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Sistema carcerário: história de violência nas prisões

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Resumo:


  • A violência nas prisões brasileiras é uma realidade histórica, com raízes nos suplícios do passado e perpetuada por fatores como superlotação e guerras entre facções.

  • A Lei de Execução Penal (LEP) busca estabelecer direitos e deveres que garantam a integridade física dos presos e promovam a ressocialização, mas enfrenta desafios na prática devido a deficiências estruturais e de gestão do sistema carcerário.

  • O massacre no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (COMPAJ) em 2017, com 56 mortos, exemplifica a gravidade da crise prisional brasileira e a necessidade urgente de reformas para garantir direitos fundamentais e humanos dos detentos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Superlotação, segregação racial, massacres e guerras entre facções.

INTRODUÇÃO

O presente artigo visa abordar acerca da história de violência nas prisões, mostrando como este aspecto histórico influenciou até hoje a cultura de violência, bem como trazer seus fundamentos jurídicos.

A responsabilização do Estado em coibir a violência nos presídios brasileiros se mostra atualmente ineficiente e ineficaz em resguardar os direitos fundamentais bem como a integridade física dos custodiados.

O objetivo deste trabalho consiste em analisar o aspecto histórico da violência nas prisões, relacionando aos suplícios do século XVI e XVII, segundo o escritor e filósofo Michel Foucault, em sua obra “Vigiar e Punir”, ora servindo de base ao presente artigo.

O trabalho alcançará esse objetivo, em um primeiro momento, demonstrando a violência nos presídios brasileiros atualmente e ainda as situações de superlotação, natureza do crime, escolaridade dos presos, segregação racial e, principalmente as guerras entre facções; Em um segundo momento o trabalho faz uma análise focal sobre o Massacre de janeiro de 2017 no Presídio Complexo Penitenciário Anísio Jobim – Manaus/Amazonas, noticiado em todos os portais de notícia do país, no último momento a autora pretende analisar os aspectos da Lei 7.210/1984, Lei de Execução Penal (LEP), como pressuposto para a efetivação dos direito, deveres e resguardar a integridade física dos presos. 

A presente pesquisa é de natureza bibliográfica. Portanto, para dar resposta aos objetivos propostos, se fará uso legislativo de julgados, doutrinas, jurisprudências e casos concretos, exemplificados em teses e dissertações, bem como em artigos científicos.

A estrutura do trabalho está assim definida: na primeira seção fala-se acerca o aspecto histórico da violência nas prisões, segundo Michel Foucault. Na segunda seção serão apresentados os pressupostos da violência. A terceira seção fala dos meios para coibir a violência. Na quarta seção será apresentada a Lei de Execução Penal – LEP como meio de efetivação da mesma no sistema carcerário brasileiro. Por fim, têm-se as considerações finais da autora.


2. FUNDAMENTAÇÃO TEORICA

2.1 A OBRA VIGIAR E PUNIR

O filósofo e escritor francês Michel Foucault, em sua obra “Vigiar e Punir” (1975), de grande valia para o nascimento da prisão e desenvolvendo uma análise de um sistema punitivo, objetiva em um primeiro momento a ressocialização do apenado, mas que, com o desenvolvimento da violência entre os próprios presos, com o intuito de “quem ganha mais é quem bota ordem na cadeia”, tornou-se uma prisão-repressiva e não mais com a finalidade de reeducação.

O livro em questão fora baseado em documento do século XVI à XIX que, relatavam os suplícios públicos e a aplicação da pena com a seguinte base: “olho por olho e dente por dente”, ou seja, o pagamento do crime era com o próprio corpo do sentenciado, envolvendo o suplicio, orações e não blasfemar perante os seus executores. Sendo disposto o suplicio de Robert-François Damiens (1957) que foi condenado por tentativa de homicídio contra o rei Luís XV de França no final do século XVIII, e que foi executado e torturado até a morte.

A grande magia das execuções pública era o espetáculo de sangue e entranhas de fronte a adultos, crianças, jovens, o qual era demonstrado que aconteceria o mesmo a quem praticasse o mesmo crime, servindo então o supliciado de paradigma para a sociedade, sendo o Estado o leviatã que era o detentor de todo o poder de punição. Cesare Beccaria nos diz que “a execução pública é vista então como uma fornalha em que se acende a violência.”

