Artigo Destaque dos editores

Conhecendo o novo Código Civil.

Série completa (3 partes)

Exibindo página 3 de 13
07/10/2005 às 00:00
Leia nesta página:

10- CLÁUSULA PENAL E ARRAS

A novidade relativa à cláusula penal reside na necessidade de culpa no inadimplemento ou na mora, o que consta expressamente do artigo 408, caput, do Código Civil.

No que diz respeito a arras, não mais conta a presunção de tornar firme a avença e obrigatório o contrato, como outrora preconizava o artigo 1094 do revogado código. Na restituição a quem deu a arras, há previsão de atualização monetária e honorários de advogado. Por fim, o artigo 420, que trata da possibilidade de arrependimento e da destinação da arras, estipula que não haverá direito de indenização suplementar. A disciplina da arras não mais está inserta na parte relativa aos contratos.


11- CONTRATOS

Na disciplina dos contratos, observa-se que o Código Civil novo acena para um regramento que não se escuda na visão estritamente privatista do revogado código. No capítulo I do Título V, foi inserida uma seção I, denominada de disposições gerais preliminares. Os artigos 421 e 422 inserem como princípios norteadores dos contratos a função social, a probidade e a boa-fé.

A função social [24] aparece como condicionante da propriedade no artigo 5º, inciso XXIII, no artigo 170, inciso III, da CF/88, e como princípio subjacente da política urbana e fundiária.

Assim como ocorre em relação à propriedade, a presença da função social não implica em suprimir a autonomia da vontade ou a liberdade contratual. Trata-se de uma condicionante, que funciona antes como uma regra negativa do que positiva. O contrato continua tendo por finalidade disciplinar relações entre as partes contratantes, mas agora há que se observar sua repercussão social enquanto mecanismo de circulação e distribuição de riqueza.

Mas qual o conteúdo prático desta dimensão social? Em parte ele já é indicado pela legislação consumerista quando refere à necessidade de observância de regras ambientais e relativas às normas trabalhistas, mas vai além, e repele práticas predatórias e que produzam uma queda na qualidade de vida no meio em que atuam concretamente. Também serve a função social de sustentáculo teórico para a vedação de práticas abusivas e iníquas, já tratadas em outras disposições do código.

O importante é que se perceba que a ótica de análise do contrato deixa de ter por base o privatisto e o individualismo que marcaram o código anterior, de inspiração napoleônica, e passa a pautar-se por valores que caracterizam o Estado Democrático Social de Direito, onde deve haver uma consciência de que as esferas de direitos se interpenetram em interações que vão além daquelas diretamente abrangidas pela relação contratual.

A relação contratual não pode mais conduzir à concentração exacerbada de renda, ao monopólio predatório, à produção inconseqüente de desigualdades sociais e regionais, à marginalização de parcelas da população, à degradação do meio ambiente em sentido amplo.

O artigo 422 condiciona a celebração e a execução do contrato à probidade e a boa-fé. Também são princípios que já haviam sido colimados com a legislação de defesa do consumidor. A probidade é a honratez, a retidão. O contrato não deve servir para veicular ou chancelar alicantinas, ardis, sejam em benefício de alguém ou prejuízo de outrem.

A boa fé, que pode ser subjetiva ou objetiva, implica na lealdade, na corretidão no proceder, na clareza das manifestações e ações. O contratante deve agir observando a boa-fé, tanto subjetiva como objetiva.

Tais conceitos condensam premissas morais que são juridicizadas, passando a servir como balizadoras da atividade contratual, tendo por consectário a possibilidade de revisão contratual, tanto para o credor como para o devedor.

O artigo 423 diz respeito aos contratos de adesão, mencionando que em caso de ambigüidade ou contradição, a interpretação deverá ser a mais favorável ao aderente. A disciplina dos contratos de adesão já constava do artigo 54 do CDC, onde não se fazia menção a regra hermenêutica de interpretação acima mencionada em vista do fato de que o artigo 47 já determinava uma exegese mais favorável ao consumidor, o que é mais amplo.

Os contratos de adesão aumentaram em escala logarítmica durante o século passado, impulsionados pelos meios de comunicação e pelas relações de consumo de massa, tendo uma de suas principais expressões nos contratos de serviços públicos e bancários. A legislação do consumidor já apanhara a necessidade de proteção ao aderente, que se encontra diante de uma proposta pronta, com pouca ou nenhuma possibilidade de negociação. O consumidor ou aderente efetivamente está em condição de hipossuficiência nesta hipótese. A ambigüidade ou contradição parte do proponente, daí sendo de presumir-se que deva ser interpretada em favor do oblato.

