Legitimidade passiva na execução trabalhista: reflexos da reforma trabalhista

27/02/2019 às 11:54
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Aborda-se a legitimidade para responsabilização pelo crédito trabalhista: aspectos legais, doutrinários e jurisprudenciais acerca do tema, além das modificações implementadas pela Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017)

 

1 INTRODUÇÃO

Neste artigo trataremos do assunto legitimidade passiva na execução trabalhista – reflexos da Reforma Trabalhista. Serão analisados aqueles que podem figurar no polo passivo da execução trabalhista além do empregador estejam ou não presentes na fase de conhecimento do processo.

O crédito trabalhista possui privilégio em razão de sua natureza jurídica de alimentos. Diante disso exige-se um processo mais célere e desburocratizado a fim de garantir  efetividade na busca do direito sonegado.

O empregador é o devedor principal dos créditos trabalhistas, portanto, figura como principal executado quando não há cumprimento espontâneo da decisão judicial. Entretanto, em razão de diversos institutos a responsabilidade pode recair sobre outras pessoas.

Nesse contexto surgem as figuras do grupo econômico, caracterizado pela comunhão de interesses entre diversas empresas que atuam em conjunto, com subordinação ou não; o consórcio de empregadores, instituto cuja previsão legal se restringe ao âmbito do trabalho rural, mas defende-se sua extensão a outros empregadores; a sucessão trabalhista, amplamente estudada pela doutrina trabalhista, cujos efeitos protegem a continuidade da relação de emprego e os créditos dos trabalhadores; a terceirização, recentemente alterada pela Reforma Trabalhista.

Por fim a responsabilidade dos sócios e a inclusão expressa do incidente de desconsideração da personalidade jurídica no processo do trabalho e responsabilidade do sócio retirante, temas também objeto da Reforma legislativa.

O objetivo deste trabalho é a análise sistemática daqueles que podem ser responsabilizados pelos créditos alimentares dos empregados, examinando as previsões legais e os entendimentos jurisprudenciais dos Tribunais Trabalhistas a fim de compreender o fundamento dessa extensão da responsabilidade, bem como  seu limite.

Destaca-se a importância do tema pela necessidade de conhecimento acerca da processualística laboral quanto ao cumprimento de sentença, tendo em vista o anseio social pela efetividade processual, pois a ampla demanda trabalhista se dá quando o trabalhador já foi dispensado e precisa dos créditos a fim de manter o seu sustento e o de sua família.

Quanto à metodologia, o tipo de pesquisa caracteriza-se quanto a sua natureza como qualitativa e exploratória. A coleta de dados foi realizada através da pesquisa bibliográfica.

 

2 LEGITIMIDADE PARA RESPONSABILIZAÇÃO PELO CRÉDITO TRABALHISTA

A execução dos créditos em face do devedor, no passado, possuía caráter pessoal, pois recaia sobre o próprio devedor, que poderia se tornar escravo ou ter sua família e filhos escravizados prestando serviços ao credor até que a dívida fosse quitada.

No entanto, com o desenvolvimento das civilizações, passou-se a adotar a natureza patrimonial da dívida, recaindo apenas sobre o patrimônio do devedor, conforme previsto em nosso ordenamento jurídico – art. 789 do CPC. Veda-se inclusive a prisão por dívida, salvo para o devedor de prestação alimentícia (CF, art. ).

Essa evolução do Direito que permitiu sua humanização, foi acompanhada também de alterações legislativas quanto ao processo, entendido como instrumento por meio do qual o Estado presta a jurisdição. O processo civil que sempre foi caracterizado pelo formalismo aproximou-se do processo do trabalho (mais simples e efetivo). Nesse sentido, Carlos Henrique Bezerra Leite (2017, p. 1436):

Com o advento da Lei Federal n. 11.232/2005, a sentença, como já vimos no Capítulo XVII, item 5.3, deixou de ser ato do juiz que extingue o processo, com ou sem resolução do mérito, e passou a ser “ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269 do CPC/73.

Houve, assim, uma substancial revolução no CPC/73, no particular, que implicou o desaparecimento do “processo de execução de título judicial” e o surgimento de uma “fase de cumprimento de sentença” dentro do próprio processo de conhecimento.

 

 Com efeito, o processo do trabalho, adotando o sincretismo processual, desde muito tempo efetiva a tutela jurisdicional na mesma relação jurídica processual em que foi reconhecida, amalgamando as fases de cognição e de execução no mesmo processo. Tal sistemática somente passou a ser adotada no processo civil a partir das reformas havidas no CPC/1973 e encampadas pelo NCPC com a manutenção do cumprimento de sentença para efetivação do direito.

Portanto, seja após o reconhecimento do direito no processo de conhecimento (título executivo judicial), seja diante de um descumprimento de um título executivo extrajudicial,  não havendo cumprimento espontâneo dá-se início à fase de cumprimento de sentença no primeiro caso e de um processo de execução, no segundo caso.

Nesse ponto é importante destacar que a maioria das execuções no processo do trabalho tem por substrato um título executivo judicial formado após o processo de conhecimento. Entretanto, é possível o ajuizamento de um processo de execução, quando a parte possui um título executivo extrajudicial. E nesse ponto reside a polêmica, tendo em vista que parte da doutrina defende a competência da Justiça do Trabalho para execução apenas dos títulos previstos no art. 876 da CLT. Outra parte da doutrina defende que o rol do art. 876 da CLT é exemplificativo, não excluindo outros títulos executivos extrajudiciais.

Para Mauro Schiavi (2016, p. 1054):

A doutrina sempre relutou em admitir outros títulos com força executiva na esfera trabalhista que não os mencionados no referido art. 876 da CLT, quais sejam, sentenças transitadas em julgado; sentenças pendentes de recurso, recebido apenas no efeito devolutivo; acordos homologados pela  Justiça do Trabalho e não cumpridos; termos de ajuste de conduta firmados perante o Ministério Público do Trabalho; e termos de conciliação firmados perante as Comissões de Conciliação Prévia, asseverando que o rol nele previsto é taxativo.

 

E prossegue o Mauro Schiavi  (2016, p. 1061):

Reformulando entendimento anterior, pensamos que os títulos de crédito que sejam emitidos em razão da relação de trabalho (cheques, notas promissórias, confissão de dívidas), principalmente para pagamento dos serviços, devem ser executados na Justiça do Trabalho, uma vez que o rol do art. 876 da CLT não é taxativo, e tal execução propicia o acesso mais efetivo do trabalhador à justiça, simplificando o procedimento, duração razoável do processo, além de justiça do procedimento.

