Lei 13.718/2018: novidades nos crimes contra a dignidade sexual

26/09/2018 às 12:30
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Em 24 de setembro de 2018, o ministro do STF JOSÉ ANTONIO DIAS TOFFOLI, na condição de presidente interino, sancionou a Lei no. 13.718, de 24 de setembro de 2018, que trouxe interessantes modificações no tocante aos crimes contra a dignidade sexual, entrando em vigor a partir de sua publicação. Passemos a analisar algumas destas alterações.

A primeira novidade diz respeito à revogação da contravenção penal prevista no artigo 61 da Lei de Contravenções Penais (Decreto-Lei no. 3.688/41), que tratava da conduta do agente que importunasse alguém, em lugar público ou acessível ao público, de modo ofensivo ao pudor, cuja previsão era apenas da pena de multa. Com efeito, criou-se um novo crime no Código Penal (artigo 215-A) chamado de “importunação sexual”, que consiste em praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceira, com uma pena de reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o ato não constituir crime mais grave.

Tal modificação ocorreu devido a fatos recentes ocorridos no Brasil, que deixaram a população perplexa, em especial o caso ocorrido em São Paulo, quando um homem, segundo se noticiou, tendo ejaculado em cima de uma passageira dentro de um ônibus, não foi preso, uma vez que enquadrado na mencionada contravenção penal, que tinha pena apenas de multa. Como o fato ocorreu sem violência física ou grave ameaça, não houve, à época, como enquadrá-lo em outro crime, sendo que ele já teria outras passagens policiais por condutas semelhantes.

Por outro lado, é sabido que no artigo 217-A, do Código Penal, temos o crime de estupro de vulnerável, quando alguém mantém conjunção carnal ou pratica outro ato libidinoso com um(a) menor de 14 (quatorze) anos, ou com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. Neste contexto, a nova lei deixou claro, para que não houvesse mais discussões jurisprudenciais acerca do assunto, que o fato deste vulnerável ter consentido com o agente na prática do crime ou o fato da vítima já ter mantido relações sexuais anteriormente ao crime, tais circunstâncias não excluem o crime de estupro de vulnerável.

Aqui, a discussão se dava muitas vezes, em casos, onde uma pessoa mantinha relações com menores, que eventualmente estivessem sendo exploradas sexualmente ou em prostituição, e o acusado levantava a “experiência” pregressa das vítimas, para querer se isentar do crime. A nova lei deixa claro que tal linha argumentativa não surtirá efeitos.

Outrossim, em boa hora, foi criado o crime de “divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia” (artigo 218-C do Código Penal) consistente na conduta de oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio – inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça a apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia. A pena prevista é de reclusão de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o fato não constituir crime mais grave, sendo que há uma causa especial de aumento de pena de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação. A nova lei prevê a hipótese de exclusão de ilicitude quando o agente pratica as condutas mencionadas em publicação de natureza jornalística, científica, cultural ou acadêmica com a adoção de recurso que impossibilite a identificação da vítima, ressalvada sua prévia autorização, caso seja maior de 18 (dezoito) anos.

Ademais, temos uma mudança importante relativa ao processo penal, considerando que a partir de agora, os crimes contra a liberdade sexual (estupro, violação sexual mediante fraude, assédio sexual) e os crimes sexuais contra vulnerável (estupro de vulnerável, satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente, favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável) passam a ser de AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA, ou seja, independem de representação ou queixa do ofendido ou de seu representante legal, para que os delitos possam ser apurados.

Outro aspecto a ser mencionado é que o novo diploma legal previu um aumento de pena pela metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tiver autoridade sobre ela. No caso de estupro coletivo, ou seja, aquele perpetrado mediante concurso de 2 (dois) ou mais agentes, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), o mesmo ocorrendo no chamado estupro corretivo, assim denominado aquele estupro que visa controlar o comportamento social ou sexual da vítima.

Por fim, o artigo 234-A do Código Penal foi modificado para prever 2 (duas) espécies de aumento de pena para os crimes sexuais em comento, a saber: a) aumento de metade a 2/3 (dois terço), se o crime resultar gravidez na vítima (antes o aumento era até a metade da pena imposta); b) aumento de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terço), se o agente transmite à vítima doença sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador, ou se a vítima é idosa (maior de 60 anos) ou pessoa com deficiência.

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Concluindo, observamos que a nova Lei 13.718, de 24 de setembro de 2018, visou dar um tratamento mais grave aos crimes mencionados, além de prever figuras novas de delitos que vêm sendo noticiado recentemente e de forma recorrente, e que não possuíam uma adequada punição anterior.

Sobre o autor
Leandro Felipe Bueno Tierno

Procurador da Fazenda Nacional em Brasília. Professor

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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