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Os precatórios judiciais e a crise financeira e orçamentária dos Municípios:

uma opção para atenuar o problema

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02/09/2005 às 00:00
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V. CONSIDERAÇÕES FINAIS: UMA OPÇÃO PARA ATENUAR O PROBLEMA

Como dito alhures, os municípios de fato incluem em seus orçamentos valores suficientes para quitar os precatórios judiciais; contudo, e em face da crise econômica vivenciada, as previsões orçamentárias não vêm sendo realizadas, ou seja, não há a arrecadação prevista. Isso impossibilita a consignação ao Poder Judiciário de valores suficientes para quitar todos os precatórios do exercício.

Entre as causas da não realização do orçamento encontra-se a constante queda da parcela do Fundo de Participação dos Municípios - FPM e o alto índice de inadimplência dos tributos municipais, o qual decorre da carência de recursos econômicos e financeiros das populações locais e da pacata atividade econômica desenvolvida nas pequenas cidades. Importante ressaltar, novamente, que o FPM representa a principal fonte de renda da maioria dos municípios do Nordeste.

Ciente da situação financeira e orçamentária dos entes públicos, o Eminente Ministro Maurício Corrêa observou com precisão na Reclamação n.º 1.779-6 - Alagoas [13] que:

"8.Ora, o fato de ter sido consignado determinado valor no orçamento não implica que, em caso de não-disponibilização do montante previsto, possa o Poder Judiciário determinar o seqüestro da diferença, como fez a autoridade reclamada.

9.Por outro lado, a previsão do §5º do artigo 100 da Carta Federal deve ser interpretada em combinação com o que dispõe o parágrafo segundo da norma. O Presidente do Tribunal que proferir a decisão exeqüenda será responsável pelo pagamento dos precatórios, de acordo com o montante colocado à disposição do juízo e não a partir dos valores consignados no orçamento do ente público devedor. Como se sabe, a lei de meios autoriza o órgão estatal a efetuar despesas segundo a arrecadação estimada, razão pela qual sua efetiva realização depende fundamentalmente da confirmação, in concreto, das previsões econômicas de receita." (destaques acrescidos).

Ocorre que essa inadimplência, já consolidada, não pode se perpetuar. Há de se encontrar uma forma de, pelo menos, minimizá-la. Uma opção seria estabelecer a obrigatoriedade de a administração consignar ao Poder Judiciário, mensalmente, valores para pagamento de precatórios, tal como ocorre com o repasse do duodécimo ao Poder Legislativo, Judiciário e ao Ministério Público. Assim, mesmo na hipótese de não ser realizada toda a receita estimada, parcela dos precatórios seria quitada.

Pelo sistema vigente, em função da inexistência de obrigatoriedade de consignação de valores para pagamento de precatórios, os municípios muitas vezes não efetuam qualquer repasse, deixando-os sem quitação.

A consignação obrigatória, que seria feita nos moldes do art. 29-A da Constituição Federal [14], obedeceria à proporcionalidade prevista na lei orçamentária e teria por base a receita efetivamente realizada.

Exemplificando: para o pagamento de débitos oriundos de sentenças transitadas em julgado, a Lei Orçamentária do Município "A" destinou o montante de R$ 15.000,00 (quinze mil reais). A receita estimada (em regra coincidente com o total das despesas autorizadas), foi da ordem de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais). O valor dos precatórios judiciais, portanto, corresponde a 5% (cinco por cento) da receita estimada. Adotando-se a sistemática ora visualizada, o Município "A" teria a obrigação de consignar ao Poder Judiciário, mensalmente ou anualmente, 5% (cinco por cento) da receita efetivamente realizada para fins de pagamento de precatórios. Da mesma forma que ocorre com o duodécimo, seria importante tipificar como crime de responsabilidade do gestor público as seguintes condutas: a) efetuar repasse a menor em relação à proporção fixada na Lei Orçamentária; e b) não efetuar o repasse no prazo estipulado (mensalmente ou anualmente).

