Acepções a respeito da responsabilidade civil

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06/11/2018 às 09:31
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Os tribunais têm reconhecido diferentes modalidades de danos patrimoniais e morais, os cidadãos têm se conscientizado de seus direitos, criando o hábito de postulação em juízo. Por isso, a identificação de quem cabe a responsabilidade é de suma relevância.

1. Conceito e acepções da responsabilidade civil

Um dos temas jurídicos de importância crescente é a responsabilidade civil, atraindo cada vez mais a atenção e estudo dos juristas, em razão do fato de que, os tribunais têm reconhecido diferentes modalidades de danos patrimoniais e morais, os cidadãos têm se conscientizado de seus direitos, criando o hábito de postulação em juízo e a identificação de quem cabe a responsabilidade é de suma relevância.

José de Aguiar Dias inicia seu Tratado de Responsabilidade Civil, ponderando que: “Toda manifestação da atividade humana traz em si o problema da responsabilidade”.[1]

A princípio, cumpre-se explicar em que consiste a responsabilidade. Existem várias acepções existentes, mas nas palavras de Paulo Nader [2]

Embora antiga a noção de responsabilidade, remontando à Jurisprudentia romana, a palavra tornou-se de uso corrente somente no século XIX. O vocábulo responsabilidade provém do verbo latino respondere, de spondeo, que significa garantir, responder por alguém, prometer

Assim sendo, toda atividade que causa um prejuízo, traz consigo a responsabilidade implícita, uma vez que, alguém terá que assumir as consequências jurídicas da atividade praticada. Isto é “destina-se ela a restaurar o equilíbrio moral e patrimonial provocado pelo autor do dano. (...) o interesse em restabelecer a harmonia e o equilíbrio violados pelo dano constitui a fonte geradora da responsabilidade civil”. [3]

Isto posto, entende-se que a fonte geradora da responsabilidade civil, está ligada à conduta humana que violar um dever jurídico originário e causar prejuízo a outrem, acarretando assim, o dever jurídico secundário, que é o de indenizar este prejuízo.


2. Distinção entre obrigação e responsabilidade civil

Estes termos, apesar de serem tratados por alguns juristas como sinônimos, devem ser diferenciados, uma vez que expressam situações diferentes. A distinção entre estes, começou a ser estudada na Alemanha, pelo autor Brinz.

Foi Alois Brinz que no fim do século 19, fazendo uma releitura das fontes romanas, desenvolveu a chamada teoria dualista do vínculo pela qual este se decompõe em dois elementos: dívida (debitum em latim e schuld em alemão) e responsabilidade (obligatio em latim e haftung em alemão).[4]

Conforme Judith Martins-Costa a teoria dualista, proposta por autores alemães e aperfeiçoada no início do século 20 por Von Gierke, decompunha a obrigação em dois momentos, sendo eles schuld, como um dever legal em sentido amplo e em sentido estrito como a dívida autônoma em si mesma; e haftung, que consiste na submissão ao poder de intervenção daquele a quem não se presta o que deve ser prestado. [5]

Deste modo, é possível verificar que o primeiro elemento consiste “no dever de prestar, na necessidade de observar certo comportamento e o segundo na sujeição dos bens do devedor ou do terceiro aos fins próprios da execução”. [6] A distinção a ser feita, é que o surgimento ocorre em momentos distintos. A dívida desde a formação da obrigação e a responsabilidade, posteriormente, quando o devedor não cumpre a prestação devida.

Ademais, a obrigação é formada por três elementos, sendo eles o elemento subjetivo, que é composto pelas partes (sujeito ativo, que é o credor e sujeito passivo, que é o devedor), o objetivo pela prestação (conduta humana de dar, fazer ou não fazer) e o imaterial ou espiritual é o vínculo jurídico. [7]

Fábio Konder Comparato, conclui que

“o grande aporte da teoria dualista da obrigação à doutrina contemporânea foi o de demonstrar que a obrigação não é uma relação simples e unitária, mas que se compõe de dois elementos: a relação de crédito e de débito, schuld, que nós chamaremos de dever e a relação de coerção e de responsabilidade (haftung), que nós chamaremos de vínculo”. [8]

 José Fernando Simão, conclui que desde muito tempo se refletia na separação entre debitum (dívida) e responsabilidade (obligatio) e que efetivamente a teoria dualista foi adotada pelo direito brasileiro (Código Civil de 1916 e 2002) e é de grande utilidade prática e teórica.[9]

Cabe ressaltar que a obrigação nasce de diversas fontes e deve ser cumprida de forma espontânea, porém, quando tal não ocorre e sobrevém o inadimplemento, surge a responsabilidade. Assim sendo, a responsabilidade é, pois, a consequência jurídica patrimonial do descumprimento da relação obrigacional. [10]

Enquanto a obrigação é um dever jurídico originário, a responsabilidade é um dever jurídico sucessivo, “uma sombra da obrigação”. Além disso, a obrigação surge da vontade dos indivíduos, enquanto que a responsabilidade, decorre da consequência do descumprimento da obrigação, ou seja, não surge como vontade das partes.