 

Diante disso, verifica-se que importante parte da doutrina entende pela ampliação da competência da Justiça do Trabalho para abranger a execução de títulos executivos extrajudiciais, o que de fato, encontra-se em consonância com a interpretação sistêmica da legislação, sobretudo em sua análise em conformidade com a Constituição Federal. De acordo com a Carta Magna, compete à Justiça do Trabalho processar e julgar as ações oriundas da relação de trabalho (art. 114, I), ou seja, não restringe ao processo de conhecimento. Ademais, a própria Constituição Federal elenca expressamente as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores (Execuções Fiscais decorrentes de títulos executivos extrajudiciais).

Outro ponto a ser ressaltado antes da análise dos legitimados passivos é quanto aos procedimentos específicos para o cumprimento de sentença (título executivo judicial). De fato, no processo de conhecimento, o magistrado poderá conceder a tutela da obrigação quantia certa ou obrigação de fazer/não fazer, cujos procedimentos são diferentes.

De acordo com Carlos Henrique Bezerra Leite (2016, p. 1437):

O primeiro é destinado ao cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação por quantia certa, o procedimento se inicia com o requerimento do exequente, sendo o devedor intimado para cumprir a sentença (NCPC, arts. 515 e seguintes).

O segundo é destinado ao cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou não fazer, podendo o juiz, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente (NCPC, art. 536 e seguintes).

 

A importância desse entendimento cresce em razão da recente Reforma Trabalhista realizada pela Lei 13.467/2017, tendo em vista que alterou a redação do art. 878 da CLT. Tal dispositivo permitia a execução da sentença/acórdão de ofício pelo Juízo Trabalhista. Com a alteração da CLT, passa-se a exigir requerimento da parte interessada. O magistrado somente poderá proceder de ofício se a parte interessada não estiver assistida por advogado.

O entendimento esposado pelo doutrinador Carlos Henrique Bezerra Leite, embora anterior à Reforma Trabalhista, permite afirmar que, nos casos de sentença cuja obrigação seja de fazer/não fazer, o magistrado deverá aplicar subsidiariamente o CPC (art. 769 da CLT e 15 do CPC) e efetivar a tutela de ofício, conforme dispõe o art. 536 do CPC, como nos casos de reintegração do empregado estável, reinclusão do trabalhador no plano de saúde, anotação da CTPS e outras obrigações de fazer/não fazer.

 No mesmo sentido entende o Professor Felipe Bernardes Rodrigues (2018, p. 961). Para o eminente doutrinador:

No sistema do Código de Processo Civil, só há necessidade de requerimento do exequente para deflagrar o cumprimento de sentença condenatória ao pagamento de prestação pecuniária (art. 513.§1º). No caso de obrigações não pecuniárias, o CPC estabelece a possibilidade da prática de atos executivos de ofício pelo juiz (arts. 536, caput, e 538, caput).

 

 Expostos os conceitos acima, afirma-se que o responsável principal para responder pelos créditos trabalhistas é o empregador, pois beneficiário da prestação de serviços. Conforme o art. 2º da CLT, o empregador assume os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

Essa responsabilidade decorre da assunção dos riscos do empreendimento ou do trabalho, pois a ordem justrabalhista impõe exclusivamente ao empregador, em contraponto aos interesses obreiros oriundos do contrato pactuado, conforme Mauricio Godinho Delgado (2017).  Diante disso, as ações judiciais trabalhistas são ajuizadas em face do empregador seja pleiteando o reconhecimento do descumprimento obrigacional ou a execução de título extrajudicial.

Observa-se também a redação do art. 779 do CPC, elencando uma série de legitimados para a execução, dentre eles, o devedor, o espólio, o novo devedor que assume a obrigação, com consentimento do credor, o fiador, o responsável titular do bem e o responsável tributário.

            Diante disso, faz-se necessário o estudo sistemático da legitimidade para figurar no polo passivo da execução trabalhista para além do empregador que, em regra, é o devedor principal.

 

2.1 GRUPO ECONÔMICO

Maurício Godinho Delgado (2017, p. 465) define grupo econômico:

A figura resultante da vinculação justrabalhista que se forma entre dois ou mais entes favorecidos direta ou indiretametne pelo mesmo contrato de trabalho, em decorrência de existir entre esses entese laços de direção ou coordenação em face das atividades industriais, comerciais, agro industriais ou de qualquer natureza econômica.

Portanto, o grupo econômico decorreria da subordinação de uma empresa a outra no que tange à organização dos seus fatores da produção (grupo econômico vertical) ou da simples atuação em conjunto a fim de alcançarem objetivo comum.

Nesse contexto, embora seja pacífico de que não há necessidade de prova documental, registrou ou homologação de qualquer órgão público para que seja provada a existência do grupo econômico, havia uma celeuma quanto à sua caracterização no caso da atividade urbana.

Tal divergência decorria da antiga redação do art. 2º da CLT, visto que alguns defendiam a existência apenas do grupo econômico por subordinação (quando uma empresa se encontra sob direção, controle ou administração de outra).

Entretanto, a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) alterou essa sistemática reconhecendo expressamente o grupo econômico por subordinação (vertical/hierárquico) e o grupo econômico por coordenação (horizontal), como se verifica pela expressão “mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico” – art. 2º §2º da CLT.

Diante disso, verifica-se que no grupo econômico por subordinação há uma empresa controladora e outra controlada, já no grupo econômico por coordenação há reunião de interesses para execução de determinado empreendimento, tendo ou não controle ou administração em comum, conforme entendimento de Vólia Bomfim Cassar (2015, p. 440).

Não obstante as circunstâncias acima, a Lei 5.889/1973 (Lei do trabalhador rural) reconhecia o grupo econômico por coordenação, sendo aplicado por analogia ao trabalhador urbano por parte da doutrina e jurisprudência.

Nesse cenário, percebe-se que a própria lei estabelece a legitimidade para que outras empresas participantes do grupo econômico sejam responsabilizadas pelos créditos trabalhistas. No mesmo sentido, parte da doutrina e jurisprudência majoritária defende tratar-se de empregador único, ou seja, qualquer empresa do grupo econômico poderá ser beneficiada da prestação de serviços do trabalhador e responsabilizada pelos créditos trabalhistas – Súmula 129 do C.TST.

