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São ilegais os serviços prestados através das linhas 0900 e seus assemelhados

01/04/1999 às 00:00
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O serviço de telefonia é um serviço público essencial, que visa, precipuamente, promover o bem-estar da coletividade, sendo este o serviço que o consumidor contrata com as concessionárias respectivas, conhecidas como TELES (Telems, Telemat, Telesp, Telerg, Telemig, Teleceará, Telebahia, etc.).

Já os serviços prestados através das linhas 0900, 900, 145 e ligações internacionais de sexo e outras - que, aliás, não se enquadram na definição legal de serviços e muito menos de serviço público, e que, na realidade, em muitos casos, chegam a ser um desserviço - não são sequer solicitados pelo consumidor. Em verdade, são impostos arbitrariamente pelas concessionárias, que são as que contratam com as empresas de serviços adicionais e impõem aos consumidores as obrigações geradas por essas avenças.

A atitude das concessionárias de serviços telefônicos, no sentido de impor ao consumidor o dever de honrar contratos feito por elas com terceiro, não encontra abrigo no ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que somente a lei, a vontade das partes e os atos ilícitos constituem fontes de obrigação, sendo que, em relação de consumo, a vontade das partes deve coincidir com a vontade da lei, sob pena de não ter validade alguma.

Insta frisar que mesmo que o consumidor quisesse ele não teria como não aceitar o serviço, sendo obrigado então a arcar com responsabilidade gerada por contrato que ele não firmou ou a arcar com os custos do bloqueio do serviço oferecido a sua revelia.

Para perceber claramente a anomalia e ilegalidade cometidas pela Telems e as demais teles do país, basta imaginar, por exemplo, a situação em que, de uma hora para outra, todas as empresas provedoras de TV a Cabo resolvessem instalar, sem solicitação alguma, na casa de todos os consumidores o serviço respectivo, de forma que aqueles que não quisessem fazer uso de tal serviço devessem comprar um aparelho especial e contratar um técnico particular para bloquear o serviço não solicitado.

É exatamente isso que fazem as referidas concessionárias. Implantam elas os serviços inespecíficos sem a devida solicitação e autorização do consumidor, para obrigá-lo, posteriormente, a efetuar gastos para poder se livrar daquilo que não solicitou.

A Norma n.º 05/79, aprovada pela Portaria 663/79, do Ministério das Telecomunicações, em seu item 5.3, exige que o consumidor faça solicitação por escrito para a utilização dos serviços prestados pelas Teles e o inciso III do artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor proíbe ao fornecedor de produtos ou serviços enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço, sendo certo que o parágrafo único deste mesmo artigo 39 equipara os serviços prestados e os produtos remetidos ou entregues nessa condição à amostra grátis e desobriga o consumidor de qualquer pagamento.

Como o consumidor não participou da avença, ele não tem conhecimento algum do contrato, nem prévio nem posterior, o que fere de morte também o artigo 46 da mesma lei protetiva, que dispõe que "Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance."

Vê-se, assim, que o direito básico do consumidor à informação adequada sobre os produtos e serviços em toda sua extensão, seja qualidade, quantidade, características, composição, preço e riscos que apresentam, como exigidos pelo artigo 6º, inciso III, do Codecon, são sumariamente desrespeitados pelos representantes legais das prestadoras de serviços telefônicos, que assaltam o bolso do consumidor a plena luz do dia.

Percebe-se, facilmente, que pelo previsto no referido inciso III do artigo 6º da lei protetiva, o consumidor tem direito a ser informado sobre todas as características do serviço em aquisição, sabendo exatamente o que dele pode esperar. Por este motivo é que a energia, o gás e a água fornecidos devem possuir relógios que informem as quantias exatas aos consumidores, possibilitando-lhes a tomada de medidas preventivas, com o propósito de reduzir ou aumentar suas despesas. No caso em apreço, aliás como todo o sistema de telefonia, não há registro sistemático das ligações originárias de um prefixo e, como tal, torna-se impossível ao usuário conhecer previamente o que está consumindo ou estão consumindo em seu nome.

Por outro lado, ao inserir terceiros e serviços estranhos à avença, as concessionárias alteram, unilateral, o contrato original, o que é vedado pelo Artigo 51, inciso XIII, do CDC.