Uma pode existir sem a outra. Assim, é possível haver obrigação sem responsabilidade, como é o caso das dívidas prescritas, por exemplo; e também, responsabilidade sem obrigação, a exemplo do fiador, que é responsável pelo pagamento do débito do afiançado, que é quem originariamente obrigado ao pagamento dos aluguéis.


3. Evolução da responsabilidade civil na história 

A responsabilidade civil passou por diversas fases até chegar na modulação atual, a qual atende as novas exigências econômicas e sociais, uma vez que com a evolução da sociedade e das civilizações ao redor do mundo, as teorias iniciais de responsabilidade passaram a ficar ultrapassadas e insuficientes em muitos de seus pontos, assim, o direito civil clássico por si só não pode servir de modelo para a responsabilidade civil da sociedade atual.

3.1 Direito Romano

Inicialmente, deve ficar claro, que não foi o Direito romano que construiu a teoria da responsabilidade civil. Esta foi sendo construída ao longo do tempo com as situações cotidianas, decisões dos juízes, entre outros fatores. Porém, “[...] muito do que o direito moderno apresenta vai-se enraizar na elaboração romana”. [11]

De acordo com a teoria clássica, a responsabilidade civil tem como base três pressupostos, sendo eles, o dano, a culpa e a relação de causalidade entre o fato culposo e o mesmo dano. Porém, nem sempre foi assim, havendo até mesmo no direito antigo, confusão entre responsabilidade civil e responsabilidade penal.

Nos primórdios da responsabilidade civil, é possível citar a vingança privada como a primeira forma de reação contra comportamentos lesivos, não se cogitando o fator culpa. Na ausência de um poder central, a situação ofensiva era levada a efeito pela própria vítima ou pelo grupo ao qual pertencia. O dano provocava reação imediata e até mesmo brutal do ofendido. Evidencia-se que não imperava ainda o direito, assim, a vingança privada segundo Carlos Roberto Gonçalves[12] “era a solução comum a todos os povos nas suas origens, para a reparação do mal pelo mal”.

Após a vingança privada, passou a vigorar a Lei de Talião, que expressa a máxima “olho por olho, dente por dente”. Vem do latim Lex Talionis, sendo que a palavra talis significa igual ou semelhante, enquanto onis, pena igual a ofensa. Presente em vários códigos antigos, como o Código de Hamurabi, se tratava de um costume dos povos primitivos, em função da proporcionalidade do castigo.

Aos poucos, as pessoas começaram a perceber que a vingança não trazia benefícios, apenas consequências nocivas para ambas as partes.  Assim, em um momento posterior as formas primitivas de autotutela, deu-se início a compensação pecuniária e superou-se a ideia de vingança. É um período de composição a critério da vítima, no qual o prejudicado verifica que lhe é muito mais vantajoso substituir a vingança, como a Lei de Talião, pela compensação econômica. “Nesse ambiente nasce a responsabilidade civil, no sentido moderno da expressão, compreendida como obrigação de restituir ao ofendido uma soma em pecúnia com a função de sancionar o ofensor e satisfazer o ofendido”. [13]

Posteriormente, quando já existe uma soberana autoridade, o legislador veda à vítima a fazer justiça pelas próprias mãos. A composição econômica, antes voluntária, passa a ser obrigatória. É importante ressaltar, que a diferenciação entre “pena” e “reparação”, começou a ser feita com a distinção entre delitos públicos, quais sejam ofensas de caráter perturbador da ordem e os delitos privados. Nos públicos, a pena econômica imposta ao réu era recolhida aos cofres públicos, enquanto que nos privados, a vítima. O Estado assumiu ele só a função de punir, surgindo assim, a ação de indenização. [14]

Destacando o pensamento do autor Caio Mário da Silva Pereira,[15] a maior revolução que ocorreu nos conceitos jus-romanísticos em termos de responsabilidade civil foi com a Lex Aquilia. A ela se prende a denominação de aquiliana para designar-se a responsabilidade extracontratual em oposição à contratual. Foi um marco tão acentuado, que se atribui a ela, a origem do elemento “culpa”, como fundamental na reparação do dano. A Lex Aquilia abriu novos horizontes à responsabilidade civil, porém, não enunciou um princípio geral de forma literal. Ou seja, a noção de culpa acabou por criar raízes na própria Lex Aquilia.