Importante ainda ressaltar a controvérsia acerca do momento em que esta empresa pertencente ao grupo econômico será incluída no polo passivo, tendo em vista que a antiga Súmula 205 do C.TST evidenciava o entendimento de que a empresa participante do  grupo econômico deveria participar da relação processual como reclamado e constar no título executivo judicial, a fim de que também fosse responsável pela execução.

Entretanto, esse entendimento restou superado, de maneira que, atualmente prevalece a tese de que a empresa pertencente ao grupo econômico poderá ser incluída na execução, independentemente de não ter participado da fase de conhecimento. Entende-se que a defesa foi realizada pela reclamada (também pertencente ao grupo econômico). Diante disso, houve o cancelamento da Súmula 205 do C.TST.

O tema volta ao debate em razão da entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil. A previsão do art. 513 §5º do NCPC exige a presença do fiador, do coobrigado ou do corresponsável no processo de conhecimento, vedando que a execução atinja quem não foi parte. Nesse sentido se manifesta importante corrente doutrinária, como destaca Otávio Calvet no Seminário sobre a Reforma Trabalhista realizado pela Escola Nacional de Formação de Magistrados do Trabalho em 28/11/2017.

Contudo, é possível defender a manutenção do entendimento prevalecente no Processo do Trabalho, tendo em vista a tese de que as empresas do grupo econômico na verdade se caracterizam como empregador único, portanto, seria o próprio empregador e não um fiador, coobrigado ou corresponsável. Trata-se do próprio empregador, portanto, legitimado direto.

 

2.2 CONSÓRCIO DE EMPREGADORES

   A figura do consórcio de empregadores teve origem, no Brasil, no âmbito do trabalho rural. Segundo Gustavo Felipe Barbosa Garcia (2017 p. 196), em 1997, no Paraná, um grupo de produtores rurais assinaram termo de ajuste de conduta comprometendo-se a somente contratar seus próprios trabalhadores para as colheitas. Tal situação levou esses produtores a conseguirem uma única matrícula perante o INSS.

Diante dessa realidade, o Ministério do Trabalho reconheceu a importância do instituto e resolveu positivar na Portaria 1964/1999 essa nova forma de contratação, conceituando consorcio de empregadores como união de produtores rurais, pessoas físicas, com a finalidade única de contratar empregados rurais. Após isso, a Lei Previdenciária (Lei 8212/91) também elencou alguns deveres do consorcio e responsabilidade solidária.

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Para Mauricio Godinho Delgado (2017 p, 500)

Em 2001, o novo instituto ganhou reconhecimento previdenciário, por meio da Lei n. 10.256, de 9.7.01, que promoveu alterações na Lei n. 8.212, de 1991 e outras do Direito de Seguridade Social. Em conformidade com o novo diploma, o Consórcio Simplificado de Empregadores Rurais (denominação utilizada no referido texto legal) foi equiparado ao empregador rural pessoa física, para fins previdenciários. Para a nova lei, a figura é formada “pela união de produtores rurais pessoas físicas, que outorgar a um deles poderes para contratar, gerir e demitir trabalhadores para prestação de serviços, exclusivamente, aos seus integrantes, mediante documento registrado em cartório de títulos e documentos” (art. 25-A, Lei n. 8.212/91, conforme redação da Lei n. 10.256, de 9.7.2001)

A doutrina passou a defender o instituto, pois protege o trabalhador rural que possuirá um vinculo empregatício e atende aos interesses dos produtores rurais pessoas físicas, pois permite que diversos produtores rurais contratem o mesmo trabalhador, sendo as despesas do contrato rateadas entre os empregadores. Afasta-se a informalidade da contratação e por consequência melhora a condição do trabalhador, pois não mais será um trabalhador eventual ou sem contrato.

Conforme o entendimento de Gustavo Filipe Barbosa Garcia (2017, p. 196):

No referido pacto, os produtores rurais responsabilizam-se solidariamente pelas obrigações trabalhistas e previdenciárias decorrentes da contratação dos trabalhadores comuns, devendo constar, ainda, a identificação de todos os consorciados (nome completo, CPF, documento de identidade, matrícula CEI individual, endereço e domicílio) e os endereços das propriedades rurais onde os trabalhadores rurais exercerão as atividades (Portaria 1.964/1999, art. 3.º, §2.º).

Como confirma e acrescenta o art. 25-A, § 1.º, da Lei 8.212/1991, o documento (a ser registrado em cartório de títulos e documentos) de outorga, a um dos produtores, de poderes para contratar, gerir e demitir trabalhadores para prestação de serviços, exclusivamente, aos seus integrantes, deverá conter a identificação de cada produtor, seu endereço pessoal e o de sua propriedade rural, bem como o respectivo registro no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA ou informações relativas a parceria, arrendamento ou equivalente e a matrícula no Instituto Nacional do Seguro Social – INSS de cada um dos produtores rurais.

 

Com efeito, as regras para caracterização do consorcio de empregadores exigem a formalização mediante documento registrado em cartório e que um dos empregadores seja eleito para anotar os dados do contrato na CTPS do trabalhador, embora como já afirmado acima, existe solidariedade dual, pois o empregado prestará serviço a todos os empregadores pertencentes ao consorcio e estes são responsáveis pelos creditos de todos os trabalhadores.

De fato, embora o art. 25 – A da Lei 8.212/91, acrescido pela Lei 10.256/2001 mencione expressamente que o consórcio de empregadores é formado pela união de produtores rurais pessoas físicas, o avanço do instituto, sua finalidade e beneficio ao trabalhador permite afirmar que não se limita a atividade rural. A doutrina defende sua aplicação ao trabalhador urbano e até domestico, pois traz o trabalhador informal para a formalidade, mediante a assinatura de sua CTPS, participação em uma categoria, possibilidade de ter direito às normas coletivas por acaso existentes e outros direitos advindos do seu registro formal como empregado. Ademais, a existência de diversos empregadores aumenta a solvabilidade do crédito trabalhista.

 

2.3 SUCESSÃO TRABALHISTA

Existe debate doutrinário acerca da nomenclatura do instituto que prevê a substituição do titular da atividade econômica. Parte da doutrina entende que a nomenclatura correta seria sucessão de empregadores. Outros defendem tratar-se de sucessão trabalhista e alteração subjetiva do contrato. Há ainda quem entenda que o correto seria sucessão de empresários.

