RESUMO
O presente artigo científico tem como escopo geral explanar de forma clara a Usucapião Familiar, trazendo seu conceito histórico e fundamentos. O art. 1.240-A foi criado pela Lei 12.424/2011, sendo a genitora da Usucapião Sanção, gerando influência no direito de família. Assim, para sua caracterização, serão observados os requisitos legais e os princípios que visam à proteção daquele que fora abandonado. O regime de bens é um importante requisito a ser analisado, se é regime de separação total, parcial, ou universal, podendo assim, caber ou não o direito à Usucapião Familiar. A Emenda Constitucional nº 66/10, extinguiu a separação judicial, sendo o divórcio o meio utilizado para a dissolução do casamento. A doutrina e a jurisprudência divergem bastante sobre a competência para julgar a Usucapião Sanção, existindo julgado na Vara de Família e na Vara Cível.
Palavras-chave: Usucapião Familiar Por Abandono do Lar. Lei 12.424/2011. Posicionamento Jurisprudêncial.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO; 2 A USUCAPIÃO; 2.1 Fundamentos; 3 DA USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA POR ABANDONO DO LAR CONJUGAL; 3.1 Requisitos; 3.2 Do regime de bens; 4 PRINCÍPIOS APLICÁVEIS À USUCAPIÃO FAMILIAR; 4.1 Princípio da dignidade da pessoa humana; 4.2 Princípio da liberdade; 4.3 Princípio da igualdade entre os cônjuges e companheiros; 4.4 Princípio da solidariedade familiar; 4.5 Princípio da vedação do retrocesso social; 4.6 Princípio da função social familiar; 5 DA COMPETÊNCIA PARA JULGAR; 6 EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 66 DE 13 DE JULHO DE 2010; 7 CONCLUSÃO; REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
1 INTRODUÇÃO
O instituto da Usucapião é um instituto bem antigo, que traz para o nosso ordenamento várias espécies desse meio aquisitivo, cada um com requisitos próprios. Contudo, este espaço se dedicará a abordagem da usucapião familiar, um meio de aquisição de propriedade originário, que não é muito antigo em nosso ordenamento jurídico, e que muita gente ainda desconhece sua existência, as vezes já com o direito adquirido, porém não vai atrás desse direito, tendo em vista não ter conhecimento de sua existência.
A Usucapião Especial Urbana por Abandono do Lar Conjugal, ou Usucapião Familiar, ou até mesmo Usucapião de Meação ou Usucapião Sansão, pode-se notar que existem várias nomenclaturas para se referir a este instituto tão peculiar e inovador, com requisitos que levaram muitas discussões e entendimentos positivos e negativos para o mundo jurídico, e também para o mundo doutrinário.
O artigo 1.240-A do Código Civil Brasileiro foi inserido no ordenamento jurídico pela Lei 12.424 de 16 de Junho de 2011, advindo do programa “Minha Casa Minha Vida” que visava garantir aquelas famílias mais necessitadas o direito a uma moradia digna, como proteção ao direito fundamental à moradia, garantida pela Carta Maior. Com a criação desse fenômeno, aquela família que foi abandonada por seu cônjuge ou companheiro poderá pleitear o direito de usucapir o bem onde mora, uma garantia e proteção à moradia para o cônjuge abandonado e sua família.
Uma particularidade deste instituto é o tempo para sua caracterização, o legislador ao elaborar este direito, colocou um lapso temporal bem inferior aos demais tipos de usucapião, sendo exíguos 02 anos do abandono injustificado do lar pelo ex-cônjuge ou ex-companheiro, juntamente com outros requisitos, a família abandonada poderá requerer a aplicação da usucapião de meação sobre este bem, para garantir o seu amparo, e assim, não ter risco de ficar desabrigada com a volta do que os abandonou.
Muitas famílias que preenchem todos os requisitos para a caracterização da usucapião de meação, não pleiteiam tal direito, por desconhecimento da existência do instituto, instituto este que visa à garantia do direito fundamental à moradia, a uma vida digna para essa família abandonada, direito fundamental este que é garantido pela própria Carta Magna.
Contudo, quando se entra com tal pedido, será observado se os requisitos se encacham, se houve abandono injustificado (por livre vontade/nãoforçado) e total do lar, se decorreram os 02 anos do abandono, se não tem outro imóvel no nome da pessoa abandona que entrou com o pedido, lembrando também que não se pode pleitear esse direito mais de uma vez. Com todos os requisitos respeitados, pode-se assim ser conferido o direito ao cônjuge abandonado.
Diante de todo o transcrito, visando minimizar o desconhecimento da lei e das possibilidades de requerer o direito ao instituto da usucapião, bem quanto as características e os requisitos a serem obedecidos para a sua aplicação, garantindo assim, a proteção à moradia, necessário se faz o desenvolvimento do presente artigo. A compreensão da existência e do conhecimento da usucapião familiar é de suma importância para se evitar injustiças e consequências terríveis para as famílias que foram abandonadas por seus companheiros e que devem ter seus direitos garantidos e protegidos.
A metodologia que se seguirá no presente artigo exploratório será baseada em uma vasta investigação bibliográfica, pesquisa em livros, em artigos científicos que já foram publicados e que tratam a respeito do tema abordado, também de entendimentos e decisões jurisprudenciais, bem como nas normas atreladas na Constituição juntamente com seus princípios, e no ordenamento jurídico que trata e regula o assunto. Tendo como ponto de partida este levantamento, pretende-se alcançar o proposito de expor de forma clara e objetiva, as principais características e formas de reconhecimento da Usucapião Especial Urbana Por Abandono do Lar Conjugal.
No capitulo 02, serão exibidos a história da usucapião e o conceito, de onde se origina a nomenclatura e o que era protegido desde a antiguidade, expondo seus os fundamentos para sua aplicação desde sua criação até os dias atuais, bem como o contexto constitucional e como a doutrina trata este instituto.
No capitulo 03, serão expostos às nomenclaturas que os doutrinadores adotam para se referir a Usucapião Familiar, bem como a forma de sua introdução no ordenamento jurídico, o que é protegido com este instituto, qual garantia é assegurada, as características a serem obedecidas e observadas para sua aplicação, será esclarecido também como será tratado o regime de bens dentro da usucapião de meação, e quando e como será possível pleitear este fenômeno.
No capitulo 04, serão apresentados uma relação de princípios aplicáveis à Usucapião Familiar, bem como sua existência dentro da Carta Maior e as características e significados de cada princípio mencionados, compreendendo a importância de cada um deles dentro do direito de família e na Usucapião Sanção.
No capitulo 05, serão tratadas as questões referentes à competência para processar e julgar a Usucapião Por Abandono do Lar se é da Vara de Família ou da Vara Cível, como a jurisprudência vem se posicionando sobre essa questão e o que é levado em consideração. Bem como o posicionamento doutrinário a respeito da competência, mostrando as divergências e os fundamentos da cada posicionamento.
De modo final, no capitulo 06, serão aduzidos esclarecimentos sobre a Emenda Constitucional nº 66 de 13 de Julho de 2010, que excluiu do texto constitucional a separação judicial e os prazos para a caracterização da extinção do vinculo maternal, deixando o divórcio como o único meio de extinção do casamento, sendo assim uma novidade no direito de famílias e podendo ser benéfico também para agilizar com menos burocracia a aplicação da Usucapião Familiar.
