Evolução das leis que regulamentam as infrações praticadas por adolescentes

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Os Direitos da Criança e do Adolescente foram uma grande conquista não somente no ordenamento jurídico brasileiro, mas também mundialmente, por meio dos tratados internacionais. Um grande avanço quanto ao respeito à dignidade da pessoa humana.

RESUMO:Em conformidade com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Art. 2º, são consideradas adolescentes as pessoas entre 12 a 18 anos. Segundo o Art. 249 do ECA, infração é descumprir, dolosa ou culposamente, os deveres inerentes ao poder familiar ou decorrente de tutela ou guarda, bem assim determinação da autoridade jurídica ou Conselho Tutelar. O ECA regulamenta os direitos, deveres e as medidas socioeducativas aplicáveis à criança e ao adolescente. Nesta perspectiva, o artigo tem como objetivo analisar a evolução das leis que regulamentam as infrações praticadas por adolescentes até a instituição do ECA.

Palavras-Chave: Estatuto da Criança e do Adolescente. Infração. Medidas socioeducativas

ABSTRACT:According to the Statute of the Child and Adolescent (SCA), Art. 2, people between 12 and 18 years old are considered adolescents. The infraction is non-compliance, intentionally or willfullyally, the duties inherent to family power or resulting from guardianship or custody, as well as determination of the legal authority or Guardianship Council. The SCA regulates the rights, duties and socio-educational measures applicable to children and adolescents. In this perspective, the article aims to analyze the evolution of the laws that regulate infractions practiced by adolescents until the institution of the ECA.

Keywords: Child and Adolescent Statute. Infringement. Educational measures


INTRODUÇÃO

O tema em estudo é de grande relevância devido ao fato de regulamentar as relações da criança e do adolescente no meio social. A mudança de fase da vida de uma pessoa é um fenômeno de alta complexidade, por isso é digno de atenção, tanto para família, sociedade e para o meio jurídico. Esse momento é decisivo para esses seres em construção, onde poderão se deparar com conflitos de natureza íntima, como também externos, daí se faz necessário à existência de leis que venham regulamentar essas relações. A Doutrina da Proteção Integral, adotada no Estatuto da Criança e do adolescente e prevista na Constituição da República de 1988, elevou o direito da criança e do adolescente para outro nível de importância, prevalecendo o melhor interesse do menor.

O Estatuto que regulamenta as relações das crianças e adolescentes com o da família, sociedade e o Estado, é de grande relevância para que se tenha uma convivência pacifica e saudável entre os protagonistas da construção dessa história.

As leis que regulamentam as relações das crianças e os adolescentes com a família, com a sociedade e com o Estado, são de fundamental importância para estabelecer os termos dessa convivência, levando em consideração os direitos, deveres, como serão punidos os atos infracionais e quais são a medidas socioeducativas utilizada para aplicação em cada caso concreto.

Para o operador do Direito ou o acadêmico é sempre relevante conhecer a evolução do ordenamento jurídico, saber em qual momento da história o legislador criou a lei e qual foi à motivação. Só é possível mensurar se os institutos evoluíram com o tempo e as necessidades da sociedade, conhecendo como eram os institutos anteriores e simulares que versavam sobre o mesmo tema no passado, daí a possibilidade de poder exercer a criticidade com base no contexto atual.

Nessa perspectiva, o objetivo desse artigo é analisar os aspectos históricos e a evolução das leis que regulamentam a relação da criança e do adolescente com a família, com a sociedade e com o Estado, no Brasil. Até a instituição do Estatuto da Criança e do Adolescente e aplicação da Doutrina da Proteção Integral, prevista no estatuto e na Carta Magna de 1988.