Sem adentrar no embate quanto à denominação, é fato que a CLT tratou do empregador como sendo a empresa – art. 2º. Diante do exposto, defende-se que a atividade econômica é o empregador, embora a personalidade jurídica pertença ao titular daquele que exerce a atividade econômica. Defende-se, então, que CLT preferiu atribuir à atividade a característica de empregador a fim de proteger os empregados, independentemente de quem esteja na titularidade da atividade econômica.

Percebe-se que tal entendimento favorece os trabalhadores, pois se assim não fosse, a substituição do titular da atividade poderia dar margem a que este pretendesse se eximir de responsabilidade em relação aos trabalhadores que laboravam antes de assumir a titularidade da empresa.

Para Volia Bomfim Cassar (2015, p. 455):

Ora, se a lei preferiu despersonalizar o empregador, para afirmar expressamente que o empregador é a empresa, assumindo uma ficção legal para proteger o trabalhador, de acordo com o art. 2º da CLT, significa dizer que a sucessão não pode ser nem de  empresas, de empregadores ou de estabelecimento e sim de titulares, de exploradores da atividade econômica, de detentores da empresa ou de empresários.

Se o empregado está vinculado à empresa e não aos seus sócios ou à sociedade que a detém, quando um empreendimento é transferido de um para outro titular e a empresa continua a mesma, os contratos de empregos são mantidos intactos e o sucessor responde por todos eles.

 

Diante disso, a sucessão trabalhista pode ser conceituada como o instituto por meio do qual se transfere a titularidade da atividade econômica, respondendo o adquirente por todos os direitos trabalhistas ainda que referentes a período anterior à assunção. Nesse sentido o art. 448 da CLT é expresso ao asseverar que a mudança na propriedade não afeta os contratos de trabalho. Diante disso, é possível afirmar que a transferência da unidade econômica é requisito para a caracterização da sucessão.

Destaca-se que o fundamento para a sucessão trabalhista é o princípio da intangibilidade objetiva do contrato de trabalho, da despersonalização e impessoalidade do empregador, do princípio da continuidade do contrato de trabalho. Ressalta-se, entretanto, que não há sucessão de empregadores em relação ao empregado doméstico, tendo em vista que não se trata de empresa (atividade organizada com fins econômicos).

Com efeito, não há dúvidas de que o novo titular assume a responsabilidade pelos débitos anteriores relativos aos contratos em vigor. A celeuma versa acerca do encargo em relação aos contratos que se extinguiram antes da alienação da titularidade da empresa.

A doutrina clássica defende que somente existirá a sucessão caso haja continuidade da prestação de serviços ao novo empregador, ou seja, se o trabalhador permaneceu prestando serviços após a transferência da propriedade.

Por outro lado, modernamente tem se entendido pela desnecessidade de continuidade na prestação de serviços. Nesse sentido Maurício Godinho Delgado (2017, p 482):

A nova vertente do instituto sucessório trabalhista insiste que o requisito essencial à figura é tão só a garantia de que qualquer mudança intra ou interempresarial não venha afetar os contratos de trabalho – independentemente de ter ocorrido a continuidade da prestação laborativa. Isso significa que qualquer mudança intra ou interempresarial significativa, que possa afetar os contratos empregatícios, seria hábil a provocar a incidência dos arts. 10 e 448 da CLT.

 

Da mesma forma, a art. 10 da CLT estabelece que a alteração na estrutura jurídica da empresa também não afeta os contratos de trabalho. Tais casos se referem às figuras previstas no direito empresarial, conforme Fabio Ulhoa Coelho (2011):

- Fusão: consiste na união de duas ou mais sociedades, para dar nascimento a uma nova

- Cisão: transferência de parcelas do patrimônio social para uma ou mais sociedades, já existentes ou constituídas na oportunidade.

- Transformação: operação de mudança de tipo societário: limitada torna-se anônima ou vice-versa.

- Incorporação: operação pela qual uma sociedade absorve outra ou outras, as quais deixam de existir.

Nesse contexto de sucessão de empregadores é importante destacar as figuras da Privatização e da Estatização. A primeira, conforme Volia Bomfim Cassar (2015), ocorre quando uma empresa estatal é alienada e adquirida por uma empresa privada. No Brasil, tal fenômeno ocorreu de forma acentuada na década de 90. De acordo ainda com a doutrinadora a jurisprudência majoritárias, há sucessão, ainda que os trabalhadores tenham ingressado sem concurso público.

Na Estatização o fenômeno é inverso. Ocorre quando a atividade passa a ser titularizada pelo Estado. Defende-se que não há sucessão tendo em vista a necessidade de realização de concurso público. Diante disso, os trabalhadores necessitariam se submeter à regra constitucional antes da contratação.

Necessário pontuar acerca da situação peculiar relativa aos cartórios extrajudiciais (art. 236 da CF e Lei 8.935/94). Trata-se de atividade delegada pelo Estado a aquele que foi aprovado em concurso público. O titular presta o serviço mediante delegação do Estado. Portanto, se não foi beneficiário da atividade do trabalhador cujo contrato foi rescindido antes de sua posse como oficial, não responde pelos débitos anteriores, vez que assume apenas após aprovação no concurso público.

Entretanto, caso o contrato do trabalhador permaneça, o novo titular responde na forma da sucessão por todos os encargos trabalhistas. Registre-se entendimento contrário, defendendo tratar-se de verdadeira unidade econômica, sendo aplicável os arts. 10 e 448 da CLT. Nesse sentido Volia Bomfim Cassar (2015).

Outro caso já julgado pelo TST foi relativo ao desmembramento de Municípios. Neste caso, a jurisprudência se firmou no sentido de que não há sucessão, cada ente político irá responder pelo período em que foi beneficiário da atividade laborativa. Defende-se que os Municípios são pessoas jurídicas de direito público, portanto, a sucessão referente aos entes da Administração Pública não teriam a mesma natureza contratual da sucessão trabalhista.

Por fim, é necessário ainda destacar a questão específica das empresas em Recuperação Judicial e Falência. O tema é regulado pela Lei 11.101/2005, cujo art. 141, II, assevera expressamente não haver sucessão trabalhista no caso de aquisição de empresa ou filial na realização do ativo da massa falida.

Manifesta-se quanto ao tema Gustavo Felipe Barbosa Garcia (2017, p. 199) nos seguintes termos:

Como se nota, o acima transcrito art. 141, II, afasta a existência de sucessão, inclusive para efeitos trabalhistas, quanto ao arrematante da empresa ou filiais, na realização do ativo (mais especificamente na alienação do ativo), no processo de falência.