2 A USUCAPIÃO
É de suma importância à análise primeira do instituto da usucapião, sua origem, o significado da palavra, qual a função de tal instituto e o que realmente é protegido por ela. É um instituto que sem dúvida gerou e ainda hoje gera muitas discursões no mundo dos juristas e doutrinadores, sempre acrescentando novidades, com novos meios de caracterização dentro do direito real.
Quando se aborda um tema de importância considerável quanto o tema da usucapião, é certo que se está abordando um meio aquisitivo de propriedade que já existe há bastante tempo, ao mesmo passo que tal instituto não deixa de ser abordado e discutido no mundo jurídico até os dias atuais, considerando, desta forma, que o direito tutelado por ela não é só uma garantia à propriedade, mas alguns direitos reais, não todos, também gozam de sua tutela, garantindo e assegurando também a dignidade humana.
Etimologicamente o termo usucapião vem do latim “capere”, e desde a idade Romana já era tida como uma ferramenta utilizada para a aquisição de propriedade seja de bem móvel ou imóvel onde se observava o tempo como fator preponderante para sua caracterização, desta forma, observa-se que desde o inicio o instituto da usucapião visa o exercício e proteção da função social da propriedade.
Seguindo na linha de raciocínio, buscando compreender melhor a origem de tal instituo, disserta Silvio de Salvo Venosa com sabedoria:[3]
Usucapio deriva de capere (tomar) e de usus (uso). Tomar pelo uso. Seu significado era de posse. A lei das XII tábuas estabeleceu que quem possuísse por dois anos um imóvel ou por um ano um móvel tornar-se-ia proprietário. Era modalidade de aquisição do ius civile, portanto destinada aos cidadãos romanos.
Observando o acima citado, é forçosa a compreensão de que a usucapião veio para garantir o direito de domínio sobre a propriedade para aquele indivíduo que por determinado tempo em posse sobre um determinado bem, agindo nele como se dono fosse, passaria a ter direito de ser dono, garantindo o direito a moradia para o possuidor e o cumprimento da função social deste bem usucapido.
No que se refere ao conceito e sobre a origem do vocábulo usucapião, é muito comum no Brasil o tratamento desse instituto ser falado no gênero feminino, contudo, na doutrina existe divergência quanto a isso, transcreve a lição de Cleyson de Moraes Mello: “O vocábulo usucapião é originado do latim usucapione. Entre os doutrinadores existe divergência quanto ao gênero do vocábulo usucapião. Para uns será “o usucapião”, para outros “a usucapião”.[4]
No ensinamento de algumas doutrinas, e em muitas universidades dentro das salas de aulas, o lecionado sobre a maneira correta de expressar o vocábulo é no gênero feminino, sendo então chamada de “a usucapião”. Um instituto conhecido como sendo um meio originário de aquisição sobre bens móveis e imóveis, a posse transforma-se em domínio, estando cumprindo alguns requisitos exigidos em lei, para que assim, possa este fenômeno ser caracterizado.
Como já relatado acima, foi com a lei das XII Tábuas que o instituto da usucapião se consagrou como um meio originário de aquisição de bens móveis e imóveis, tendo como requisito, a posse contínua de 01 (um) ou 02 (dois) anos, tendo como data 455 antes de Cristo.
Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald transcrevem um breve histórico sobre a origem da usucapião. Senão vejamos:[5]
A usucapião restou consagrada na Lei das Doze Tábuas, datada de 455 antes de Cristo, como forma de aquisição de coisas móveis e imóveis pela posse continuada por um ou dois anos. Só poderia ser utilizada pelo cidadão romano, eis que os estrangeiros não gozavam dos direitos preceituados no ius civile.
Diante do citado, curioso observar que, os requisitos sempre esteve presentes para utilização da usucapião, como visto, os estrangeiros não faziam jus ao exercício do direito para com o instituto, não gozavam dos direitos elencados no ius civile, ou seja, apenas os romanos gozavam de tal direito, não importando se cumprira os requisitos, pois ser romano já era um dos requisitos.
A posse continuada, de forma mansa e pacifica por um determinado tempo, permite que o direito de domínio em cima daquele bem seja adquirido pelo possuidor, desta forma, extinguido o direito do proprietário sobre este bem. Carlos Roberto Gonçalves leciona em sua lição que: “[...] É modo originário de aquisição da propriedade e de outros direitos reais suscetíveis de exercício continuado (entre eles, as servidões e o usufruto) pela posse prolongada no tempo, acompanhada de certos requisitos exigidos pela lei; [...]”.[6]
Quando Gonçalves cita a questão sobre o usufruto, está a vista um importante requisito para o reconhecimento da usucapião, usufruir, no sentido de usar como se fosse seu, neste caso usando o bem com animus domini, ou seja, usar como sendo dono, se sentindo dono do bem, com isso, fazendo bem feitorias, sejam elas, necessárias ou voluptuárias, podendo até em alguns casos, fazer melhoramentos consideráveis neste bem, causando uma elevação positiva em seu valor.
As críticas mais comuns dentro da sociedade é que a usucapião causa um dano oneroso no patrimônio do então dono do bem, pegando este bem e presenteando outrem, no entanto, este meio de aquisição de propriedade, zela pelo direito a moradia, que é um direito fundamental garantido pela constituição, zela também pela função social da propriedade, que está prevista também na Carta Maior.
Tratando da nomenclatura do instituto da usucapião como “o usucapião”, o que para muitos soaria estranho, visto que a forma mais comum de tratar dessa nomenclatura é no feminino, Silvio de Salvo Venosa em sua lição, disserta conceituando este meio originário de aquisição de propriedade do seguinte modo:[7]
O usucapião deve ser considerado modalidade originária de aquisição, porque o usucapiente constitui direito à parte, independentemente de qualquer relação jurídica com anterior proprietário. Irrelevante ademais houvesse ou não existido anteriormente um proprietário.
A relação jurídica com anterior proprietário não vai ser o que vai dar ensejo ao direito à usucapião, mas sim, a relação do usucapiente com o bem, se aquele bem está mesmo passível de usucapião, e se o possuidor está enquadrado nos requisitos exigidos em lei para sua caracterização, como por exemplo a posse continuada, bem feitorias, o tempo exigido em lei, etc.
Com sabedoria Cleyson de Moraes Mello expõe seu pensamento da seguinte forma: “A usucapião é o modo originário de aquisição da propriedade, pelo decurso do tempo fixado em lei. Ora, é um modo de aquisição da propriedade de forma originária, já que inexiste relação jurídica entre o adquirente e o anterior proprietário”.[8]
O instituto da usucapião é uma forma originária de aquisição da propriedade, seja ela móvel ou imóvel, forma esta que advém do uso contínuo, prolongado e ininterrupto do bem, da posse exercida de forma contínua, duradoura, mansa e pacífica, por um determinado lapso temporal a ser percorrido estabelecido em lei para que ocorra a prescrição aquisitiva, observados todos os requisitos previstos em lei, passa o bem a ser passível da ação de usucapião sobre ele.
O instituto da usucapião está previsto no Código Civil Brasileiro e na Constituição Federal de 1988, apontando para cada espécie de usucapião, que diga-se de passagem, não são poucas as espécies desse instituto, os requisitos a serem cumpridos, o lapso temporal a ser percorrido e observado para sua caracterização e possível aplicação, entre outras peculiaridades. Sem duvida nenhuma a usucapião consagra o princípio da função social da posse e da propriedade.
2.1 Fundamentos
O fundamento do instituto da usucapião está atrelado na junção da posse com o tempo, logo, no princípio da função social e em dar segurança à propriedade, este fenômeno faz com que a posse transforme-se em domínio pelo decurso de um tempo, ou seja, existe um limite temporal em que o proprietário pode ficar inerte, passando esse lapso temporal junto com outros requisitos previstos em lei, o usucapiente toma o imóvel para seu domínio tornando-se dono.
O proprietário do bem tem o dever/direito de usar, gozar, dispor desse bem, dando um sentido social e coletivo, respeitando deste modo, o Princípio da Função Social da Propriedade que está prevista na Carta Maior e no Código Civil. Ademais, se deve considerar que o modo de aquisição seja de justo título, como aduz o Enunciado 303 da IV jornada de Direito Civil:[9]
Considera-se justo título, para a presunção relativa da boa-fé do possuidor, o justo motivo que lhe autoriza a aquisição derivada da posse, esteja ou não materializado em instrumento público ou particular. Compreensão na perspectiva da função social da posse.
É certo que se o proprietário do bem não utiliza-lo, mesmo que de forma indireta, correrá o risco de perder este bem pela usucapião para quem está com a posse do bem, móvel ou imóvel. Vamos então à lição de Carlos Roberto Gonçalves sobre os fundamentos da usucapião: “O fundamento da usucapião está assentado, assim, no princípio da utilidade social, na conveniência de se dar segurança e estabilidade à propriedade, bem como de se consolidar as aquisições e facilitar a prova do domínio”.[10]
Dito isto, observa-se que a posse e a propriedade não se confundem, quem tem a posse tem o poder de fato sobre o bem, já quem tem a propriedade tem o poder de direito sobre o bem, e é este poder de direito que se desvincula pela inercia do proprietário em cima do bem usucapido, transferindo esse poder de direito ao possuidor, deste modo, a posse transforma-se em domínio.
É de suma importância à compreensão dos fundamentos da usucapião em relação ao que é protegido e o que se busca garantir, e com isso observar os aspectos objetivos e subjetivos dentro deste instituto. Para melhor entendimento sobre esses dois aspectos, leciona Cleyson de Moraes Mello em sua obra o seguinte raciocínio:[11]
O fundamento da usucapião para uns apresenta cariz subjetivo, para outros aspecto objetivo. O caráter subjetivo está relacionado à negligência do proprietário quanto a sua posse, uma espécie de renúncia quanto ao domínio de sua coisa. O aspecto objetivo está ancorado no atendimento da função social e econômica da propriedade.
Com o que foi exposto, compreende-se que o fundamento da usucapião assenta-se em garantir ao possuidor de boa-fé, que deu função social a determinado bem, usando como seu e de sua família, agindo assim, com animus domini, fazendo valer o principio da utilidade social, dando estabilidade e proporcionando segurança à propriedade, o direito de pleitear, e uma maior facilidade em provar o domínio e de se robustecer as aquisições.
3 DA USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA POR ABANDONO DO LAR CONJUGAL
A usucapião familiar, que também pode ser chamada de usucapião especial urbana por abandono do lar conjugal, ou usucapião de meação, ou usucapião sanção ou até mesmo de usucapião pró-família, que só pode ser concedido para a mesma pessoa uma única vez, é um instituto bem peculiar gerador de várias discursões dentro da doutrina.
É um meio originário de aquisição de propriedade que contem o menor prazo para sua caracterização, trazendo um prazo de 02 anos apenas, observa-se que este fenômeno contém um prazo menor que a usucapião de bem móvel, sendo que o prazo a ser percorrido para a caracterização da usucapião de bem móvel vem a ser de 03 anos.
Foi com a entrada em vigor da lei nº 12.424 de 16 de junho de 2011[12] que foi atrelada no ordenamento jurídico mais uma espécie de usucapião, que foi batizada de usucapião familiar ou de meação, ou até mesmo, usucapião especial urbana por abandono do lar, com o dever de garantia do direito a moradia, direito esse garantido pela própria Constituição Federal de 1988, sendo um dos direitos sociais de grande relevância previstos na carta magna.
O Estado, com a vontade de propiciar uma melhor condição de vida, com moradias dignas, àquelas famílias mais necessitadas, de baixa renda, cria o Programa Minha Casa Minha Vida (Lei no 11.977, de 07 de julho de 2009[13]), este programa foi alterado pela lei 12.424 de 16 de junho de 2011, modificando também o Código Civil, visto que foi incorporado o art. 1.240-A, apontando em seu texto como e quando ocorre a prescrição aquisitiva. Paulo Nader com sabedoria, leciona sobre o tema da seguinte forma:[14]
Objeto de várias críticas de juristas, a modalidade em epígrafe, denominada por alguns usucapião familiar, foi criada pela Lei nº 12.424, de 16 de junho de 2011, que, ao dispor sobre o Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV), introduziu o art. 1.240-A no Código Civil.
Daí nasceu mais uma forma de aquisição originária de propriedade por intermédio da usucapião, com requisitos bem peculiares e um lapso temporal muito inferior que as demais modalidades de usucapião, não existem no ordenamento jurídico qualquer outra modalidade de usucapião com um prazo tão exíguo, o que veio a causar muitas discursões no mundo jurídico.
Diante do que aqui foi exposto, é de notória compreensão de que o nascimento do art. 1.240-A se deu no intuito e com a missão de atender e garantir o direito à moradia para aqueles que foram abandonados por seus ex-companheiros ou ex-cônjuges, em que detinham cada qual o poder de domínio sobre a metade do bem, metade esta que será objeto de usucapião familiar por consequência do abandono do lar.
3.1 Requisitos
Para que ocorra o fenômeno da usucapião familiar, é necessário que esteja encaixado certos requisitos que a lei determina, como o tempo a ser percorrido, o bem imóvel não ultrapassar a 250² (duzentos e cinquenta metros quadrados), ter o usucapiente a posse ativa e não ser possuidor de outro bem imóvel urbano ou rural, e o ex-cônjuge ou ex-companheiro abandonar o lar de forma espontânea.
E é com essa linha de pensamento que Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald que classifica a usucapião familiar como usucapião pró-família, nos mostra 03 (três) requisitos para configuração da usucapião familiar:[15]
A nova modalidade de usucapião especial urbana – ou pró-moradia – requer a configuração conjunta de três requisitos: (a) a existência de único imóvel urbano comum; (b) o abandono do lar por parte de um dos cônjuges ou companheiros; (c) o transcurso do prazo de dois anos.