O artigo 439 disciplinou a promessa de fato de terceiro. Para os vícios redibitórios, os prazo de decadência ficaram em um mês para móveis e um ano para imóveis, contados da entrega ou por metade em caso de posse anterior. Tratando-se de vício oculto, os prazos são de 180 dias e um anos, respectivamente. O prazo não corre na vigência de cláusula de garantia, mas a denúncia do vício deverá ser feita até trinta dias após o seu descobrimento (artigo 446).

A evicção apresenta uma fórmula mais abrangente e genérica que a anterior, mencionando apenas contratos onerosos. Foi incluída a alienação judicial. Na sistemática do código revogado, não havia espaço para a evicção em caso de alienação judicial, pois não havia alienação onerosa contratual. Não obstante, se reconhecia o dever de indenizar do exeqüente com base noa vedação de enriquecimento sem causa [25].

Os artigos 462 a 471 inseriram figuras que não existiam no revogado código. Cuida-se do contrato preliminar e do contrato com pessoa a declarar. O contrato preliminar passa a ser fonte de obrigação, desde que contenha os requisitos do contrato a ser celebrado. Pode o credor exigir que a outra parte celebre contrato e caso esta não o faça, poderá postular por sentença o suprimento da vontade, pretensão que já encontrava guarida no artigo 639 do CPC.

No contrato com pessoa a declarar, interferem três figuras a saber: o stipulans e o promittens, que contratam entre si, cabendo ao stipulans indicar em prazo de cinco dias, se outro não tiver sido estipulado, o electus, que tomará seu lugar [26].

A extinção do contrato [27] recebeu um tratamento mais preciso e sistemático, elencando o novo código como causas de extinção: a) o distrato; b) a cláusula resolutiva; c) a exceção de contrato não cumprido; c) a resolução por onerosidade excessiva.

Na tratativa do distrato, referindo-se à cláusula de resilição unilateral, o artigo 473, parágrafo único, buscando evitar iniqüidades e refletindo a postura de busca da boa fé contratual, condiciona a denúncia ao transcurso de prazo razoável em vista do investimento do contratante prejudicado.

A resolução por onerosidade excessiva nada mais é do que aplicação da teoria da imprevisão, condicionada aos contratos de execução continuada ou diferida, onde as prestações de um dos contratantes se tornar excessivamente onerosa devido a acontecimentos extraordinários e imprevisíveis. O efeito, por expressa disposição legal, retroage à data da citação. Mas em busca da conservação do contrato, os artigos 479 e 480 apresentam alternativas de adaptação.


12- DOS CONTRATOS EM ESPÉCIE

O novo Código Civil prevê vinte tipos de contratos, mais do que o anterior. Trataremos neste capítulo apenas das modificações mais significativas em cada espécie.

12.1- Compra e Venda

A compra e venda está prevista nos artigos 481 a 532. Além da disciplina da compra e venda em si, também estão previstas as denominadas cláusulas especiais, dentre as quais estão os chamados pactos adjetos à compra e venda, que são a retrovenda, a venda a contento, a preempção ou preferência, e a venda com reserva de domínio.

Uma primeira inovação reside na possibilidade de a compra e venda ter por objeto coisa futura, ainda não existente, ficando nesse caso, condicionada a eficácia do contrato à existência, ressalvada a hipótese de essa existência consistir em álea desejada pelos contratantes (artigo 483).

No que diz ao preço, o artigo 487 permite que sejam utilizados índices ou parâmetros determináveis na sua fixação. O artigo 493 estabeleceu como regra para determinação do local da tradição aquele que se encontrava quando por ocasião da venda.

O artigo 496 diz anulável a venda de ascendente para descendente salvo anuência dos demais descendentes e cônjuge. Dois pontos se destacam. O primeiro reside na inclusão da anuência do cônjuge, uma vez que o artigo 1.132 do revogado código não a previa. Mas a aquiescência do cônjuge somente será necessária quando o regime não for o da separação de bens. O segundo consiste na expressa menção da conseqüência como sendo a anulabilidade. No regime do revogado código havia discussão acerca da conseqüência da inexistência do cumprimento do requisito de aquiescência. Havia opiniões pela nulidade [28] e pela anulabilidade [29]. Resta exaurida, portanto, esta discussão [30].

O artigo 499 expressamente prevê a possibilidade de compra venda entre cônjuges, desde que em relação aos bens excluídos da comunhão. A rigor, o dispositivo somente tem por finalidade dirimir dúvidas, pois nunca houve uma vedação geral a esta modalidade de negócio.

