What´s App como meio probatório nas ações de família

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23/11/2018 às 11:21
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3.    APLICABILIDADE DO WHAT´S APP como PROVA NAS ações DE FAMÍLIA

Neste tópico será abordado um dos exemplos de meio para obtenção da prova digital, o aplicativo What´s App, e sua autenticidade, podendo, através da impressão das mensagens trocadas, ser utilizado nas ações de família no processo de conhecimento. 

 3.1  noções de DIREITO de família

 O direito de família pode ser considerado a área mais vinculada à vida, vez que todas as pessoas estão ligadas às outras, juridicamente falando ou não. Durante toda sua existência criam novos laços, com o casamento ou a união estável, por exemplo.

Diniz (2018, p. 17) conceitua o Direito de família como um “complexo de normas que regulam a celebração do casamento, sua validade e os efeitos que dele resultam, as relações pessoais e econômicas do matrimônio, a dissolução deste, a união estável, as relações entre pais e filhos, o vínculo de parentesco e os institutos complementares da tutela, curatela e tomada de decisão apoiada”, possuindo como objeto a própria família.

 Este ramo do direito regula “as relações entre os seus diversos membros e as consequências que delas resultam para as pessoas e bens” (GONÇALVES, 2018).

Uma das características é a sua natureza personalíssima, possuindo direitos irrenunciáveis e intransmissíveis por herança, ou seja, alguns direitos não podem ser transferidos ou renunciados e nem cedidos.

 Por ser um bem tão importante, a família é considerada a base da sociedade, tendo proteção especial do Estado, conforme prevê o art. 226 da Constituição Federal.

 3.2  WHAT’S APP COMO CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL NO PROCESSO DE CONHECIMENTO NAS AÇÕES DE FAMÍLIA

 Com os avanços tecnológicos, os meios de comunicação estão mais diversificados, as pessoas estão se comunicando de forma instantânea por meio de redes sociais com o auxílio da internet. Tal comunicação permite-se ser registrada de várias formas, podendo uma delas ser através da captura da tela do aparelho utilizado.

Um exemplo é o aplicativo What´s App, utilizado para troca de mensagens de texto instantaneamente, além de vídeos, fotos e áudios através de uma conexão à internet. Mais de 1 bilhão de pessoas, em mais de 180 países, possuem o app. Seu uso tornou-se tão prevalente que se tornou um modo primário de comunicação para muitos indivíduos. Por tal motivo, podem conter conversas de diversos conteúdos, sejam assuntos de trabalho, negócios e bate papo entre amigos e familiares.

Assim sendo, abriram-se margens para novos meios comprobatórios nos processos judiciais, tornando-se relevante o uso de tais meios, por demonstrarem a vida íntima das partes, sendo ainda mais imprescindível nas ações de família, pelo fato de já possuírem relacionamento anterior à propositura da ação, podendo levar aos autos os diálogos entre os litigantes, coma finalidade de confirmar a veracidade dos fatos alegados.

 O CPC de 2015 disciplina as Ações de Família, apresentando um rol taxativo no artigo 693:

Art. 693.  As normas deste Capítulo aplicam-se aos processos contenciosos de divórcio, separação, reconhecimento e extinção de união estável, guarda, visitação e filiação.

O artigo mencionado em seu parágrafo único estabelece que:

Parágrafo único.  A ação de alimentos e a que versar sobre interesse de criança ou de adolescente observarão o procedimento previsto em legislação específica, aplicando-se, no que couber, as disposições deste Capítulo.

Posto isto, segundo Silva (Migalhas, 2018) podemos usar como exemplo da utilização das provas digitais nas ações de família:

AÇÃO DE ALIMENTOS: Imagens, fotos ou vídeos que revelem sinais exteriores de riqueza (viagens, carros, ostentações, baladas, hábitos de consumo requintados, roupas de grife, constantes idas a bares, boates e restaurantes, etc.) da mãe, do pai ou de outras pessoas obrigadas legalmente a fornecer os meios de sustento e manutenção de menores ou maiores incapazes, podem ser utilizadas para auxiliar no justo arbitramento do valor da pensão alimentícia, principalmente nos casos onde quem tem que o dever de prestar os alimentos alega estar desempregado, ser autônomo, não tem meio de renda conhecido ou tem e procura esconder outras fontes de receita, além da espontaneamente informada. 

AÇÃO OU INCIDENTE DE ALIENAÇÃO PARENTAL: Áudios, imagens, vídeos, mensagens ou fotos que contenham tentativas de desqualificação ou ridicularização da conduta de um dos genitores no exercício da paternidade ou maternidade, bem como que revelem indícios de difamação, de falsas denúncias contra genitor, contra familiares deste - incluído atual namorado(a), companheiro(a) ou cônjuge - ou contra avós, bem como os que busquem denegrir a imagem destes, no intuito de obstar ou dificultar a convivência com a criança ou adolescente, tal qual retirar ou esvaziar a autoridade paterna ou materna em relação ao filho comum, podem ser utilizadas para comprovar a prática de atos de alienação parental. 

AÇÃO DE GUARDA DE FILHOS: Fotos, vídeos, imagens, mensagens e áudios que atestem, em qualquer tempo e situação, a convivência efetiva, constante e afetuosa do filho com o genitor que busca a guarda compartilhada ou até mesmo que revelem a tentativa e esforço para possibilitar tal contato e estreitar os laços afetivos, bem como que demonstrem a participação do interessado, mãe ou pai, no cotidiano do menor, através do exercício dos direitos e deveres concernentes ao poder familiar, poderão ser utilizadas como meio probatório em favor da mãe ou do pai que pleiteia o compartilhamento da guarda do filho comum.

Nesses casos, as impressões das mensagens, áudios, fotos, vídeos envidas através do aplicativo podem ser utilizadas como confissão extrajudicial, conforme prevê o art. 389 do CPC, quando a parte admite a verdade de fato contrário ao seu interesse e favorável ao do adversário. E mesmo que a confissão extrajudicial seja feita oralmente terá eficácia nos casos em que a lei não exija prova literal, com fulcro no art. 394 do mesmo código.

3.3  AUTENTICAÇÃO DA PROVA

 O registro de conversas realizadas por meio do What´s App é parte integrante do significado de documento, podendo ser tratado como qualquer outro arquivo impresso quando se fala de admissibilidade.

 Mesmo que uma das partes impugne a autenticidade do documento, ainda pode ser admitido como prova, se os critérios necessários forem observados.

 A parte que juntou aos autos a impressão da mensagem presente no aplicativo deve comprovar que o seu assunto diz respeito à existência ou não do fato em apreço, ou que é pertinente para o processo.

 Em tais casos, para preservar a integridade da prova digital, bem como o intuito de convertê-la, à forma impressa, a solução é levar ao Cartório de Notas e solicitar a lavratura de uma ata notarial, que será abordado no próximo tópico.

 Posto isto, incumbe à parte interessada esgotar as medidas pertinentes para desobrigar-se, em tempo cabível e de modo previsto em lei, do seu ônus probatório, expandindo a probabilidade do seu pedido ser acolhido.

3.4  ATA NOTARIAL

 Em casos de impugnação ou com o intuito de preservar o documento, a parte interessada poderá fazer uso da ata notarial, um instrumento público pelo qual o tabelião ou o seu preposto, relatará fielmente a existência e conteúdo do respectivo registro de conversa, mesmo as que contenham áudios, imagens e vídeos.

O art. 384 do CPC e seu parágrafo único versam sobre tal meio de verificação:

“Art. 384.  A existência e o modo de existir de algum fato podem ser atestados ou documentados, a requerimento do interessado, mediante ata lavrada por tabelião.

Parágrafo único.  Dados representados por imagem ou som gravados em arquivos eletrônicos poderão constar da ata notarial.” 

Assim, compreende-se como serviços notariais e de registro, com fulcro no art. 1 da Lei 8.935/1994, a organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos.

Desta forma, a ata notarial possui a qualidade de documento público, atrelando a si maior credibilidade e segurança na sua utilização como meio probatório em processos judiciais, podendo ser aliada das provas digitais, como o registro de conversas realizadas pelo aplicativo What’s App, fortalecendo a comprovação de sua veracidade.


Conclusão

 Os problemas levantados ao iniciar-se o presente estudo referem-se a como as provas digitais são aplicáveis na fase de conhecimento da causa, se o aplicativo What´s App se torna meio de prova em juízo, e se, nas Varas de Família, por envolverem situações em que o fato existe anteriormente ao direito, as conversas registradas podem ser utilizadas como meio probatório de confissão extrajudicial.

O desenvolvimento do presente estudo possibilitou uma análise de como as provas digitais podem ser utilizadas como instrumento probatório na fase de conhecimento dos processos judicias, auxiliando no convencimento do magistrado ao examinar a pretensão das partes. Além disso, também permitiu, através de pesquisas bibliográficas e estudo de leis, reunir informações que se encontram dispersas acerca das provas digitais e sua autenticidade.

O Código de Processo Civil brasileiro vigente se manifesta de forma expressa, no artigo 369, com relação à legitimidade das provas admitidas pelo ordenamento jurídico. As conversas realizadas por meio do aplicativo podem ser utilizadas como provas no processo de conhecimento, por serem moralmente legítimas, mesmo que não especificadas no código.

 Nas Varas de Família, os registros de manifestação de vontade através do aplicativo poderão ser utilizados, a sua veracidade será comprovada pela falta de impugnação da parte contrária. E mesmo que uma das partes impugne a autenticidade do documento, ainda pode ser admitido como prova, se os critérios necessários forem observados.

Para finalizar, a partir dos conteúdos desenvolvidos para este trabalho, é possível notar que se abriram margens para novos meios comprobatórios nos processos judiciais, tornando-se relevante o uso das redes sociais, por demonstrarem a vida íntima das partes, sendo ainda mais imprescindível nas ações de família, pelo fato de já possuírem relacionamento anterior à propositura da ação.


REFERÊNCIAS

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Sobre a autora
Thais Ribas Chicre

Acadêmica de Direito, indo para o 9º período.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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