Observa-se que somente o imóvel urbano é passível de usucapião familiar, tendo em vista que o que se busca privilegiar aqui é a moradia e não o trabalho. Ocorrendo a separação ou dissolução da união estável, ou seja, separação de fato, e logo depois de demonstrada que realmente existiu tal relação e consequentemente sua dissolução, começará daí a contagem do prazo da prescrição aquisitiva, dando importância também os demais requisitos previstos no art. 1.240-A, CC/02.[16]
A usucapião familiar é uma espécie nova de usucapião especial urbana, deste feito, é de suma importante relatar sobre a semelhança em alguns pontos entre a usucapião especial urbana e a usucapião familiar ou de meação. Carlos Roberto Gonçalves expõe algumas semelhanças e diferenças entre os dois institutos:[17]
Trata-se, como mencionado, de nova modalidade de usucapião especial urbana, instituída em favor de pessoas de baixa renda, que não têm imóvel próprio, seja urbano ou rural. A lei em apreço disciplina o novo instituto nos mesmos moldes previstos no art. 183 da Constituição Federal. Tanto no caso da usucapião especial urbana, como no da usucapião familiar, é necessário que o usucapiente não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural e exerça posse mansa, pacífica e ininterrupta sobre imóvel urbano de até 250 metros quadrados, para fins de sua moradia ou de sua famí1ia, não sendo permitida a concessão da medida mais de uma vez em favor da mesma pessoa.
Podem ser apontadas, no entanto, as seguintes diferenças entre as duas modalidades: a) na usucapião familiar, ao contrário do que sucede na usucapião especial urbana disciplinada no art. 1.240 do Código Civil, exige-se, além dos requisitos mencionados, que o usucapiente seja coproprietário do imóvel, em comunhão ou condomínio com seu ex-cônjuge ou ex-companheiro; b) exige-se, também, que estes tenham abandonado o lar de forma voluntária e injustificada; e c) o tempo necessário para usucapir é flagrantemente inferior às demais espécies de usucapião, consumando-se a prescrição aquisitiva no prazo de dois anos.
Observou-se que no quesito tamanho do terreno referente à 250², a usucapião por abandono do lar assemelha-se à usucapião especial urbana, também não podendo o usucapiente ter outro bem imóvel urbano ou rural, porém quanto ao tempo, é assombroso a diferença, a usucapião pró-família veio com o menor tempo para aquisição de propriedade já visto, causando muitas discursões, tendo o prazo menor que a usucapião de bem móvel.
Flavio Tartuce explana um pouco em sua lição sobre a semelhança entre os institutos aqui mencionados, expondo seu entendimento da seguinte forma:[18]
O instituto traz algumas semelhanças em relação à usucapião especial urbana que já estava prevista, a qual pode ser denominada como regular.
De início, cite-se a metragem de 250 m², que é exatamente a mesma, procurando o legislador manter a uniformidade legislativa. Isso, apesar de que em alguns locais a área pode ser tida como excessiva, conduzindo a usucapião de imóveis de valores milionários. Ato contínuo, o novo instituto somente pode ser reconhecido uma vez, desde que o possuidor não tenha um outro imóvel urbano ou rural.
A principal novidade é a redução do prazo para exíguos dois anos, o que faz com que a nova categoria seja aquela com menor prazo previsto, entre todas as modalidades de usucapião, inclusive de bens móveis (o prazo menor era de três anos). Deve ficar claro que a tendência pós-moderna é justamente a de redução dos prazos legais, eis que o mundo contemporâneo possibilita a tomada de decisões com maior rapidez.
Diante o exposto, foi compreendido que a usucapião de meação, garante ao ex-cônjuge ou ex-companheiro que foi abandonado, a pleitear o direito de domínio encima do bem que até então era de ambos, para que este que foi abandonado não fique desamparado. Vale ressaltar que aplica-se também este instituto a casais homoafetivos, não importando se é do mesmo sexo ou não, como prevê o Enunciado n° 500 da V jornada de Direito Civil: “A modalidade de usucapião prevista no art. 1.240-A do Código Civil pressupõe a propriedade comum do casal e compreende todas as formas de família ou entidades familiares, inclusive homoafetivas” .[19]
No que se refere ao abandono do lar, este fato tem que ser de forma voluntária e injustificada, um abandono integral, definitivo, um abandono físico, no sentido de sair do lar, um abandono intelectual, no sendo de não haver nenhum vinculo ou comunicação com o lar abandonado, seja por meio de mensagem ou qualquer outro suporte de comunicação, e abandono financeiro, não prestando nenhum suporte financeiro ao lar.
Ao passo que ocorrer a separação de fato, e for configurado o abandono do lar, começará então a correr o prazo da prescrição aquisitiva prevista no art. 1.240-A do Código Civil. Importante observar que caso o companheiro saia do imóvel por determinação judicial, como por exemplo, a utilização dos meios elencados no art. 22 da Lei nº 11.340/2006, a lei Maria da Penha, neste caso não se configurará abandono do lar, visto que a saída não foi de forma voluntária e injustificada.
Pablo Stolze & Rodolfo Pamplona, transcrevem em sua obra sobre o que acima foi abordado, vejamos:[20]
Questão interessante diz respeito à saída compulsória de um dos cônjuges, em virtude de ordem judicial, a exemplo do que se dá nas medidas de natureza acautelatórias emanadas da Lei Maria da Penha.
Neste caso, é forçoso convir, não se poderá reconhecer a prescrição aquisitiva contra quem fora compelido a se retirar da residência, mesmo que houvesse dado causa à medida por conta do seu mau comportamento.
A contagem do prazo de 02 anos da prescrição aquisitiva dentro da usucapião de meação só começará a correr a partir da entrada em vigor da lei 12.424 de 16 de junho de 2011, desta forma está previsto no Enunciado 498 da V jornada de Direito Civil, “A fluência do prazo de dois anos previsto pelo art. 1.240-A para a nova modalidade de usucapião tem início com a entrada em vigor da lei nº 12.424/2011”.[21] Tendo em vista, esta lei não poder pegar de surpresa um dos ex-cônjuges ou ex-companheiros, causando assim, a perda de seus bens em consequência de uma lei nova e desconhecida, sob pena de ofensa ao princípio da segurança jurídica.
Ora, é certa que, a usucapião é uma proteção àquelas famílias mais necessitadas, porém, não teria sentido esta lei trabalhar ferindo princípios constitucionais, mas sim, garantir a prevalência dos direitos fundamentais que a constituição reserva ao povo, assim, entrando em vigor respeitando sem afetar atos de ates da sua vigência. Na lição de Carlos Roberto Gonçalves:[22]
"Usucapião familiar. Abandono do lar. Art. 1.240-A do Código Civil.
Prazo da prescrição aquisitiva. Termo inicial- data da vigência da lei.
O prazo de dois anos da prescrição aquisitiva exigido para a usucapião familiar, fundada no abandono do lar de ex-cônjuge- modalidade introduzida no art. 1.240-A do Código Civil-, tem como termo a quo o início da vigência da Lei n. 12.424/2011, pois orientação diversa permitiria que, eventualmente, aquele que abandonou o lar perdesse automaticamente a propriedade, em flagrante ofensa ao princípio da segurança jurídica.
Identifica-se então, que, não pode ser usucapido um bem de um ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar antes da vigência da Lei 12.424/2011, mesmo que tal situação esteja cumprindo com todos os requisitos exigidos pelo art. 1.240-A do Código Civil, pois, como já dito acima, seria expressa violação ao princípio da segurança jurídica, princípio este que garante a estabilidade das relações jurídicas e está previsto de forma implícita na Constituição de 1988.