O artigo 501 estabeleceu prazo para o exercício das ações ex empto [31], quanti minoris (ou aestimatoria) [32] e redibitória em caso de venda ad mensuram [33]. A redação do dispositivo sofre críticas de Nelson Nery Júnior, a quem assiste inteira razão ao mencionar que a as ações em testilha (ex empto e quanti minoris) exercem-se por meio de pretensões condenatórias, sendo caso, portanto, de prescrição, e não de decadência. Esta existe somente no caso de rescisão por vício redibitório, pois a ação busca sentença desconstitutiva. [34]

Na retrovenda, houve aglutinações de disposições, com nova redação e estabelecida a possibilidade de, havendo mais de uma pessoa com direito de retrato, e não havendo consenso, prevalecer o direito daquela que efetua o depósito integral. Antes, no sistema do revogado código, neste último caso, o direito de todos caducava. Estabeleceu-se, ainda, a cessibilidade do direito e sua transmissibilidade a herdeiros e legatários.

Na venda a contento, a condição de agrado do comprador funciona, agora, sempre como suspensiva, ficando o adquirente, assim como também no caso de venda sujeita a prova, na condição de mero comodatário.

Quanto ao direito de preempção, ficou estabelecido o prazo máximo para exercício do direito, sendo de 180 dias para móveis e dois anos para imóveis (artigo 513, parágrafo único). Após a notificação, o prazo para exercício caduca em 03 dias, se móvel, e em dois meses (e não mais em trinta dias) se imóvel.

A venda com reserva de domínio não tinha previsão no código anterior, A matéria tinha tratativa, por outro lado, na lei processual civil (artigo 1.070 e 1.071). Cuida-se, a rigor, de condicionar a transmissão de propriedade de coisa móvel, suscetível de perfeita caracterização, ao integral pagamento do preço em cláusula cuja oponibilidade a terceiros carecerá de registro no domicílio do devedor. Fica o alienante, em caso de mora do comprador, autorizado a rescindir o negócio ou a buscar o pagamento das prestações, podendo, no primeiro caso, reter parte das parcelas pagas a título de indenização pela deterioração da coisa.

Ainda no tangente à venda, foi inserida a denominada venda sobre documentos, que nada mais é do que uma venda realizada a vista de título representativo cuja tradição representa a da coisa. O novo código não repetiu o regramento do pacto comissório e do pacto de melhor comprador.

12.2- Troca ou Permuta

Foi acrescida a menção à permuta na epígrafe do capitulo. A troca de valores desiguais entre ascendentes e descendentes sem o consentimento dos demais teve acrescido o consentimento do cônjuge como requisito cuja ausência implica agora em anulação e não em nulidade, como constava do artigo 1.164 do revogado código.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

12.3- Contrato Estimatório

O contrato estimatório não tinha previsão legislativa no anterior código, mas era usualmente utilizado nos meios negociais, recebendo tratativa da doutrina. Trata-se de uma venda levada a efeito por pessoa que não o proprietário, que se compromete a pagar um certo preço. Este, o consignatário, não adquire a propriedade da coisa senão depois de pagar o preço avençado.

12.4- Doação

A doação é um dos negócios jurídicos mais comuns sendo frequentemente objeto de disputas. Na parte geral da espécie, que vai dos artigos 538 a 554, o novo código pouco acresceu à disciplina que constava dos artigos 1.165 a 1.180 do revogado código.

Na parte geral, foi introduzida a vedação à cláusula que estipule reversão do bem doado em favor de terceiro e a responsabilidade por evicção na doação para casamento com pessoa certa e determinada, salvo estipulação em contrário (artigos 547, parágrafo único, e 552 do Código Civil).

No que se refere às causas de revogação, observamos pequenas modificações em uma das hipóteses caracterizadoras da ingratidão, pois enquanto o artigo 1.183 do revogado código falava em "atentar contra a vida do doador", o artigo 557, inciso primeiro acresce "ou cometeu crime de homicídio doloso contra ele". Realmente a redação do dispositivo anterior era falha, pois em uma interpretação literal se poderia, invocando conceitos penais, dizer que a simples tentativa implicaria em ingratidão, ao passo que o crime consumado não. Tal ilação por certo que se afigurava ilógica, mas implicava em lapso do legislador. A ação em caso de morte do doador por homicídio, cabe aos seus herdeiros, "exceto se aquele houver perdoado" (artigo 561). Para que exista possibilidade de perdão do doador em caso de homicídio, por óbvio que este deverá ter ocorrido entre o fato delituoso e a morte.