FORMAS DE TRATAMENTO DAS CIVILIZAÇÕES AO LONGO DOS SÉCULOS APLICADO ÀS CRIANÇAS E ADOLESCENTES

Na Idade Antiga, século V d.C, os laços familiares eram criados conforme os vínculos religiosos, e não por relação de parentesco (consanguíneo) ou por afinidade. Em Roma, o pai era visto como o pater familiae, ou seja, autoridade máxima familiar e também religiosa, nesse contexto às crianças e os adolescentes não despediam de nenhuma proteção. Já no Oriente Antigo, o Código de Hamurábi (1728/1686 a.C.) previa o corte da língua do filho que ousasse dizer aos pais adotivos que eles não eram seus pais, assim como a extração dos olhos do filho adotivo que aspirasse voltar à casa dos pais biológicos (art. 193). Caso um filho batesse no pai, sua mão era decepada (art. 195). Em contrapartida, se um homem livre tivesse relações sexuais com a filha, a pena aplicada ao pai limitava-se a sua expulsão da cidade (art. 154) (BARROS, 2005).

Azambuja (2006) aborda o assunto ressaltando que em Roma (449 a.C), a Lei das XII Tábuas permitia ao pai matar o filho que nascesse disforme mediante julgamento de cinco vizinhos (Tábua Quarta, nº 1), sendo que o pai tinha sobre os filhos nascidos de casamento legítimo o direito de vida e de morte e o poder de vendê-los (Tábua Quarta nº2). Em Roma e na Grécia Antiga, a mulher e os filhos não possuíam qualquer direito. O pai, o chefe da família, podia castigá-los, condená-los e até excluí-los da família.

Praticamente em quase todos os povos da antiguidade evidencia-se que não havia direitos reservados para as crianças e nem para os adolescentes em muitos casos eram tratadas como adultos e caso descumprissem as regras impostas eram castigados duramente pela sua desobediência, na Grécia Antiga essa violência encontrava-se em um contexto educativo familiar e no contexto educativo escolar, nesse diapasão, Cambi (1999) relata como era a infância na civilização Grega:

A criança cresce em casa controlada pelo “medo do pai”, atemorizada por figuras míticas semelhantes às bruxas (às Lâmias, em Roma), gratificadas com brinquedos (pense-se nas bonecas) e entretidas com jogos (bolas, aros, armas rudimentares), mas sempre colocada à margem da vida social. Ou então por esta brutalmente corrompida, submetida a violência, a estupro, a trabalho, até a sacrifícios rituais. O menino – em toda a Antiguidade e na Grécia também – é um “marginal” e como tal é violentado e explorado sob vários aspectos, mesmo se gradualmente –a partir dos sete anos, em geral -é inserido em instituições públicas e sociais que lhe concedem uma identidade, lhe indicam uma função e exercem sobre ele também uma proteção (CAMBI, 1999, p. 82)

Em Esparta a situação em que viviam as crianças e os adolescentes não diferia muito, eram privadas da sua infância, pois desde muito cedo eram retiradas do seio familiar para serem inseridas em um contexto onde passariam por situações de risco em escolas de formação militar, essas crianças eram retiradas de suas casas aos sete anos de idade e permaneceriam lá até os seus dezesseis anos de idade, perdendo, desse modo, a sua juventude. De acordo com Cambi (1999) essa educação militar iria proporcionar-lhes a aquisição da força e também da coragem, em contrapartida na cidade de Atenas:

Numa primeira fase, a educação era dada aos rapazes que frequentavam a escola e a palestra, onde eram instruídos através da leitura, da escrita, da música e da educação física [...]. O rapaz (pais) era acompanhado por um escravo que o acompanhava e o guiava: o paidagogos. [...] Central também era o cuidado do corpo, para torná-lo sadio, forte e belo, realizado nos gymnasia. Aos 18 anos, o jovem era “afebo” (no auge da adolescência), inscrevia-se no próprio demo (ou circunscrição), com uma cerimônia entrava na vida da cidade e depois prestava serviço militar por dois anos (CAMBI, 1999, p. 84).

Na idade Média a criança era considerada um adulto, pois era tratado da mesma forma, ou seja, trabalhava nos mesmos lugares e não havia diferenciação nas vestes dos mesmos. O trabalho era imposto para toda a sociedade, as crianças aprendiam o ofício desde cedo, desse modo elas não freqentavam a escola, as aulas eram aplicadas em lugares públicos, como por exemplo em igrejas e praças: “A criança era, portanto, diferente do homem, mas apenas no tamanho e na força, enquanto as outras características permaneciam iguais” (ARIÈS, 1981, p.14).

Somente no século XVII que foram criadas as primeiras escolas, e foi no final desse século que as crianças e os adolescentes começaram a ser diferenciados, também com o descobrimento das práticas que aumentariam a expectativa de vida da população. A igreja nesse contexto teve grande importância ao fazer correlações entre crianças e anjos, principalmente nas obras, houve então um avanço no sentimento de afetividade, foi um dos primeiros passos, onde começou a preocupação com a saúde e higiene.


EVOLUÇÃO DAS LEIS NO BRASIL COM RELAÇÃO AO TRATAMENTO DADO AOS ADOLESCENTES

Almejando agradar aos interesses da Coroa Portuguesa, no Brasil, durante o período colonial as crianças eram catequizadas de acordo com os costumes destes em detrimento das novas regras que iriam se estabelecer.  No ano de 1549 é formada a chamada Companhia de Jesus composta por um grupo de religiosos que tinham por objetivo evangelizar os habitantes, as crianças chamadas de “grumetes”[3] e que vinham nas embarcações de Portugal, durante esse período, recebiam um foco especial e eram considerados animais selvagens (RAMOS, 1999).

Observa-se que a política do Brasil Império no ano de 1824 não faz qualquer referência quanto à proteção da criança ou do adolescente visto que estava voltada para as questões administrativas. Com a promulgação da Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, em 24 de fevereiro de 1891, ocorreu a mesma situação, como aborda Veronese (1997) em relação ao com o Código de Menores de 1927:

[...] conseguiu corporificar leis e decretos que, desde 1902, propunham-se a aprovar um mecanismo legal que desse especial relevo à questão do menor de idade. Alterou e substituiu concepções obsoletas como as de discernimento, culpabilidade, responsabilidade, disciplinando, ainda, que a assistência à infância deveria passar da esfera punitiva para a educacional (VENORESE, 1997. p.10).

 O Código de Menores ou Código Mello Matos[4] alterou o que se entendia por culpabilidade e responsabilidade, foi nesse código que houve as primeiras denominações como, por exemplo: “menor” e “infrator” e ressalta-se que a responsabilidade desses jovens recaia sobre o Estado que por vezes aplicavam-lhes castigos. De acordo com Alberton (2005) o Código de Menores de 1927 fazia menção aos sujeitos menores de 18 anos, abandonados e delinquentes. Dessa forma o Estado passa a aplicar a sanção com o caráter educacional, ou seja, zelava pela mudança de comportamento do individuo por meio de assistência. O código de menores estipulou a imputabilidade (imputar o fato típico e ilícito ao agente) antes dos dezoito anos de idade. A Lei de Assistência e Proteção aos Menores proibiu a intitulada “Roda dos Expostos” e fundou a escola de assistência para delinquentes” e “a escola de reforma para os abandonados”.

No governo provisório de Getúlio Vargas, em 1932, foi realizada uma reforma no primeiro Código Penal da República estipulando que a maioridade penal seria de quatorze anos. Em 1934 houve a Promulgação da Constituição que suscitou questões referentes ao trabalho de crianças e adolescentes, evitando o trabalho noturno para os menores de dezesseis anos e para os jovens menores de dezoito anos houve a proibição do trabalho em ambientes insalubres. De acordo com a Constituição de 1934:

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Art 138. Incumbe á União, aos Estados e aos Municípios, nos termos das leis respectivas: a) assegurar amparo aos desvalidos, criando serviços especializados e animando os serviços sociaes, cuja orientação procurarão coordenar;  b) estimular a educação eugênica;  c) amparar a maternidade e a infancia;  d) soccorrer as familias de prole numerosa;    e) proteger a juventude contra toda exploração, bem como contra o abandono physico, moral e intellectual;     f) adoptar medidas legislativas e administrativas tendentes a restringir a mortalidade e a morbidade infantis; e de hygiene social, que impeçam a propagação das doenças transmissiveis;  g) cuidar da hygiene mental e incentivar a lucta contra os venenos sociaes.

