese, ou seja, haver decisão, ainda que não se tenha verificado anterior debate”.[8]

Em sua obra, Eduardo Ribeiro de Oliveira deixa claro que, para ele, prequestionamento se equivale ao conteúdo da decisão que se pretende recorrer, independentemente do debate travado entre as partes antes de seu proferimento:

“O que se terá como indispensável é o exame da questão pela decisão recorrida, pois isso sim, deflui da natureza do especial e do extraordinário e resulta do texto constitucional. Destinando-se o extraordinário, como salientado, a garantir a exata aplicação da Constituição, falta razão a ele, se da norma constitucional não se tratou na decisão impugnada. O mesmo se diga do especial, pois não há como fazer-se o controle, quando à correta interpretação do tratado ou da lei federal, em relação a matéria de que não se cogitou. Não pode o julgado havê-las contrariado, ou a elas haver negado vigência, se não versada a questão que regulam”[9]

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Já para José Miguel Garcia Medina, a tese de que prequestionamento também não guarda qualquer relação com a formulação do recurso especial e/ou extraordinário. Prequestionamento só pode ser entendido como a iniciativa das partes que não vinculam, necessariamente, a decisão da qual se pretende recorrer. Elas prequestionam, o Tribunal decide. E é da decisão do Tribunal que se recorre e não da iniciativa das partes.[10]

Há, ainda, muitos outros entendimentos que se diferem dos supracitados, mas que renderiam uma discussão muito intensa e aprofundada. Por hora, basta que fique claro que, não obstante as inúmeras divergências doutrinárias e jurisprudenciais sobre o que é ou como efetivamente se dá o prequestionamento, a sua exigência como óbice para interposição dos recursos excepcionais nas cortes superiores é fato.

Será, portanto, a nosso ver, oportuna a reforma do CPC, lançando luz no que diz respeito ao voto vencido para fins de prequestionamento, bem como quanto à pacificação no que diz respeito à aplicação do prequestionamento ficto em ambos os Tribunais Superiores, encerrando, portanto, as dúvidas a esse respeito.


REFERÊNCIAS

BUENO, Cassio Scarpinella. Quem tem medo do prequestionamento. Jus Navigandi, Disponível em:. Acesso em, v. 16, 2003.

CARNEIRO, Athos Gusmão. Recurso especial, agravos e agravo interno: exposição didática, área do Processo Civil, com base na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Forense, 2001.

CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Prequestionamento e voto vencido. Revista Dialética de Direito Processual, n. 17, 2004.

HENRIQUES, Danilo Carlos Ramos; PINHEIRO, Paulo Eduardo DArce. PREQUESTIONAMENTO E OS RECURSOS EXTRAORDINÁRIO E ESPECIAL. Intertem@ s ISSN 1677-1281, v. 7, n. 7, 2008.

KOEHLER, Frederico Augusto Leopoldino. Do prequestionamento ficto como meio de efetivação dos princípios da instrumentalidade, economicidade e celeridade do processo. ESMAFE, p. 165.

MEDINA, José Miguel Garcia. O prequestionamento nos recursos extraordinário e especial, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2ª edição, 1999;

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. Método, 2014.]

OLIVEIRA, Eduardo Ribeiro de. “Prequestionamento” em Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis de acordo com a Lei 9.756/98, obra coletiva coordenada por Teresa Arruda Alvim Wambier e Nelson Nery Jr., São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999, pp. 245/257;

RAVACHE, Alex. O prequestionamento ficto nos recursos excepcionais. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/22335/o-prequestionamento-ficto-nos-recursos-excepcionais/2>. Acesso em: 10/08/2018.

SCALZILLI, Roberta; MACEDO, Elaine Harzheim. Prequestionamento no recurso especial sob a ótica da função do STJ no sistema processual civil: uma análise perante o novo Código de Processo Civil. In: Revista de Processo. 2015.


Notas

[1] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. Método, 2014.

[2] SANTOS, Alexandre Moreira Tavares dos. “Prequestionamento”. Revista Virtual da AGU nº23. Ano III. Abr, 2003. p.109

[3] RIBEIRO, Cândido. “RE, RESP e REVISTA – Prequestionamento por via de embargos declaratórios”. Revista Virtual da AGU nº17. Ano II. Dez, 2001. p.2

[4] MORAIS, Fernanda Bezerra. “A (in)subsistência do prequestionamento após o advento da repercussão geral?”. Revista ESMAPE nº27. v.13. Recife: ESMAPE. 2008. p.143

[5] CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Prequestionamento e voto vencido. Revista Dialética de Direito Processual, n. 17, 2004.

[6] KOEHLER, Frederico Augusto Leopoldino. Do prequestionamento ficto como meio de efetivação dos princípios da instrumentalidade, economicidade e celeridade do processo. ESMAFE, p. 165.

[7] BUENO, Cassio Scarpinella. Quem tem medo do prequestionamento. Jus Navigandi, Disponível em:. Acesso em, v. 16, 2003.

[8] OLIVEIRA, Eduardo Andrade Ribeiro de. Prequestionamento. Coletânea de Julgados e Momentos Jurídicos dos Magistrados no TFR e STJ, p. p. 167, 2010.

[9] Ibidem. P. 248-249

[10] MEDINA, José Miguel Garcia. O prequestionamento nos recursos extraordinário e especial. Editora Revista dos Tribunais, 1999.

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Sobre a autora
Dannielle Oliveira

Advogada autônoma, amante do direito, da música e da literatura. Atualmente na Europa em busca de melhorar o inglês e acrescentar o francês ao seu currículo. Pretende se especializar em Direito Internacional.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Trabalho de Conclusão de Curso apresentada ao curso de Direito da Faculdade Pitágoras – Campus Vale do Aço/MG, como requisito parcial para a obtenção do título de bacharel Direito.

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