O artigo 559 estabelece prazo de um ano a contar do conhecimento do fato, para que seja intentada a demanda visando à revogação

12.5- Locação

A locação versada pelo código civil é toda aquela residual em relação a Lei de Locações (Lei nº 8.245/91). O texto dos artigos 565 a 578 é quase idêntico ao dos artigos 1.188 a 1.199 do revogado código. Uma mudança sensível reside no artigo 571 do novo código, que estabelece que o locatário somente poderá restituir a coisa ao locador se pagar a multa proporcionalmente prevista no contrato. No artigo 1.193, parágrafo único do revogado código, o locatário deveria pagar o aluguer do tempo restante. Esta soma-se, agora, à multa contratual. Se esta obrigação resultar excessiva, o artigo 572 contempla uma regra de abrandamento, segundo a qual o magistrado poderá fixá-la em "bases razoáveis".

O parágrafo único deste artigo 571 prevê expressamente o direito de retenção ao locatário enquanto não for ressarcido pelas perdas e danos resultantes da retomada do objeto do contrato. Tal direito deve ser exercido mediante os denominados "embargos de retenção".

O parágrafo único do artigo 575estabelece a possibilidade de redução do aluguel fixado pelo locador em caso de manutenção da coisa pelo locatário, não obstante notificado para restituição. Esta previsão de interferência do magistrado não existia no revogado código.

12.6- Empréstimo

Neste capítulo V, foram inseridas duas seções, uma relativa ao comodato e outra ao mútuo.

No que diz respeito ao comodato, a redação dos artigos 579 a 585 repete ipsis litteris a dos artigos 1.248 a 1.255 do revogado código. O artigo 589, relativo ás hipóteses, nas quais, abrindo-se exceção ao artigo antecedentes, que estabelece a impossibilidade de retomada da coisa pelo mutuante em caso de mútuo celebrado com menor, apresenta sensíveis modificações em relação ao artigo 1.260 do revogado código. O inciso II deste artigo reportava-se ao artigo 392, inciso II, do código revogado, o qual tratava dos bens deixados ao filho para fim certo e determinado. A nova redação prevê "bens e ganhos como seu trabalho". Foram inseridos mais dois incisos. O IV possibilita a retomada se o mútuo reverteu em proveito do menor, e o V menciona a obtenção maliciosa do empréstimo.

O artigo 591 acresceu em relação ao artigo 1.262 do revogado C.C. Diz ele que "destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos juros, os quais, sob pena de redução, não poderão exceder a taxa a que se refere o art. 406, permitida a capitalização anual." [35] No dispositivo anterior, a previsão de juros em relação ao empréstimo de dinheiro ou coisas fungíveis deveria constar de cláusula expressa, com ou sem capitalização.

12.7- Prestação de Serviços

A prestação de serviços regida pelo código civil é aquele não sujeita à lei trabalhista ou especial (artigo 593 do C.C). Neste último caso, devem ser consideradas especialmente as sujeitas ao CDC, podendo se afirmar que representam a maioria dos casos.

O texto foi quase integralmente mantido. Um das poucas modificações reside na possibilidade de recebimento das prestações vencidas e na responsabilização por perdas e danos em caso de despedida por justa causa.

Dispositivo que inova efetivamente é o artigo 606 segundo o qual: "Se o serviço for prestado por quem não possua título de habilitação, ou não satisfaça requisitos outros estabelecidos em lei, não poderá quem os prestou cobrar a retribuição normalmente correspondente ao trabalho executado. Mas se deste resultar benefício para a outra parte, o juiz atribuirá a quem o prestou uma compensação razoável, desde que tenha agido com boa-fé" ressalvando porém, que "não se aplica a segunda parte deste artigo, quando a proibição da prestação de serviço resultar de lei de ordem pública".

O artigo 607 condensa as formas de extinção do contrato, especificando que "o contrato de prestação de serviço acaba com a morte de qualquer das partes. Termina, ainda, pelo escoamento do prazo, pela conclusão da obra, pela rescisão do contrato mediante aviso prévio, por inadimplemento de qualquer das partes ou pela impossibilidade da continuação do contrato, motivada por força maior."

Antes a rescisão contratual era a forma com previsão específica em dois artigos, conforme fosse pelo locador ou pelo locatário (art. 1.226 e 1.229 do revogado código).

Por fim, o prazo previsto no artigo 1.235, versando sobre a pena em caso de aliciamento, e que era de quatro anos, passou, na redação do artigo 608, para dois anos.