Assim, “a origem da responsabilidade civil extracontratual nos moldes que conhecemos hoje, isto é, aferida mediante a apuração da culpa (subjetiva), remonta à promulgação da Lei Aquilia (286 a. C.) ”.[16]

A partir do surgimento deste novo elemento, a responsabilidade mediante culpa passou a ser a regra em todo o Direito Comparado, influenciando diversas codificações privadas modernas, a exemplo, o Código Civil Francês, de 1804.

3.2 Direito Francês (Código de Napoleão)

De acordo com Judith Martins da Costa[17], após a queda do império romano, passou-se a manifestar a existência paralela entre o direito civil e o direito canônico (direito da igreja, formado sob a primazia da moral cristã) esferas estas, que resultaram nas bases do direito privado. Vigora a ideia de que cada um deve reparar o mal que causou.

Influenciando as legislações de diversos povos (inclusive o Código Civil brasileiro de 1916), o Código Civil francês de 1804, conhecido também como “Código de Napoleão”, foi o primeiro estatuto de direito privado da era moderna, seguindo o direito romano e “adotando a teoria da culpa como fundamento do direito de indenizar, no qual aquele que por ação ou omissão violar direito de outrem, causando dano, fica obrigado a reparar mediante a apuração de culpa, conforme expressamente previsto em seus arts. 1.382 e 1.383”.[18] De acordo com este Código, a culpa, ainda que levíssima, obriga a indenizar.

 [...] pela doutrina clássica francesa e pela tradução do art. 1.382 do Código Napoleônico, os elementos tradicionais da responsabilidade civil são a conduta do agente (comissiva ou omissiva), a culpa em sentido amplo (englobando o dolo e a culpa stricto sensu), o nexo de causalidade e o dano causado. Seguindo essa construção, o Direito Civil pátrio continua consagrando como regra a responsabilidade com culpa, denominada responsabilidade civil subjetiva, apesar das resistências que surgem na doutrina.[19]

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Ou seja, segundo este Código, aquele que causar um dano a outrem, ficará obrigado a indenizar a vítima, porém, mediante apuração de culpa. Isso conduz a necessidade da vítima não só provar que o dano foi causado pela pessoa, como principalmente provar que o autor do dano agiu com culpa. Assim, no código de Napoleão só há indenização se a pessoa teve conduta, dano, nexo causal e culpa.

3.3 Revolução Industrial e a nova doutrina francesa: Saleilles, Josserand e Ripert

Toda a teoria tradicional da responsabilidade repousava sobre a velha ideia de culpa: não há responsabilidade sem culpa provada, como exposto anteriormente; porém esta teoria passou a não mais resistir as transformações, as revoluções e etc.

De acordo com Josserand a constante e acelerada evolução

[...] deve ser procurada na multiplicidade dos acidentes, no caráter cada vez mais perigoso da vida contemporânea. Antes, ao tempo de nossos antepassados, o acidente era raro, ou, pelo menos, apresentava-se sob uma feição tal que não era absolutamente gerador de responsabilidades [...][20]

O século XIX foi marcado pela revolução industrial e consequentemente pelos riscos criados pelo maquinismo e pela automação do mundo. Nas fábricas, não haviam equipamentos de proteção, horários máximos de trabalho, descanso e nem segurança, assim, muitos acidentes ocorriam. O ônus da prova era da vítima, singularmente pesado, uma vez que para que pudesse comprovar, precisava fazer prova contra o empregador, o que era muito difícil. O corolário disso, é que a vítima acabava ficando sem indenização. Ou seja, a teoria tradicional repousava em bases muito estreitas, se mostrando cada vez mais insuficiente e perempta.

 Assim sendo, a Revolução Industrial, precursora do modelo capitalista, trouxe consequências jurídicas importantes, uma vez que a teoria clássica da culpa não conseguia mais satisfazer todas as necessidades de um mundo industrializado e de uma sociedade cada vez mais dinâmica e complexa, com casos concretos em que os danos se perpetuavam sem reparação pela impossibilidade de comprovação do elemento culpa.

A jurisprudência, a doutrina e os tribunais, começaram a duvidar se a culpa era fundamento suficiente para todo e qualquer caso de atribuição de responsabilidade. Ao final do século XIX, Raymond Saleilles, seguido por Louis Josserand e Georges Ripert iniciou estudos que consideravam a culpa como insuficiente para resolver todos os problemas, assim, acreditavam que a reparação do dano, deveria ser em razão do fato ou do risco criado.

Surge então, a teoria do risco: há situações que naturalmente criam risco, a citar, o exemplo das fábricas, assim, quem desenvolve uma atividade como esta, está criando risco para terceiros, deste modo, o responsável passa a ser também quem cria o risco. Isto é, o “exercício de atividade que possa oferecer algum perigo representa um risco, que o agente assume, de ser obrigado a ressarcir os danos que venham resultar a terceiros dessa atividade”.[21]

Dos estudos de Saleilles e Josserand sobre a teoria do risco, surgem, a partir do ano de 1897, as primeiras publicações sobre a responsabilidade civil objetiva, ou seja, sem culpa.

Conforme Paulo Nader  

A adoção da teoria objetiva, na França, teve o seu marco em uma decisão da Corte de Cassação que, pelo Tribunal Pleno, em 13 de fevereiro de 1930, admitiu que, em casos de acidentes de automóveis, o condutor somente podia liberar-se da responsabilidade pelos danos causados provando a ocorrência de caso fortuito ou de outra causa que lhe fosse estranha. Em outras palavras, não competia à vítima a prova de culpa (lato sensu) do agente.[22]

Isto é, passou-se a adotar também a responsabilidade objetiva, para que os casos que revelem dificuldade em fazer prova de culpa, possam ser também ressarcidos em razão dos danos causados.

3.4 Direito Brasileiro

O que vigorava no Direito Civil Brasileiro, antes do Código Beviláquia de 1916, eram as Ordenações Filipinas, porém, insuficientes para disciplinar todos os acontecimentos, recorria-se ao Direito Romano e ao Canônico e de forma subsidiária, aos costumes.

A responsabilidade aquiliana no Brasil era regida por disposição semelhante à do artigo 1.382 do Código de Napoleão, localizada no artigo 68 da Lei de 3 de dezembro de 1841 e arts. 21 e 22 do Código Criminal de 1830.  De acordo com Carlos Roberto Gonçalves

O Código Criminal de 1830, atendendo às determinações da Constituição do Império, transformou-se em um código civil e criminal, prevendo a reparação natural, quando possível, ou a indenização; a integridade da reparação, até onde possível; [...][23]

Neste, antes de ser adotado o princípio da independência da jurisdição civil e da criminal, a reparação era condicionada à condenação criminal apenas.  

O artigo 159 do Código de 1916, se baseando no artigo 1.382 do Código de Napoleão, dispôs sobre a responsabilidade aquiliana ao definir ato ilícito, considerando como elementos a conduta por ação ou omissão, o prejuízo a outrem ou violação de direito e dolo, imprudência ou negligência do agente e como consequência ao ato ilícito, estabelecia o dever de reparação do dano.

Porém, como já explicado anteriormente, o progresso e o desenvolvimento industrial acabaram por ocasionar o surgimento de novas teorias, que conferissem uma maior proteção as vítimas.

Já era possível verificar no artigo 15 do Código Civil de 1916 uma das primeiras tentativas de consagrar a nova vertente doutrinária, trazendo a responsabilidade civil do Estado pelos atos comissivos de seus agentes.

Em complemento ao dispositivo acima, a Constituição Federal de 1988, em seu art. 37, § 6.º, também prevê responsabilidade civil objetiva do Estado. O Poder Público foi atingido pela responsabilidade sem culpa em virtude da amplitude de sua atuação diante dos cidadãos, tendo em vista a constatação de que prestação de serviços públicos cria riscos de eventuais prejuízos.

É importante ressaltar também, a existência do Decreto 2.681/1912 regulamentando as atividades das estradas de ferro. Este apresenta a ideia da responsabilidade objetiva, ou seja, dispensa-se a prova da culpa e passa a ter o risco como fundamento da responsabilidade.

Com isso, a teoria do risco começou a se destacar e a responsabilidade passa a ser encarada sob o aspecto objetivo:

A responsabilidade objetiva funda-se num princípio de equidade, existente desde o direito romano: aquele que lucra com uma situação deve responder pelo risco ou pelas desvantagens dela resultantes (ubi emolumen- tum, ibi onus; ubi commoda, ibi incommoda). Quem aufere os cômodos (ou lucros), deve suportar os incômodos (ou riscos). [24]

Cabe evidenciar, que tal teoria não veio para substituir a teoria da culpa, mas sim para cobrir as hipóteses em que a teoria tradicional se mostrava insuficiente.

3.4.1. Código do Consumidor

O que alterou significativamente a responsabilidade no Direito Brasileiro, foi o Código de Defesa do Consumidor, promulgado em 1990 e mais moderno do que o Código Civil. A relação jurídica de consumo é composta de elementos subjetivos (consumidor e fornecedor) e objetivos (aquisição ou fruição de um produto ou serviço).

O Código de Defesa do Consumidor, atento aos novos rumos da responsabilidade civil, também consagrou a responsabilidade objetiva do fornecedor, em razão da existência de uma sociedade de produção e consumo em massa.

Este Código, afirma que nas relações de consumo, se o produto ou serviço causar dano, a responsabilidade é objetiva, ou seja, independe de culpa. Ao consumidor cabe apenas provar que comprou e/ou utilizou o produto ou serviço, ao passo que o dever de indenização, só será afastado se ficar comprovado que não foi o fornecedor que colocou no mercado ou que ocorreu mal-uso por parte do consumidor.

Porém, a adoção da responsabilidade objetiva, possui exceções, como é o caso dos profissionais liberais. Nestes casos, só cabe indenização se ficar comprovada que este agiu com culpa.

O referido código, “[...] substituiu os princípios de igualdade e autonomia da vontade, nas relações de consumo, por regras de ordem pública e interesse social, que tutelam a parte presumidamente mais fraca”. [25] Para caracterizar o consumidor, os autores indicam o princípio da vulnerabilidade, como um meio de justificar todo o sistema de proteção à parte mais fraca na relação de consumo.

Cabe destacar, que ao adotar o sistema da responsabilidade civil objetiva pelos danos causados a direitos do consumidor, o legislador brasileiro seguiu as modernas legislações dos países industrializados, como por exemplo, os Estados Unidos, a Inglaterra (Consumeer Protection Act, de 1987), a Áustria, a Itália (Lei n. 183/87), a Alemanha, entre outros.

Ou seja, o CDC ampliou extensivamente o número de hipóteses em que a responsabilidade é objetiva.

3.4.2. O Sistema binário de Responsabilidade Civil do Código Civil de 2002

O Código Civil de 2002, se manteve fiel a teoria subjetiva nos artigos 186 e 927, caput; ou seja, para que haja responsabilidade, é necessário a culpa. Sem prova de culpa, inexiste a obrigação de reparar o dano. Estes artigos, expressam basicamente o que exprimia o artigo 159 do código anterior. Porém, sendo insuficiente para as imposições do progresso, o legislador passou a fixar casos em que há obrigação de reparar, independentemente de culpa.

Nos referidos casos, aplica-se a responsabilidade objetiva, disposta nos artigos 187, 981 e 927, parágrafo único. Neste último, pode-se considerar como uma cláusula geral, uma vez que poderá aplicar esta responsabilidade tanto nos casos especificados em lei quanto na atividade normalmente desenvolvida que implique, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Inclusive, há outros dispositivos e mesmo leis esparsas que passaram a adotar os princípios da responsabilidade objetiva, sendo eles:

[...] os artigos 936 e 937, que tratam, respectivamente, da responsabilidade do dono do animal e do dono do edifício em ruína; nos arts. 938, 927, parágrafo único, 933 e 1.299, que assim responsabilizam, respectivamente, o habitante da casa de onde caírem ou forem lançadas coisas em lugar indevido, aquele que assume o risco do exercício de atividade potencialmente perigosa, os pais, empregadores e outros, e os proprietários em geral por danos causados a vizinhos. A par disso, temos o Código Brasileiro de Aeronáutica, a Lei de Acidentes do Trabalho e outros diplomas, em que se mostra nítida a adoção, pelo legislador, da responsabilidade objetiva.[26]

Percebe-se assim, que o Código Civil de 2002, trabalha com dois sistemas, o da responsabilidade subjetiva e o da objetiva, ou seja, trata-se de um sistema dúplice ou binário de responsabilidade. Além disso, com a Constituição Federal de 1988, houve um grande passo em direção a responsabilidade objetiva, pois esta trouxe mais casos, como o da responsabilidade objetiva do Estado, em algumas situações, se causar danos.

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