Sem maiores pretensões, essa é, apenas, uma sugestão para a viabilizar o pagamento dos precatórios pela Fazenda Pública.


REFERÊNCIAS

BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. 20. ed. atual.. São Paulo: Saraiva, 1999.

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição brasileira de 1988. 2. ed. atual.. São Paulo: Saraiva, 1997. V. 1.

GOMES, Carlos Roberto de Miranda. Direito financeiro e finanças. Natal: Instituto Brasileiro de Tecnologia Jurídica, 1996.

HORTA, Raul Machado. Estudos de direito constitucional. Belo Horizonte: Del Rey, 1995.

______. Direito constitucional. 4. ed. rev. e atual.. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.

Juris síntese millennium: legislação, jurisprudência, doutrina e prática processual. Porto Alegre: Editora Síntese, v.. 8, n. 47, maio/ jun. 2004. 1 cd-rom.

MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2001;

NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação extravagante. 7. ed. rev. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003;

OLIVEIRA, Regis Fernandes de, e HORWATH, Estevão. Manual de direito financeiro. 6. ed. rev. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003;

SARAIVA, Paulo Lopo. Manual de direito constitucional: a Constituição deles não é a nossa. São Paulo: Editora Acadêmica, 1995;

SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 12. ed.. Rio de Janeiro: Forense, 1993;

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 9. ed. rev. e ampl.. São Paulo: Malheiros Editores, 1992;

TEMER, Michel. Elementos de Direito constitucional. 2. ed. rev. e ampl.. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais.

SITES DA INTERNET:

- Superior Tribunal de Justiça: www.stj.gov.br

- Supremo Tribunal Federal: www.stf.gov.br


NOTAS

01 STF – AGRPET 1266 – SP – 2ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio – DJU 06.03.1998.

02 § 1º É obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades de direito público, de verba necessária ao pagamento de seus débitos oriundos de sentenças transitadas em julgado, constantes de precatórios judiciários, apresentados até 1º de julho, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente.

03 STF - ADI 1662/SP – São Paulo, Ação Direta de Inconstitucionalidade, Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Reqte. Governador do Estado de São Paulo, Reqdo.: Tribunal Superior do Trabalho – TST.

04 STF – IF 298 – SP – TP – Rel. p/o Ac. Min. Gilmar Mendes – DJU 27.02.2004 – p. 00022.

05 Rcl 1091/PA – PARÁ – RECLAMAÇÃO - Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA - Julgamento: 22/05/2002 - Órgão Julgador: Tribunal Pleno - Publicação: DJ DATA-16-08-2002 PP-00088 EMENT VOL-02078-01 PP-00031.

06 IF 3977 AgR / SP - SÃO PAULO - AG.REG.NA INTERVENÇÃO FEDERAL - Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA - Julgamento: 05/11/2003 - Órgão Julgador: Tribunal Pleno - Publicação: DJ DATA-30-04-2004 PP-00029 EMENT VOL-02149-05 PP-00032.

07 § 2º As dotações orçamentárias e os créditos abertos serão consignados diretamente ao Poder Judiciário, cabendo ao Presidente do Tribunal que proferir a decisão exeqüenda determinar o pagamento segundo as possibilidades do depósito, e autorizar, a requerimento do credor, e exclusivamente para o caso de preterimento de seu direito de precedência, o seqüestro da quantia necessária à satisfação do débito. (destaques acrescidos).

08 EFICÁCIA VINCULANTE E FISCALIZAÇÃO NORMATIVA ABSTRATA DE CONSTITUCIONALIDADE - LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO ART. 28 DA LEI Nº 9.868/99. - As decisões consubstanciadoras de declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive aquelas que importem em interpretação conforme à Constituição e em declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, quando proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de fiscalização normativa abstrata, revestem-se de eficácia contra todos ("erga omnes") e possuem efeito vinculante em relação a todos os magistrados e Tribunais, bem assim em face da Administração Pública federal, estadual, distrital e municipal, impondo-se, em conseqüência, à necessária observância por tais órgãos estatais, que deverão adequar-se, por isso mesmo, em seus pronunciamentos, ao que a Suprema Corte, em manifestação subordinante, houver decidido, seja no âmbito da ação direta de inconstitucionalidade, seja no da ação declaratória de constitucionalidade, a propósito da validade ou da invalidade jurídico-constitucional de determinada lei ou ato normativo. Precedente. O DESRESPEITO À EFICÁCIA VINCULANTE, DERIVADA DE DECISÃO EMANADA DO PLENÁRIO DA SUPREMA CORTE, AUTORIZA O USO DA RECLAMAÇÃO. - O descumprimento, por quaisquer juízes ou Tribunais, de decisões proferidas com efeito vinculante, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sede de ação direta de inconstitucionalidade ou de ação declaratória de constitucionalidade, autoriza a utilização da via reclamatória, também vocacionada, em sua específica função processual, a resguardar e a fazer prevalecer, no que concerne à Suprema Corte, a integridade, a autoridade e a eficácia subordinante dos comandos que emergem de seus atos decisórios. Precedente: Rcl 1.722/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO (Pleno)." (STF - Rcl 2143 AgR / SP - São Paulo, Relator(a): Min. Celso de Melo, Agte.(s): Município de Sumaré, Agdo.(a/s): Nélia Regina Aranha Giordano, Julgamento: 12/03/2003, Órgão Julgador: Tribunal Pleno).

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09 EMENTA: RECLAMAÇÃO. PEDIDO CONTRA ATO FUTURO: INADMISSIBILIDADE. PRECATÓRIO. VENCIMENTO DO PRAZO PARA PAGAMENTO: SEQÜESTRO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Reclamação. Incabível contra possível atuação da autoridade reclamada, supostamente contrária à decisão desta Corte. Exigência de prática de ato concreto. Não-conhecimento do pedido nesta parte. 2. Vencimento do prazo para pagamento de precatório. Hipótese que não se equipara à preterição da ordem de precedência, sendo ilegítima a determinação de seqüestro em tal situação. 3. O Tribunal decidiu, de forma expressa, no julgamento de mérito da ADI 1662-SP, que a previsão de que trata o § 4º do artigo 78 do ADCT-CF/88, na redação dada pela Emenda Constitucional 30/00, refere-se exclusivamente aos casos de parcelamento de que cuida o caput desse dispositivo. Inaplicável, portanto, aos débitos trabalhistas de natureza alimentícia. 4. Ratificação da exegese de que a única situação suficiente para motivar o seqüestro de verbas públicas destinadas à satisfação de dívidas judiciais alimentares é a ocorrência de preterição da ordem de precedência, que se afigura ausente no caso concreto. Reclamação parcialmente conhecida e, nesta parte, julgada procedente." (Rcl 1859/SP – São Paulo, Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Julgamento: 20/05/2002, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Reclte.: Governador do Estado de São Paulo, Recldo.: Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região).

10 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 618.

11 Informativo STF n.º 289 - Brasília, 4 a 8 de novembro de 2002. Reclamação n.º 1880-SP – Reclamante: Município de Turmalina – Reclamado: Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região