3.2 Do regime de bens
É de grande necessidade abordar sobre as formas de comunhão em que são possíveis a aplicação do objeto da usucapião conjugal ou usucapião pró-família ou de meação, tendo em vista, que não são todos os regimes que são passíveis de aplicação deste instituto. Destinando-se sua aplicação aos regimes de comunhão parcial e comunhão universal, deste modo, a aplicação da usucapião familiar ao regime de separação total de bens, no que se refere aos bens adquiridos antes ou depois do casamento, está fora de cogitação, pois estes bens não se comunicam.
Contudo, o legislador buscou abranger a maior eficácia possível para a situação fática da separação usando as expressões “ex-cônjuges e ex-companheiros”, como explica o Enunciado 501 da V jornada de Direito Civil: “As expressões “ex-cônjuge e ex-companheiro”, contidas no art. 1.240-A do Código Civil, correspondem à situação fática da separação, independentemente de Divórcio”.[23]
O texto da súmula n° 377 do Supremo Tribunal Federal, aduz que “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”.[24] Nestes temos, buscando compreender melhor sobre em que condições há de ser possível ou não, buscar a aplicabilidade do fenômeno da usucapião familiar ou de meação pelo ex-cônjuge ou ex-companheiro abandonado, é que Pinheiro & Cavalheiro trazem a seguinte lição:[25]
Poderia ser aplicado na comunhão parcial de bens, em que o imóvel é adquirido após a união, comunicando-se, ou na participação final dos aquestos, em que também se comunicam os bens que restaram ao termino da relação, indicando a usucapião familiar. Já na situação do ex-cônjuge, casado sob o regime de separação total de bens, os bens havidos antes ou depois do casamento não se comunicariam, tornando clara a impossibilidade de usucapião familiar, visto que os bens não estão em comunhão.
O que se pôde compreender foi que, no que tange ao regime de separação total de bens, adquiridos anterior ou na constância da união, estes bens não se comunicam, deste modo, o cabimento de usucapião está fora de cogitação sobre determinado bem, tendo em vista, que o fenômeno da usucapião de meação ou pró-família só abrange os regimes de comunhão total ou parcial, não incluindo o regime de separação total.
Reforçando a linha de pensamento para melhor esclarecer sobre o assunto explanado, leciona Simão do seguinte modo:[26]
Também, se o marido ou a mulher, companheiro ou companheira, cujo regime seja o da comunhão parcial de bens compra um imóvel após o casamento ou início da união, este bem será comum (comunhão do aquesto) e poderá ser usucapido por um deles. Ainda, se casados pelo regime da comunhão universal de bens, os bens anteriores e posteriores ao casamento, adquiridos a qualquer título, são considerados comuns e, portanto, podem ser usucapidos nesta nova modalidade. Em suma: havendo comunhão ou simples condomínio entre cônjuges e companheiros a usucapião familiar pode ocorrer.
Ora, o que se pode notar a respeito do citado, é que não basta observar somente o tempo a ser percorrido, ou o abandono em questão, mas também em qual tipo de união os cônjuges ou companheiros estão vinculados, sendo por tanto, mais um requisito a ser considerado, para que assim, leve em consideração se o bem é passível ou não de usucapião familiar dentro do caso concreto.
4 PRINCÍPIOS APLICÁVEIS À USUCAPIÃO FAMILIAR
As leis que regem o ordenamento jurídico não são feitas de qualquer forma, sem observar o que vai atingir ou proteger, existe um ponto de partida a ser seguido, uma espécie de alicerce, são eles, os princípios, que servem como parâmetros para que o legislador possa ter uma base de elaboração das leis, os princípios devem ser respeitados, não se pode criar uma lei ferindo um princípio constitucional por exemplo, sob pena de inconstitucionalidade desta lei.
É obvio o entendimento de que, o direito civil e o direito de família, tem que estar de acordo com a constituição, tendo em vista, estar ambos dentro da carta magna, obedecendo assim, os princípios que são meio como alicerce, como ideias que fundamentará o direito positivo, a raiz que vai garantir a estabilidade da ordem jurídica. Maria Berenice Dias relata a respeito da seguinte forma: “Os princípios constitucionais representam o fio condutor da hermenêutica jurídica, dirigindo o trabalho do intérprete em consonância com os valores e interesses por eles abrigados”.[27]
4.1 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
O princípio da dignidade da pessoa humana é o princípio maior é considerado o pináculo do Estado Democrático de Direito, este princípio da ensejo a outros princípios, como por exemplo cidadania, liberdade, alteridade e igualdade, autonomia privada, pois o princípio da dignidade é classificado como um superprincípio ou macroprinípio. Está previsto na Constituição Federal em seu art. 1º, III.[28]
Ainda contando com a sabedoria de Maria Berenice Dias: “É o princípio maior, o mais universal de todos os princípios. É um macroprincípio do qual se irradiam todos os demais: liberdade, autonomia privada, cidadania, igualdade e solidariedade, uma coleção de princípios éticos”.[29]
Pelo transcrito, compreende-se que a igualdade entre as famílias, entre homem e mulher, igualdade também entre filhos, está atrelada ao princípio da dignidade da pessoa humana, que existe um elo com os direitos humanos e a dignidade da pessoa humana, garantido para as famílias uma existência e moradia com condições de vida dignas.
A dignidade está dentro de cada um, algo que a Constituição Federativa do Brasil de 1988 não aceita ser ferido, ser violado, é a honra, a virtude, que está sob a proteção da carta magna. Este princípio é tido como base para elaboração, aplicação, interpretação e consequentemente, para a subsistência do próprio direito.
4.2 PRINCÍPIO DA LIBERDADE
Considerado um dos mais importantes, também não podia ser diferente, este princípio proíbe o intrometimento do estado ou de qualquer que seja no corpo familiar, (art. 1.513, CC/02[30]), definição do regime de bens (art. 1.639, CC/02[31]), a maneira de cuidar dos bens de família (art. 1.642-1.643, CC/02[32]), etc.
O particular tem autonomia sobre sua vida, podendo vive-la como melhor lhe convém, sem que haja intromissão, óbvio que dentro do que o ordenamento permite, assim, não cabe ao Estado decidir como o particular vai constituir ou dissolver sua família, como vai educar os filhos, na religião a ser seguida, tanto o Estado quanto a sociedade deve obediência ao princípio da liberdade.
Em sua explanação sobre o princípio da liberdade LÔBO aduz sobre a intromissão do Estado na vida privada das pessoas, demonstrando o que o princípio da liberdade visa proteger, garantindo que o Estado não ultrapasse seus limites quando se trata de interferir no âmbito familiar. Vejamos:[33]
O princípio da liberdade diz respeito não apenas à criação, manutenção ou extinção dos arranjos familiares, mas à sua permanente constituição e reinvenção. Tendo a família se desligado de suas funções tradicionais, não faz sentido que ao Estado interesse regular deveres que restringem profundamente a liberdade, a intimidade e a vida privada das pessoas, quando não repercutem no interesse geral.