Nota-se que houve pela primeira vez uma preocupação quanto aos direitos da criança e do adolescente. Em dez de novembro de 1937, Getúlio Vargas promulgou a Constituição dos Estados Unidos do Brasil no artigo 16, inc.XXXVII, diz que é competência da União, poder de legislar sobre as normas da defesa e da proteção da saúde da criança e no artigo 127 cita que a infância e a juventude são objetos de cuidado e merece cuidados especiais do Estado e dos Municípios, assegurando-lhes o acesso ao ensino público. Foi na vigência do Estado Novo que o Estado atuou como responsável das garantias da infância e da juventude.

No ano de 1941 foi fundado o Serviço de Assistência a Menores (SAM), foi o órgão federal pioneiro responsabilizar-se pelo monitoramento da assistência aos jovens, acolhia os menores abandonados e desvalidos, e os encaminhava para as instituições especializadas na época, muitas vezes sendo internados em reformatórios.

Acrescenta Jesus (2005), que o objetivo era fornecer assistência a menores desvalidos e delinquentes; proceder à investigação social e ao exame médico-psico-pedagógico. Com o golpe militar de 1964 o SAM foi extinto e surgiu uma nova instituição a chamada Fundação Nacional do Bem Estar do Menor (Funabem) e a Política Nacional do Bem Estar do Menor (PNBEM), as quais iriam coordenar as ações na área. Desse modo os assuntos relacionados à infância passa a ser examinada como um problema de segurança nacional e originou as Fundações Estaduais do Bem-Estar do Menor (FEBEM). Veronese relata que “[...] a partir do momento que o problema da infância adquire status de problema social, sobre ele recaem os preceitos da ideologia da segurança nacional. A PNBEM – Política Nacional de Bem estar do Menor , tem assim sua estrutura autoritária resguardada pela Escola Superior de Guerra [...]” (VERONESE, 1997. p.10).

Em dezenove de Junho do ano de 1975 foi criada a primeira Comissão Parlamentar de Inquérito (CPMI) com o intuito de investigar a questão da criança desassistida no Brasil, o que contribui para a formação de um novo Código de Menores no ano de 1979, no qual traz consigo o que seria a doutrina da proteção integral existente na concepção posterior do ECA, (Estatuto da Criança e do Adolescente), porém a estrutura primordial era baseada em conformidade com o instituído em 1927,ou seja, com o mesmo sinal assistencialista e repressivo, o que gerou o termo “menor em situação irregular”. Dessa forma eram considerados em situação irregular e inseridas no Código de Menores de 1979 as crianças e adolescentes até 18 anos, que cometessem atos infracionais e também aquelas que estivessem sofrendo maus tratos pela família, incluindo as que fossem abandonadas pela sociedade.

Saraiva explica “[...] devido à falta de critérios determinantes sobre a aplicação do Código de Menores de 1979, a doutrina mostrou-se deficiente em agir de forma preventiva” (SARAIVA, 2005. p.44) . Assim foi declarada a falência da PNBEM, considerando que os problemas voltados à infância e à juventude não eram somente responsabilidade do Estado, mas também da sociedade.

O Código de Menores de 1979 (Lei 6.667, de 10 de outubro de 1979) utilizou a doutrina jurídica de proteção do “menor em situação irregular”, a qual  engloba situações de abandono, da prática de infrações, do desvio de conduta, da falta de representação legal e da ausência de assistência.  Relembrando que a lei de menores era um dispositivo de gestão da infância e do adolescente, padecedores do afastamento e até mesmo do próprio abandono da família, da sociedade e do Estado em seus direitos basilares que servem como alicerce na formação do indivíduo. O Código de Menores de 1979 com a publicação do Estatuto da Criança e do Adolescente foi revogado do ordenamento jurídico, mas ainda deixou o seu legado com os termos “mentalidade menorista” e da “doutrina da situação irregular”.

