Introdução
Os princípios contratuais regem-se por inúmeros princípios, uns clássicos e outros modernos. A função destes princípios é de estabelecer um equilíbrio entre os contratos.
Alguns princípios sempre estiveram presentes entre os contratos, regulando uma justa relação dentre os que se vinculam e procuram assumir obrigações.
Mesmo que se tenham que seguir todos os princípios, diversos possuem exceções e, se há alguma obstrução em seu cumprimento, uma das partes podem deixar de cumpri-los.
Como os contraentes não são subordinados uns aos outros, devem respeitar todos os princípios contratuais para que se formule corretamente o contrato.
A seguir, verificaremos os princípios clássicos que norteiam os contratos: autonomia da vontade, obrigatoriedade dos contratos, relatividade dos efeitos do contrato e consensualismo que vieram com o Código Civil de 1916 e permanecem em nosso Código, como os modernos: função social do contrato, boa-fé objetiva e equilíbrio econômico.
1 Princípios Clássicos
1.1 Princípio da Autonomia da Vontade
O princípio da autonomia da vontade é um dos princípios contratuais clássicos. Desde o direito romano pessoas tem a liberdade de contratar escolhendo com quem, sobre o que e com o conteúdo que quiserem ao celebrar seu contrato. Tal princípio teve seu apogeu após a Revolução Francesa, com a predominância do individualismo e culto a liberdade em todas as áreas, incluindo o direito contratual.
O alicerce do princípio da autonomia da vontade é a ampla liberdade contratual e o poder dos contratantes de disciplinar seus interesses por acordos de vontades, por contratos nominados ou inominados, tutelados pela ordem jurídica, mesmo sem precisar do Estado para tal. O princípio da liberdade e o da propriedade, presentes na Constituição Federal dão respaldo para tal situação, pois permitem que a pessoa proprietária de algo faça com este o que quiser.
As partes tem a faculdade de celebrar ou não os contratos, a princípio, sem nenhuma intervenção de terceiros. Porém, existem limitações nas quais as partes não podem escolher todo o conteúdo do contrato. A principal delas é a lei, não podem ser acordados objetos ilícitos. O poder de autorregulamentação dos interesses pertence às partes, porém estes deverão ser lícitos como diz o artigo 421 do Código Civil.
O artigo 425 do Código Civil prevê a liberdade de contratar ao dizer que podem ser estabelecidos contratos atípicos que são os resultados de acordos de vontade não regulamentadas pelo ordenamento jurídico, geradas pelas necessidades e interesses das partes.
Porém esta liberdade não é absoluta, os contratos atípicos só serão válidos se as partes forem capazes e o objeto for licito, possível, determinado ou determinável e suscetível de apreciação econômica. Com isso, o contrato atípico requer muitas cláusulas que especifiquem todos os direitos e obrigações que o compõe.
Existem situações em que se a parte não contratar ela receberá sanções, como é o caso, por exemplo, do seguro obrigatório e do artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor proíbe que fornecedores condicionem o fornecimento de bens e serviços sem justa causa ou recusem a demanda dos consumidores se tiverem disponibilidade de estoque para cobri-las.
Outra divisão da autonomia da vontade é a liberdade contratual, que subdivide-se novamente na liberdade de escolher com quem contratar e liberdade de escolher o conteúdo do contrato, ambas as subdivisões também estão sujeitas à limitações.
Quando há monopólio de serviços públicos ou privados o consumidor não tem a opção de escolher de quem vai contratar tal serviço. Ao se falar das cláusulas e regras que regem o contrato, existem casos em que o consumidor não tem a chance de escolhê-las, só tem a opção de firmar ou não o contrato, como é o caso dos contratos em massa.
Uma vez celebrado o contrato as partes são obrigadas a cumprir o que for contratado, pois a obrigação originária escolhida se impõe aos contratantes que acordaram. O contrato faz lei entre as partes e qualquer uma delas tem legitimidade de exigir que a outra cumpra o que foi estabelecido.