Este princípio revolucionou a relação familiar, dando cabimento e direito de constituição de relação conjugal, seja entre homem e mulher ou entre pessoas do mesmo sexo, dando assim, mais espaço para a dissolução de união estável ou de casamento, formação de um novo relacionamento e até mesmo alteração no que se refere ao regime de bens na vigência do casamento.
4.3 PRINCÍPIO DA IGUALDADE ENTRE OS CÔNJUGES E COMPANHEIROS
O art. 5º, I, CF/88[34], prevê que homens e mulheres são iguais tanto em direitos como nas obrigações, vindo também o art. 226, § 5º, CF/88[35], falando que os direitos e deveres que diz respeito à sociedade conjugal, serão igualmente exercidos tanto pelo homem quanto pela mulher, vendo essa igualdade, é forçosa a compreensão que aquela família patriarcal que existiu, na qual o homem era o chefe, era quem mandava na família, não existe mais.
A conceituada Maria Helena Diniz nos orienta no seguinte entendimento:.[36]
Com este princípio desaparece o pode marital, e a autocracia do chefe de família é substituída por um sistema em que as decisões devem ser tomadas de comum acordo entre conviventes ou entre marido e mulher, pois os tempos atuais requerem que marido e mulher tenham os mesmos direitos e deveres referentes à sociedade conjugal, o patriarcalismo não mais se coaduna com a época atual, nem atende aos anseios do povo brasileiro; por isso juridicamente, o poder de marido é substituído pela autoridade conjunta e indivisa, não mais se justificando a submissão legal da mulher. Há uma equivalência de papéis, de modo que a responsabilidade pela família passa a ser dividida igualmente entre o casal.
O Código Civil nos traz uma prova de sua recepção do principio da igualdade em seu artigo 1.511, dizendo que: “O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges”.[37] Deste modo, homem e mulher são iguais, possuem os mesmos direitos dentro do corpo da família, não podendo um se beneficiar mais que o outro, todos tem os mesmo direitos e obrigações devendo cumpri-los sob pena de ferir o princípio da igualdade entre os cônjuges e companheiros.
O modo como cônjuges e companheiros serão tratados legalmente e juridicamente, será um tratamento sem distinção, direitos e deveres serão atribuídos de forma igual, logo, não existe mais aquele conceito de que o homem é o chefe, que sustenta, hoje, muito se vê a mulher independente, muitas vezes trabalhando, e o marido em casa, provando assim, que tanto o homem como a mulher, são capazes de forma igual.
4.4 PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE FAMILIAR
Para tratar sobre o princípio da solidariedade familiar, vamos à Constituição examinar o Art. 3º, CF/88, que nos traz o seguinte texto: “Art. 3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária”. [38]
Quando se fala em solidariedade, trata-se de um ponto ético, quando há um dever de cuidado uns com os outros, uma relação de sentimentos envolvendo ajuda, é o dar por afeto, e claro que uma família sem solidariedade não tem como perdurar no tempo, tendo em vista que o afeto e a boa convivência tem que ser alimentado, gerando um ambiente harmônico dentro do lar.
Desta feita, reforçando o entendimento sobre tal questão, Maria Berenice Dias transcreve em sua lição sobre o princípio da solidariedade suas características, mostrando a importância desse princípio. Senão vejamos:[39]
Solidariedade é o que cada um deve ao outro. Esse princípio, que tem origem nos vínculos afetivos, dispõe de acentuado conteúdo ético, pois contém em suas entranhas o próprio significado da expressão solidariedade, que compreende a fraternidade e a reciprocidade. A pessoa só existe enquanto coexiste. O princípio da solidariedade tem assento constitucional, tanto que seu preâmbulo assegura uma sociedade fraterna.
Pelo exposto, o animus de ajuda, o sentimento de afeto, o ajudar o próximo, tudo isso é ligado à solidariedade, e no direito de família, o princípio da solidariedade está cravado no art. 229, CF/88, que traz em seu texto não só o dever dos pais para os filhos, mas também o dever dos filhos para com os pais, o art. vem com o seguinte texto: “Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.[40]
Dentro do ambiente familiar, é de suma importância que haja reciprocidade de afeto, compreensão, ajuda, é preciso à existência da solidariedade mutua, pois esse é o alimento que matem vivo o laço familiar, e não só dentro do ambiente familiar, mas também para o desenvolvimento da convivência em sociedade, cuidando uns dos outros pelo sentimento de cuidado e dever de cidadão.
4.5 PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL
Oferecendo como ponto de partida para explanar sobre esse princípio, o art. 6º da Constituição da República, Título II, tem como destino os direitos e garantias fundamentais estabelecendo em seu texto o seguinte: “Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.[41]
Interessante observar a lição de Maria Berenice Dias para melhor se aprofundar no entendimento desse princípio, relatando os direitos que a Constituição da República garante para as famílias, explanando sobre os pluralismo das entidades familiares e o tratamento igualitário entre os filhos. Vejamos:[42]
A Constituição Federal, ao garantir especial proteção à família,
estabelece as diretrizes do direito das famílias em grandes eixos, a saber: (a) a igualdade entre homens e mulheres na convivência
56/1250 familiar; (b) o pluralismo das entidades familiares merecedoras de proteção; e (c) o tratamento igualitário entre todos os filhos. Como são normas de direito subjetivo com garantia constitucional, servem de obstáculo a que se operem retrocessos sociais, o que configuraria verdadeiro desrespeito às regras constitucionais.
Há uma compreensão de que a autora acima citada entende que a usucapião familiar na verdade fere o princípio em questão, alegando um exagero de direitos, e que assim esses direitos não podem sofrer limitações nem restrições da legislação ordinária, no entanto, se o direito a moradia é um direito garantido pela lei maior, afronta mesmo seria a negativa de tal direito, isso sim seria um retrocesso.
Ainda falando sobre controvérsias, muitos doutrinadores levantaram o elemento culpa como um retrocesso na nova modalidade da usucapião familiar pelo abandono do lar, hodiernamente não se mais tem dúvidas da pacificação de tal divergência, como versa o Enunciado 595 da VII jornada de Direito Civil:[43]
O requisito "abandono do lar" deve ser interpretado na ótica do instituto da usucapião familiar como abandono voluntário da posse do imóvel somado à ausência da tutela da família, não importando em averiguação da culpa pelo fim do casamento ou união estável. Revogado o Enunciado 499.
Se um direito foi alcançado, não pode haver neste direito, uma mudança que diminua o que antes era de direito, o direito já alcançado não pode sofrer retrocesso, é uma estabilidade garantida pelo principio da vedação do retrocesso, importante salientar que não significa que a lei é imutável, mas que se for haver alteração em seu texto terá que sofrer um processo de minucioso, para ao final ser benéfico para os destinatários.
4.6 PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL FAMILIAR
A família pode ser vista como o coração da sociedade, é o que faz a sociedade ter vida, uma peça fundamental do quebra cabeças, prevê o art. 226, caput da Constituição da República Federativa do Brasil, que a família é o alicerce da estrutura que sustenta a sociedade, e conta com a proteção especial do Estado: “Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”.[44]
Flavio Tartuce com sabedoria comenta em sua obra o seguinte teto: “Há algum tempo se afirmava, nas antigas aulas de educação moral e cívica, que a família é a “celula mater” da sociedade”.[45] Desse modo, a família é de suma importância no convívio e na evolução da sociedade, que está sempre em mutação, seja de costumes ou cultura, e é função do direito acompanhar essa mutação.
