Resumo: O presente artigo aborda a definição de saúde pela Organização Mundial de Saúde bem como as dimensões dessa, analisando os parâmetros de bem estar apresentados em sua definição. A partir dessa análise, é revelada a preocupação de legisladores constitucionais de dois países do Mercosul (Argentina e Brasil), no que diz respeito a garantia da saúde espiritual, bem como sua positivação de forma implícita nas cartas magnas de ambos os países mencionados.
Palavras-chave: Saúde. Bem estar. Dimensões. Faces. Múltiplas.
Sumário: Introdução. 1. Saúde. 2.Sentimento de “Bem-estar” como indicador de Saúde. 2.1. Satisfação com a Vida. 2.1.1. Satisfação basal de vida. 2.1.2. Satisfação transitória. 2.1.3. Satisfação plena. 2.2. Sentimento de Felicidade. 3. Saúde como produto final do “bem-estar”. 4. Definição tridimensional de saúde. 4.1. Saúde Física. 4.2. Saúde mental. 4.3. Saúde Social. 5. As duas dimensões da saúde quanto a essência. 5.1. Dimensão material da saúde. 5.2. Múltiplas percepções imateriais da saúde. 5.2.1. A face espiritual da saúde. 6. O Direito como garantidor da saúde humana. 6.1. O Direito a saúde espiritual. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO.
O presente trabalho aborda o tema saúde a partir da definição dada pela Organização Mundial de Saúde – OMS. Serão utilizados alguns referenciais teóricos e definições consagradas. O tema será apresentado a partir de uma perspectiva dimensional, lançando mão de alegorias e exemplos.
Figuras serão utilizadas para melhor entendimento dos conceitos e definições propostas. A aproximação com as ciências exatas, mas especificamente a matemática e a geometria, como fontes das alegorias escolhidas, objetivam facilitar a visualização das ideias a serem apresentadas.
Nos primeiros capítulos abordar-se-á o tema a partir da perspectiva do bem-estar humano, analisando cada elemento que o define e, consequentemente, cada face do que venha a ser conhecido como saúde humana. No capítulo seguinte será proposta uma hipótese tridimensional do que consiste a definição de saúde.
No capítulo 6 serão abordadas as dimensões da saúde quanto as duas essências que a envolve. O capítulo 7 abordará o direito a saúde em sua tridimensionalidade somando-se a esse o capítulo 8, o qual tratará de uma face não considerada nas referências, mas implicitamente existente nas normas, ou seja, o direito a saúde espiritual. Logo após será apresentada uma conclusão sucinta do trabalho efetuado.
1. SAÚDE
A continuidade da existência humana depende do perfeito equilíbrio biológico que essa possui. Entretanto, a racionalidade inata do homem evoca uma extensão maior de necessidades para que possa existir com qualidade. Essas necessidades, sendo atendidas, resultam no que se pode chamar de “estado de saúde”.
Segundo a Organização Mundial da Saúde – OMS compreende-se por saúde o estado de bem-estar físico, mental e social, não sendo apenas a ausência de doenças ou de enfermidade. Verifica-se nessa definição uma percepção tridimensional de bem-estar, o que na realidade observa-se como uma situação difícil de alcançar na sociedade atual.
Atribuir o estado de saúde a alguém não é uma tarefa tão fácil, haja vista que cada cidadão possui uma percepção própria de bem estar que, as vezes, difere completamente de outro. É possível que o estado de saúde reconhecido por um indivíduo possa ser interpretado como condição de “enfermo” por outro.
O ponto em comum para se fixar o estado de saúde em qualquer indivíduo será o sentimento de bem-estar, o qual poderá ou não ser aceito pelo grupo de pessoas que o cerca. Mesmo assim atmosferas, situações e sentimentos comuns, que proporcionam bem estar, têm sido elementos aferidores do estado de saúde no mundo.
2. SENTIMENTO DE “BEM-ESTAR” COMO INDICADOR DE SAÚDE.
A partir dos ensinamentos de Iolanda Costa Galinha (2008), pode-se concluir que “bem-estar” é o resultado da junção de dois sentimentos: SATISFAÇÃO COM A VIDA e FELICIDADE. Se assim for, verifica-se que não há como se alcançar uma real definição de saúde a partir do preenchimento de requisitos materiais de existência, mas sim sob parâmetros internos e imateriais. Diante disso, nasce uma nítida dificuldade em se alcançar um ponto de equilíbrio para se definir o que realmente venha a ser “bem-estar”.