12.8- Empreitada

Também se trata de uma forma contratual bastante utilizada embora nem sempre os contratantes observem as prescrições da lei civil.

O artigo 610 acresce dois parágrafos na redação do artigo 1.237. O primeiro esclarecendo que a obrigação conjunta de fornecimento de materiais além do trabalho não é presumida, devendo decorrer da lei ou da vontade das partes. O segundo assevera que a elaboração de um projeto não implica na obrigação de executá-lo.

Na disciplina do artigo 1.238 do revogado código, estando o contratante em mora accipiendi e havendo fornecimento conjunto de materiais, os riscos em relação a estes correriam de igual forma para as duas partes. O artigo 611 carreia esta responsabilidade integralmente ao contratante que encomendou a obra.

No caso de obra de partes ou sujeita à medição, o parágrafo segundo do artigo 614 estabelece prazo de 30 dias para denúncia de vícios, sob pena de considerar-se verificado o que se mediu.

O artigo 618 estabelece prazo de 180 dias para o exercício do direito decorrente da responsabilidade civil do empreiteiro de edificação em caso de vício ou defeito, contado da data do aparecimento destes. Trata-se não obstante a menção a "decairá do direito" de prazo de prescrição.

Os artigos 620 a 626 não repetem disposições do código revogado. O artigo 620 estabelece a possibilidade de pedido de revisão contratual em caso de variações superiores a 1/10 do valor convencionado. Por outro lado, o artigo 621 impede que o proprietário da obra introduza modificações na obra sem anuência do autor, salvo hipótese de inconveniência ou excessiva onerosidade na execução. O artigo 622 estabelece limites a responsabilidade do autor do projeto quando não é simultaneamente o diretor ou executor da obra, ressalvando-se os defeitos do próprio projeto, que deve ser alegado na forma do parágrafo único do artigo 618.

O artigo 625 estabelece hipóteses nas quais o empreiteiro pode suspender a obra. No inciso I menciona-se a culpa do dono e a força maior. A culpa deve ser exclusiva. No inciso II, está prevista a aplicação da imprevisão, condicionada, porém, a sustação à impossibilidade de que o contrato seja espontaneamente revisto. O inciso III diz respeito à alterações no projeto que queira fazer o dono da obra, desde que, em vista da natureza da obra e seu vulto, resultem desproporcionais.

Por fim, o artigo 626 ressalva que a morte dos contratantes não enseja a extinção do contrato salvo se ajustada como causa em vista das qualidades pessoais do empreiteiro.

12.9- Depósito

O depósito é uma modalidade negocial que tem recebido especial atenção da doutrina e da jurisprudência, principalmente devido a uma de suas conseqüências, que é a possibilidade de prisão do devedor.

A celeuma formou-se em torno da constitucionalidade da possibilidade de conversão da ação de busca e apreensão em ação de depósito, diante da previsão do artigo 4º, do Decreto nº 911/69, que trata da alienação fiduciária.

A respeito, há divergência entre os posicionamentos do STF e do STJ. A Excelsa Corte tinha por constitucional a conversão da ação e a prisão do devedor, mesmo em face do Pacto de São José da Costa Rica. [36] O Superior Tribunal de Justiça, de seu turno, entende inconstitucional a medida [37].

Em face da Emenda Constitucional nº 45/04, poderá ser aventada a tese de que o Pacto de São José da Costa Rica tem efetivamente status de norma constitucional. Destarte, a inserção de um parágrafo 3º no artigo 5º, determinando que os tratados e convenções internacionais aprovados pelas duas casas do congresso com pelo menos três quintos dos membros tem estatura de emenda constitucional pode ensejar uma revisão da posição do STF, apesar de a citada Emenda 45 lhe ser posterior.

É que a alteração que o artigo 60, § 4º, da CF/88 veda em relação aos direitos e garantias fundamentais é aquela que venha a suprimir estes direitos ou garantias ou diminuir-lhes o espectro de abrangência. Podem ser concebidas emendas constitucionais para aumentar o alcance do conteúdo do artigo 5º. Por outro lado, tendo em mira o caráter público da norma em apreço, pode ser alvitrada a retroação em relação ao status constitucional do mencionado pacto.

O artigo 628 inova em relação ao artigo 1.265 do revogado código, pois estabelece que a possibilidade de remuneração existe quando tratar-se de atividade negocial ou for exercida como profissão, devendo a remuneração, em caso de ausência de previsão convencional ou legal, regular-se pelos usos do lugar, e na falta desses pelo arbitramento.

O artigo 630 suprimiu a presunção de culpa do depositário em caso de violação do depósito que coisa que se entrega selada, fechada ou lacrada. Na lei civil anterior não havia disposição acerca do local onde a coisa deveria ser devolvida. O artigo 631 dirime a dúvida, determinando como local para a restituição, salvo estipulação contrária, aquele em que estiver depositada a coisa, correndo as despesas da restituição à conta do depositante.

Também sem previsão anterior, o artigo 632 trata do depósito realizado no interesse de terceiro, cujo consentimento passa a ser necessário para a restituição da coisa com eficácia exoneratória.

Dentre as hipóteses nas quais pode o depositário negar-se a restituir a coisa, foi acrescida a do direito de retenção. Na parte final do artigo 633, a menção a coisa furtada ou roubada, existente no artigo 1.268 do C.C. anterior foi substituída por coisa "dolosamente obtida".

Quanto ao depósito necessário, o texto sofreu mudanças mais de redação do que de conteúdo.

12.10- Mandato

A estrutura básica do instituto foi mantida. Uma primeira modificação sensível reside no fato de que no mandato por instrumento particular, o reconhecimento de firma não é mais essencial a sua validade, mas este poderá ser exigido por terceiro.

O mandato continua presumidamente gratuito, salvo as hipóteses de exercício de profissão lucrativa. O artigo 658, parágrafo único, insere regra acerca da fixação do patamar de remuneração, no que era omisso o anterior código.

O artigo 662 explicita a conseqüência dos atos praticados sem mandato ou sem poderes suficientes: a ineficácia. Esta menção inexistia, mas é mantida a possibilidade de ratificação, expressa ou tácita.

No tocante às obrigações do mandatário, em caso de existência de poderes de substabelecimento, na redação do artigo 1300, § 2º do revogado código, o mandatário que substabeleceu somente seria responsável em caso de notória incapacidade ou insolvência do substabelecido. Na redação do 667, § 2º, esta responsabilidade existe em vista da culpa in eligendo do que substabelece ou por culpa nas instruções transmitidas ao substabelecido.

O artigo 663 introduz alteração em relação ao artigo 1.307 do revogado código. No dispositivo anterior, em caso de o mandatário obrar em seu nome, o mandante ficava desvinculado. O artigo 663 estabelece que o mandatário ficará pessoalmente obrigado quando assim agir, mesmo que "a conta do mandante". As obrigações do mandante permanecem quase que inalteradas.

No que diz respeito à revogação, algumas modificações podem ser apontadas. Inicialmente, o artigo 683 determina obrigação de pagar perdas e danos ao mandante que revogar mandato onde constava cláusula de irrevogabilidade. Indenizar a quem? Na falta de disposição limitadora, há que se entender que a qualquer um que cause prejuízo, inclusive ao mandatário.

Os artigo 684 e 685 versam sobre hipóteses antes sinteticamente tratadas como incisos do artigo 1.317 do revogado código. O artigo 684 estabelece que é a ineficácia a sanção que atinge a revogação do mandato conferido no interesse do mandatário ou como condição para negócio bilateral.

Já o artigo 685 determina que: "conferido o mandato com a cláusula ‘em causa própria’, a sua revogação não terá eficácia, nem se extinguirá pela morte de qualquer das partes, ficando o mandatário dispensado de prestar contas, e podendo transferir para si os bens móveis ou imóveis objeto do mandato, obedecidas as formalidades legais." O dispositivo imuniza o mandato em causa própria, não só cominando a ineficácia como sanção, como, ainda estabelecendo o alcance dos poderes, que no caso são exercidos em único interesse do mandatário. [38]

O mandato judicial, que antes recebia seis artigos de tratativa, teve sua disciplina relegada exclusivamente para a lei processual.

10.11-Comissão

A inserção da disciplina do contrato de comissão no código civil espelha o compromisso de se proceder à unificação do direito civil e comercial sob um mesmo diploma, na esteira do que já fizera o código civil italiano. O código comercial era considerado, e não sem razão, um diploma anacrônico e vetusto em muitos de seus aspectos e a unificação traduz uma possibilidade de melhor sistematização de matérias afins. No código comercial, o contrato de comissão mercantil ocupava os artigo 165 a 190. As disposições do código civil não provocaram grandes mudanças neste espécie contratual.

Neste modalidade contratual, o comissário adquire ou vende bens em seu nome mas à conta do comitente, não tendo este ação contra aqueles que contratarem com o comissário, nem eles contra o comitente. Foi mantida a fórmula "del credere" [39]. Aplicam-se subsidiariamente as disposições relativas ao mandato por expressa previsão legal.

10.12- Agência e Distribuição

Trata-se também de uma modalidade tipicamente mercantil, que outrora encontrava regulação através da Lei nº 4.886/65, pertinente aos representes comerciais autônomos, não havendo, porém, uma exata correspondência.

Neste modalidade negocial, o agente ou distribuidor realiza à conta de outrem a promoção de negócios em determinada área geográfica, sem vínculo de subordinação. Por expressa disposição legal (artigo 721 do C.C), aplicam-se subsidiariamente as regras da comissão, do mandato e da legislação especial.

10.13- Corretagem

É outra modalidade tipicamente mercantil, onde o corretor obriga-se a obter negócios para outrem, com o qual não tem ligação decorrente de mandato, seguindo instruções deste e sem limitação geográfica necessária.

10.14- Transporte

O contrato em exame não tinha tratativa no revogado código civil, tendo menção apenas no C. Com.. É sem dúvida, uma das modalidades de contrato das mais importantes.

Inicialmente, é de se mencionar que, nos termos do artigo 736, o transporte feito por cortesia não se subordina ás regras do capítulo XIV, considerando-se, porém, a vantagem indireta como apta a ensejar esta aplicação.

Ponto que chama a atenção reside no regime de responsabilidade objetiva a que está submetido o transportador, nos termos dos artigos 734, 735 e 738 parágrafo único. Quando o dano resultar de culpa de terceiro, tem o transportador ação regressiva contra este, mas a responsabilidade em relação ao transportado não é elidida. Quando este o transportado, contribuir para o eventus damni, poderá ser reduzida a indenização [40]. Somente a força maior poderá afastar a responsabilidade.

O artigo 740 concede ao transportado o direito de rescindir (rectius= revogar) o contrato antes de iniciada a viagem, devendo ser restituído o valor desde que a comunicação seja feita em tempo ao transportador de modo a permitir a renegociação da passagem. As normatizações administrativas a respeito da devolução de valor de passagem em caso de desistência normalmente impõe um tempo relativamente grande como limite para a possibilidade de revogação. A rigor, há de valor sempre a lei civil, não se podendo dizer que uma normatização que estabeleça prazo limite de 24 horas esteja de acordo com o citado artigo, dentro de uma perspectiva de razoabilidade. No mesmo artigo, fica estabelecida a possibilidade de multa contratual em as de desistência após iniciada a viajem em percentual de 5%.

O artigo 741 condensa disposição de largo alcance prático, uma vez que impõe ao transportador a obrigação de, em caso de interrupção involuntária da viagem, de contratar veículo de categoria idêntica para continuidade do serviço e de arcar com todas as despesas adicionais dos transportados.

O transporte de coisas já tinha previsão na legislação comercial, e suas linhas gerais foram mantidas.

É aplicável ao contrato de transporte a legislação consumerista.

10.15- Seguro [41]

Embora a limitação já houvesse anteriormente em legislação extravagante, o artigo 757 parágrafo único, delimita a possibilidade de contratação de seguro a entidades legalmente autorizadas.

Segundo o C.C. vigente, o contrato de seguro prova-se pela exibição da apólice ou bilhete de seguro, cuja emissão deve sempre ser precedida de proposta escrita, da qual constarão os elementos essenciais, ou através de documento comprobatório ou prova de pagamento do seguro. No caso de seguro de pessoas, as apólices ou bilhetes não poderão ser ao portador. [42]

O artigo 762 inquina de nulidade o contrato de que vise seguro de risco decorrente de ato "doloso". No artigo 1.436 do revogado código a menção era a "ato ilícito", sendo circunstâncias visivelmente diversas, já que o ato ilícito pode ser culposo, ao passo que nem todo ato doloso é ilícito.

O artigo 766 amplia as hipóteses antes referidas pelo artigo 1.444 do revogado código. A falsidade das declarações dolosas do segurado passam a poder advir dele ou de representante. Em caso de inexistência de má-fé, fica assegurado o direito do segurador de rescisão contratual ou de cobrança, mesmo após o sinistro, da diferença do prêmio.

O artigo 769, além de manter a obrigação do segurado de comunicar fatos que aumentem o risco em relação a coisa segurada, possibilita ao segurador rescindir o contrato, o que terá eficácia trintas dias após a notificação ao segurado, devendo, porém, restituir a diferença no valor do prêmio. Esta possibilidade não existia no código revogado.

O artigo 770 cria a possibilidade de pedido de revisão, por parte do segurado, no que diz respeito ao valor do prêmio, ou mesmo a resolução do contrato em caso de diminuição considerável do risco.