Compreende-se desta forma, que a sociedade e as famílias estão em constante mutação, os costumes, as tradições, assim como também as leis estão em constante mutação, pois a lei tem que estar em consonância com a sociedade e com seus costumes, ou seja, em coerência com todas as mudanças que ocorre com o passar dos tempos, pois bem, o Direito Civil também muda a família muda, logo, a legislação deve se adequar as essas mudanças, acompanha-las.
A socialização tem a função de afastar discussões em litígios de separações, serve também para justificar a relação civil acerca da paternidade sócio afetiva, daí se vê quão importante é o reconhecimento da função social à família e ao ramo legal que lhe toma por base de estudo. Ora, parte-se do pressuposto de que reconhecendo a função social da família, está-se reconhecendo a função social da própria sociedade, e negando tal reconhecimento à família, é o mesmo que negar este reconhecimento à sociedade.
5 DA COMPETÊNCIA PARA JULGAR
5.1 Entendimento doutrinário
Ao entrar no campo da competência para processar e julgar a ação de usucapião familiar, diga-se de passagem, a doutrina diverge bastante, se um dos requisitos é a observação da dissolução do casamento ou união, e o abandono do lar, trata-se de um problema no corpo familiar, então parte-se do pressuposto de que a competência seja da vara de família.
Contudo a aquisição de um bem por usucapião é um direito real, onde se pleiteia o direito de domínio sobre um bem, observando o tempo de posse, entrando deste modo para o campo da competência da justiça comum, sendo o abandono do lar nada mais que um dos requisitos para a aquisição do bem por meio da usucapião de meação.
Pode-se notar que os dois lados da conversa trazem seus argumentos, seus pontos de vista sobre o que defendem. Entendendo ser da vara de família a competência para julgar a usucapião familiar, Rolf Madaleno menciona em sua obra o seguinte posicionamento:[46]
E da Vara de Família, onde houver, a competência para processar a ação de usucapião familiar, por tratar de efeito jurídico derivado da relação de casamento ou da de união estável que se prorroga em razão da matéria, exigindo justamente o artigo 1.240-A do Código Civil que o imóvel a ser usucapido seja aquele utilizado pelo ex-casal como moradia familiar ou conjugal, não podendo o promovente da usucapião ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
Caio Mario Da Silva Pereira não acredita que a usucapião por abandono do lar tenha alguma relação com a culpabilidade do fim da relação, mas sim, relação com o abandono do bem que vai ser produto de usucapião. Sua lição aduz:[47]
A nova forma de aquisição de imóvel nada tem a ver com a culpabilidade ou não pelo fim do casamento, com o abandono do lar ter sido voluntário ou necessário; enfim, a usucapião, como instituto de direito real, tem como um dos seus requisitos, o abandono do bem a ser usucapido, e não o abandono do lar conjugal ou da família.
Insistindo na lição de Caio Mario Da Silva Pereira sobre a competência para julgar a usucapião de meação, explana o autor o seguinte pensamento, “Com o advento do novo Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/2015, a ação de usucapião passa a seguir o rito ordinário, sendo regida pelas regras do procedimento comum, não havendo mais um procedimento especial como no CPC/1973”. [48]
Essa discussão acerca da competência para julgar o fenômeno da usucapião por abandono dor lar não está só dentro do meio doutrinário, a jurisprudência também tem suas divergências acerca do assunto, alguns entendem ser da vara de família por ser analisado para sua caracterização, o abandono do lar e a extinção da união ou casamento. Porém outros julgados afastam esses argumentos, usando-os apenas como requisitos, analisando de fato a aquisição originária do bem usucapido, levando a questão para a vara cível.
5.2 Posicionamento Jurisprudencial
Como já acima explanado, o que se busca na usucapião de meação é a aquisição de um bem em decorrência do abandono do lar pelo ex-cônjuge ou ex-companheiro, sendo o abando ou a dissolução do casamento ou união, apenas um requisito necessário para a caracterização do fenômeno da usucapião, contudo a questão principal é a aquisição daquele bem pela usucapião pró-família, assim, vamos então ao seguinte julgado:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE DIVÓRCIO - RECONVENÇÃO - USUCAPIÃO FAMILIAR - ART. 1240-A DO CC/02 - COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO - DIREITO REAL - COMPETÊNCIA DA VARA CÍVEL - DECISÃO MANTIDA.
Na usucapião familiar, prevista no art. 1240-A do CC/02, a existência de instituição familiar, seja o casamento ou a união estável, é apenas um dos requisitos necessários para a sua constituição. A questão de fundo nela contida refere-se a constituição de domínio sobre imóvel, constituindo-se, portanto, ação de cunho patrimonial.
Tendo em vista que a usucapião familiar não se refere a estado de pessoas, mas sim a aquisição originária de propriedade imobiliária, cujos efeitos poderão atingir terceiros, a competência para seu julgamento é dos Juízes da Vara Cível, e não da Vara de Família." (e-STJ, fl. 89). (STJ – Recurso Especial-Nº 1.476. 712-MG (2014/0207402-8), Relator(a): Des.(a) MINISTRO RAUL ARAÚJO , coordenadoria da quarta turma, julgamento em 19/12/2014)[49]
Segundo o primeiro entendimento, o que está em discussão na ação de usucapião familiar é o interesse de garantir ao cônjuge ou companheiro abandonado, o direito a moradia, para que sua família não fique desamparada, é uma ação de aquisição de propriedade, um direito real, uma ação que envolve patrimônio, sendo desta forma da vara cível a competência para julgar. Contudo, há quem pense o contrário do entendimento acima citado, vejamos no seguinte julgado:
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO DE USUCAPIÃO POR ABANDONO DO LAR CONJUGAL. COMPETÊNCIA. A ação de usucapião com base em alegação de abandono do lar conjugal envolve ex-cônjuges. Nela debate-se abandono conjugal e existência de bem comum. Em face dessas circunstâncias, entende-se que a competência para processar e julgar tal demanda é do juízo especializado de família. Essa conclusão vale especialmente para o caso concreto, já que a ação de usucapião é conexa (por identidade de objetos) à outra ação declaratória de qualidade sucessória e de exclusão de bens da herança que tramita perante o juízo de família. JULGARAM PROCEDENTE O CONFLITO. (Conflito de Competência Nº 70063771927, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Pedro de Oliveira Eckert, Julgado em 23/04/2015). (TJ-RS - CC: 70063771927 RS, Relator: José Pedro de Oliveira Eckert, Data de Julgamento: 23/04/2015, Oitava Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 28/04/2015)[50]
Deste modo, diante desse impasse, conclui-se que o melhor a se fazer é esperar a jurisprudência entrar em um consenso a respeito de tal discussão, tendo em vista a lei não trazer expresso em seu texto sobre onde seria a real competência, se é da Vara Cível ou da Vara de Família, tendo em vista também haver julgados nas duas competências. Dito isto, salienta-se que, independente da vara, se é da família ou cível, a lei 12.242/2011, veio com seu art. 1.240-A, para garantir às famílias mais carentes a proteção do direito a moradia, que como já falado, é um dos direitos fundamentais garantidos pela Constituição da República Federativa.
