Para que um (ou mais indivíduos) tenha pleno desenvolvimento de suas habilidades, faz-se necessário o emprego de normas e valores coerentes à sociedade em que estão inseridos, quer no ambiente de trabalho ou no âmbito escolar.
Nesse contexto, é indispensável que esses espaços estejam preparados para a garantia de um ambiente socialmente saudável, proporcionando condições favoráveis a trabalhadores e alunos, para que possam desenvolver com êxito, suas habilidades e aptidões e, ao mesmo tempo, expressar seus interesses, de maneira ativa, pacífica e produtiva, nos diversos aspectos da vida social.
Porém, nesses ambientes, existem situações contrárias às normas e valores coerentes à sociedade, expressas de maneiras sutis e com características próprias, por tratar-se de fenômenos sociais, como por exemplo, o Assédio Moral e o Mobbing entre indivíduos no ambiente de trabalho e o Bullying, no ambiente estudantil/acadêmico.
Tais fenômenos demonstram-se como tipos de violência, pois trata-se de comportamentos ligados às agressividades física, verbal e psicológica, de um ou mais indivíduos contra vítimas desprotegidas, causando esgotamento, dor, angústia e insegurança, decorrentes dessas experiências negativas.
Esses fenômenos têm sido pesquisados nas últimas décadas e quando não causam sequelas físicas, esses comportamentos provocam consequências psicológicas ou emocionais graves nas vitimas, pois as atitudes agressivas não têm um motivo justo, e são adotadas por um ou mais indivíduos contra outro(s).
Acredita-se que isso vem ao encontro do que Freud descreve, onde coloca que, muitas vezes, os comportamentos violentos dos indivíduos refletem uma proteção deles mesmos. “Realmente, parece necessário que destruamos alguma outra coisa ou pessoa, a fim de não nos destruirmos a nós mesmos, a fim de nos protegermos contra a impulsão de autodestruição.” (FREUD, 1933)
Presente no ambiente profissional, o Assédio Moral ocorre tanto na iniciativa privada, quanto nas instituições públicas, caracterizando-se por ações ligadas à degradação das relações de trabalho e à exclusão social. Tais práticas são evidenciadas nas relações hierárquicas, em que predominam condutas negativas e antiéticas, por longos períodos, promovidas por um, ou mais chefes, contra um, ou mais subordinados, entre colegas, ou ainda, subordinado (s) contra chefe (s).
Para Heinz Leymann, pioneiro nas pesquisas a respeito do fenômeno, o Assédio Moral é visivelmente maléfico, pois
“em uma psicologia do terror, ou, simplesmente, psicoterror, manifestado no ambiente de trabalho por uma comunicação hostil e sem ética direcionada a um indivíduo ou mais. A vítima, como forma de defesa, reprime-se, desenvolvendo um perfil que somente facilita ao agressor a prática de outras formas de assédio moral. A alta frequência e a longa duração das condutas hostis acabam resultando em considerável sofrimento mental, psicossomático e social aos trabalhadores que são vítimas do assédio moral.” (LEYMANN)
Desta forma, o Assédio Moral traz consequências negativas para a vítima, afetando-a psicologicamente, mentalmente ou, ainda, na área física ou moral, comprometendo sua capacidade laboral, pois a afasta do contexto social, onde a vítima é obrigada a deixar, involuntariamente, o seu ambiente de trabalho, a fim de livrar-se dos episódios onde, constantemente, é hostilizada, ridicularizada e desacreditada sem qualquer motivo pré-determinado.
Hádassa Dolores Bonilha Ferreira conceitua assédio moral como sendo,
“o processo de exposição repetitiva e prolongada do trabalhador a condições humilhantes e degradantes e a um tratamento hostil no ambiente de trabalho, debilitando sua saúde física e mental. Trata-se de uma guerra de nervos, a qual conduz a vítima ao chamado “assassinato psíquico”.” (FERREIRA, 2010, p. 42)
Em relação ao Assédio Moral, as atitudes impostas por este fenômeno são constrangedoras e humilhantes, como intimidações por meio de palavras, gritos e gestos, insinuações e ofensas, oferecendo riscos à saúde do trabalhador, sobretudo, no que se refere ao manter-se empregado, após situações marcadas por longos períodos de dor e angústia, como por exemplo, a violência moral contra a mulher que retorna da licença maternidade, ou de mesma forma, quando um funcionário retorna de licença médica, por ter ficado doente/acidentado e, ao retornar, encontra outra pessoa na sua função, sendo direcionado a exercer sua função, em outro setor da empresa, incompatível à atividade anterior ou, ainda, por conta de sua orientação sexual, religiosa, etnia ou classe social.
Semelhante ao Assédio Moral, porém presente no âmbito escolar e, com características peculiares, o Bullying não é apenas assédio moral, como a difamação e a exclusão, mas é igualmente físico quando, por exemplo, uma criança precisa dar a outra, diariamente, certa quantia para não ser agredida, e devendo tanto, para não ser humilhada perante a família, recorre então a pequenos furtos, dentro e fora da escola, para o pagamento desse tipo de “pedágio”.