Atualmente a população humana ultrapassa a ordem de bilhões de indivíduos, sendo que cada um pode ter uma concepção específica do sentimento em destaque. Na realidade o que um indivíduo pode chamar de bem-estar outro pode considerar como estado de aflição e consequentemente estado de enfermidade, seja psicológica, social ou física.
A partir dessa problemática pode-se entender que o “bem-estar” é definido por parâmetros internos e imateriais de cada indivíduo. Por essa razão verifica-se que uma definição universal somente poderia ser alcançada se o “cerne” do entendimento humano fosse decifrado. A partir daí, poder-se-ia estabelecer um ponto de convergência entre todos, definindo-se real e plenamente o que viria a ser o bem-estar e consequentemente saúde.
Até que haja uma evolução no que tange a uma definição real e perfeita de bem estar, resta considerar o que é proporcionado hodiernamente, ou seja, bem-estar trata-se de uma satisfação com a vida e felicidade, as quais podem trazer à realidade a condição de pessoa saudável.
2.1. SATISFAÇÃO COM A VIDA
Segundo Pablo Magno da Silveira et al (2015), a satisfação com a vida é:
“um julgamento cognitivo de alguns domínios específicos na vida e depende de uma comparação entre as circunstancias de vida do individuo e um padrão por ele estabelecido.” (SILVEIRA et al, 2015).
Por satisfação de vida, pode-se entender o alcance pessoal dos objetivos e metas traçados consciente ou subconsciente por um indivíduo. Ao se atingir determinado estado de conforto almejado, o ser humano tende a estabelecer um “ponto de repouso” e “usufruto temporal”. Geralmente a satisfação inibe no ser a continuidade de elevar o estado de vida atual.
Observa-se que a “satisfação de vida”, em sua essência, é dividida em pelo menos três classes: basal, transitória e plena.
2.1.1. Satisfação basal de vida
A satisfação basal de vida pode ser fisicamente observada num recém-nascido. Acalentamento, alimento e proteção, são três eixos de necessidades que se supridas, proporcionam ao bebê a calma advinda de um sentimento de satisfação. A deficiência na oferta de um desses eixos promove o sentimento de insatisfação na criança, de forma que ela deixa o seu estado de inércia e reage, dentro de seus limites, para conquistar seu ponto satisfatório.
De igual forma, pessoas adultas, desprovida de esperança para reagir as intempéries externas, como crises econômicas, doenças, condições sub-humanas de vida, podem instintivamente reduzir, a níveis basais, o seu parâmetro de satisfação, de forma a se contentar com conquistas básicas. A sobrevivência pode ser o único requisito para alcançar satisfação de um indivíduo nessas condições.
2.1.2. Satisfação transitória.
Pessoas com objetivos e metas específicos e compartimentalizados, e com prévia determinação de tempo para alcança-los, no intuito de não serem afligidos por cobranças internas e pessoas, podem acatar certo estado de satisfação. Quando percebem que alcançaram o ponto desejado, no momento previsto de sua linha existencial, imergem num transitório estado de satisfação. Ressalta-se que este estado geralmente possui um tempo determinado pela própria pessoa. Uma vez findando, expira a satisfação transitória e busca-se novo período ou a perseguição final da satisfação plena.
2.1.3. Satisfação plena.
A satisfação plena, em tese, é o sentimento resultante da chegada ao ponto final das metas e objetivos traçados ao longo da vida. Tal estado é apresentado apenas a título teórico posto não ser uma hipótese que se harmonize com a natureza humana, a qual possui em si a contínua busca de melhoria de estado.
A raça humana é por natureza aspirante de novas conquistas, de forma que o alcance de um status só representa uma pausa na marcha em busca de um novo objetivo. A satisfação plena decididamente não é um estado que se alcance no decurso da vida, porém pode-se entender que algo similar talvez ocorra ao final dessa.
2.2. SENTIMENTO DE FELICIDADE
Lançando mão dos apontamentos de Renata Barboza Ferraz et al (2007), pode-se chegar ao entendimento de que a felicidade trata-se de um sentimento derivado da satisfação em face de conquistas e sucessos auferidos em determinados intentos presentes no indivíduo. O sentimento de felicidade pode influenciar inclusive na dimensão física do que vem a ser conhecido como saúde.
Uma pessoa infeliz pode alcançar níveis de aflição capazes de materializarem-se em forma de doenças. Segundo Moreira (apud ESPÍDOLA, 2012), “o estado emocional dos indivíduos altera o funcionamento do sistema endócrino através do sistema límbico [1]e do circuito de Papez[2]”. Percebe-se que um sentimento abstrato como a infelicidade pode afetar estruturas concretas como o sistema imunológico ou endócrino de um indivíduo.
Doenças podem advir se um ser humano foi subjugado a um estado de infelicidade constante, ou mesmo sob um pico desse sentimento em proporções realmente “bombásticas”. Porém, se assim for, o inverso da “equação” também será realidade. Níveis de felicidade podem trazer sensações reparadoras ao indivíduo, e por que não dizer até mesmo uma cura.
3. SAÚDE COMO PRODUTO FINAL DO “BEM-ESTAR”
Observa-se que a saúde é alcançada quando os elementos definidores do bem-estar estão presentes na existência do indivíduo. De certo, a alma humana é muito mais complexa do que um problema matemático, não podendo ser mensurada como qualquer fenômeno físico observado. Entretanto, a apropriação de um entendimento mais amplo pode ser conquistada a partir de uma alegoria, nesse caso uma “equação”.
Assim sendo, considerando que os elementos ensejadores do bem-estar estejam presentes, pode-se dizer que o indivíduo alcançou o que se pode chamar de “saúde”. Sabendo-se que a manutenção dessa trata-se do equilíbrio contínuo dos elementos definidores, sem que haja qualquer subtração de tais elementos.
4. DEFINIÇÃO TRIDIMENSIONAL DE SAÚDE
Segundo a Organização Mundial da Saúde – OMS, um estado de bem-estar físico, mental e social, não sendo apenas a ausência de doenças ou de enfermidade é o que se compreende por saúde. Verifica-se nessa definição uma percepção tridimensional de bem-estar a qual acaba por ser um tanto utópica se for considerado a complexidade da civilização atual.
Ao se retomar a definição de saúde, observa-se que essa extrapola uma percepção simplória, ou seja, possui dimensões que devem ser estudadas e delimitadas, no intuito de se poder alcançar a plenitude de sua ocorrência.
Considerando a definição tridimensional da saúde, como estado de bem-estar físico, mental e social, pode-se apresentar pelo menos as seguintes expectativas:
4.1. SAÚDE FÍSICA:
Evidentemente, por saúde física pode-se entender o equilíbrio físico-biológico do indivíduo, no qual todas as funções orgânicas do ser humano devem ocorrer eficaz e harmonicamente. Juntamente com a perfeita operação fisiológica e apresentação anatômica, deve-se haver perfeita ausência de fatores patológicos no ser. Vivendo o homem sem doenças e no exercício de suas funções orgânicas será esse considerado saudável.
4.2. SAÚDE MENTAL:
Essa face da definição de saúde encontra seu cerne no campo imaterial do ser humano. Trata-se do equilíbrio existente da alma humana frente aos fatores que lhe podem alcançar, tais como: intempéries emocionais e psíquicas. Pode-se dizer que a ausência de aflições nas áreas suportes da satisfação, ou mesmo a capacidade de gerenciá-las de forma a se manter ou alcançar o que se pode chamar de “paz interior”, trata-se de saúde mental.
Como áreas suporte para um bem estar mental, elencam-se as modalidades de atuação na vida, tais como: vida financeira, emocional e espiritual.
Como todo ser vivo, a paz interior pode ser alcançada quando devidamente providas as necessidades de recursos, ausência de estresses e equilíbrio com suas convicções subjetivas e abstratas de vida.
Algo interessante se observa, quando da análise da temática “saúde mental”. Essa parece ser um ponto de equilíbrio entre a saúde física e a saúde social, posto que havendo equilíbrio nessa face da saúde, todas as demais tenderão, ainda que sob intempéries, ser atraídas ao equilíbrio, proporcionando certo “status” de “pessoa saudável”.
4.3. SAÚDE SOCIAL:
O ser humano é um ser social por natureza. A interação harmônica com outros indivíduos, principalmente com os do seu próprio seio familiar, traz como resultado um equilíbrio, que por sua vez adentrará no campo mental de seu ser, contribuindo para seu estado de saúde social e mental concomitantemente. Pode-se dizer que essas duas faces se interligam de forma a quase se confundirem.
5. AS DUAS DIMENSÕES DA SAÚDE QUANTO A ESSÊNCIA.
Como apresentado anteriormente, a saúde possui pelo menos três faces apresentadas: a material, a mental e a social. Porém, deve-se observar que essas formam duas dimensões de saúde, a saber: dimensão material e dimensão imaterial. A dimensão material é aquela que se pode mensurar de forma física. É possível estabelecer um padrão de saúde, ainda que a título de “regra” com suas exceções.
5.1. DIMENSÃO MATERIAL DA SAÚDE.
Em sua dimensão material, a saúde pode ser percebida por terceiros, por meio dos sentidos humanos e medida pelos parâmetros gerais criados pelos indivíduos interagentes. Aspectos físicos, capacidades de atuação, intensidade de interação, equilíbrio biológico entre outros, são parâmetros para julgamento do que venha a ser uma pessoa saudável.
Entretanto, na dimensão material, pode-se observar que o avaliação da condição de enfermo ou saudável é fundamentada em padrões biológicos ou até comportamentais, convencionados pela sociedade onde está inserido o indivíduo.
5.2. MULTIPLAS PERCEPÇÕES IMATERIAIS DA SAÚDE.
No que tange a dimensão imaterial, apresenta-se apenas a saúde mental e a social, as quais não podem ser mensuradas com perfeição, haja vista que cada pessoa possui uma perspectiva própria do que possa ser caracterizado como bem estar. O que é “bem-estar” para um agricultor pode não o ser para um operário; o que traz contentamento para um estudante ou cientista pode não significar nada para um trabalhador braçal.
Essa múltipla definição de bem-estar, impossibilita uma conclusão objetiva. Isso não só ultrapassa parâmetros conhecidos dentro das leis físicas conhecidas, como também vai além do próprio elemento caracterizador da saúde (bem estar), adentrando numa face não explorada pela OMS, que aqui chamar-se-á de “bem-estar espiritual”.
5.2.1. A face espiritual da saúde.
O alcance da plenitude do bem-estar é o ideal para que o indivíduo possa perceber-se como pessoa saudável. Assim sendo, verifica-se que a percepção do bem estar não ocorre na dimensão externa do indivíduo, mas sim internamente. Razão pela qual se verifica que o modelo de saúde testemunhado pelo homem, pode ser representado, para melhor compreensão de sua forma tridimensional, por uma pirâmide de base triangular.
Lançando mão da definição tridimensional de saúde e mesclando-a com a percepção geométrica tridimensional humana, como por exemplo, por meio da figura de uma pirâmide de base triangular, poder-se-á compreender melhor a proposta de uma nova dimensão para o que venha a ser definido como saúde.
Ao posicionar o indivíduo, não em apenas uma das faces, mas no interior da figura geométrica proposta, uma face não revelada ou pelo menos não considerada da saúde, poderá ser percebida: a espiritual.
Diante da complexidade do que se apresenta como “status” de pessoa saudável, é predominante a percepção apenas de uma “face” do que se entende por saúde, a saber: “saúde física”. Imperioso também é alcançar a saúde mental e social. Entretanto, uma forma de saúde não considerada, por não ser percebida por observadores externos, é a saúde espiritual, percebida e verificada unicamente pelo próprio indivíduo avaliado.
Pode-se dizer que o ser humano tem, em sua essência, uma necessidade de se reportar a alguém superior a si em sua busca por ajuda. Talvez essa seja a razão pela qual a maior parte, e por que não dizer toda sociedade humana, lança mão da fé em alguém ou alguma coisa, para buscar um estado de equilíbrio interior. Essa pode ser a razão, para não se observar grandes civilizações desprovida por alguma forma de fé.
A dimensão espiritual tem trazido certa percepção de bem estar, mesmo para quem não possui saúde em sua “face” física. Em contrapartida pode-se verificar que algumas pessoas, desprovidas de saúde espiritual, podem não possuir saúde física, mental ou social. Não se pode ignorar tal fato.
Verdade é que a busca pelo equilíbrio humano e sua real conquista pelo bem estar, deve ser norteada pelos objetivos certos e em sua devida ordem. É necessário buscar o equilíbrio imaterial, para se alcançar o material. Afinal não são poucos os relatos de que pessoas adoeceram por não possuírem em sua alma um equilíbrio real.
6. O DIREITO COMO GARANTIDOR DA SAÚDE HUMANA.
Lançando mão do que venha ser considerado “bem-estar mental”, tem-se que alguns sentimentos devem existir para que tal seja alcançado, como por exemplo: o sentimento de segurança ante a garantia de satisfação de uma necessidade. A incerteza quanto a provisão de algo, por si só já atinge o bem estar mental, capaz de trazer certa aflição para um ser humano.
Contudo, com o advento do Estado, o homem passou a ter não só obrigações, mas também direitos, os quais em seu interior se caracterizariam como elemento proporcionador de bem-estar mental, em face a garantia proporcionada pelo Estado, por meio do direito posto. Logo, se observa que o direito a saúde traria ao cidadão um bem estar mental.
A garantia da saúde aos homens tem sido proporcionada no direito, desde a Constituição de uma nação. Pode-se verificar tal preocupação na Carta Magna Brasileira de 1988, em seu artigo 6º, quando define saúde como um direito social:
CF 1988.
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (BRASIL, 1988).
O povo brasileiro ainda ganhou maior segurança, a qual acabou por se traduzir por bem estar interior, quando a Constituição Federal do Brasil, em seu artigo 196, impôs ao Estado o dever de garantir o direito a saúde para todos:
CF/1988
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. (BRASIL, 1988)
Tal amparo trás significativa sensação de bem estar e consequentemente saúde mental. A violação a esse direito será traduzida imediatamente pelo ser humano como um estado de turbação e, consequentemente, de “quebra no bem-estar mental”.
Além do dever atribuído ao Estado, a Constituição Brasileira estende o dever de garantir a saúde para a família e para a sociedade, como se pode perceber no artigo 227:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL, 1988)
A garantia do amparo do indivíduo pela sociedade acaba por proporcionar também a busca da saúde em face do bem-estar social. Verifica-se então o direito como um mecanismo ativo e construtor, por meio da provocação e incentivo do cidadão, da sociedade e do Estado, do sentimento de bem-estar capaz de produzir o que se entende por saúde.
6.1. O DIREITO A SAÚDE ESPIRITUAL
Conforme dito anteriormente, apesar da OMS definir a saúde como um estado de bem-estar mental, físico e social, não é possível dissociar a necessidade espiritual do ser humano de sua condição de satisfação. O reconhecimento de mais uma face ou dimensão da saúde, a saber, saúde espiritual, deve ser uma realidade.
Tais faces ou dimensões, também podem ser percebidas, no direito, como “pilares”, a saber: sustentáculos da condição de saúde do ser humano, como se ilustra abaixo:
O pilar espiritual da saúde é uma realidade não reconhecida explicitamente, porém presente no comando dado pela norma. O legislador constitucional inseriu de forma indireta, na constituição, a saúde espiritual, assim observada quando garantiu o exercício do culto.
Por mais que se atribuía aos Estados uma condição laica, é notória a preocupação com o bem-estar espiritual. A atenção para com esse pilar está implícita em muitos ordenamentos jurídicos. Pode-se constatar tal preocupação, por exemplo, em dispositivos presentes em constituições como as do Brasil e da Argentina.
O inciso VI, artigo 5º da Constituição Brasileira de 1988, assim determina:
CF/88
Art. 5º (...)
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; (BRASIL, 1988)
Na mesma senda, observa-se nos artigos 14 e 20 da Constitucion Nacional Argentina a preocupação para com a liberdade de culto:
CONSTITUCION NACIONAL ARGENTINA LEY Nº 24430
Artículo 14.- Todos los habitantes de la Nación gozan de los siguientes derechos conforme a las leyes quE reglamenten su ejercicio; a saber: de trabajar y ejercer toda industria lícita; de navegar y comerciar; de peticionar a las autoridades; de entrar, permanecer, transitar y salir del territorio argentino; de publicar sus ideas por la prensa sin censura previa; de usar y disponer de su propiedad; de asociarse con fines útiles; de profesar libremente su culto; de enseñar y aprender.
...
Artículo 20.- Los extranjeros gozan en el territorio de la Nación de todos los derechos civiles del ciudadano; pueden ejercer su industria, comercio y profesión; poseer bienes raíces, comprarlos y enajenarlos; navegar los ríos y costas; ejercer libremente su culto; testar y casarse conforme a las leyes. No están obligados a admitir la ciudadanía, ni a pagar contribuciones forzosas extraordinarias. Obtienen nacionalización residiendo dos años continuos en la Nación; pero la autoridad puede acortar este término a favor del que lo solicite, alegando y probando servicios a la República. (ARGENTINA, 1994). Grifo nosso.
