Anotações sobre a dação em pagamento, a assunção e a cessão de crédito

Exibindo página 2 de 5
30/11/2018 às 20:21

Resumo:


  • A dação em pagamento é um meio de extinção de uma obrigação no qual o devedor entrega ao credor algo diferente do que foi originalmente pactuado, mas que é aceito como forma de pagamento.

  • A assunção de dívida envolve a substituição do devedor original por um terceiro, que assume a obrigação de pagar a dívida existente com o consentimento do credor.

  • A cessão de crédito ocorre quando um credor transfere seu direito de crédito a um terceiro, que passa a ter o direito de cobrar a dívida do devedor original.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

3. A PROMESSA DE TERCEIRO

Diversa era a promessa de terceiro, prevista no artigo 1.272 do Código Civil italiano de 1945.

Quando sem ser por ordem recebida, mas espontaneamente, um terceiro prometa ao credor de outra pessoa o que esta lhe deve, verifica-se a figura, que, na Itália, era chamada de espromissione, a qual pode corresponder, de resto, a alguns dos tipos pelos quais se faz a cessão. Mas, como orientou Ruggiero (obra citada, pág. 141), também essa promessa espontânea do débito alheio não produz tecnicamente sucessão a título particular no débito, porque ou concorre com a aceitação da promessa por parte do credor a vontade de libertar o devedor, pelo qual o promitente se obriga, e dá-se a novação, que pode efetuar-se sem o consentimento do primeiro devedor (artigo 1.270 do Código Civil italiano de 1865); ou falta essa vontade de o libertar e o efeito será a junção de um segundo devedor ao primeiro, que permanece obrigado, pelo menos subsidiariamente.

A simples indicação feita pelo devedor (indicação em pagamento ou consignação, assegnazione), de uma pessoa que deva pagar em seu lugar, não produz novação. Também não a produz a simples indicação feita pelo devedor de uma pessoa que deva pagar em seu lugar. É um contrato unilateral pelo qual o devedor dá ao próprio credor a faculdade de receber de um terceira uma quantia para pagamento do que lhe é devido, ou pelo qual o credor autoriza o devedor a fazer a um terceiro o pagamento que ao primeiro é devido. Glucinski (Zur Lehre von der Assignation und delegation, 1877, pág. 299) via identificação com a consignação em pagamento.


4. A CEDÊNCIA DO DÉBITO

Fala-se ainda em cedência do débito, cedência simples, cedência cumulativa e cedência novativa.

A cedência de débito, como expõe De Ruggiero (Accollo), é limitada apenas às mudanças do lado passivo das obrigações. A cedência é o ato de chamar a si um débito alheio, isto é, uma convenção entre o devedor e um terceiro, mediante a qual este toma sobre si o débito daquele. Este ato de tomar a responsabilidade de um débito alheio pode, porém, apresentar formas e aspectos diversos, conforme o terceiro tome inteiramente o lugar do primitivo devedor, libertando-o, mas deixando quanto ao resto imutável a obrigação originária; o substitua com efeito liberatório, mas transformando-se a obrigação antiga numa nova; ou ainda se acrescente como segundo obrigado ao primeiro, que fica vinculado subsidiária ou solidariamente. Há quatro tipos de cedência:

  1. A cedência simples, na qual o cessionário do débito alheio se obriga para com o devedor a pagar em seu lugar, mas em cujo acordo não toma parte o credor, que não perde, por isso, o seu devedor originário. O acordo entre os dois fará com que o cessionário se torne nas suas relações o devedor principal, sendo obrigado em primeiro lugar a satisfazer o credor, o qual poderá também contra ele se conhecer a convenção, mas subsidiariamente fica, todavia, obrigado também o primeiro, contra o qual o credor não pago poderá sempre agir;

  2. Cedência cumutativa: na qual ao primeiro devedor se acrescenta um segundo, ficando o novo e o originário solidariamente obrigados;

  3. Cedência novativa: que se dá mediante novação da primeira obrigação, isto é, a sua extinção e o nascimento de uma obrigação na qual um novo devedor toma o lugar do originário e fica liberto. Para surtir este efeito, deve com o acordo entre o primeiro e o segundo devedor, concorrer o consentimento do credor e uma correspondente vontade sua de novar, e a consequência será aqui, como em qualquer caso de novação, que extinguindo-se a relação antiga, as suas exceções e os seus privilégios não se transferem para a nova relação.

  4. Cedência privativa, que se distingue tanto das duas primeiras formas na parte em que um só é obrigado, isto é, que toma para si o débito como da terceira, pois que, posto que havendo liberação do primitivo devedor, não se dá mediante novação, visto que a primitiva obrigação não se extingue e apenas há a substituição pessoal do antigo devedor pelo novo.

Desde a introdução do processo formular em Roma e da cessão do crédito por meio de procuração in rem suam, a liberação do devedor cedente opera-se com a contestação da lide.


5. CESSÃO DE CRÉDITOS E A SUB-ROGAÇÃO

Por outro lado, há cessão de crédito que é um modo de transferência de créditos.

No direito romano não havia sucessão singular de créditos, ou em dívidas. Daí ter-se lançado mão da novação, para a qual se exigia a colaboração do devedor (delegatio nominis). Depois, com a intensificação do comércio e o influxo do ius gentium, foi que se criou algo de transmissão sem cooperação do devedor, que era a procuratio in rem suam.

O procurator em rem suam era constituido para o processo, de modo que estabelecida entre ele e o demandado a relação jurídica processual, a condenação que atingisse o demandado, era para prestar ao outorgado, e esse, por estar em juízo (Gaio, Inst. II, § § 38 e 39, e IV, § 86; L. 3§ 5, D, de in rem verso, 15, 3). Pontes de Miranda (Tratado de direito privado, tomo XXIII, ed. Bookseller, pág. 303) já dizia que entendia-se que tal procurador judicial também podia tratar amigavelmente. Mas os inconvenientes eram grandes, como, por exemplo, o devedor podia prestar ao credor outorgante, o outorgante podia revogar e o outorgante ou o outorgado podia morrer.

A actio utilis viera obviar a esses inconvenientes, com a notificabilidade do devedor. No fim da evolução, que no direito romano se operara, teve-se apenas a sucessão singular no direito a exigir crédito alheio. A concepção romana do crédito ligado ao credor encontrou-se com a concepção germânica, a que repugnava essa dependência.

A cessão com a mudança subjetiva e a permanência objetiva é concepção pós-romana. Só o sucessor in universum ius quod defunctus habuit, sucedia, no sentido hoje entendido para a sucessão singular nos créditos e nas dívidas.

No direito germânico antigo sustentou-se que era necessário o consentimento do devedor, na cessão de crédito para a sua transferibilidade, como entenderam H. Brunner (Forschungen, 602 e 603), assim como O. Stobbe (Handbuch des deutschen Privatrechts, III, 3ª edição, § 226).

No direito germânico empregou-se o mandato processual como meio para se transferir o crédito, inclusive, na Idade Média, com a cláusula "para ganho ou perda", como ensinou Pontes de Miranda, à luz do ensinamento de Georg Buch.

No direito alemão, a permissão da transferibilidade era diferente do assentimento ou do consentimento, com que os sistemas posteriores quiseram construir a cessão de crédito (assentimento ao negócio jurídico de cessão, ou o consentimento em negocio juridico unilateral).

O expediente a que recorreram os romanos para tornar possível que quem tendo o crédito, sem extinguir ou novar a obrigação, o pudesse transferir para outra pessoa, foi, na sua origem, tratado como instituto da representação processual.

Consiste, modernamente, numa convenção entre o credor e terceiro, destinada a transmitir e, respectivamente, adquirir o crédito, e funda-se sobre uma justa causa, que é o fim econômico da transmissão.

São requisitos:

  1. Entre cedente e cessionário: o ato que transfere o direito de crédito é uma convenção entre o credor e o cessionário e como tal fica perfeito entre as partes, sem necessidade de formas especiais e solenes; pelo simples acordo daqueles, independentemente da adesão do devedor;

  2. Com relação a terceiros: é ela res inter alios para com terceiros;

  3. Em relação ao objeto: o princípio geral, que qualquer crédito ainda que a termo ou sujeito a condições, pode ser transferido mediante cessão, tem limites, ou na natureza do crédito, que não se preste a mudar de sujeito, ou em algumas proibições especiais da lei, que vedam a cessão de modo absoluto ou apenas relativamente.

O efeito da convenção é o de fazer entrar o cessionário no lugar do cedente, sem que em nada se altere a primitiva obrigação.

Com relação a terceiros, verificado o ato de cessão, o credor considera-se destituído, à face de todos, do seu direito e, em seu lugar, definitivamente investido no crédito o cessionário.

A cessão de crédito é negocio jurídico bilateral de transmissão de crédito entre o credor e outrem, no direito brasileiro. A base dele pode ser um negócio jurídico, porém a cessão de crédito independe dele ou da sua existência.

O credor cede porque é titular do direito.

A cessão de crédito é negócio jurídico abstrato, uma vez que a cessão é abstrata, em si, não podendo ser nula por ilicitude do objeto. Se o negócio jurídico subjacente é nulo, cabe a repetição.

A cessão de crédito não está sujeita a forma especial. A esse respeito, tinha-se o artigo 1.067 do Código Civil de 1916 onde dizia-se:

Art. 1.067. Não vale, em relação a terceiros, a transmissão de um crédito, se se não celebrar mediante instrumento público, ou instrumento particular revestido das solenidades do art. 135. (art. 1.068). (Redação dada pelo Decreto do Poder Legislativo nº 3.725, de 15.1.1919)

Parágrafo único. O cessionário de crédito hipotecário tem, como o sub-rogado, o direito de fazer inscrever a seção à margem da inscrição principal.

Como ensinou Pontes de Miranda (obra citada, tomo XXIII, pág. 308) não vale estava aí por ineficaz.

O crédito que passa ao cessionário é o mesmo crédito, a que apenas se mudou o sujeito. As pretensões que se já existiam, transferem-se, como bem assim as ações.

A pretensão futura pode ser cedida.

O cessionário adquire o crédito como sucessor do cedente, e não diretamente. A cessão de créditos futuros apenas exige que se haja caracterizado o que se cede, isto é, que, ao nascer o crédito, se saiba ao certo, qual será o crédito cedido.

Por fim, há o pactum de non cedendo.

A cedibilidade pode ser pré-eliminada pelos contraentes; ou pelo devedor em virtude do negócio jurídico unilateral. A incedibilidade pode ser restrita.

O devedor não pode impedir que o credor ceda o crédito. Todavia, pode o devedor pactuar de non cedendo. Essa não forma de cessibilidade pode ser restrito ao tempo. Esse pacto pode referir-se a dívida futura, a dívida a termo ou condicional.

O fiador pode convencionar com o credor ou com o credor e o devedor a incedibilidade do crédito.

O que não é personalíssimo vai com o crédito cedido.

O devedor pode opor ao novo credor as objeções e as exceções que contra o cedente existiam ao tempo de se concluir o negócio jurídico entre o credor e o terceiro.

Distingue-se da cessão de crédito da sub-rogação.

No Direito das obrigações, o pagamento com sub-rogação é um instrumento jurídico utilizado para se efetuar o pagamento de uma dívida, substituindo-se o sujeito da obrigação, mas sem extingui-la, visto que a dívida será considerada extinta somente em face do antigo credor, mas permanecendo os direitos obrigacionais do novo titular do crédito.

O ato de sub-rogar é substituir o credor, de modo que o pagamento por sub-rogação se assemelha a cessão de crédito por se tratar da pessoa do credor. Ocorre a sub-rogação quando a dívida de alguém é paga por um terceiro que adquire o crédito e satisfaz o credor, mas não extingue a dívida e nem libera o devedor, que passa a dever a este terceiro.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Por sua vez, o expediente a que os romanos recorriam para tornar possível que quem tendo o crédito, sem extinguir ou novar a obrigação, o pudesse transferir para outra pessoa foi, na origem, dado pela representação processual. No direito moderno, há o instituto da cessão de créditos, que é o ato que transfere o direito de crédito numa convenção entre o credor e o cessionário e, como tal, fica perfeito entre as partes, sem necessidade de formas especiais, sem que haja, necessariamente, a intervenção do devedor. A transferência fica perfeita entre as partes pelo simples acordo entre elas e seja qual for a sua causa, desde que idônea, para justificar a aquisição. Para dar ao ato plena eficácia, mesmo para com terceiros, é, pois, necessário um meio que o torne público, e este meio é dado pela intimação da cessão ao devedor ou de sua aceitação por parte deste último. Entre o cedente e o cessionário o efeito da convenção é o de fazer entrar o cessionário no lugar do cedente sem que em nada se altere a primitiva obrigação. Não havendo nenhuma mudança objetiva na obrigação, resulta que com o crédito se transferem todos os seus acessórios, como as garantias pessoais. Diversa é a assunção de débitos que se dá entre os devedores, com a permissão do credor, mantendo-se a mesma obrigação.

Voltemos a sub-rogação.

O termo “sub-rogação” significa, no direito, substituição. Nessa modalidade de pagamento, um terceiro, que não o próprio devedor, efetua o pagamento da obrigação. Nesse caso, a obrigação não se extingue, mas somente tem o seu credor originário substituído, passando automaticamente a este terceiro (sub-rogado) todas as garantias e direitos do primeiro. O devedor, que antes pagaria ao originário, deverá realizar o pagamento ao sub-rogado, sem prejuízo algum para si.

No ordenamento brasileiro, existem duas modalidades de sub-rogação: a legal e a convencional. A primeira há a par do artigo 346, incisos I a III, do Código Civil, para que ocorra a sub-rogação, o terceiro opera de pleno direito nos casos taxativamente previstos pela lei, independentemente da manifestação de vontade de terceiros, e adquire os direitos do credor. Na sub-rogação convencional existe o acordo de vontade (ou entre o credor e terceiro ou entre o devedor e o terceiro), algo contemporâneo ao pagamento e expressamente declarado, uma vez que a sub-rogação não se presume.

Se o terceiro solvens tem interesse jurídico vai se sub-rogar nos direitos do credor primitivo, ou seja, vai adquirir todas as eventuais vantagens, privilégios, garantias e preferências do credor primitivo, além de, é óbvio, exigir o reembolso. Ex: A deve cem reais a B com uma garantia de fiança ou hipoteca; se C pagar essa dívida terá direito a cobrar os cem reais de A, mas só terá direito à garantia da fiança ou da hipoteca caso C possua interesse jurídico (346, III).

Efeitos da sub-rogação: 1) satisfativo em relação ao credor primitivo. O credor primitivo vai se satisfazer com o pagamento feito pelo terceiro, mas a obrigação permanece para o devedor; a sub-rogação não extingue a dívida; 2) translativo: o novo credor vai receber todas as vantagens e direitos do credor primitivo, desde que o pagamento tenha sido feito por sub-rogação (349).

Seja como for tanto a sub-rogação como a cessão de crédito se distinguem da novação, que é forma de extinção da obrigação.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos