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Relação de trabalho na Emenda Constitucional nº 45

20/06/2005 às 00:00
Leia nesta página:

            A Emenda Constitucional 45/2004 acarretou uma considerável ampliação da competência material da Justiça do Trabalho, como se pode depreender da nova redação atribuída ao artigo 114, da Constituição Federal.

            Em razão de sua natureza especializada, a Justiça do Trabalho, por disposição constante no antigo texto do artigo 114 da Constituição Federal, no campo individual, analisava, em regra, apenas litígios decorrentes da relação de emprego e, em caráter excepcional, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, como por exemplo, nas hipóteses previstas no artigo 652, a, III e V, da CLT, em razão de expressa autorização constitucional para ampliação da competência material por meio de lei ordinária (antiga redação do artigo 114, da CF).

            Não importava a natureza do provimento jurisdicional reclamado, desde que este resultasse da mencionada relação, a Justiça do Trabalho tinha competência material para sua apreciação. Assim é que os mandados de segurança, ações possessórias, ações rescisórias e ações consignatórias eram deduzidos perante a Justiça do Trabalho sem maiores resistências. Tanto isso é verdade, que o STF já havia se manifestado no sentido de que a competência material da Justiça do Trabalho firmava-se pela pertinência da pretensão ao contrato de trabalho, não se levando em consideração a providência deduzida, desde que esta fosse reclamada por uma das partes envolvidas no mencionado contrato laboral, excepcionando-se, apenas, as questões acidentárias (Súmula 501, do STF, e artigo 843, §2º, da CLT).

            Com o advento da Emenda Constitucional 45/2004, mormente em razão da expressão "relação de trabalho" constante nos incisos I e VI, do artigo 114, foi desencadeada uma série de interpretações, chegando-se aos exageros mais inusitados.

            Se a expressão "relação de trabalho" for considerada em seu sentido mais lato, estar-se-á diante de um caos. Neste particular, escreve WAGNER D. GIGLIO (1):

            "Convém enfim observar, em cumprimento ao princípio da razoabilidade, que a se exagerar o alcance da ampliação da competência, e como quase todas as relações sociais implicam ou estão vinculadas a uma relação de trabalho, muito pouco restaria sob a égide da Justiça Ordinária: as relações de família, as patrimoniais não derivadas do trabalho, as de comércio não relacionadas à prestação de serviços e as de defesa da propriedade, como lembra JORGE LUIZ SOUTO MAIOR, para concluir que chegaríamos ao absurdo de transformar a Justiça do Trabalho em Justiça Comum e esta, em Justiça Especial (in "Nova Competência da Justiça do Trabalho, p. 183).

            Nessa linha, há autores sustentando que, em razão do disposto no inciso IX, do artigo 114, a competência para apreciar litígios decorrentes da "relação de trabalho" estaria limitada à existência de lei trazendo esta previsão. Assim, como os litígios decorrentes da relação de emprego (CLT, artigo 652, a, IV), do contrato de empreitada do pequeno empreiteiro (CLT, artigo 652, a, III) e do trabalho avulso (CLT, artigo 652, a, V), contam com esta previsão, a Emenda Constitucional 45/2004 nenhuma alteração teria acarretado neste tocante.

            Neste sentido, ensina SÉRGIO PINTO MARTINS (2):

            "O inciso I do art. 114 da Constituição determina a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar ações oriundas da relação de trabalho. Estabelece o que abrange essas relações, que são os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Inclui, portanto, as autarquias e fundações públicas dos referidos entes da federação.

            Dispõe o inciso IX do art. 114 da Lei Maior que outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei, são de competência da Justiça do Trabalho.

            A interpretação sistemática da Constituição mostra que as outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho que serão previstas em lei são diversas das já previstas nos incisos I a VIII do mesmo artigo 114 da Lei Magna, pois elas já estão indicadas nos incisos, como exercício do direito de greve, representação sindical, dano moral, penalidades administrativas etc".

            Por outro lado, há autores que admitem a ampliação da competência para apreciar litígios decorrentes da relação de trabalho, desde que esta tenha cunho econômico, pois é da história da Justiça do Trabalho a lida com o conflito entre capital e trabalho.

            As várias correntes são unânimes em reconhecer que o atual texto do artigo 114 é deveras confuso. Todavia, uma interpretação acerca do verdadeiro sentido da expressão "relação de trabalho" ainda não foi abordada.

            Não obstante as Constituições anteriores sempre terem limitado a competência material da justiça do trabalho a litígios decorrentes da "relação de emprego" (3), sendo esta apenas uma espécie de "relação de trabalho", há, no próprio texto constitucional originário, o uso da expressão "relação de trabalho" como sinônimo de "relação de emprego". Isso acontece no inciso XXIX, do artigo 7º, da Constituição Federal, quando diz:

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            Art. 7º

"São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

            (...)

            XXIX

 - ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho;" (g.n.)

            É inegável que, neste dispositivo, o constituinte se referia à relação de emprego. Se não fosse este o entendimento, todos os incisos constantes no artigo 7º, da Constituição Federal, seriam aplicáveis a todos os trabalhadores, sejam eles subordinados (empregados) ou não. Caso contrário, por outro lado, qualquer relação de trabalho, desde que prestada por uma pessoa física (trabalhador), teria, como prazo prescricional para reclamação de créditos dela decorrentes, aquele previsto no mencionado inciso.

            Não se faz necessária uma ginástica de raciocínio para constatar que os incisos do artigo 7º, da Constituição Federal, não são aplicados a qualquer trabalhador urbano ou rural, pois ali constam, elencadas nos incisos, verbas nitidamente trabalhistas, tomadas em seu sentido estrito, o que, obviamente, acaba limitando sua aplicação no âmbito da relação de emprego.

            Nesse diapasão, é perfeitamente razoável a interpretação que sugere a utilização da expressão "relação de trabalho" como sinônimo de "relação de emprego", quando analisados os incisos I e VI, do artigo 114, da Constituição Federal.

            De outra banda, a expressão "relação de trabalho" constante no inciso IX, por se tratar de simples cópia da previsão que já constava no antigo texto do mencionado artigo 114, tem justificada sua utilização no sentido lato, já que reclama lei ordinária para ampliação da competência da justiça laboral, como ocorre nos casos já mencionados neste texto.

            Em razão do exposto, com fins de viabilizar o debate acerca da amplitude da expressão "relação de trabalho", sugere-se seja, nos incisos I e VI, do artigo 114 da Lei Fundamental, tomada como sinônimo de "relação de emprego", a exemplo do que se faz no inciso XXIX, do artigo 7º, e, com relação ao inciso IX do mencionado artigo 114, que continue a ser aplicada como antes, significando relação de trabalho em sentido lato.


BIBLIOGRAFIA

            GIGLIO, W.D. Nova competência da justiça do Trabalho: aplicação do processo civil ou trabalhista? Revista LTr Legislação do trabalho. Vol. 69, nº3, Março de 2005.

            MARTINS, S.P. Direito processual do trabalho. 23ª ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 132-3.

            BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. 32ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005


Notas

            01

Nova competência da justiça do Trabalho: aplicação do processo civil ou trabalhista? Revista LTr Legislação do trabalho. Vol. 69, nº3, Março de 2005.

            02

Direito processual do trabalho. 23ª ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 132-3

            03

Relação existente entre empregado (CLT, artigo 2º) e empregador (CLT, artigo 3º)
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Sobre o autor
Luís Carlos Mello dos Santos

Professor de Direito Processual do Trabalho da UNIRP - Centro Universitário de Rio Preto Membro da Coordenadoria do Curso de Direito da UNIRP - Centro Universitário de Rio Preto, Mestrando em Direito pela ITE/BAURU-SP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Luís Carlos Mello. Relação de trabalho na Emenda Constitucional nº 45. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 715, 20 jun. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6902. Acesso em: 24 nov. 2024.

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