Por que havia estes suplícios? Foucault nos fala que era a demonstração do poder do Estado em aplicar as leis severamente com os meios mais cruéis e por isso a pena deveria ser equiparada ao crime cometido. Não havia contraditório, nem ampla defesa, era pura e simplesmente um procedimento inquisitorial e torturante.

Com mudanças no objeto social, o Estado torna-se garantidor da aplicação da pena com o surgimento das prisões e não mais com o sofrimento público. A punição torna-se mais branda, ou como alguns doutrinadores chamam, de punição “gentil”, mas não por questões de dignidade da pessoa humana, e sim porque o poder da violência sobre o corpo do condenado era imprevisível e que o Estado deveria ser uma forma de poder público, porém segundo o filósofo francês este era somente um ato de paixão por mudanças e não o caráter humanitário.

Todas estas mudanças, surgimento da prisão, o Estado como garante, foram se moldando ao logo do tempo e os suplícios deram lugar ao trabalho, como forma de pagamento. Segundo Margareth Rago, historiadora brasileira, Foucault cita o Poder Disciplinar, sendo este uma rebuscada forma de dominação e exercício da violência. Por isso a prisão produz delinquente, enquanto deveria produzir comportamentos e não repressão.

Prisão, em latim, significa “carcere” que é o lugar no qual as pessoas têm a liberdade pessoal restrita. Ou seja, a prisão surgiu em um determinado momento da historia como forma de coibição e reeducação do encarcerado, uma vez que o deixando em cárcere, este não voltaria a cometer outros delitos. Assim, segundo o escritor, esta era a forma geral de tornar sujeitos “dóceis e úteis”, cuja pena seria cumprida por excelência.

Logo, a prisão aparenta uma forma de reparação de dano, porém tornou-se uma instituição econômica em que o preso é somente um objeto social e que, cada vez mais faz sua própria lei dentro da prisão, não alcançando objetivo de reeducar e ressocializar. O escritor e filosofo era um homem à frente de seu tempo, então em sua infinita contemporaneidade, instituiu uma classificação para a política criminal, quais sejam: 1- regra da quantidade mínima: quanto à pena imposta, uma vez que esta deve ser a mínima exigida para ter um caráter preventivo; 2- regra dos efeitos colaterais: semelhante ao primeiro, esta deve ser preventiva e isso causa um efeito na sociedade e mostrar que a conseqüência do cometimento do delito é o cárcere; 3: regra da idealidade suficiente: o próprio titulo subentende-se o fim dos suplícios e o não pagamento do crime com o corpo flagelado; 4- regra da certeza perfeita: é a consciência de que o corolário do cometimento do delito é a prisão, não obstante, os doutrinadores nominam como “certeza plena”; 5- regra da especificação ideal: deve haver uma tipificação para cada delito e; 6- regra da verdade comum: não há mais o corpo do condenado como objeto de tortura ou flagelo e sim, o ser, enquanto racional, de uma exposição dos fatos através de provas concretas.

Em consonância com o entendimento contemporâneo do filósofo, a prisão tornou-se uma fábrica de produção de reincidentes de idas e vinda à instituição carcerária. A técnica da delinquência é corromper indivíduos primários, sem antecedentes, à sucumbência na permanência no mundo do crime.

O estabelecimento prisional foi-se moldando e tornou-se um regime autoritário, repressivo e com a finalidade tão somente de aprisionar os condenados, para fins de tirar o elemento da sociedade e assim degenerar o pensamento e o comportamento dos prisioneiros. O ciclo interminável de cometimento de crime, perversão do pensamento, saída e volta ao sistema prisional, não se cessará enquanto o objeto do Estado não mudar.

A violência então fora implantada no sistema criminal não por acaso, e sim por omissão e negligência do Estado em intenção de punir com severidade o condenado. Logo, Foucault dispõe acerca das 7 máximas universais da “boa condição penitenciária”, quais serão citadas: 1- a função da prisão é única e exclusivamente a função social de recuperar o sujeito; 2- esta segunda máxima é a mais importante e deveria ser seguida à risca, pois a separação dos condenado pelo grau do crime, periculosidade, faixa etária e sexo, seria o fim de reinserção ao mundo do crime quem não se integra nestes grupo, pois assim não se corromperia; 3- basicamente este item nos fala sobre a progressão do regime, comportamento do preso, resultado do trabalho e os seus progressos; 4- neste, há  o principio do trabalho como obrigação e como direito, ou seja, o trabalho deve ser prioridade para que quando o indivíduo voltar a sociedade, este terá oportunidades para se reintegrar, mas muitas vezes este é marginalizado pela própria sociedade; 5- a educação deve ser um meio intrínseco ao encarceramento para voltar ao convívio na sociedade, sendo este o que Foucault fala de o “Princípio da Educação Penitenciária”; 6- o Estado como garantidor da ordem publica deve colocar pessoas especializadas e com qualificações condignas com os padrões de disciplina e aptas ao trabalho carcerário; 7- por último, devem haver medidas inibitivas de evasão dos presos, ou seja, deve haver controle dentro do estabelecimento penitenciário e depois, uma vez que a assistência facilitaria a reinserção ao mercado de trabalho e à sociedade.

Como visto, a visão do escritor coincide com a situação carcerária no Brasil. Todas as classificações aqui apresentadas estão positivadas na Lei de Execuções Penais – Lei 7.210/1984, com Direitos, Deveres e aplicação imediata da Norma. Isto posto, há um dispositivo para coibir a violência nas prisões, reeducar e colocar em prática os ensinamentos de Michel Foucault, em sua obra ora servindo de base ao presente artigo cientifico.

Em suma, a evolução de selvajaria nas prisões segundo Michel Foucault, se condiciona a fatores históricos e, o poder subjetivo do Estado em punir torna-se condescendente em suas perspectivas em ter um sistema carcerário de qualidade. A história se funde no momento atual, especialmente no Brasil, com a crise carcerária e com a omissão do Estado em frear o avanço do ilusionismo de que quanto mais cárcere, melhor para a sociedade e colocar enjaulado os indivíduos é o modo inibidor, pois saem das ruas e não cometem mais crimes.

Assim, surge o paradoxo, uma vez que, todo o sistema é pensado para que a saída, o “pós-cárcere”, da prisão, seja oportunidade de mudança do ser, enquanto individuo da sociedade e precisa sobreviver aos percalços na marginalização, ao passo que o Estado mesmo tira as oportunidades, tendo como auxiliares indispensáveis, as grades e o isolamento, como forma de repreensão e indivíduos cada vez mais selvagens.

2.2 O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO

As razões de tanta violência nos presídios brasileiros e ao longo da história é um conjunto de fatores que sempre estarão presentes enquanto não houver reforma no sistema carcerário e a negligencia do Estado acabar.

Como dito acima, este segundo objetivo visa analisar os motivos de tanta violência. O fato é que, os presídios brasileiros estão superlotados, não há infraestrutura para tanto, uma vez que se prende muito e solta pouco. Neste contexto, a separação dos presos por natureza do crime, cor, escolaridade e periculosidade, não acontece, pois o Estado obsoleto não está preocupado em qualidade e retorno a sociedade como indivíduos com sede de mudança, e sim com mais encarceramento e marginalização.

Em pesquisa feita pelo IFOPEN – Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias e DEPEN – Departamento Penitenciário Nacional, em dados de 2014 e 2016, existe um perfil de presos no Brasil. Em 2014 a população carcerária era de 622.202 presos[1], em Junho de 2016 era de 726.712[2].

Assim vê-se que a tendência é crescer ainda mais, pois segundo pesquisas, o numero de pessoas presas por pequenos delitos, ou melhor, crime de menor potencial ofensivo está em ordem crescente a cada ano. Pessoas que cometem este tipo de crime não ficam separadas de outros detentos que, no geral, são de alta periculosidade. Estes são colocados no mesmo cubículo e assim acontece à sucumbência à violência e, consequentemente, ao mundo do crime.

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Indivíduos que, muitas vezes, sem nenhum antecedente criminal ou reincidência, passam a ter sua integridade física e moral abaladas, e como corolário desta violência, são obrigados a integrar alguma facção. Por isso a importância da separação dos encarcerados, como está positivado na Lei de Execuções Penais é a chave para atenuação da violência.

Logo, a prisão, nestes termos, corrompe os direitos humanos, uma vez que a liberdade do indivíduo é violada no momento em que é obrigatório a entrar em facção criminosa para não morrer e assim, o numero de membros destas, crescem a cada ano. Sendo assim, sujeitos presos por crimes de menor potencial ofensivo, ou sem violência ou grave ameaça, crescem ainda mais, aumenta a massa de presidiários, tendo aí a superlotação nos presídios brasileiros e, por consequência, estas corroboram para o aumento no numero de membros em facções.