A “mentalidade menorista” faz alusão a uma forma de pensar crianças e adolescentes em que estes eram referenciados pelo termo “menores”, o uso dessa expressão já havia sido utilizada nas duas legislações anteriores relacionadas com a faixa etária. Com a elaboração da Constituição de 1967 estabeleceram-se novos parâmetros para a vida civil, pois anteriormente prevalecia a presença autoritária da forma de governo do Estado.

A Constituição de 1967 foi promulgada com o propósito de normalizar na medida do possível a situação, o período dos governos militares foi marcado por dois documentos de fundamental importância na área da infância e da juventude: A lei que criou a Fundação Nacional do Bem Estar do Menor (Lei 4.513 de 1/12/64) e o Código de Menores de 1979 (Lei 6697 de 10/10/79) ambos explanados no presente artigo. Da mesma forma que o Código de 1927 o Código de 1979 é direcionado para uma parcela específica da população, quais sejam as crianças e os adolescentes em especial os que são considerados em situação irregular, eis então a caracterização:

“Art. 2º. Para efeitos deste Código, considera-se em situação irregular o menor: I - privado de condições essenciais à sua subsistência, saúde e instrução obrigatória, ainda que eventualmente, em razão de: a) falta, ação ou omissão dos pais ou responsável; b) manifesta impossibilidade dos pais ou responsável para provê-las; II - vítima de maus tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou responsável; III - em perigo moral, devido a:a) encontrar se, de modo habitual, em ambiente contrário aos bons costumes;b) exploração em atividade contrária aos bons costumes;IV –privado de representação ou assistência legal, pela falta eventual dos pais ou responsável;V –com desvio de conduta, em virtude de grave inadaptação familiar ou comunitária;VI –autor de infração penal”.(BRASIL, 1979)

Acrescenta-se ainda que a escolarização e a profissionalização do menor serão obrigatórias nos centros de permanência e, além disso, no artigo 11 é regulamentado que “Toda entidade manterá arquivo das anotações a que se refere o parágrafo 3 do artigo 9º desta lei, e promoverá a escolarização e a profissionalização de seus assistidos, preferentemente em estabelecimentos abertos” (BRASIL, 1979).

No dia 5 de outubro de 1985 a chamada “Ciranda da Constituinte” torna-se o marco da aprovação no Congresso da Emenda Criança, que serviu de origem para os artigos 227 e 228 da Constituição Federal, mais de 20 mil crianças fizeram uma ciranda em torno do Congresso Nacional. Primeiro de março de 1988 é criado o fórum Nacional de Entidades Não Governamentais de Defesa da Criança e do Adolescente (Fórum CDA) onde houve o encontro de várias instituições de defesa da criança e do adolescente, foi crucial no processo de discussão e elaboração da Nova Constituição e também do ECA, durante a década de 80 tornou-se mais visível a procura pela democracia, Ressalta Costa e Hermany que:

[...] foi possível a incorporação dos novos ideais culturais surgidos na sociedade, implementando, ao menos formalmente, a democracia participativa. A proposta é de que a descentralização e a formulação de políticas públicas e eficazes, que respondem satisfatoriamente aos anseios da população e que sejam capazes de prevenir e combater a tão propalada exclusão social [...] (COSTA;HERMANY, 2006. p.165).

Com o advento da Constituição de 1988 predominou a importância à proteção e à garantia dos direitos da criança e do adolescente, nesse novo contexto a responsabilidade passa a ser do Estado, da família e da Sociedade, de acordo com o disposto no diploma jurídico de 1988 em seu artigo 227:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 1988).