Tanto é assim que os empregados do devedor devem ser admitidos mediante “novos contratos de trabalho”, sem responsabilização do arrematante, quanto às obrigações do contrato anterior (§2º).

 

Dessa forma, trata-se de regra especial que afastaria a hipótese geral de sucessão prevista nos arts. 10 e 448 da CLT, especificamente prevista para a circunstância de falência da empresa.

Quanto à hipótese de Recuperação Judicial, o art. 60 p. único da mesma lei estabelece expressamente apenas a inexistência de sucessão quanto aos débitos comuns, inclusive tributários, remetendo ao §1º do art. 141 (casos em que excepcionalmente pode haver sucessão). Diante disso, parte da jurisprudência passou a reconhecer a sucessão em alienações realizadas em Recuperação Judicial, responsabilizando o adquirente.

A matéria foi submetida ao STF quanto do julgamento da ADI 3934-2, manifestando-se pela ausência de sucessão trabalhista também na hipótese de Recuperação Judicial. Portanto, é possível afirmar que, nos casos de Recuperação Judicial e Falência, aqueles que adquirem as unidades produtivas alienadas nos respectivos processos judiciais não serão responsabilizados pelos créditos trabalhistas referentes ao período anterior à aquisição, o que de fato, incentiva e facilita o processo de realização dos ativos de tais empresas submetidas à Recuperação Judicial e Falência.

 

2.4 TERCEIRIZAÇÃO

    A terceirização é definida como a transferência de certas atividades periféricas do tomador de serviços, passando a ser exercidas por empresas distintas e especializadas, conforme Gustavo Felipe Barbosa Garcia (2017, p. 233).

   Trata-se de instituto de direito material por meio do qual as empresas tomadoras de serviço delegam atividades a serem realizadas por outras empresas, seja dentro ou fora do seu ambiente de trabalho. O trabalhador presta serviço ao tomador, porém é empregado da empresa prestadora de serviço.

A terceirização é muito defendida pelos estudiosos da ciência da administração sob o argumento de que possibilita que a empresa concentre seus esforços nas atividades principais, pois as atividades periféricas serão realizadas por empresas contratadas – descentralização empresarial.

     Historicamente, no Brasil, tal fenômeno teve início na Administração Pública por meio do Decreto-Lei 200/67 que estabeleceu diretrizes para a Reforma Administrativa com objetivo de descentralização e controlar o crescimento da máquina Administrativa – a execução das atividades da Administração deveriam ser amplamente descentralizada.

     No setor privado a Lei 6.019/74, em sua redação original, tratou apenas sobre o trabalho temporário e a Lei 7.102/83 regulamentou a atividade dos vigilantes e estabeleceu a terceirização na atividade bancária em caráter permanente.

      Não havia uma lei geral tratando acerca da possibilidade ou limites da terceirização no Brasil. Diante disso, o Poder Judiciário, interpretando a Constituição Federal e as normas internacionais (Convenções da OIT) e outros diplomas normativos, construiu entendimento de que não era possível a terceirização desenfreada. Nesse sentido o art. 1º, III e IV da CF e o Anexo I “a” da Constituição da OIT e seu anexo (Declaração da Filadélfia), para quem o trabalho não é mercadoria.

            De acordo com o eminente Maurício Godinho Delgado (2017, p. 455):

Não obstante esse pequeno grupo de normas autorizativas da terceirização, tal processo acentuou-se e generalizou-se no seguimento privado da economia dnas décadas seguintes a 1970 – em amplitude e proporção muito superior às hipóteses permissivas contidas nos dois diplomas acima mencionados. Tais circunstâncias induziram à realização de esforço hermenêutico destacado por parte dos tribunais do trabalho, na busca da compreensão da natureza do referido processo e, afinal, do encontro da ordem jurídica a ele aplicável.

 

     A interpretação do C.TST, consubstanciada na Súmula 331, entendia que o ordenamento jurídico limitava a terceirização. Portanto, não haveria possibilidade de contratação de trabalhadores terceirizados para atuação na atividade fim. A permissão, até em razão da Lei 7.102/83 seria apenas para as atividades periféricas, ou seja, atividades que não se constituem no objeto social da empresa, tais como limpeza e conservação.

      Diante desse quadro, firmou-se o entendimento de que a terceirização em atividade-fim era ilícita, acarretando o vínculo empregatício diretamente com a tomadora, salvo se esta fosse entidade da Administração Pública, em razão da regra do concurso público. Em tais circunstâncias, a tomadora era responsável solidariamente. Já em casos de terceirização nas atividades periféricas (terceirização lícita), a responsabilidade da empresa tomadora dos serviços se dava de maneira subsidiária à responsabilidade da empregadora.

     Existia muita crítica a esse entendimento jurisprudência dominante. Para aqueles que discordavam da posição do C.TST, a jurisprudência havia criado uma responsabilidade subsidiária para a empresa tomadora de serviços sem amparo de lei.

      Ressalta-se que o C.TST efetuou mudanças na redação do enunciado da Súmula 331 após o Supremo Tribunal Federal julgar procedente a  ADC 16 confirmando a constitucionalidade do art. 71 da Lei 8.666/93, cuja ementa segue transcrita:

EMENTA: RESPONSABILIDADE CONTRATUAL. Subsidiária. Contrato com a administração pública. Inadimplência negocial do outro contraente. Transferência consequente e automática dos seus encargos trabalhistas, fiscais e comerciais, resultantes da execução do contrato, à administração. Impossibilidade jurídica. Consequência proibida pelo art., 71, § 1º, da Lei federal nº 8.666/93. Constitucionalidade reconhecida dessa norma. Ação direta de constitucionalidade julgada, nesse sentido, procedente. Voto vencido. É constitucional a norma inscrita no art. 71, § 1º, da Lei federal nº 8.666, de 26 de junho de 1993, com a redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995.