O tráfico de drogas é também outro fator que auxilia na superlotação. Cerca de 28% da população em prisões é por tráfico ilícitos de entorpecentes[3].

Outro fator para contribuição da violência é o grau de escolaridade dos presos. Em dados mais recentes, cerca de 24,92% possuem ensino médio incompleto; até ensino fundamental completo 75,08%[4]; menos de 1% tem graduação[5], ou seja, conclui-se um déficit de educação e, quanto menor o grau de escolaridade, mais chance do individuo cometer delitos. O Brasil é um Estado precário em oferecer uma educação de qualidade.

As oportunidades são poucas, a marginalização está explicita na sociedade. É dever do Estado oferecê-la, logo, o investimento de estudos dentro do estabelecimento prisional, com professores preparados e com a noção que a educação transforma o indivíduo, baixaria muito o índice de violência.A Lei de Execução Penal também dispõe sobre o estudo do condenado.

Além de tudo já demonstrado, o perfil dos presidiários, em sua grande maioria, são pessoas negras, tendo o índice de 64% a prisões (dados 2016). Assim, denota-se a segregação racial no Brasil, em que os negros são a maioria nas prisões brasileiras. Em consonância, a faixa etária dos jovens entre 18 e 29 anos, é de 55% da população (2016), demonstrando assim a entrada ao mundo do crime é prematura e, em sua maioria, tem reincidência.

O direito à Educação, positivado na Constituição Federal, em seu artigo 206, inciso I[6], dispõe que “o ensino será ministrado com base nos seguintes princípios; I- igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”. Este é um direito ferido todas as vezes que jovens e adolescentes não têm oportunidade de estudo.

Assim também, o artigo 208, em seu inciso I, do mesmo diploma legal, preceitua que é dever do Estado dar a garantia de educação básica obrigatória e gratuita dos 4 aos 17 anos e que, caso estes adolescentes e jovens, quando em idade própria, não participaram da escola, estes terão a segurança de executá-la quando quiser, pois é um direito de todos. No Amazonas, este índice é de 40%. Logo, se constata uma deficiência na distribuição igualitária de educação, levando à marginalização e um caminho aberto para o crime.

Outrossim, analisando o que fora demonstrado, a tipificação do crime também está ligado ao aumento da violência. Os índices de crimes no Brasil[7] estão divididos da seguinte forma: 46% são crimes contra o patrimônio, por exemplo, roubo e furto;tráfico ilícito de entorpecentes 28%; crimes contra a pessoa 13%; estatuto do desarmamento 5%; 5%; crimes contra a dignidade sexual 4%; crimes contra a paz pública 2%[8].

Assim, os crimes elencados nesta seção, devem, segundo a Lei de Execuções Penais, estar separados pelo seu grau de periculosidade, violência, grave ameaça à pessoa, o que não acontece. Por conta disso, a prisão em toda a sua rigidez paradoxal, fere o principio basilar que está positivado na Constituição Federal, como um dos fundamentos da República, no artigo 1º, III, CF/88, o princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Com esta gênese, a inconstitucionalidade, é instantânea.

Há também um alto percentual de mulheres na prisão, segundo o IFOPEN[9], cerca de 5% da população, são mulheres, totalizando 45.989. O crime mais comum praticado é o tráfico ilícito de entorpecentes, com 62%.

Não obstante, o artigo 5º, inciso XLIX, da Carta Magna[10], preceitua que “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”. Logo, o Estado, com o seu “jus puniendi”, dever de punir, precisa também assegurar a integridade dos presos, uma vez que, todo o sistema carcerário é deficiente em oferecer a diminuição da violência e a forma de coibição seria colocar na prática estes princípios elencados e ter políticas públicas, começando pela sociedade.

Nesta linha tênue, sobre um viés punitivo e omissivo, o Estado necessita criar elementos para que o sistema penitenciário seja uma reeducação e, segundo o filosofo Foucault[11], esta dever ser totalmente repensada, de forma que a ressocialização seja total e eficiente, de modo que a reincidência seja erradicada.

Por isso, uma sociedade educada reflete instantaneamente nos delitos cometidos, uma vez que, como já exposto, o grau de escolaridade baixo, produz pessoas propensas ao crime, pois não há oportunidades para todos. Não tendo a separação criteriosa dos estabelecimentos prisionais, as facções tornam-se maiores, dentro e fora das cadeias brasileiras, aumentado assim o crime organizado nas comunidades mais pobres do Brasil.

Ordens para o cometimento dos delitos, na sociedade brasileira, o tráfico de drogas que são comandados pelos “chefes das facções” do lado de dentro, onde deveriam estar se reeducando, trabalhando para pagar a pena imposta pelo judiciário, mas que há conluio com o Estado, ante sua omissão.

Com a superpopulação os presídios, as facções recrutam mais membros e, assim, ocorre a guerra entre facções. A realidade do sistema carcerário brasileiro é a fabricação de delinquentes, como já visto, em sua maioria, jovens com baixa escolaridade e com falta de oportunidades, tendo sua integridade física e moral violadas.

2.3 O COMPLEXO PENITENCIÁRIO ANÍSIO JOBIM

 Como já visto, a guerra entre as facções só tende a crescer ano a ano. Logo, para uma análise no caso concreto, o Presídio Complexo Penitenciário Anísio Jobim – COMPAJ, em Manaus, Amazonas, foi palco da maior carnificina em anos, em 2017.

No Amazonas, o número de presos provisórios[12], é de 40%[13]. Já os presos condenados, são de 64,4%. O presídio onde ocorrera o massacre, foram mortos 56 detentos, enquanto 225 presos evadiram-se, porem 165 foram recapturados pela policia do Amazonas. Este foi o ápice da superlotação e a incompetência do Estado.

O segundo maior massacre do Brasil, fora registrado pelas câmeras de segurança durante 17 horas. Presos da facção Família do Norte – FDN e decidiram começar a matança para assumir o poder e mostrar “quem é que manda”, massacrando, esquartejando, torturando membros da facção rival, o Primeiro Comando da Capital – PCC, oriunda de São Paulo, pois há uma concorrência pelo tráfico de drogas. Alguns detentos tinham se evadido do Instituto Penal Antônio Trindade – IPAT e foram recapturados, esta serviu para manter as autoridades ocupadas, assim teriam a chance do show de horrores se concretizar, alcançando a finalidade de intimidação ao poder público, gerando uma verdadeira comoção na sociedade nacional e internacional.

O planejamento de todo este suplicio entre os presos que estão sob a tutela do Estado e que deveriam estar cumprindo suas penas, mostra o poder das facções e poder de pessoas sobre o próprio Estado que as encarcera. A efetivação dos Direitos Humanos e os Direitos Fundamentais foram totalmente deturpados, mostrando a carência de um sistema de planejamento de políticas públicas, em harmonia com o dispositivo legal. O massacre em Manaus, Amazonas, fora a explosão da crise carcerária no Estado, bem como nacional.

Finalmente, em uma análise estritamente penalista, os recursos do Estado devem, com a tutela que lhe é inerente, assegurar o cumprimento da pena imposta por Sentença Condenatória Transitada em Julgado, bem como instituir um sistema de desenvolvimento para que o encarcerado seja, ao sair, reintegrado à sociedade com consciência de que terá oportunidades de trabalho, principalmente se no estabelecimento prisional onde este estava, preparava-o para o mercado de trabalho, mas para que isto reflita neste, o Estado deve garantir, em sua saída, o que este aprendeu em seus dias de trabalho e estudos dentro da prisão.

2.4 A LEI DE EXECUÇÃO PENAL

 Neste quarto objetivo, a Lei de Execução Penal – Lei 7.210/1984 define em seu Artigo 1º[14]que, sua finalidade é “efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal”, bem como a integração deste ao seio da sociedade. Verifica-se que a Lei por si só tem aplicação imediata, uma vez que o Artigo 2º dispõe acerca do princípio da legalidade, igualmente sua natureza jurídica de executar a pensa imposta.

O ordenamento jurídico não satisfaz aos anseios que esta lei completa nos traz. Ademais, o Artigo 5º da mesma[15], preceitua sobre a classificação, feita por uma comissão especial, para definir acerca de seus antecedentes, reincidência e personalidade, ou seja, periculosidade do sentenciado. Tudo isso e consonância com o princípio da Isonomia, disposto no Artigo 3º, para que seja atingida a finalidade de individualização da pena e que seja cumprida com excelência, tendo a percepção da saída de um egresso reintegrado ao seio social de forma pacífica. Esta classificação é feita pela Comissão Técnica de Classificação que fará apreciação minuciosa dos presos condenados.

Em consonância, o Artigo 84, da LEP, em seu § 1º[16], os presos provisórios deverão ficar separados dos presos por sentença judicial transitado em julgado, tal como obedecer os seguintes incisos: “I-acusados pela prática de crimes hediondos ou equiparados; II- acusados pela prática de crimes cometidos com violência ou grave ameaça a pessoa; III- acusados pela prática de outros crimes ou contravenções diversos dos apontados nos incisos anteriores”. Já o §2º dispõe sobre a prisão especial, um vez que o condenado seja funcionário da administração da justiça criminal.

Não obstante, o §3º, trata-se dos presos condenados e será da seguinte forma: “I- condenados pela prática de crimes hediondos ou equiparados; II- reincidentes condenados pela prática de crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa; III- primários condenados pela prática de crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa; IV- demais condenados pela prática de outros crimes ou contravenções em situação diversa das previstas nos incisos anteriores”. Do mesmo modo, o §4º ordena que “o preso que tiver sua integridade física, moral ou psicológica ameaçada pela conveniência com os demais presos ficará segregado em local próprio.”

Logo, há a percepção de uma Lei com uma natureza humana e ressocializadora, para que o sujeito cumpra sua pena nos moldes de sua personalidade e delito cometido.

A Comissão realizará procedimentos, com o fim de atender a sentença e o cumprimento da Lei. Ademais, serão realizados exames “para obtenção dos elementos necessários a uma adequada classificação e com vistas à individualização da execução”[17].

Na mesma linha, a LEP dispõe acerca das assistências[18], em consonância com a Constituição Federal de 1988, material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa. O Artigo 10, da referida Lei, nos diz que é dever do Estado prestar esta assistência. De modo que, a assistência material consiste no “fornecimento de alimentação, vestuário e instalações higiênicas”[19] dentre outras que estão positivadas, a assistência jurídica é a garantia de não ter prejuízo da sua defesa, quando não tiver recursos financeiros. para advogado.

Ademais, a assistência educacional[20], na Lei de Execução Penal, se complementa com o Decreto nº 7.626/2011 que institui o Plano Estratégico de Educação no âmbito do Sistema Prisional, e é compreendida “a instrução escolar e a formação profissional do preso e do internado.”

A escolaridade dos presos é uma parte importante para o processo de reintegração à sociedade e este será definido da seguinte forma: o primeiro grau será obrigatório e o supletivo será oferecido aos presos, presas, jovens e adultos, com o fim de obter formação, como dispõe a Carta Magna, em suscitar que a educação é universal.

Já para que a ressocialização seja alcançada, a assistência social tem “a finalidade de amparar o preso e o internado e prepará-los para o retorno à liberdade”[21]. Por este motivo, há uma serie de critérios que devem ser seguidos, de acordo com o Artigo 23: “incumbe ao serviço de assistência social: I- conhecer os resultados dos diagnósticos e exames; II- relatar, por escrito,ao diretor do estabelecimento, os problemas e as dificuldades enfrentados pelo assistido; III- acompanhar o resultado das permissões de saídas e das saídas temporárias; IV- promover a orientação do assistido, na fase final do cumprimento da pena, e do liberando, de modo a facilitar o seu retorno à liberdade; V- providenciar a obtenção de documentos, dos benefícios da previdência social e do seguro por acidente no trabalho; VI- orientar e amparar, quando necessário, a família do preso, do internado e da vítima.”

Em detrimento desta, a assistência ao egresso[22] é corolário natural, uma vez que este necessita se adequar ao meio da sociedade e com a orientação e apoio, rapidamente se integrará à sociedade. Não obstante, o trabalho na cadeia auxilia a esta rápida reinserção ao convívio em sociedade.

O trabalho também está positivado[23]e “é um dever social e condição de dignidade humana”. A finalidade é a educação e produção. O preso não deve ser ocioso, mas também deve receber pelo trabalho remunerado. Porém, este trabalho não está vinculado à Consolidação das Leis do Trabalho. Segundo o Artigo 29, o trabalho do preso não poderá ser inferior três quartos do salário mínimo. Já o produto é da seguinte forma: “§ 1º o produto da remuneração pelo trabalho deverá atender: a) à indenização dos danos causados pelo crime, desde que determinados judicialmente e não reparados por outros meios; b) à assistência à família; c) a pequenas despesas pessoais; d) ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação prevista nas letras anteriores.”