12 "Cumpre acentuar, preliminarmente, nos termos do recentíssimo julgamento plenário de questão de ordem suscitada nos autos da Rcl 1.880-AgR/SP, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, que se revela plenamente viável a utilização, no caso, pela Fundação do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, do instrumento reclamatório. Com efeito, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao analisar, no referido julgamento, o sentido e o alcance da norma inscrita no art. 28 da Lei nº 9.868/98, firmou orientação no sentido de que "todos aqueles que forem atingidos por decisões contrárias ao entendimento firmado pelo STF, no julgamento do mérito proferido em ação direta de inconstitucionalidade, sejam considerados como parte legítima para a propositura de reclamação" ("Informativo/STF" n. 289/2002, 4 a 8/11/2002 - grifei), razão pela qual assiste, à Fundação ora reclamante, legitimidade ativa ad causam para fazer instaurar a presente medida processual." (STF – Reclamação n.º 2.223-4, Proced.: Rio de Janeiro, Relator: Min. Celso de Mello, Reclte.(s): Fundação do Teatro Municipal do Rio de janeiro, Recldo.(a/s): Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região).

"LEGITIMIDADE ATIVA PARA A RECLAMAÇÃO NA HIPÓTESE DE INOBSERVÂNCIA DO EFEITO VINCULANTE. - Assiste plena legitimidade ativa, em sede de reclamação, àquele - particular ou não - que venha a ser afetado, em sua esfera jurídica, por decisões de outros magistrados ou Tribunais que se revelem contrárias ao entendimento fixado, em caráter vinculante, pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos processos objetivos de controle normativo abstrato instaurados mediante ajuizamento, quer de ação direta de inconstitucionalidade, quer de ação declaratória de constitucionalidade. Precedente." (STF - Rcl 2143 AgR / SP - São Paulo, Relator(a): Min. Celso de Melo, Agte.(s): Município de Sumaré, Agdo.(a/s): Nélia Regina Aranha Giordano, Julgamento: 12/03/2003, Órgão Julgador: Tribunal Pleno).

13 STF - Reclte: Governador do Estado de Alagoas – Recdo: Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 19ª Região

14 Artigo acrescentado pela Emenda Constitucional nº 25 de 2000, DOU 15.02.2000, com vigência a partir de 01.01.2001: Art. 29-A. O total da despesa do Poder Legislativo Municipal, incluídos os subsídios dos Vereadores e excluídos os gastos com inativos, não poderá ultrapassar os seguintes percentuais, relativos ao somatório da receita tributária e das transferências previstas no § 5º do artigo 153 e nos artigos 158 e 159, efetivamente realizado no exercício anterior: I - oito por cento para Municípios com população de até cem mil habitantes; II - sete por cento para Municípios com população entre cem mil e um e trezentos mil habitantes; III - seis por cento para Municípios com população entre trezentos mil e um e quinhentos mil habitantes; IV - cinco por cento para Municípios com população acima de quinhentos mil habitantes. § 1º A Câmara Municipal não gastará mais de setenta por cento de sua receita com folha de pagamento, incluído o gasto com o subsídio de seus Vereadores. § 2º Constitui crime de responsabilidade do Prefeito Municipal: I - efetuar repasse que supere os limites definidos neste artigo; II - não enviar o repasse até o dia vinte de cada mês; ou III - enviá-lo a menor em relação à proporção fixada na Lei Orçamentária. § 3º Constitui crime de responsabilidade do Presidente da Câmara Municipal o desrespeito ao § 1º deste artigo.

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Sobre o autor
Adriano Mesquita Dantas

Juiz Federal do Trabalho do Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região/PB, Professor Universitário e Presidente da Amatra13 - Associação dos Magistrados do Trabalho da 13ª Região. Graduado em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Pós-Graduado em Direito do Trabalho e em Direito Processual Civil pela Universidade Potiguar (UnP). Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino (UMSA). Foi Agente Administrativo do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte, Analista Judiciário do Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região/RN, Advogado, Advogado da União e Diretor de Prerrogativas e Assuntos Legislativos da Amatra13 - Associação dos Magistrados do Trabalho da 13ª Região.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DANTAS, Adriano Mesquita. Os precatórios judiciais e a crise financeira e orçamentária dos Municípios:: uma opção para atenuar o problema. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 791, 2 set. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7232. Acesso em: 26 abr. 2024.

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