 

    Entretanto, como se infere do julgamento do STF, não houve exclusão total da responsabilidade estatal, apenas foi afastada a responsabilidade objetiva, direta, com base da tese de que foi beneficiada pelo serviço prestado pelo trabalhador. Afastou-se também a culpa in eligendo, nos casos de realização da licitação, tendo em vista a adoção dos procedimentos legais. No dizer de Maurício Godinho Delgado (2017, p. 515):

Com a decisão do STF na ADC 16, prolatada em 24.11.2010, afastando a responsabilidade objetiva do Estado em casos de terceirização (além da responsabilidade por culpa in eligendo, desde que observado o processo licitatório), o Tribunal Superior do Trabalho promoveu ajustes na Súmula 331, direcionando o item IV da súmula para o conjunto da economia e da sociedade, ao passo que o novo item V aponta estritamente para a peculiaridade das entidades estatais.

 

    O tema retornou ao cenário político e consequentemente jurídico em 2017, quando ocorreram intensos debates no âmbito do Poder Legislativo quando da análise dos Projetos de Lei que antecederam as Leis 13.429/2017 e 13.467/2017.

    A primeira lei acima tratou de diversas alterações na Lei 6.019/1974, entretanto, não trouxe modificações quanto à terceirização propriamente dita, prevendo a delegação a terceiros de serviços determinados e específicos, o que já era possível no regime anterior. Não obstante, significou um marco legal para a previsão da responsabilidade subsidiária da empresa tomadora, embora já pacificado na jurisprudência, a legislação carecia de um fundamento legal específico. Conforme Maurício Godinho Delgado e Gabriela Delgado (2017, p 207):

Por fim, o novo § 5º do art. 5º-A da Lei n. 6.019/74 se reporta à responsabilidade subsidiária da empresa tomadora de serviços (ou "empresa contratante", dentro da nova linguagem legal) pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer a prestação de serviços, sem prejuízo da responsabilidade solidária criada pelo art. 31 da Lei n. 8.2 1 2/1991, no caso de verbas de caráter previdenciário.

 

     A segunda lei supramencionada (Lei 13.467/2017 – Reforma Trabalhista), por sua vez alterou significativamente o instituto por meio da inserção expressa de dispositivo que permite a terceirização na atividade-fim da empresa contratante, sendo mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante:

Art. 4o-A.  Considera-se prestação de serviços a terceiros a transferência feita pela contratante da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal, à pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços que possua capacidade econômica compatível com a sua execução.   (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)

Art. 4o-C.  São asseguradas aos empregados da empresa prestadora de serviços a que se refere o art. 4o-A desta Lei, quando e enquanto os serviços, que podem ser de qualquer uma das atividades da contratante, forem executados nas dependências da tomadora, as mesmas condições

Art. 5o-A.  Contratante é a pessoa física ou jurídica que celebra contrato com empresa de prestação de serviços relacionados a quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)

§ 5o  A empresa contratante é subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer a prestação de serviços, e o recolhimento das contribuições previdenciárias observará o disposto no art. 31 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991.        (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)

 

     Diante do exposto, verifica-se a parcial superação do entendimento jurisprudencial no que tange à impossibilidade de terceirização generalizada. Porém, conforme já era de conhecimento da comunidade jurídica, o Poder Legislativo encampou a tese do C.TST ao estabelecer a responsabilidade subsidiária da empresa tomadora dos serviços. Trata-se de responsabilidade objetiva cujo pressuposto é apenas o inadimplemento do empregador. A Lei 6.019/1974 não prevê existência de culpa ou dolo para a responsabilização da empresa que utiliza a intermediação de mão de obra ou a terceirização para responsabilização pelos débitos das empresas de trabalho temporário ou prestadoras de serviços.

 

2.5 RESPONSABILIDADE DO SÓCIO

 O ordenamento jurídico admite a responsabilização do sócio pelas dívidas societárias. Nesse contexto, devem-se diferenciar as hipóteses de responsabilização direta do sócio, nos casos em que a lei atribui responsabilidade solidária. Em tais casos seque é necessária a desconsideração da personalidade jurídica da sociedade empresária a fim de atingir o patrimônio pessoal dos sócios.

  Nesse sentido leciona Volia Bomfim Cassar (2015, p. 434/437):

A teoria da penetração não deve ser confundida com outras formas de responsabilidade dos sócios no direito empresarial. Quando a lei responsabiliza gerentes, administradores, controladores ou sócios ela já está autorizando o comprometimento do patrimônio particular do sócio, seja de forma subsidiária â sociedade, seja de forma isolada ou solidária.

 

Diante desse quadro, é possível elencar diversas hipóteses de responsabilidade ilimitada junto com a sociedade:

  • o sócio comanditado na comandita simples – arts. 1.045/1.051 do Código Civil;
  • o sócio ostensivo na sociedade em conta de participação – arts. 991/996 do Código Civil;
  • todos os sócios na sociedade em nome coletivo – arts. 1.039/1.044 do Código Civil;
  • todos os sócios na sociedade em comum (sociedade de fato ou irregular) – arts. 986/990 do Código Civil;
  • todos os sócios na sociedade simples ou simples pura – arts. 997/1.038 do Código Civil;
  • o diretor-acionista na comandita por ações – arts. 1.090/1.092 do Código Civil;
  • o administrador na sociedade limitada, quando não houver cláusula expressa para aplicação das regras das sociedades anônimas – arts. 1.052/1.087 do Código Civil
  • a diretoria na S/A, quando o diretor-presidente praticar atos ilegais ou com extravagância do objeto social arts. 158, II, §§ 1º e 2º; 233 e 239, parágrafo único, todos da Lei nº 6.404/76 c/c art. 50 do CC.

 

De acordo com Volia Bomfim Cassar, todos os sócios acima possuem responsabilidade ilimitada com a sociedade, sendo que os últimos três casos, a responsabilidade seria por desvio de finalidade, ato ilícito e abuso dos administradores.

De fato, nas hipóteses supra, a própria lei já estabelece a responsabilidade ilimitada, e poderão ser condenados diretamente e solidariamente com a empresa pelo passivo trabalhista.

A renomada doutrinadora explica ainda (2015, p. 435) que:

Assim, quando o diretor ou acionista controlador exerce seu poder de forma abusiva e desvia a sociedade para fim estranho ao seu objeto social é possível responsabilizá-lo pessoalmente e comprometer seu patrimônio particular (art. 117, § 1º, e art. 158 da Lei nº 6.404/76). Dentro de um rigor técnico, este ato não foi de desconsideração da personalidade jurídica e sim de aplicação de regra geral de direito material, de caráter cogente.