Mas não é só ser preso e automaticamente terá um trabalho. Este passará por uma avaliação e serão analisadas as aptidões e capacidades do apenado. A cada três dias trabalhados, este sofre a remição, ou seja, um dia da pena é descontado[24]. Em HC 261.514/SP, julgado pelo STJ, o apenado que estiver sem condições de trabalhar, por conta de acidente, ainda assim este se beneficiará com a remição[25]. Logo, o tempo que foi remido terá efeitos de computação para a pena cumprida. Por isso a importância do preso ter um trabalho, além deste poder diminuir a sua pena, este voltará à sociedade de forma a estar apto a prestar um serviço com qualidade com mudanças na vida.

Assim, os presos têm direitos e deveres internos, todos elencados na Lei de Execução Penal, mas não só com os outros presos, mas também às autoridades que trabalham nos presídios.  Os deveres[26] estão elencados no Artigo 39 e, todos devem seguir para a regra da boa convivência. Dentre alguns, destaco que é um dever do apenado a execução do trabalho, das tarefas e ordens, bem como o pagamento de indenização ao Estado, se possível, das despesas, com desconto proporcional da remuneração do trabalhador.

Ademais, os direitos positivados na LEP, também estão em outros dispositivos, como a Constituição Federal em seu Artigo 5º, III e XLIX, bem como o Decreto nº 9.455 - Pacto de San Jose da Costa Rica, em seu Artigo 5º, Item I e II. Os presos devem ter sua integridade respeitada, mas não só às autoridades devem ter este acatamento, mas os outros presidiários também devem respeitar. Nas prisões brasileiras não vigora este direito fundamental, uma vez que a violência cresce em proporções assustadoras e a crise carcerária nunca acaba.

Os Direitos inerentes ao ser humano são os direitos humanos, fundado na Dignidade da Pessoa Humana, logo, o pagamento da pena por delito cometido, deve ser de forma criteriosa e de acordo com o ordenamento jurídico vigente. Com a crise assolando o país, deve o poder público instituir meios para o funcionamento de um sistema punitivo rigoroso de acordo com as lides passadas para mais eficiência, ou seja, os meios serão o modo como chegará ao fim social almejado.

O controle que Lei de Execução Penal dispõe em seu conteúdo é a base para o sistema progredir. A execução não trata somente dos condenados definitivos, tão somente os presos provisórios são abrangidos por ela.

Por fim, os estabelecimentos penais[27]são destinados aos condenados, presos provisórios, aos submetidos à medida de segurança e ao egresso. Este tem a finalidade de deixar em cárcere o apenado e que este cumpra até o final a execução da pena. Deve haver algumas regras que serão impostas ao estabelecimento.

De acordo com a Resolução do Conselho Nacional de Política Criminal[28], nos fala acerca do oferecimento universal da educação às prisões. Em seu Artigo 3º preceitua em seus incisos: “A oferta da educação no contexto prisional deve: I- atender aos eixos pactuados quando da realização do Seminário Nacional pela Educação nas Prisões (2006), quais sejam: a) gestão, articulação e mobilização; b) formação, e valorização dos profissionais envolvidos na oferta de educação na prisão; c) aspectos pedagógicos. II- resultar do processo de mobilização, articulação e gestão dos Ministérios da Educação e Justiça, dos gestores estaduais e distritais da educação e Administração Penitenciaria, dos Municípios e da sociedade civil; III- ser contemplada com as devidas oportunidades de financiamento junto aos órgãos estaduais e federais; IV- estar associada às ações de fomento à leitura e implementação ou recuperação de bibliotecas para atender à população carcerária e os profissionais que trabalham nos estabelecimentos penais; e V- promover, sempre que possível, o envolvimento da comunidade e seus familiares do(a)s preso(a)s e internado(a)s e prever atendimento diferenciado para contemplar as especificidades de cada regime, atendendo-se para as questões de inclusão, acessibilidade, gênero, etnia, credo, idade e outras correlatas.”

Deve haver então uma colaboração de toda a comunidade, em conjunto com a tutela do Estado para que estas normas tenham aplicação e que sejam eficientes.

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Sobre as autoras
Karen Rosendo de Almeida Leite Rodrigues

ADVOGADA, PROFESSORA UNIVERSITÁRIA, PESQUISADORA

Eloíse Regina da Silva Cacau

GRADUANDA DO CURSO DE DIREITO DA UNINORTE

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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