4 - A Constatação do Dano Moral
De um lado, não se pode pretender constatar o dano moral, evento de natureza imaterial utilizando-se meios e modos materiais, na expectativa de que o resultado seja material, de constatação objetiva. Essa orientação conduziu muitos estudiosos à negação da existência do Dano Moral, até a consagração constitucional por meio da norma que prevê a Indenização por Dano Moral.
De outro lado, o fato de o evento ser consequência de agressão aos valores sentimentais da vítima tornando-o de constatação subjetiva, isso não é razão para que esses valores sejam considerados extrapatrimoniais, como ainda é o entendimento majoritário dos doutrinadores, tampouco que sejam desmerecedores da consideração de quem tem por oficio reconhece-los, ninguém menos que os membros do Poder Judiciário.
O fato de expressão material é de fácil constatação objetiva, enquanto os sentimentos que são fatos de expressão moral, são de fácil constatação subjetiva, por parte de quem os tem e de possível verificação intersubjetiva por parte de quem deles tem noticia.
A verificação intersubjetiva ocorre no processo judicial para o magistrado quando ele recebe o testemunho do Autor que teve o seu patrimônio moral danificado informando as características dos sentimentos por ele experimentados, informando e comprovando as circunstancias ensejadoras de tais sentimentos.
O magistrado, usando de sua alta qualificação intelectual e moral, valorará em seu subjetivismo a razoabilidade e a proporcionalidade dos males enfrentados pelo titular do bem moral danificado. Essa valoração expressará o sentimento do magistrado diante da comprovação objetiva das circunstancias vivenciadas pelo autor da ação.
Inúmeros são os institutos jurídicos de natureza imaterial e cujas verificações ocorrem de maneira intersubjetiva. No Direito Penal, o dolo e a culpa são verificados de intersubjetivamente, a partir da comprovação objetiva das circunstancias, colhida no inquérito policial. O Ministério Público afirma a culpa ou dolo do réu, pedindo a sua condenação.
No Direito Empresarial, a Afeccio Societatis assim como a sua ruptura também são verificadas de maneira intersubjetiva, por meio da comprovação objetiva das circunstancias.
A análise do magistrado tem guarida constitucionalmente prevista no art. 5°, Caput da CF, segundo o qual, “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, ...”. Essa igualdade está na humanidade que é característica essencial de ambos (juiz e autor)
O Principio da Legalidade fundamenta e justifica a oportunidade que o magistrado tem de avaliar em si mesmo o dano sofrido pelo Autor em seu patrimônio moral, ao ser submetido a todas essas agruras descritas, podendo aquilatar de maneira precisa o dano moral levado ao seu conhecimento.
O sistema jurídico brasileiro, já contempla esse posicionamento, quando no seu art. 112 o Código Civil dá prevalência ao aspecto moral, em detrimento do material da declaração de vontade.
Art. 112 CC - Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.(24)
Por essa razão não tem qualquer sentido ou fundamento estabelecer como parâmetro para fixação do valor da indenização por dano moral a posição sócio-econômica daquele que sofreu o dano moral, nem tampouco como fator de afastamento da ideia do enriquecimento sem causa, como querem alguns doutrinadores.
Sendo o dano moral, a sua avaliação deve ser de cunho moral, sofrendo, posteriormente, conversão para a realidade financeira do réu, para que este a receba como penalidade pela ilegalidade, ilegitimidade e agressividade de seu ato que danificou o patrimônio moral do agredido.
5 - A Conversão do Valor Moral em Valor Financeiro
O pagamento do valor da indenização estipulado pelo titular do bem moral danificado pelo mal sofrido não o torna indene, por não ter o condão de apagar de sua memoria a lembrança da agressão, assim como os sentimentos experimentados.
A recuperação do agredido ocorre quando ele mesmo se decide pela busca da superação dos efeitos da agressão, iniciando por dar continuidade à sua vivencia apesar do trauma, fortalecendo-se em seguida, até alcançar plena recuperação emocional.
Entre a decisão e o alcance da recuperação emocional, há o intervalo de tempo e uma gama de esforços a serem feitos pelo agredido que em sua condição humana carece de auxilio externo para ultimar a recuperação. Auxilio que pode ser dado pelo agressor, espontaneamente ou compelido pelo Poder Público.
O valor da indenização é a expressão da atenção e do reconhecimento que o titular do bem danificado recebe do Poder Público Judicante que demonstra a sua autoridade de mantenedor da ordem justiça social proporcionando meios para alcançar reequilíbrio do relacionamento entre as partes, o que se dá com a recuperação do patrimônio moral do agredido, para qual deve contribuir agressor, cuja responsabilização contém os dois sentidos da palavra punição, quais sejam sofrimento e o corretivo. Ambos têm o propósito de educar o agressor, estimulando-o à reflexão sobre o seu comportamento desrespeitoso.
É como regula o art. 12 do Código Civil) :
Art. 12 CC - Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.(25)
Como responsável pelo dano ao bem moral, o agressor deve ser levado a contribuir para o desfazimento do dano. Mas não é da natureza do bem moral danificado, ser emendado, remendado, reposto, trocado, substituído; como ocorre ao bem material, que admite troca ou substituição por outro da mesma espécie.
O dinheiro, que em principio é o elemento socialmente eleito como meio de troca de bens e serviços, veio se tornando, ao longo do tempo e da historia da humanidade, fator de medição do grau de consideração social e daí o medidor da moralidade individual a que todos se submetem sem maiores questionamentos. Por essa razão, a justa indenização por dano moral pressupõe o reconhecimento do bem moral, seu valor moral e, por fim, a conversão desse valor moral para financeiro, a fim de alcançar a sensibilidade e o entendimento do agressor, cuja percepção de valor mostra-se limitada ao aspecto material e à perspectiva financeira.
Portanto, estando objetivamente comprovados os fatos, o nexo de causalidade, assim como a responsabilidade do individuo apontado como agressor, a verificação do dano moral ocorrerá intersubjetivamente e, com o auxílio da Teoria do Valor do Desestímulo ou da doutrina do Punitive Damages e aplicação dos Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade, estará o Magistrado de posse dos elementos necessários não só para a constatação do dano moral cometido pelo agressor à vítima, mas podendo também avaliar a sua intensidade e seus reflexos, transformando essa avaliação moral em avaliação financeira.
A seu turno, ao agressor é dada oportunidade de entender e compreender o bem moral e o seu valor para a vida individual e coletiva.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
01 – Constituição da República Federativa do Brasil, art. 5°, V e X;
02 – Lei no 10.406, de 10/01/2002. Código Civil – arts. 186 e 927
03 - Código de Defesa do Consumidor – arts. 14 e segs.
04 – Coelho, Fabio Ulhoa - Curso de Direito Civil – Obrigações. Responsabilidade Civil 2, Saraiva, 2009 p.287
05 – Idem, ibidem, p. 289.
06 – PASSOS, José Joaquim Calmon de. O imoral nas indenizações por dano moral. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 57, 1 jul. 2002. item 10 - Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/2989>. Acesso em: 12 de agosto de 2017.
07 – Idem, ibidem –
08 – Cahali, Yussef Said - Dano Moral, Ed. Revista dos Tribunais 3ª edição 2005. 1.2, pags.20/21
09 – idem,ibidem, p. 21;
10 – Apud Cahali, Yussef Said - Dano Moral, Ed. Revista dos Tribunais 3ª edição 2005. P. 22
11 – Barros, Lorena Pinheiro e Borgholm, Danielle, in O princípio da razoabilidade como parâmetro de mensuração do dano moral . Disponível em http://www.lfg.com.br. Consultado em 13/01/2018.
12 – idem, ibidem,
13 - BRANDÃO, Caio Rogério da Costa. Dano Moral: valoração do quantum e razoabilidade objetiva. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 3, no 129. Disponível em: <https://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=659> Acesso em: 16 jan. 2018.
14 - Araújo Filho, Raul, Ministro do STJ - Punitive Damages e Sua Aplicabilidade No Brasil
(http://www.stj.jus.br/publicacaoinstitucional/index.php/Dout25anos/article/view/1117/1051
15 – STJ – Superior Tribunal de Justiça - Recurso especial provido. (REsp 210.101/PR, Rel. Ministro CARLOS FERNANDO MATHIAS, QUARTA TURMA, julgado em 20/11/2008, DJe de 9/12/2008
16 - T.J.M.G. Apelação Cível Nº 1.0672.12.026845-9/001 – Rel. Des. Vicente de Oliveira Silva
17 – Novo Código de Processo Civil, no art. 489, § 1°, incs. II e III
18 – Barroso, Luís Roberto, Curso de Direito Constitucional Contemporâneo, Saraiva, 6ª ed, p. 296
19 – BUITONI, Ademir. Revisão do dano moral. Por que reparar só em dinheiro?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1832, 7 jul. 2008. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/11416>. Acesso em: 21 julho 2017.
20 – Código Civil – art. 884
21 – Enciclopédia Eletrônica Wikipédia, consulta em 24/02/2018
22 - Sêneca, Lucius, Séneca, in 'Cartas a Lucílio’
23 – Conceito de Razão - Enciclopédia Eletrônica Wikipédia – consulta em 10/10/2017, 00,30h
24 – Código Civil, art. 112
25 – idem, art. 12