A literatura define o Bullying como fenômeno enquanto certas ações ocorridas em conjunto e/ou isoladas e, em língua portuguesa[1], para expressar as idéias de intimidação repetida, humilhação, agressão, ofensa, gozação, emprego de apelidos, assédio, perseguição, ignoração, isolamento, exclusão, discriminação, sofrimento, aterrorização, amedrontamento, tirania, dominação, empurrão, violência física, quebra e roubo de pertences daqueles que são vítimas de Bullying. (BARBIERI, 2016; BARBIERI, 2013; OLIVEIRA, 2007)
O Bullying entre adultos, no ambiente de trabalho, é chamado de Mobbing, termo sugerido por Heinz Lorenz, ao definir o comportamento de certos animais que, ao circundar outros membros do grupo, o fazia de forma ameaçadora, provocando a fuga destes por medo de um ataque.
Tanto o Assédio Moral, quanto o Bullying e o Mobbing são tipos de violência, expressas de maneiras distintas, em ambientes também distintos, porém, assemelham-se em malefícios contra vítimas vulneráveis, incapazes de defesa e, para cada um destes fenômenos, no Brasil, há lei específica que qualifica, quantifica e criminaliza os fenômenos.
Ora, se por um lado, o Assédio Moral é ligado à cultura organizacional e à hierarquia, por outro, tanto o Bullying quanto o Mobbing são confundidos com brincadeiras, onde a hierarquia não existe de fato, porém o agressor promove certa liderança negativa perante aos que assistem os rituais de intimidação, por medo ou por conivência.
Tem-se, por certo, que o espaço ideal para as vítimas é aquele que proporciona a elas, a princípio, um ambiente que as proteja de humilhações e intimidações e posteriormente, estimule a capacidade de defesa frente ao fenômeno Bullying; Ademais, no que diz respeito aos agressores/intimidadores e aos espectadores de suas ações, a Escola deve oferecer meios de conscientização sobre o respeito e as regras de conduta frente ao coletivo, neutralizando possíveis ações transgressivas e, ao mesmo tempo, cumprindo o que está previsto na Lei 13.185 - Programa de Combate à Violência Sistemática, em todo o território nacional.
Por fim, a sociedade brasileira, em se tratando de Assédio Moral, Bullying e Mobbing, demonstra, como senso comum, noções superficialmente admitidas sobre os fenômenos, com tamanha incapacidade de reflexão, quanto aos seus significados, suas consequências negativas, as atitudes covardes dos opressores, o silêncio dos oprimidos, a conivência dos espectadores, e, sobretudo, o que é previsto na legislação vigente.
Incapacidade de reflexão, pois está claro que esses fenômenos têm reflexos na vida do indivíduo, ocasionando violência contra a dignidade, interferindo na vida das suas vítimas, causando danos psíquicos, morais, mentais, físicos e emocionais, impossibilitando-as do pleno desenvolvimento de suas habilidades, quer na escola, quer no ambiente de trabalho.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMAZARRAY, M. R., Violência Psicológica e Assédio Moral no Trabalho Enquanto Expressões de Estratégias de Gestão, 2010.
Assédio moral e sexual no trabalho – Brasília : MTE, ASCOM, 2009.
BARBIERI, J. M. O. Desvendando e Prevenindo Bullying: a aplicabilidade da Lei 13.185, Araraquara: Juliana Munaretti de Oliveira Barbieri, 2016.
BARBIERI, J. M. O. Bullying: conhecimento é a melhor forma de prevenir, Araraquara: Juliana Munaretti de Oliveira Barbieri, 2016.
BARBIERI, J. M. O. Bullying: conhecimento é a melhor forma de prevenir, Araraquara: Suprema, 2013.
BARRETO, M. Uma Jornada de Humilhações, 2000. Disponível em: www.assediomoral.org.br>
CHAPPEL, D.; DI-MARTINO, V. Violence at work. Jonhannesburg, 2000. Disponível em: http://www.ilo.org/public/english/protection/safework/violence/violwk/violwk.htm
GUEDES, M. N. Mobbing - Violência psicológica no trabalho, 2003.
FREUD, S. Por qué la guerra? - Carta de Freud a Einstein 1933: 132. Buenos Aires, 1993
LEYMANN, H., The Mobbing Encyclopedia. Disponível em <www.leymann.se/English/frame.html>.
OLIVEIRA, J. M. Indícios de casos de Bullying no Ensino Médio de Araraquara –SP. Araraquara, 2007. http://www.uniara.com.br/ageuniara/7281/bullying-pesquisadora-de-araraquara-fala-sobre-o-fenomeno-e-sua-prevencao/ Acessado em 14.03.2016
http://www.uniara.com.br/ageuniara/7210/camara-dos-deputados-aprova-projeto-de-lei-contra-o-bullying/ Acessado em 14.03.2016
http://g1.globo.com/sp/sao-carlos-regiao/jornal-da-eptv/videos/t/edicoes/v/professora-fala-sobre-lei-que-incentiva-escolas-a-assumir-deveres-contra-o-bullying/4598627/ Acessado em 14.03.2016
http://www.araraquara.com/noticias/policia/policia_internaNOT.aspx?idnoticia=1086245 Acessado em 14.03.2016
http://vestibular.uol.com.br/resumo-das-disciplinas/atualidades/bullying-brasil-cria-lei-para-lidar-com-a-violencia-na-escola.htm Acessado em 14.03.2016
http://www.jornaloimparcial.com.br/v2/?tpconteudo=artigo&id=8499&idc=3 Acessado em 14.03.2016
http://jornaloimparcial.com.br/v2/index.php?menu=&tpconteudo=artigo&id=4739&idc =1 Acessado em 14.03.2016
Nota
[1] Em língua portuguesa, não existe ainda uma palavra, como na inglesa, que expresse o conjunto de ações que dá significado ao Bullying.