 

Por outro lado, a legislação elenca diversos casos em que a responsabilidade do sócio será limitada:

  • o sócio comanditário na comandita simples – arts. 1.045/1.051 do Código Civil;
  • participante na sociedade em conta de participação – arts. 991/996 do Código Civil;
  • o quotista na sociedade limitada, com capital integralizado – arts. 1.052/1.087 do Código Civil;
  • os acionistas na S/A – arts. 158, II, §§ 1º e 2º; 233; 239, parágrafo único, todos da Lei nº 6.404/76.

Embora nesses casos a responsabilidade seja limitada ao capital integralizado, é possível que os sócios respondam juntamente com a sociedade.

Deve-se destacar que vigora no Direito do Trabalho a assunção dos riscos do empreendimento pelo empregador, conforme art. 2º da CLT. Dessa forma, apesar da autonomia patrimonial da sociedade empresária, assegura-se a responsabilidade subsidiária dos sócios da entidade, caso não sejam encontrados bens da sociedade suficientes para quitação dos débitos trabalhistas.

 

2.5.1 Procedimento para responsabilização do sócio – Incidente da Desconsideração da Personalidade Jurídica

O Código Civil de 1916 não tratava da desconsideração da personalidade jurídica. Inicialmente vigorava a autonomia completa e separação total da pessoa jurídica em relação aos sócios. Apenas algumas decisões judiciais responsabilizavam os sócios pelas dívidas das empresas, ainda que sem fundamento legal específico. No âmbito do direito comum apenas com as Leis 4.591/64 e o CTN passou-se a responsabilizar os sócios legalmente por condutas advindas da empresa. Posteriormente o CDC permitiu ao Juiz desconsiderar a personalidade jurídica quando houver prejuízo ao consumidor, conforme Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2012, p 459/460).

Embora até o CPC/2015 não houvesse previsão legal acerca do procedimento necessário para redirecionamento da execução a fim de atingir os bens dos sócios, a Consolidação dos Provimentos da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho (arts. 78/79) já estabelecia procedimentos a serem adotados pelos magistrados trabalhistas, com objetivo de padronização e observância do contraditório e ampla defesa dos sócios.

Com o Novo Código de Processo Civil em 2015 surge o instituto (art. 133 a 137) com regras para desconsideração da personalidade jurídica da sociedade. Registre-se que o entendimento inicial do C.TST foi por sua aplicação ao processo do trabalho (IN 39/2016). Embora tal Instrução Normativa não se constituísse de caráter vinculante, demonstrava o entendimento predominante no âmbito da Corte Superior Trabalhista.

  Superando a discussão doutrinária que surgia acerca da aplicação ou não do incidente ao processo do trabalho, tendo em vista a ausência de poder vinculante da IN 39/2016 do TST, a Lei 13.467/2017, trouxe para dentro da CLT expressamente o incidente, determinando a aplicação do incidente da desconsideração da personalidade jurídica na redação do art. 855 – A da CLT.

   Portanto, a partir da entrada em vigor da Reforma Trabalhista, encerra-se a discussão quanto à aplicabilidade do instituto ao processo do trabalho.

  Importante ainda destacar as teorias acerca da desconsideração da personalidade jurídica. Para a denominada teoria maior os requisitos seriam o desvio de finalidade, a confusão patrimonial ou abuso de direito. Fundamenta-se na redação do art. 50 do Código Civil. Outra teoria, a menor, entende que o mero inadimplemento do débito justifica o redirecionamento da execução em face dos sócios, independentemente da existência de fraudes ou vícios na gestão empresarial. Nesse sentido o art. 28 do CDC.

 No dizer de Cristiano Farias e Nelson Rosenvald (2012, p. 453 e 454):

Em síntese, a teoria maior exige a presença de um requisito específico para que se efetive a desconsideração, e com isso, seja possível alcançar o patrimônio do sócio por dívida da pessoa jurídica (...).

De outra banda, a teoria menor trata como desconsideração da personalidade jurídica toda e qualquer hipótese de comprometimento do patrimônio pessoal do sócio por obrigação da empresa. Fundamenta seu cerne no simples prejuízo do credor para afastar a autonomia patrimonial da pessoa jurídica.

 

  A teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica é a regra, aplicável a todos os casos em que se pretenda responsabilizar os sócios pelas dívidas da sociedade, exigindo-se a prova da conduta irregular dos sócios, seja por desvio de finalidade, confusão patrimonial ou abuso da personalidade jurídica. Entretanto, nos casos expressamente previstos em lei, como no direito do consumidor e no direito ambiental, bem como por analogia ao credor consumidor hipossuficiente, quanto se tratar de créditos trabalhistas, não se exige a prova da conduta do sócio. Apenas o inadimplemento justifica a desconsideração.

 

2.5.2  Espécies de desconsideração da personalidade jurídica

É possível diferenciar as espécies de desconsideração da personalidade jurídica em função da pessoa que terá seu patrimônio constrito:

  • Desconsideração direta – é a desconsideração clássica, por meio da qual é possível atingir os bens particulares dos sócios por dívidas da empresa.
  • Desconsideração inversa – ocorre quando o sócio pretende ocultar seu patrimônio particular na pessoa jurídica. O sócio é devedor e transfere seu patrimônio para a pessoa jurídica. O tema foi tratado pelo Enunciado 283 da Jornada da Justiça Federal: É cabível a desconsideração da personalidade jurídica denominada "inversa" para alcançar bens de sócio que se valeu da pessoa jurídica para ocultar ou desviar bens pessoais, com prejuízo a terceiros.
  • Desconsideração expansiva – parte da doutrina cita a desconsideração expansiva, a qual tem por objeto atingir a personalidade do sócio eventualmente oculto e que, não raramente, encontra-se escondido na empresa, conforme entendem Cristiano Farias e Nelson Rosenvald.

 

Independentemente da espécie de desconsideração da personalidade jurídica, o instituto é amplamente aplicável ao processo do trabalho, a fim de se alcançar a efetividade da tutela jurisdicional.

 

2.5.3  Responsabilidade dos sócios retirantes

 O último aspecto da responsabilidade patrimonial na execução trabalhista a ser abordado é quanto ao sócio retirante, tema recentemente tratado pelo Poder Legislativo por meio da Lei 13.467/2017, que incluiu o art. 10-A à CLT, prevendo expressamente a responsabilidade subsidiária do sócio retirante, sendo importante conhecer o cenário legislativo anterior e quais as teses acerca da responsabilidade do sócio retirante.