Ao garantir a liberdade de culto, o Estado, por meio do direito, ainda que não explicitamente, garante a integridade do quarto pilar, a saber: saúde espiritual, que sustêm o que se entende como saúde. Por meio do exercício da fé, sentimento inato ao ser humano, que o indivíduo busca o equilíbrio com sua parte imaterial, alcançando assim um bem-estar, e consequentemente a saúde espiritual, a qual poderá refletir nos demais pilares de sua existência.
CONCLUSÃO:
Apesar de não ser prudente reduzir um sentimento humano a um resultado de uma “equação matemática”, deduz-se, a partir das referências apresentadas, que para definir saúde e bem-estar, se pode utilizar, a título de ilustração, uma equação matemática. Assim sendo, se permitido for a alegoria, tem-se, pelo menos que:
Bem-estar = (SATISFAÇÃO com a vida + FELICIDADE)
SAÚDE = (Bem-estar físico)+(bem-estar mental)+(bem-estar social)
A equação supracitada trata-se de um “problema” a ser resolvido por três destinatários: o indivíduo, a sociedade e o Estado. Contudo, o resultado de todos deve ser somado para que seu produto possa refletir de uma forma plena e eficaz.
Verifica-se que o “estado de saúde”, depende da percepção, por parte do indivíduo, do seu sentimento de satisfação e realização, para com o seu corpo, sua paz interior e sua conexão com o meio que o cerca. Entretanto, é necessário atentar para o fato de que a “paz interior” somente poderá ser alcançada se for considerada a importância de se perseguir também a saúde espiritual.
REFERÊNCIAS:
ARGENTINA. Constitucion Nacional Argentina - Ley Nº 24430. 1994. Disponível em: <https://www.casarosada.gob.ar/images/stories/constitucion-nacional-argentina.pdf>. Acesso em: 29 nov. 2018.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 29 nov. 2018.
ESPÍNDOLA, Andréia Magalhães. Dissertação: estresse, emoções e câncer de mama: Relações possíveis. 2012. Disponível em: <http://www.ufjf.br/ppgpsicologia/files/2010/01/Andr%C3%A9ia-Magalh%C3%A3es-Espindola.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2018.
FERREIRA, Clara Fontes et al. Guia de estudos: Organização Mundial da Saúde. 2014. Disponível em: <https://sinus.org.br/2014/wp-content/uploads/2013/11/OMS-Guia-Online.pdf>. Acesso em: 13 out. 2018.
FERRAZ, Renata Barboza; TAVARES, Hermano; ZILBERMAN, Mônica L. Felicidade: uma revisão. Ver. Psiq. Clin. 34 (5); 234-242. Fev 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rpc/v34n5/a05v34n5>. Acesso em: 22 nov. 2018.
GALINHA, Iolanda Costa. Bem-Estar Subjetctivo: Fatores Cognitivos, Afectivos e Contextuais. 1ª ed. Dezembro de 2008. Tipografia Lousanense – Ltda. Disponível em: <http://repositorio.ual.pt/bitstream/11144/580/1/3%20Livro%20Bem-Estar%20Subjectivo.pdf>. Acesso em: 22 nov. 2018.
MAIA, Ângela da Costa. Artigo: emoções e sistema imunológico: um olhar sobre a psiconeuroimunologia. 2002. Disponível em: <http://www.conhecer.org.br/download/IMUNOLOGIA/leitura%20anexa%201.pdf>. Acesso em: 29 nov. 2018.
SILVEIRA, Pablo Magno da, et al. Artigo: Criação de uma escala de satisfação com a vida por meio da Teoria da Resposta ao Item. 2015. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/jbpsiq/v64n4/0047-2085-jbpsiq-64-4-0272.pdf>. Acesso em: 30 nov. 2018.
[1] Sistema Límbico: região constituída por núcleos de neurônios, que formam uma espécie de borda em volta do tronco encefálico. Essas estruturas surgiram com os mamíferos inferiores e coordenam comportamentos necessários à sobrevivência. Emoções e sentimentos, como ira, pavor e alegria têm origem no sistema límbico, que também é responsável por alguns aspectos da identidade pessoal e funções importantes ligadas à memória. (Guyton e Hall, apud ESPÍNDOLA, 2012)
[2] Circuito de Papez é um circuito formado por quatro estruturas básicas, interligadas por feixes nervosos: o hipotálamo e seus corpos mamilares, o núcleo anterior do tálamo, o giro cingulado e o hipocampo. É responsável pela elaboração das emoções, assim como suas expressões periféricas. (Guyton e Hall, apud ESPÍNDOLA, 2012).