O Estado pode intervir no firmamento de contratos criando lei para inibir comportamentos injustos, as normas podem ser dispositivas, ou seja, facultativas para os contratantes, ou normas cogentes, que são as impostas pois o interesse público sobrepõe o particular, é o chamado dirigismo contratual.
1.2 Princípio da Obrigatoriedade dos Contratos
O princípio da obrigatoriedade dos contratos representa a força vinculante das convenções, como ninguém é obrigado a contratar pelo princípio da autonomia da vontade, os que o fizerem serão obrigados a cumprir o contrato que celebraram se este for válido e eficaz, pois foram as partes que escolheram e aceitaram os termos e cláusulas descritos sem interferência do juiz.
A força obrigatória significa a irreversibilidade da palavra empenhada, e tem por fundamentos a necessidade de segurança nos negócios jurídicos, que deixaria de existir se os contratantes tivessem a opção de não cumprir o que acordaram, e a intangibilidade ou imutabilidade do contrato, pois o acordo faz lei entre as partes.
Pacta sunt servanda diz que os contratos devem ser cumpridos e não podem ser alterados nem pelo juiz sem ter a concordância de ambas as partes contraentes. Qualquer alteração ou revogação tem que ser um acordo bilateral para ser permitida.
No caso de inadimplemento, a parte lesada poderá utilizar-se dos instrumentos judiciários para obrigar a parte inadimplente a cumprir o contrato ou indenizá-lo por perdas e danos, sob pena de execução patrimonial. A previsão legal para tal está no artigo 389 do Código Civil.
A necessidade de segurança jurídica se explica como função social do contrato, uma vez que se os contratantes não tivessem a intenção de cumpri-lo, este instrumento deixaria de ser confiável, o que geraria tumulto e caos social. Em outras palavras, a imutabilidade do contrato decorre da convicção de que o contrato faz lei entre as partes.
Existem, no entanto, limitações para o princípio da obrigatoriedade dos contratos, são exceções, pois a regra é que o contrato firmado é obrigatório. Tais limitações serão explicadas a seguir.
Caso fortuito e força maior, exceção que sempre existiu. Ocorrência de fato extraordinário e inevitável que torne impossível o cumprimento da obrigação, situação na qual não cabe indenização à parte que não recebeu a obrigação.
Desistência ou arrependimento, neste caso o contratante pode se arrepender ou desistir de contrato firmado por meio de arras. Pode ser convencional, quando as partes convencionam no contrato que qualquer uma delas pode se arrepender, essa modalidade tem uma desvantagem, que é a falta de segurança jurídica ou legal, situação onde o contrato não prever desistência ou arrependimento das partes mas a lei explicita no caso concreto.
Fatos supervenientes inevitáveis, são casos imprevisíveis que tornam o cumprimento da obrigação extremamente difícil de ser cumprida pelo devedor mas não a torna impossível, não se encaixando nas situações de caso fortuito ou força maior. Para tal foram criadas diversas teorias: Cláusula rebus sic stantis (alteração das circunstâncias), teoria da pressuposição (presume-se como será a situação na hora do pagamento), teoria da imprevisão (libera o devedor no caso de fato superveniente imprevisível que tornou o pagamento impossível) e, por fim, teoria da excessiva onerosidade (evita que a parte mais forte tenha privilégio sobre a parte mais fraca).
No direito moderno, a convicção de que o Estado deve intervir na vida contratual só pode acontecer para evitar que se consume atentado contra a justiça.
1.3 Princípio da relatividade dos efeitos do contrato
O princípio da relatividade dos efeitos do contrato tem como premissa que o contrato somente produz efeito em relação às partes contratantes, isto é, àqueles que manifestaram sua vontade vinculando-os ao seu conteúdo, não afetando terceiros nem seu patrimônio. Tem como objetivo a satisfação das necessidades individuais.
A obrigação vincula também os sucessores das partes, a título universal ou singular, a não ser no caso de a obrigação ser personalíssima, situação na qual nem os sucessores estarão vinculados ao contrato.
Este princípio foi atenuado pelo reconhecimento de cláusulas gerais, por conterem normas de ordem pública que não se destinam apenas à proteção dos direitos individuais dos contratantes, mas também a tutelar os interesses da coletividade, que sempre devem prevalecer.
Assim como o contrato não vincula terceiros, também não é permitida a interferência deles nas relações jurídicas pessoais caso isso venha a causar prejuízo para alguma das partes contratantes.
Existem exceções em que o contrato vincula terceiros, são elas a estipulação em favor de terceiro, a promessa de fato de terceiro e os contratos coletivos.
1.4 Princípio do consensualismo
Este princípio resulta da concepção de que o contrato se aperfeiçoa a partir do acordo de vontades, ou seja, do consenso entre as partes, independentemente da entrega da coisa. As partes têm a faculdade de vincular-se pelo consenso, baseadas no princípio ético do respeito à palavra e na confiança recíproca entre as partes.
Se as partes tem a opção de contratar de acordo com a sua vontade própria, a lei deve evitar de estabelecer solenidades, formas ou fórmulas que conduzam ou qualifiquem o contrato. Salvo em figuras cuja seriedade de efeitos exija a sua observância, assim, os contratos consensuais são considerados não solenes.
No direito brasileiro, os contratos são celebrados, em regra, por forma livre, ou seja, as partes podem celebrar o contrato pelo meio que entenderem adequado, podendo ser escrito ou oral, público ou particular. A exceção é que a lei exija a forma escrita, pública ou particular para dar maior segurança e seriedade aos negócios jurídicos.
Sendo assim, os contratos brasileiros são, em regra, consensuais, a não ser que a lei obrigue, no caso concreto, que sejam reais e só se aperfeiçoem com a entrega da coisa, subsequente ao acordo de vontades.
1.5 Princípio da função social do contrato
Entrando nos princípios modernos do direito contratual, o princípio da função social do contrato afasta as concepções individualistas do Código Civil de 1916 e segue orientação compatível com a socialização do direito contemporâneo, refletindo assim, a prevalência dos valores coletivos sobre os individuais.
Previsto no artigo 421 do Código Civil de 2002 a função social do contrato tem o objetivo de promover a realização de uma justiça comutativa, diminuindo as desigualdades substanciais entre os contratantes. Assim, tal princípio subordina a liberdade contratual para priorizar os princípios condizentes com a ordem pública.
A função social do contrato serve para limitar o princípio clássico da autonomia da vontade quando confrontar o interesse social e este deva prevalecer. É uma condicionante ao princípio da liberdade contratual.
O atendimento a função social do contrato tem enfoque em dois aspectos: um deles individual, relativo aos contraentes, que se valem do interesse particular, e outro público, que é o interesse da coletividade sobre tal contrato. Sendo assim, a função social do contrato só é considerada cumprida quando este se aperfeiçoa de forma justa, como uma fonte de equilíbrio social.
A função social do contrato é tida atualmente como cláusula geral que exige um comportamento condizente com a probidade e a boa fé objetiva. Por ser norma de ordem pública, o juiz pode aplicar as cláusulas gerais em qualquer ação judicial de ofício, assim, ele pode ajustar o contrato para que fique equilibrado.
O contrato cumpre sua função social quando respeitar a função econômica de promover a circulação de riquezas ou manutenção de trocas econômicas. E descumpre tal função quando inibe o movimento natural do comércio jurídico e prejudica a coletividade.
1.6 Princípio da boa-fé objetiva
O princípio da boa-fé está previsto no Código Civil em seu artigo 422. Exige que as partes se comportem de forma correta não só durante as combinações, como também durante a formação e cumprimento do contrato.
O juiz deve presumir a boa-fé ao julgar contratos, enquanto a má-fé deve ser provada pela parte que a alega. Deve-se supor que as partes estão agindo com boa-fé objetiva, que impõe ao contratante um padrão de conduta, de agir com probidade, honestidade e lealdade levando-se em consideração os usos e costumes do local e época da celebração e cumprimento do contrato. O intérprete do contrato busca qual foi a efetiva intenção dos contraentes com o que está escrito.
A boa-fé objetiva é cláusula geral de conduta do direito obrigacional e deve ser aplicada pelo juiz no julgamento das relações obrigacionais, juntamente com o fim social do contrato e a ordem pública. Difere do Código Civil anterior pois este dava mais importância a autonomia da vontade e obrigatoriedade do contrato e por ser fonte de direitos e obrigações.
Os fundamentos para o princípio da boa-fé objetiva são a honestidade, a retidão, a lealdade e a consideração para com os interesses do outro contratante. Constitui assim um modelo jurídico na medida em que se reveste de variadas formas, dependendo sempre do caso concreto para ser analisada.
De acordo com o artigo 422 do Código Civil que traz a figura da boa-fé com maior força, cabe ao juiz estabelecer a conduta que deve ser adotada pelas partes, nas circunstâncias do caso e levando em conta os usos e costumes.
A boa-fé pode ocorrer tanto para se reclamar do contratante o cumprimento da obrigação, da melhor maneira possível para a outra parte, como para exonerá-lo dela. Também aparece quando alguma das partes é inadimplente absolutamente ou parcialmente, quando o contratante deixa de cumprir algum dever anexo ou lateral do contrato, que podem ser exemplificados por dever de proteção, dever de lealdade e dever de informação.
Uma das funções mais importantes da boa-fé objetiva é a proibição de venire contra factum proprium, que proíbe qualquer uma das parte de agir em contradição com o que foi assumido anteriormente, visando a proteção da outra parte. A conduta contraditória entre os comportamentos da parte é vista como quebra de injustificada de confiança em prejuízo da contraparte, assim, a conduta posterior não tem eficácia.
1.7 Princípio do equilíbrio econômico
O princípio do equilíbrio econômico se opõe à obrigatoriedade dos contratos. Permite aos contraentes recorrerem ao poder judiciário para alterar o contrato acordado anteriormente em situações específicas geradas por fatores externos que levem uma das partes a ter onerosidade excessiva ou enriquecimento sem causa.
Este princípio presume a existência de uma cláusula implícita nos contratos comutativos de trato sucessivo e execução diferida pela qual a obrigatoriedade gerada pressupõe a inalterabilidade da situação de fato.
No Brasil, foi adotada a teoria da imprevisão, que consiste na possibilidade de requerimento ao juiz de desfazimento ou revisão forçada do contrato caso ocorra fato extraordinário imprevisível que justifique a alteração contratual, o devedor pode pedir ao juiz que o isente da obrigação, parcial ou totalmente se a sua prestação se tornar exageradamente onerosa.
A cláusula rebus sic standibus e a teoria da imprevisão são aplicadas em casos excepcionais e se preenchidos certos requisitos: vigência de um contrato comutativo de execução diferida ou de trato sucessivo; ocorrência de fato extraordinário e imprevisível; considerável alteração da situação de fato existente no momento da execução, em confronto com o momento da celebração; onerosidade excessiva para um dos contratantes e vantagem exagerada para o outro.
A parte prejudicada pode pedir revisão judicial do negócio jurídico se ainda for possível manter o vínculo contratual com modificações nas prestações, ou pode pedir resolução se o caso concreto se encaixar nos artigos 317 e 478 do Código Civil. Para a resolução o juiz deve apreciar as cláusulas gerais sobre o enriquecimento injusto, a boa-fé e o fim social do contrato.
A teoria da imprevisão, por tratar de evento imprevisível, não pode ser aplicada aos contratos aleatórios, pois estes envolvem riscos normais do contrato, a não ser que o imprevisível decorra de fatores estranhos ao risco natural do contrato.
Conclusão
Os princípios contratuais são de grande importância para que o cumprimento das obrigações acordadas entre as partes aconteça de maneira válida e justa.
O intérprete do contrato deve entender o que as partes querem ao estabelecê-lo e resolver a situação da melhor maneira para ambos.
Princípios podem ser cumpridos em diferentes graus e, seu cumprimento não depende apenas das possibilidades jurídicas na hora do aperfeiçoamento do contrato, mas também das possibilidades reais que cercam as partes.
Referências
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 2011
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: contratos e atos unilaterais. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2011