Rui Barbosa disse que justiça atrasada não é justiça. Isso é especialmente verdadeiro no universo empresarial para os pequenos negócios.
E apesar das mudanças ocorridas na sociedade, nos meios de comunicação e na tecnologia, nos processos de trabalho, a afirmação é ainda atualíssima, principalmente no que se refere às decisões judiciais sobre o Simples Nacional.
Elas são de grande importância pois esse regime tributário concentra mais de 74% das empresas brasileiras (sem contar o regime especial do MEI, em números de 2015). Mais ainda, essas definições são relevantes quando tratam da manutenção ou não dos pequenos negócios no regime tributário favorecido, pois isso pode significar a diferença entre a vida e a morte do empreendimento.
Nesse sentido, serve como exemplo recente pronunciamento do Tribunal Regional Federal da 1ª Região acerca da manutenção de decisão de primeira instância que reconheceu a nulidade de ato administrativo do fisco federal que excluiu empresa do Simples.
O ato de exclusão foi baseado no entendimento de que não pode permanecer no Simples a pessoa jurídica que presta serviços profissionais cujo exercício dependa de habilitação exigida em lei. No caso concreto, os sócios eram engenheiros e, ao que parece, esse teria sido o real motivo da exclusão: a formação profissional dos sócios.
No caso concreto, o objetivo social era a prestação de serviços de manutenção, afiação e industrialização de ferramentas de corte, que não está no rol daquelas privativas de engenheiros.
Para quem acompanha o aprimoramento da legislação do Simples Nacional, chama a atenção a discussão sobre o assunto, considerando que, desde 2014, com a aprovação da Lei Complementar 147, não há mais limitação para ingresso das chamadas empresas de profissão regulamentada, se fosse esse o caso.
Olhando com mais cuidado e pesquisando a respeito de suas fontes é possível descobrir que a decisão do TRF trata da legislação anterior, que criou o Simples Federal, a Lei 9.317, de 1996.
A empresa foi criada em 2002, o ato de exclusão do Simples é de 2004 e a ação foi ajuizada em 2005, de quando data a decisão que deferiu a tutela antecipada para manter a empresa no regime diferenciado. Depois de 2 anos e 4 meses, veio a sentença que julgou procedente o pedido da pequena empresa. Ocorrendo a apelação em 2008, o processo ficou no TRF da 1ª Região, indo e voltando dos gabinetes por longos 10 anos, até a decisão agora noticiada.
E a pequena empresa? Não conseguiu esperar 13 anos por uma solução definitiva. Foi tragada por esse ambiente inóspito que é a economia brasileira e, mesmo com o Simples, fechou as portas. Ainda bem para os empreendedores que a decisão da primeira instância foi mantida, pois, do contrário, ainda enfrentariam outra batalha judicial posterior sobre a responsabilidade pelo passivo advindo das diferenças entre regimes tributários.
Esse fato, que é mero exemplo do que ocorre aos milhares, indica a necessidade de reflexão sobre novas formas de solução dos conflitos decorrentes do Simples.
A demora na prestação dos serviços públicos jurisdicionais é excessiva e contribui para o ambiente de insegurança aos empreendedores. Significa risco e desincentivo ainda maiores para os pequenos negócios, para os quais um eventual passivo tributário acumulado em anos de espera por uma solução jurisdicional pode impactar fortemente a própria continuidade regular da vida dos cidadãos que ousaram empreender. Basta ver a lista de consequências do débito tributário não pago, desde negativações cadastrais e protestos até a nova possibilidade de bloqueio administrativo de bens.
Ao contrário das maiores empresas, que possuem meios e condições de administrar essa demora, inclusive por meio de provisões para essas contingências, os pequenos negócios devem merecer tratamento diferenciado também junto ao Poder Judiciário, de forma a priorizar as demandas do Simples Nacional.
É necessário discutir novas formas de atender as demandas jurisdicionais que envolvam as micro e pequenas empresas, pelo evidente interesse público de rápida solução de litígios que comprometem diretamente a sua sobrevivência e o seu potencial de crescer e gerar trabalho, emprego e renda.
É de se comemorar que o Conselho Nacional de Justiça tenha desde 2009 fixado metas de desempenho do Poder Judiciário, buscando proporcionar serviços mais céleres, eficientes e qualificados, mas isso não tem sido suficiente.
Em 2018 espera-se julgar na Justiça Federal, até 31 de dezembro, todos os processos distribuídos até 2013. Ou seja, a meta contempla a admissão de uma demora de 5 (cinco) anos, o que é excessivo tratando-se de uma definição de grande impacto social e econômico.
Aproveitando que a formulação de metas do CNJ adotou um processo participativo, enquanto mudanças nas regras não puderem ser viabilizadas, caberia às entidades representativas dos pequenos negócios defenderem o estabelecimento de meta específica para 2019 voltada aos processos que envolvam o Simples Nacional visando reduzir sensivelmente o seu tempo médio de duração entre o andamento inicial e a baixa. É a chamada priorização dos julgamentos já aplicada a diversos outros temas.
Outra possibilidade é a aceleração da implantação do recente Código de Defesa do Usuário de Serviços Públicos que também impõe ao Poder Judiciário várias ações que têm direta relação com os anseios dos cidadãos e das empresas.
São os casos da obrigação de criar a Carta de Serviços, instituir o Comitê de Usuários, estabelecer prazos para a conclusão dos serviços e níveis mínimos de qualidade etc. Agora não mais como metas de governança, mas como deveres que podem trazer avanços mais rápidos e consistentes.
Em 2020, a afirmação de Rui Barbosa completa 100 anos. Ainda há tempo de torná-la superada ao menos para quem mais precisa de celeridade entre os empreendedores brasileiros.