O parágrafo único do artigo 771 determina que as despesas de salvamento, até o limite fixado no contrato, correm por conta do segurador. A recondução do contrato de forma tácita foi limitada a uma única vez (art. 774).

Na seção II, sob a epígrafe "do seguro de dano", foram mantidas disposições anteriormente existentes e acrescida nova disciplina a algumas questões. Foi mantida a limitação da garantia ao valor do interesse segurado no momento da celebração do contrato, o qual também constitui limite para a indenização, e que ta será, porém, aferido no momento do sinistro.

Nos seguros de responsabilidade civil, a responsabilidade do segurado perante terceiros remanesce em caso de insolvência do segurador, sendo que o segurado, uma vez intentada ação contra si, deve informar ao segurador. Em caso de ser acionado diretamente o segurador, somente poderá opor a exceptio non adimpleti contractus ao segurado se promover a citação deste para integrar o pólo passivo da lide.

O código vigente não mais trata do seguro de vida, preferindo a menção a seguro de pessoa. O artigo 792 estabelece que "na falta de indicação da pessoa ou beneficiário, ou se por qualquer motivo não prevalecer a que for feita, o capital segurado será pago por metade ao cônjuge não separado judicialmente, e o restante aos herdeiros do segurado, obedecida a ordem da vocação hereditária." Deveria ter contemplado também o companheiro, pois como permite o artigo 794, este também pode ser beneficiário expresso. Porque não deveria ser parificado ao cônjuge?

No seguro de pessoa, a inadimplência no pagamento do prêmio não autoriza ação para sua cobrança pelo segurador, podendo, no entanto ser pleiteada a redução do capital segurado ou a rescisão contratual.

Há possibilidade de fixação de prazo de carência para o segurador, sendo que o suicídio do segurado em prazo de até dois anos após a celebração do contrato ou de sua recondução induz em eximência da obrigação de indenizar, devendo a reserva ser restituída. Não obstante, em outros casos, elencados no artigo 799, verificam-se hipóteses em que a responsabilidade do segurador não é afastada. [43]

12.16- Constituição de Renda

A constituição de renda, antes prevista nos artigos 1.424 a 1.431, não sofreu grande alterações, mas deverá, agora, ser estipulada através de instrumento público.

12.17- Jogo e Aposta

Duas novidades podem ser destacadas. A primeira reside no fato de que "as disposições dos arts. 814 e 815 não se aplicam aos contratos sobre títulos de bolsa, mercadorias ou valores, em que se estipulem a liquidação exclusivamente pela diferença entre o preço ajustado e a cotação que eles tiverem no vencimento do ajuste." Tal disposição do artigo 816 é contrária ao que previa expressamente o artigo 1.479, que submetia tais operações às regras de jogo.

Outra exceção reside no parágrafo segundo do artigo 814, que retira da obrigação decorrente de jogo permitido o caráter de obrigação exclusivamente natural.

12.18- Fiança

No contrato de fiança, o código vigente praticamente manteve intactas as disposições dos artigos 1.481 a 1.504 do revogado código.

Alteração importante há, no entanto, no que diz respeito à exoneração na fiança prestada sem prazo. Anteriormente, segundo o artigo 1.500, a exoneração somente surtiria efeito após o ato amigável ou a sentença que decretasse a exoneração. O artigo 835 permite que a exoneração se dê por mera notificação do credor, não salientando porém se há necessidade de que seja formalizada por ato específico, devendo entender-se que a mera notificação escrita baste. Ficará, porém, o fiador responsável por sessenta dias após a notificação por todos os efeitos do contrato.

12.19- Transação

As modificações restringiram-se praticamente a questões meramente semânticas e de estilo de redação. Vale lembrar que a transação também encontra previsão no artigo 158 do CPC, e implica em julgamento de extinção do feito nos termos do artigo 269, inciso III, do mesmo Estatuto de Ritos.

12-20-Compromisso

O compromisso, originalmente previsto no revogado C.C., foi revogado pela Lei nº 9.307/96. Retorna ao código civil através de três dispositivos que o admite como cláusula contratual e o veda em questões de estado, questões familiares e outras sem caráter estritamente patrimonial.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Marcelo Colombelli Mezzomo

Ex-Juiz de Direito no Rio Grande do Sul. Professor.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MEZZOMO, Marcelo Colombelli. Conhecendo o novo Código Civil.: Série completa (3 partes). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 826, 7 out. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7234. Acesso em: 26 abr. 2024.

Mais informações

Fusão de série de três trabalhos do autor, com o título: "Conhecendo o novo Código Civil"

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos