What´s App como meio probatório nas ações de família

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23/11/2018 às 11:21
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A vontade manifestada por meio do aplicativo What´s App pode ser utilizada como meio probatório nos juízos de família, com fundamento no CPC?

RESUMO: Este artigo tem como tema o What´s App como meio probatório nas ações de família, visando a elucidar alguns aspectos referentes às provas no processo civil brasileiro, bem como tecer alguns comentários sobre algumas espécies de provas existentes em nosso ordenamento jurídico pátrio e o seu tempo de juntada, dando maior enfoque na documentação eletrônica, abordando sobre provas digitais, seu regime legal e autenticidade, apresentando breve comentário acerca da Lei 11.419, de 2006, como também justificando o uso do aplicativo como meio probatório nas Varas de Família, a sua utilidade como confissão extrajudicial, sua autenticidade e o uso da ata notarial através de fundamentações teóricas baseadas em doutrinas e jurisprudências.

Palavras Chave: Provas no Processo civil. Espécies de provas. Documentação Eletrônica. Ações de Família.

ABSTRACT This article has as its theme the What's App as a probative means in family actions, aiming to elucidate some aspects related to the evidence in the Brazilian civil process, as well as to make some comments about some species of evidence existing in our legal order and its time with a focus on electronic documentation, addressing digital evidence, its legal regime and authenticity, with a brief comment on Law 11.419, of 2006, as well as justifying the use of the application as a probative means in Family Sticks, its usefulness as an extrajudicial confession, its authenticity and the use of notarial acts through theoretical foundations based on doctrines and jurisprudence.

Keywords: Evidences in civil proceedings. Species of evidence. Digital evidence. Family law actions. 


INTRODUÇÃO

 O Direito está presente no dia a dia de cada cidadão, procurando resolver conflitos por meios conciliatórios, proporcionando uma gama de possibilidades para solucionar tais litígios que possam surgir. No entanto, as partes podem não chegar a um acordo, necessitando recorrer às vias judiciais, nas quais precisarão de meios que comprovem suas alegações. As aplicabilidades dos meios comprobatórios estão mencionadas no Código de Processo Civil.

 Durante o processo, conforme o artigo 369 do Código mencionado acima, as partes possuem o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados no dispositivo, para provar a veracidade dos fatos em que se baseia o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do magistrado.

 Em decorrência dos avanços tecnológicos, os meios de comunicação estão mais diversificados, as pessoas estão se comunicando de forma instantânea por meio de redes sociais com o auxílio da internet. Tal comunicação permite-se ser registrada de várias formas, podendo uma delas ser através da captura da tela do aparelho utilizado.

 Sendo assim, abriram-se margens para novos meios comprobatórios nos processos judiciais, tornando-se relevante o uso das redes sociais, por demonstrarem a vida íntima das partes, sendo ainda mais imprescindível nas ações de família, pelo fato de já possuírem relacionamento anterior à propositura da ação. Um exemplo são os registros de conversas realizadas no aplicativo What´s App, nos quais podem ser demonstrados diálogos entre as partes que confirmem a veracidade dos fatos alegados.

 Posto isso, o presente artigo possui a finalidade de realizar uma abordagem da aplicabilidade da manifestação de vontade por meio do aplicativo Whats' App como meio probatório em juízo, com fundamento no Código de Processo Civil Brasileiro, apresentando a definição e a função da prova no processo de conhecimento, examinando a aplicabilidade da comprovação documental eletrônica, justificando o uso do aplicativo como meio probatório nas Varas de Família através de fundamentações teóricas baseadas em doutrinas e jurisprudências.

 O estudo é realizado por meio da metodologia jurídica Positivismo jurídico, onde o Direito positivo é a fonte exclusiva da interpretação, sendo realizada uma análise dogmática. Os fatos apenas referidos pela lei serão considerados. Não desenvolvendo uma crítica política no campo científico do Direito, somente crítica técnica. Utilizando uma metodologia de abordagem dedutiva, sendo a extração discursiva do conhecimento a partir de premissas gerais aplicáveis a hipóteses concretas. Por intermédio de uma cadeia de raciocínio em ordem descendente, de análise do geral para o particular, chega a uma conclusão.

 Sendo assim, o artigo apresenta a prova na visão do Código de Processo Civil, indicando seus tipos e uma abordagem sobre o ônus da prova. Bem como as especificidades da documentação eletrônica e sua previsão legal. E, a aplicabilidade do What´s App nas Varas de Família, explanando acerca dos tipos de ações de família, os tipos de provas recorrentes, sua autenticidade e possibilidade do uso da ata notarial.


1.    PROVA

Este tópico inaugural irá versar acerca das noções gerais de prova no processo à luz da Constituição Federal e do Código de Processo Civil, discorrendo sobre o meio probatório documental e o seu momento de juntada aos autos.

1.1  NOÇÕES GERAIS DE PROVA

A Constituição Federal de 1988, no seu artigo 5º, inciso LV, se manifesta com relação à produção de provas para que seja exercido o direito do contraditório e ampla defesa:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; (BRASIL, 1988)

Em sintonia com o disposto no art. 5º, LV, da Constituição Federal, o Código de Processo Civil explana acerca de como devem ser tais meios e recursos:

Art. 369.  As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz.

A noção de prova acaba sendo ligada à descoberta da verdade, sendo aquilo que comprova a veracidade ou a autenticidade de um fato ou alguma coisa. Segundo Cardoso (2007, Migalhas), “a função da prova no processo civil é de autenticar os fatos alegados nos autos”, devendo ser produzida dentro dos limites impostos pela legislação ordinária e constitucional. Segundo Marquesin (2017, Direito Net)

“A prova possui um papel fundamental no processo civil brasileiro, seja por ratificar um direito alegado, ou até mesmo por acelerar a prestação jurisdicional de acordo com a qualidade da prova produzida, pois por meio dela pode-se emitir um juízo de certeza ou um “juízo de probabilidade”.

Nas palavras do mestre Carnelutti, a prova em seu sentido jurídico consiste na demonstração da verdade formal dos fatos discutidos, mediante procedimentos determinados, ou seja, através de meios legítimos.

Toda prova possui como características o objeto (os fatos que desejam certificar), a finalidade (convicção sobre determinada alegação), o destinatário (o magistrado que julgará a causa) e os meios (espécies de provas para constatar o fato), podendo ser obtidas de acordo com a lei ou de forma ilícita.”

“Constata-se a suma importância das provas, por ser uma das bases norteadoras da decisão judicial. O seu conceito pode assumir diferentes conotações não apenas no processo civil, mas também em outras ciências” (Reichelt, p. 19).

Para Marinoni (2016, p. 257):

Assim é que pode significar inicialmente os instrumentos de que se serve o magistrado para o conhecimento dos fatos submetidos à sua análise, sendo possível assim falar em prova documental, prova pericial, etc. Também pode essa palavra representar o procedimento através do qual aqueles instrumentos de cognição se formam e são recepcionados pelo juízo. De outra parte, prova também pode dar a ideia da atividade lógica, celebrada pelo juiz, para o conhecimento dos fatos. E, finalmente, tem-se como prova, ainda, o resultado da atividade lógica do conhecimento. (MARINONI, 2016, p. 257) 

Nesse contexto, Marinoni (2016, p. 259) conceitua prova como “todo meio retórico regulado pela lei, e dirigido a, dentro dos parâmetros fixados pelo direito e de critérios racionais, convencer o Estado-juiz da validade das proposições, objeto de impugnação, feitas no processo”.

1.2  PROVA DOCUMENTAL

São enumerados alguns tipos de provas no Código de Processo Civil de forma não exaustiva, havendo a possibilidade de serem produzidas outras espécies, contanto que não contrariem o sistema normativo jurídico brasileiro. O objetivo do presente artigo não é abordar todos os tipos de provas presentes no código, apenas a prova documental, em especial a eletrônica que será abordada no próximo tópico.

Segundo Comoglio, Ferri e Taruffo (1999, p. 657, apud MARINONI, 2016, p. 364) “à categoria das provas documentais se reduzem em geral todas as coisas que aparecem idôneas a documentar um fato, ou seja, a narrá​-lo, a representá​-lo ou a reproduzi​-lo”.

Sendo assim, quando falamos em prova documental atrelamos a documentos escritos, seja em papel ou qualquer outro material. No entanto, não são unicamente os escritos, mas tudo que apresente expressamente um registro físico sobre algum acontecimento, como as fotografias ou impressão de mensagem eletrônica, extraídas de celulares, realizadas por aplicativos de mensagem instantânea, por exemplo.

Os documentos podem ser públicos ou particulares, dependendo de sua origem. Serão públicos quando provierem de departamentos públicos e particulares quando confeccionados pelas próprias partes. Ainda, eles podem ser apresentados em seu estado original ou por meio de cópias.

Para Theodoro Júnior (2017, p. 1251):

São reproduções eficazes dos documentos públicos ou particulares: (a) o traslado; (b) o traslado do traslado; (c) a pública­forma; (d) o registro público; (e) a certidão de inteiro teor, de tudo que constar de livro público ou de autos; (f) a certidão por extrato parcial de documento, ou a certidão em forma de relatório sobre o processo; (g) a fotocópia ou a xerocópia autenticada.

Precisam ser autênticos, ou seja, verdadeiros. Qualquer suspeita de falsificação será analisada por perícia e, caso comprovada, as devidas providências serão tomadas pelo juízo.

1.3  MOMENTO DA JUNTADA

Em regra, conforme o art. 435 do CPC, os documentos probatórios devem ser juntados aos autos com a petição inicial ou com a contestação.

Todavia, em seu parágrafo único, admite-se também a juntada posterior de documentos formados supervenientes à propositura da ação, bem como dos que se tornaram conhecidos, acessíveis ou disponíveis após esses atos, cabendo à parte que os produzir comprovar o motivo que a impediu de juntá-los anteriormente e incumbindo ao juiz, em qualquer caso, avaliar a conduta da parte de acordo com o art. 5o.

A parte, intimada a falar sobre documento constante dos autos, prazo de 15 (quinze) dias, poderá impugnar a admissibilidade da prova documental, impugnar sua autenticidade, suscitar sua falsidade, com ou sem deflagração do incidente de arguição de falsidade e manifestar-se sobre seu conteúdo.

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2.    DOCUMENTAÇÃO ELETRÔNICA

O presente ponto irá abordar acerca da documentação eletrônica, apresentando a definição de provas digitais, seu regime legal e autenticidade. E ainda, realizar um breve comentário sobre a Lei 11.419.

2.1  PROVAS DIGITAIS

   Ao falar de provas digitais, é normal o uso da expressão “documentação eletrônica” para referir-se aos dados e arquivos digitais. Todavia, as provas digitais possuem características diferenciadas, que conduzem ao seu enquadramento em uma classificação própria, muito embora as semelhanças entre a prova digital e o documento permitam a utilização do meio de prova documental como procedimento probatório em juízo.

     Os elementos obtidos das fontes digitais, em conjunto com os demais elementos do processo, conduzem, então, ao resultado probatório, por meio da verificação das asserções feitas pelas partes.

     Encontram-se, na doutrina, algumas definições de prova digital (referida na doutrina norte-americana e inglesa como digital evidence), as quais, geralmente, possuem múltiplos sentidos ou correspondem ao sentido de “elemento de prova”.

     Eoghan Casey (2004, p. 12) define digital evidence como “qualquer dado armazenado ou transmitido usando um computador que confirma ou rejeita uma teoria a respeito de como ocorreu um fato ofensivo ou que identifica elementos essenciais da ofensa como intenção ou a álibi”.

Rodrigues (2011, p. 30) conceitua “prova electrónico-digital” como “qualquer tipo de informação, como valor probatório, armazenada (em repositórios electrónicos-digitais de armazenamento) ou transmitida (em sistemas de redes informáticas ou rede de comunicações electrónicas, privadas ou publicamente acessíveis, sob a forma binária ou digital”.

     Sendo assim, pode-se definir prova digital como os dados em forma digital tendo como meio físico um suporte eletrônico ou transmitidos em rede de comunicação, os quais contêm a representação de fatos ou ideias.

2.2  REGIME LEGAL E AUTENTICIDADE

Segundo o artigo 439 do Código de Processo Civil de 2015, “a utilização de documentos eletrônicos no processo convencional dependerá de sua conversão à forma impressa e da verificação de sua autenticidade, na forma da lei.

Há uma problematização acerca desse tipo de prova, vez que é notório a flexibilidade da sua formação e utilização. Por tal motivo, é uma abertura para que se torne alvo de alteração, o que feriria a sua confiabilidade e, consequentemente, a sua eficácia probatória.

A verificação da autenticidade das provas digitais não está́ inserida no Código de Processo Civil de 2015. Ainda não existe uma lei específica, mas artigos avulsos que, lidos juntamente, permitem elucidar os dispositivos processuais.

A Medida Provisória nº 2.200­2/01 instituiu um órgão responsável pelo reconhecimento e garantia da integridade de documentos eletrônicos, que realiza a emissão de certificação digital com base no uso de chaves públicas, chamado ICP Brasil (Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira). Tal MP ainda possibilita que sejam usados diferentes meios para a comprovação da autoria e veracidade da prova digital, ainda que não se use certificação digital, desde que a mesma seja aceita pelas partes. Assim como a MP, o art. 225 do Código Civil aborda acerca da aceitação da prova digital afirmando que:

Art. 225. As reproduções fotográficas, cinematográficas, os registros fonográficos e, em geral, quaisquer outras reproduções mecânicas ou eletrônicas de fatos ou de coisas fazem prova plena destes, se a parte, contra quem forem exibidos, não lhes impugnar a exatidão.

A análise da veracidade dá-se, inicialmente, verificando sua autenticidade na origem do documento, ou seja, a autoria. E, após, a verificação da integridade do documento.

Ocorrendo a arguição de falsidade do documento original, ela será processada eletronicamente na forma da lei processual em vigor, conforme o Art. 10, § 2o da Lei 11.419/06, que disciplina o processo eletrônico.

Nos casos em que não for possível a conversão da documentação eletrônica para a forma impressa, conforme determina o art. 439, o documento não será́ excluído do processo, mas terá́ seu valor probante apreciado pelo magistrado, assegurado às partes o acesso ao seu teor (art. 440, CPC).

A ausência de autenticação do documento convertido só é relevante se houver impugnação da parte contrária (art. 411, III, CPC).

2.3 A PROVA DOCUMENTAL ELETRÔNICA NA LEI 11.419, DE 2006

A Lei 11.419/2006 dispõe sobre a informatização do processo judicial. O teor do artigo 11 da referida lei, estabelece que “os documentos produzidos eletronicamente e juntados aos processos eletrônicos com garantia de origem e de seu signatário, na forma estabelecida nesta Lei, serão considerados originais para todos os efeitos legais”.

Nesse seguimento, as provas digitais juntadas aos processos eletrônicos serão consideradas originais para todos os efeitos legais, se for possível a verificação de sua fonte. Com fulcro no § 3o do art. 11 da lei mencionada, “os originais dos documentos digitalizados (...) deverão ser preservados pelo seu detentor até o trânsito em julgado da sentença ou, quando admitida, até o final do prazo para interposição de ação rescisória”, para que seja possível a constatação de sua legitimidade, caso haja impugnação da parte oposta.

Tal regra é deveras parecida ao que já existia no art. 225 do Código Civil e no Código de Processo Civil. Logo, a novidade é conceder à parte contrária o ônus da prova quanto à arguição de falsidade da prova trazida aos autos, verificando sua autenticidade.

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Sobre a autora
Thais Ribas Chicre

Acadêmica de Direito, indo para o 9º período.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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