No mesmo dispositivo, o § 4º apresenta sanções como medida punitiva sobre a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente respeitando assim a Doutrina da Proteção Integral instituída primeiramente na Carta Magna. No dia 13 de Julho de 1990 foi aprovado no Congresso Nacional o Estatuto da Criança e do Adolescente, publicado sobre a lei federal n° 8069 estabelecendo que crianças e adolescentes possuem direitos como cidadãos.

Na concepção de Maurício Jesus, “a nova lei começava a reconhecer a importância do controle social e da antecipação ao desvio social”, sobre o Estatuto destaca-se:

O Estatuto da Criança e do Adolescente, é uma lei modelar que, considerando crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, pessoas em condição peculiar de desenvolvimento, coloca-os como prioridade absoluta, em uma repetição redundante, contundente, valendo-se de um pleonasmo necessário tendo em vista a realidade desastrosa e nefasta em que vivíamos sob a égide do código de Menores”. (JESUS, 2000.  p.24).

O ECA apresentou em sua estrutura um teor da Declaração Universal dos Direitos da Criança de 19179 e também da Convenção Internacional no que tange os direitos da criança admitido pela Organização das Nações Unidas (ONU) no ano de 1989. Os Direitos da Criança e do Adolescente são fundamentados no ordenamento jurídico na Constituição da República Federativa do Brasil, no Estatuto da Criança e do Adolescente também está presente nas Convenções Internacionais de Proteção aos Direitos Humanos.

É de suma importância que haja também compreensão dos princípios fundamentais Os princípios, no marco de um sistema jurídico baseado no reconhecimento do direito, pode-se dizer que são direitos que permitem exercer outros direitos e resolver conflitos entre direitos igualmente reconhecidos. Entendo deste modo, a ideia de ‘princípios’, a teoria supõe que eles se impõem às autoridades, isto é, são obrigatórias especialmente para as autoridades públicas e são dirigidos precisamente para (ou contra) eles (BRÑOL apud OLIVEIRA, 2017).

Por conseguinte, os direitos da criança e do adolescente acham-se espalhados no complexo de direitos fundamentais, no artigo 4°, 7° e no caput do artigo 19 traz expressamente o direito à vida, à saúde e a convivência familiar e comunitária. Determina em seu artigo 5° que: “nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, sendo punido na forma de lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”.

No que tange à liberdade, ao respeito e à dignidade, está previsto legalmente no art. 15 do ECA: A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis. ”O legislador procurou proteger as crianças e adolescentes de qualquer forma de injustiça por parte do Estado e da sociedade e também da família. Nesse sentido Veronese explica:

O ECA criou os conselhos de direitos em âmbito nacional, estadual e municipal que passam a ser canal de participação e envolvimento conjunto do Estado e da sociedade na defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes, e os conselhos tutelares que atuam no caso de violação dos direitos individuais das crianças e adolescentes, que se encontram em situação de risco (VERONESE, 2003. p.40).

Em se tratando das crianças e dos adolescentes no ordenamento jurídico brasileiro, pode-se dividir em duas fases distintas, quais sejam: a primeira que seria a situação irregular, como já foi abordado, onde a criança ou o jovem infrator só eram “descobertos” no momento em que se encontravam em uma situação irregular, ou seja, não estava incluso no ambiente familiar, ou teriam praticado um fato ilícito contra o ordenamento jurídico. Já o sendo momento é chamada de Doutrina da Proteção Integral, que teve como alicerce a Constituição Federal de 1988, e no seu artigo 227 está expresso que é dever da família, do Estado e da sociedade assegurar os direitos básicos de que necessitam. Desse modo há o rompimento da Doutrina da situação irregular e o que vigora é a Doutrina da Proteção Integral.

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Sobre os autores
Manoel Francisco Pereira dos Santos

Graduando do Curso de Direito. Faculdade Luciano Feijão.

Byanka Rodrigues Ribeiro

Graduanda do Curso de Direito. Faculdade Luciano Feijão.

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