6 EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 66 DE 13 DE JULHO DE 2010
A Emenda Constitucional nº 66 de 13 de julho de 2010[51], trouxe uma novidade para o mundo do Direito de Família, no que se refere ao divórcio, tendo em vista que era exigido antes, uma separação judicial, com um lapso temporal de um ano, ou então, a separação de fato, com um espaço de tempo de dois anos de ocorrido, o que após a emenda 66/10 foi extinto da constituição.
Hoje a dissolução do casamento se completa diretamente pelo divórcio ou pela morte, visto que o § 6º do art. 226 da Carta Magna foi alterada pela referida emenda, banindo da Constituição Federal a separação judicial ou prazos para a caracterização da extinção do vinculo, que antes era necessário ser observado e obedecido. Nas letras da lição de LÔBO podemos compreender melhor sobre o assunto acima citato. Vejamos:[52]
c) com a emenda 66 de 2010 que deu nova redação ao § 6º do art. 226 da Constituição, a separação judicial desapareceu, inclusive na modalidade de requisito voluntário para conversão ao divórcio; desapareceu, igualmente, o requisito temporal para o divórcio, que passou a ser exclusivamente direto, tanto por mútuo consentimento dos cônjuges (judicial ou extrajudicial), quanto litigioso.
Compreende-se então que para a ocorrência e consumação da extinção do casamento, o procedimento a seguir é somente o divórcio, pois assim estabelece o novo texto do § 6º do art. 226[53], que foi alterado pela emenda constitucional 66 de 13 de Julho de 2010, ressaltando ainda, que, como já falado, pode haver a extinção do casamento também pela morte de um doss cônjuges ou companheiro.
A sociedade está sempre em mutação, seja nos costumes, religião ou nas culturas de cada povo, e com isso, o Código Civil está sempre acompanhando essas mudanças, não perdendo sua coerência com a sociedade. A emenda constitucional 66 de 13 de Julho 2010 tornou mais rápido e eficiente o procedimento de dissolução do casamento, retirado certas burocracias.
Desta forma, qualquer dos cônjuges pode entrar com o pedido de divórcio, só basta assim querer, para que assim, logo após o pedido de divórcio, esteja efetuada a extinção do vinculo conjugal, não existindo mais discussão em relação à culpa da separação. A Constituição da República não garante só o direito ao casamento, garante também o direito de sair dele, e hoje, com mais facilidade.
Ora, ninguém é obrigado a dar amor ou carinho à alguém de forma forçada, muito menos ficar ao lado de alguém da qual não mais tem interesse, existe sim a obrigação de respeito, de guarda e amparo para com o próximo, respeitando e protegendo a dignidade da pessoa humana que nos é garantido pela Constituição Brasileira de 1988.
CONCLUSÃO
O que se pretendeu no presente artigo científico, foi verificar e compreender o instituto da Usucapião Especial Urbana Por Abandono do Lar, relatando o momento de sua inserção no ordenamento jurídico, pontuando seus requisitos, suas características, o que este instituto protege, analisando em quais casos será possível sua aplicação, apontando quem poderá ser atingido e em quais casos, bem como em que regime de bens caberá a usucapião familiar. Deste modo conhecendo mais a fundo este fenômeno da Usucapião Familiar.
A Usucapião Especial Urbana Por Abandono do Lar é um meio originário de aquisição de propriedade, um direito real, onde a posse se torna domínio sobre o bem usucapido, dando vida ao Princípio da Função Social da Propriedade, e da Dignidade Humana, garantindo às famílias que sofrera um abandono por parte do companheiro, o não desamparo, a garantia à moradia e proteção para sua família.
Entende-se que este instituto gerou muitas discursões entre a doutrina sobre sua constitucionalidade, sobre o tempo para sua caracterização ser tão baixo, apenas 02 anos, assim, como também, sobre qual seria a competência para processar e julgar, visto que uns entendiam ser da Vara de Família, enquanto outros entendiam ser da Vara Cível, existindo assim, julgados em ambas as Varas.
No item 02, foram aduzidos o conceito histórico e a origem da nomenclatura da Usucapião, de como a doutrina trata este instituto, comentando um breve relato de como era aplicado este instituto desde sua criação até os dias atuais, bem como quais são os fundamentos jurídicos para sua aplicabilidade.
No item 03, verificou-se a maneira como a doutrina trata a nomenclatura da usucapião, que é no gênero feminino, e de como veio a ser introduzida no ordenamento jurídico a Usucapião Familiar, bem como as características e os requisitos para a caracterização deste fenômeno, apresentando também o que este instituto vem a proteger e quais regimes de bens devem ser observados para que assim, verifique-se se é passível de Usucapião ou não.
No item 04, foi apresentada uma relação dos princípios a serem observados no direito de famílias e na aplicação da Usucapião de Meação, princípios estes que são de suma importância, cada qual com sua particularidade e proteção, garantindo a aplicabilidade e efetivação do direito real da usucapião.
No item 05, foi esclarecido de quem é a competência para processar e julgar a Usucapião Familiar, tendo em vista que era uma discussão acirrada no mundo da doutrina e da jurisprudência, pois havia julgados tanto na Vara de Família quanto na Vara Cível, expondo também, como a doutrina até os dias atuais vem tratando essa questão da competência.
Finalizando, no capitulo 06, foi analisado sobre a questão da extinção da separação judicial, através da criação da Emenda Constitucional nº 66 de 13 de Julho de 2010, que inovou o direito de família no que se refere à extinção do casamento, não havendo mais separação judicial e sendo o divórcio o único meio de se pretender a extinção do vinculo maternal.
Diante do contexto aqui exposto, é de suma importância à compreensão, e o conhecimento dos direitos atribuídos a todos, pode-se notar que o legislador buscou uma maior proteção às famílias mais carentes, que foram abandonadas pelos seus ex-cônjuges ou ex-companheiros, tendo em vista ter atribuído à Usucapião Familiar um exíguo prazo de 02 anos, tendo um lapso temporal menor que o da usucapião de bem móvel que vem com um prazo de 03 anos para sua caracterização.
Desta feita, é óbvio que nenhuma pessoa é forçado a dar amor ou carinho a outra pessoa, a conviver junto se não existe mais tal interesse por uma das partes, mas, contudo, existe o dever de guarda, amparo e proteção quanto à dignidade da pessoa humana, com isso, o que irá se observar futuramente, é apenas se estão ou não preenchidos todos os requisitos exigidos em lei, não se atentando mas na questão da constitucionalidade do instituto da usucapião pro-família, tendo em vista já está pacificado o entendimento quanto a essa questão.
Por fim, diante de todo o trancrito, é forçosa a compreensão de que o que se busca proteger com o fenômeno da Usucapião Familiar, que é um meio de aquisição originário de propriedade, um direito real, busca-se proteger um direito fundamental garantido pela própria Constituição da República Federativa do Brasil, o direito à moradia, o direito a uma vida digna para a família, o respeito a dignidade humana, não deixando no desamparo aquela família que está naquele momento necessitando de proteção e que fora abandonada pelo ex-cônjuge ou ex-companheiro.
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