  O Código Civil em seu art. 1.032 já estabelecia uma limitação temporal à responsabilidade do sócio que se retirava da sociedade – até 2 anos após a averbação de sua retirada da sociedade.

  Não obstante essa previsão legal, havia celeuma na doutrina e jurisprudência, pois uma linha defendia a responsabilidade dos sócio independentemente da averbação de sua exclusão da sociedade, fundamentando na inaplicabilidade do dispositivo civilista ao direito do trabalho, sob o fundamento de que a responsabilidade dos sócios retirantes não se limita aos dois anos previstos no art. 1.032 CC . Outra parte da doutrina e da jurisprudência defendia a aplicação do art. 1.032 do Código Civil:

  Perdurava, portanto, a controvérsia e insegurança jurídica do sócio quanto a responder ou não pelos créditos quanto já excluído da sociedade. Por outro lado, o trabalhador, não sabia se poderia contar com a garantia patrimonial desse sócio retirante.

 Nesse cenário conflituoso, o Poder Legislativo incluiu na CLT dispositivo específico tratando do tema e limitando temporariamente a responsabilidade do sócio retirante. A referida Lei teve a virtude de prever expressamente a responsabilidade patrimonial dos sócios e estabelecendo uma ordem de preferência.

  Para Maurício Godinho Delgado “Com o advento do novo art. 10-A da CLT, essa responsabilidade subsidiária passou a contar, ademais, com dispositivo expresso no interior da própria Consolidação das Leis do Trabalho”.

  Portanto, com a Reforma Trabalhista pacifica-se a responsabilidade do sócio retirante, que para o doutrinador Felipe Bernardes Rodrigues, já era o entendimento majoritário antes da Reforma Trabalhista (2018).

Diante disso, o sócio que sai da sociedade não se exime das dívidas da empresa, pois ficará vinculado até dois anos após a averbação da retirada na Junta Comercial. Importante destacar que somente se isentará se efetivamente averbar a exclusão na Junta Comercial, pois essa medida dá publicidade para terceiros.

     Outro ponto relevante é quanto à contagem desses dois anos quando já houver sido ajuizado processo trabalhista em face da sociedade empresária. Nesse sentido defende Maurício Godinho Delgado e Gabriela Neves Delgado (2017, p 110)

Segundo o novo preceito normativo, o sócio retirante manter-se-á responsável nas " ações ajuizadas até dois anos depois de averbada a modificação do contrato" (caput do art. 1 0-A). Para o dispositivo da CLT, não importa a data de inserção do sócio no pólo passivo do processo judicial contra a entidade societária, mesmo que essa inserção aconteça vários anos após o início desse processo trabalhista; o que importa é que a respectiva ação seja ajuizada, para fins de futura e potencial responsabilização do sócio até, no máximo, "dois anos depois de averbada a modificação do contrato" (caput do art. 10-A, in fine, CLT).

    Portanto, caso o ajuizamento se dê antes de decorrido esse prazo, ainda que o redirecionamento da execução ocorra apenas muitos anos depois, o sócio não se isentará da responsabilidade.

 

CONCLUSÃO

O presente artigo procurou abordar o estudo da execução trabalhista em seu aspecto subjetivo passivo, cuja responsabilização, em regra, será do empregador que se aproveitou do labor, da energia de trabalho do empregado. Entretanto, é possível que outras pessoas também sejam responsabilizadas pelos créditos dos empregados. Nesse contexto surgem diversas pessoas jurídicas e físicas que podem ser responsabilizadas.

Nesse cenário, tratou-se do grupo econômico, instituto que sofreu alteração em sua caracterização pela Reforma Trabalhista, mas manteve-se a responsabilidade pela lei que estabelece expressamente a legitimidade para que outras empresas participantes do grupo econômico sejam responsabilizadas pelos créditos trabalhistas. Destacou-se que a jurisprudência já defendia sua caracterização como empregador único.

Posteriormente analisou-se o consorcio de empregadores, sua previsão legal na Lei 8.212/91, acrescido pela Lei 10.256/2001, caracterizado pela união de produtores rurais pessoas físicas. Entretanto, foi visto que a doutrina defende sua aplicação no âmbito do trabalho urbano e doméstico.

Após, abordou-se a responsabilidade pela sucessão trabalhista, cujos contornos se encontram no art. 448 da CLT, asseverando que a mudança na propriedade não afeta os contratos de trabalho e em seguida, verificou-se a responsabilidade pela terceirização, abordando o histórico do instituto e suas recentes alterações promovidas pelas Leis Leis 13.429/2017 e 13.467/2017.

Finalizando o estudo, tratou-se acerca da responsabilidade do sócio, o Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica, criado pelo CPC/2015 e expressamente aplicável ao Processo do Trabalho, cujo objetivo foi estabelecer um procedimento de contraditório antes da execução do sócio pelas dívidas da Pessoa Jurídica, mencionando-se ainda as teorias e espécies de desconsideração e o limite temporal da responsabilidade do sócio retirante.

 

Referências:

BERNARDES, Felipe. Manual de Processo do Trabalho / Felipe Bernardes – Salvador: JusPODIVM, 2018. 1008p.

BOMFIM, Vólia. Direito do trabalho/Volia Bomfim Cassar. – 11ª Ed. ver. e atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015.

COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de direito comercial: direito de empresa/Fábio Ulhoa Coelho. 23. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2011.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho/Maurício Godinho Delgado. 16. Ed. rev. e  ampl. – São Paulo: LTr, 2017.

DELGADO, Maurício Godinho; DELGADO, Gabriela Neves. A Reforma Trabalhista no Brasil: com comentários à Lei 13.467/2017/ Maurício Godinho Delgado, Gabriela Neves Delgado. – São Paulo: LTr, 2017.

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: parte geral e LINDB. 10. ed. Salvador: Jus Podivm, 2012. v. 1.

GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito do trabalho/Gustavo Filipe Barbosa Garcia – 11ª Ed., ver., atual e ampl – Rio de Janerio: Forense, 2017.

LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito processual do trabalho/Carlos Henriqeu Bezerra Leite. 14. Ed. De acordo com o novo CPC – Lei 13.105 de 16-3-2015. São Paulo: Saraiva, 2016.

SCHIAVI, Mauro. Manual de direito processual do trabalho/Mauro Schiavi. – 10 ed. de acordo com o Novo CPC – São Paulo: LTr, 2016

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Sobre o autor
Elionai Mendes Pessoa

Analista Judiciário - Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região.

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