5. CONCLUSÃO
Com a entrada em vigor do Protocolo de Quioto, em fevereiro deste ano, estabeleceu-se um novo mercado, envolvendo a negociação de certificados de emissão reduzida, amplamente conhecidos pela alcunha de "Créditos de Carbono", oriundos da utilização do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo.
Tais "créditos", que poderão ser concedidos aos países em desenvolvimento que implementarem projetos de desenvolvimento sustentável, buscando a manutenção de um meio-ambiente equilibrado, são passíveis de comercialização, mostrando-se como forma complementar para os países do Anexo I atingirem suas metas de redução, estabelecidas no Protocolo de Quioto.
Diante da necessidade de se conhecer mais a fundo a natureza jurídica das Reduções Certificadas de Emissões, nos propusemos a este estudo, e constatamos que se tratam de bens incorpóreos – ou bens intangíveis – de acordo com os pilares da doutrina de direito privado, especialmente no ramo que se propõe ao estudo das coisas.
Por fim, analisamos a incidência tributária que deverá gravar as operações de comercialização dos Créditos de Carbono, com base na legislação fiscal atualmente em vigor, e concluímos o quanto segue:
- IRPJ/CSLL – o valor decorrente da comercialização dos Certificados de Emissão Reduzida deverá ser registrada contabilmente como receita, e desta forma afetará o lucro contábil, e conseqüentemente as bases de cálculo do IRPJ e da CSLL da empresa que atuar neste mercado. Portanto, a menos que o PL nº 4.425/04 venha a ser aprovado – concedendo isenção deste dois tributos sobre as receitas decorrentes da venda de "Créditos de Carbono" – as receitas ora em análise serão gravadas pelo IRPJ e pela CSLL.
- PIS/COFINS – as operações que envolverem a exportação de "Créditos de Carbono" estarão protegidas da incidência do PIS e da COFINS por força de imunidade, encontrada no artigo 149, § 2º, I, da Constituição Federal.
- IOF – Há a possibilidade de incidência do IOF sobre o valor da cessão dos "Créditos de Carbono", caso estes títulos venham a ser reconhecidos como ativos financeiros (derivativos), e conseqüentemente como títulos ou valores mobiliários.
- ISS – as receitas decorrentes da comercialização de "Créditos de Carbono" não deverão sofrer a incidência do ISS, tendo em vista que, ao contrário do que se repete incansavelmente na doutrina econômica, a cessão de direitos não se confunde com a prestação de serviços. Vale lembrar que a argumentação da Ciência da Economia não pode invadir a esfera jurídica, da Ciência do Direito.
É certo que não pretendemos, com este estudo, esgotar o quanto se há para discutir acerca de instituto tão novo, e que ainda encontra-se sujeito à uma série de regulamentações jurídicas, como por exemplo os citados Projetos de Lei nos 3.552/04 e 4.425/04, mas apenas apresentar nossas conclusões acerca da natureza jurídica das RCE’s e do seu adequado tratamento tributário.
Notas
01 Países industrializados membros da OCDE, exceto México e Coréia do Sul, além de países industrializados em processo de transição para uma economia de mercado, que constam do Anexo I, da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima.
02 Devemos destacar que o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo é uma forma subsidiária de cumprimento de metas, sendo vedado aos países do Anexo I a utilização deste para o cumprimento total de suas metas.
03 Para os projetos a serem implementados no Brasil, a Entidade Operacional Designada é a Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima (CIMGC).
04 MONTEIRO, Washington de Barros – "Curso de Direito Civil – V.1" – 27ª. Ed., Saraiva, p. 135
05 VENOSA, Sílvio de Salvo – "Direito Civil – Parte Geral" – Atlas Jurídico, 5ª. Ed., 2005, p. 329
06 Definição extraída do Dicionário de Finanças, disponível no site da BOVESPA – www.bovespa.com.br
07 FORTUNA, Eduardo – "Mercado Financeiro – Produtos e Serviços", Qualitymark, 10ª. Ed., 1997, p. 343
08 A natureza jurídica de valor mobiliário concedida aos "Créditos de Carbono", segundo a Exposição de Motivos do referido Projeto de Lei, independe de sua classificação como ativo intangível puro ou como derivativo.
09 "CCX is the world’s first and North America’s only voluntary, legally binding rules-based greenhouse gas emissions allowance trading system". Texto extraído do site da CCX – www.chicagoclimatex.com
10 VENOSA, Sílvio de Salvo – "Direito Civil – Contratos em Espécie", Atlas Jurídico, 5ª. Ed., 2005, p. 34
11 De acordo com o inestimável magistério de Roque A. Carrazza "a obrigação tributária só nasce diante da plena e cabal identificação do conceito do fato ocorrido com o conceito da hipótese de incidência. Assim, se o fato ocorrido é identificável como cessão de direitos não há como subsumi-lo à hipótese de incidência vender mercadorias." (grifos no original) (CARRAZZA, Roque Antonio – "ICMS", Malheiros, 8ª. Ed., 2002, p.119)
12 MELO, José Eduardo Soares de – "ICMS – Teoria e Prática", Dialética, 5ª. Ed., 2002, p. 18
13 Vale mencionar, no que toca o questionamento da incidência da CSLL sobre as receitas de exportação no judiciário, que esta tese não teve boa aceitação nos Tribunais. Temos notícia da concessão de liminares em primeira instância, algumas das quais foram caçadas, e algumas poucas sentenças, também de primeira instância. Ressalte-se que este tema ainda não foi apreciado pelo STF.
14 Manual de Contabilidade das Sociedades Por Ações – FIPECAFI – 5ª. Ed. – 2000, p. 51.
15 Art. 15, § 1º., III, "c"
16 Vale destacar que o adicional de 10% do IRPJ somente será devido por aquelas empresas que apresentarem base tributável superior a R$ 240.000,00 no ano-calendário.
17 CARRAZZA, Roque Antonio – "ICMS", 8ª. Ed., Malheiros, 2002, p. 340
18 Tais títulos já são negociados na forma de commodities pela Chicago Climate Exchange (CCX), e existe um projeto para que no Brasil sejam negociados na BVRJ e na BM&F.
19 Devemos destacar que não é absurda a idéia de que se possa pretender a incidência de ISS sobre cessão de direito, equiparando-a à prestação de serviço. Apenas para dar concretude a nosso receio, trazemos à colação alguns itens inseridos na Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/03:
1.05 – Licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação.
3.02 – Cessão de direito de uso de marcas e de sinais de propaganda.
15.09 – Arrendamento mercantil (leasing) de quaisquer bens, inclusive cessão de direitos e obrigações, substituição de garantia, alteração, cancelamento e registro de contrato, e demais serviços relacionados ao arrendamento mercantil (leasing).