Muitas vezes, o responsável pela linha é obrigado a pagar gasto exorbitantes em razão de ligações feitas por terceiro, sem conhecimento prévio dele, em sua maioria os usuários são crianças, adolescentes, leigos, idosos ou incapazes, que, geralmente, não têm a exata noção dos custos elevados desses serviços e são os principais alvos desse tipo de desserviço, postos, sem qualquer critério, a sua disposição.

Outro dia, este articulista recebeu um e-mail através do qual um pai desesperado pedia auxílio no sentido de saber como proceder para se livrar de uma conta de R$ 6.000,00, gerada por uso indevido desses serviços inespecíficos por parte de seu filho menor.

Fatos como esses são comuns no dia-a-dia das pessoas, com prejuízos de toda ordem.

Essa forma de proceder constitui-se em uma prática abusiva, pois, por vezes, se aproveitam da deficiência de julgamento e experiência da criança e adolescente, o que é vedado pelo CDC, que em seu artigo 39, inciso IV, proíbe ao fornecedor "prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços".

Além do mais, o oferecimento de certos serviços, como o tele-sexo, disc-erótico, dentre outros, ofendem também o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei n.º 8.069, de 13 de julho de 1990, posto que colocam em risco formação da personalidade da criança e do adolescente, por proporcionarem conversações eróticas de fácil acesso sem o mínimo critério e com o desconhecimento total dos pais.

Paga também o usuário pelo que os empregados das empresas terceirizadas fazem de seu terminal telefônico, quando, sob o pretextos de fazer consertos e testes, passam horas a fio em conversa de tele-sexo e outros desserviços que por aí existem. Basta, para isso, plugarem-se nas linhas telefônicas de qualquer consumidor, através das caixas de distribuição existentes pela cidade.

Paga, finalmente, o consumidor contratante pelas ligações cruzadas, fruto igualmente da deficiência do serviço posto a seu dispor, deficiência esta conhecida como MANOBRA PAR.

Apenas com o intuito de esclarecer. A manobra par é uma falha no sistema de captação na origem das chamadas que ocasionam a transferência de ligações de uma linha qualquer para outra, acarretando a cobrança indevida e causando transtornos ao consumidor, principalmente quando se trata de ligações para esses serviços atípicos, posto que deles sempre resultam altíssimas contas.

Há que se questionar a natureza legal dos serviços conhecido por disque-tarô, dentre outros assemelhado, por explorar a credulidade pública e, assim, tipificar a contravenção prevista no artigo 27 (1) do Decreto-lei 3.688, de 03/10/1941, conhecido como Lei de Contravenções Penais.

O disparate maior reside no fato da cobrança, pela execução do serviço não contratado, ser vinculada ao consumo mensal, chegando-se ao absurdo de penalizar o consumidor com a suspensão do fornecimento dos serviços telefônicos quando o consumidor não pode pagar os exorbitantes valores abusivos cobrados pelos serviços não solicitados, sendo certo que, muitas vezes, ocorre até a perda do direito de uso da linha, ficando o consumidor, neste caso, sem seu terminal telefônico.

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É para evitar abusos como estes que o artigo 39, I, do Código de Defesa do Consumidor proíbe que se "condicione o fornecimento de produtos ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos".

No caso em análise, ou o consumidor aceita o desserviço colocado a sua disposição e paga todos os valores que em sua fatura forem lançados ou ele não terá direito ao uso do serviço contratado e seu telefone é bloqueado.

Ora, se os serviços adicionais são contratados pelas Teles com os respectivos provedores, em avença estranha ao consumidor; se os serviços fornecidos sem solicitação prévia são tidos como amostra grátis; se se feriu o direito básico à informação; se a prática de alguns serviços são contravencionais; se algumas prática são abusivas, por se aproveitar da deficiência e inexperiência das crianças e adolescentes e se quem usou o serviços especial não foi responsável pela linha telefônica - a cobrança do consumidor, nestas condições, é indevida, em razão do que se aplica ao caso o parágrafo único do artigo 42 do CDC que dá ao consumidor o direito de reaver - em dobro, devidamente corrigido e acrescida dos juros legais - as quantias indevidamente pagas.

As ligações para os serviços tratados nesse trabalho não contribuem de nenhuma forma para incutir conceitos de cidadania ou difundir conceitos educacionais aos usuários. Pelo contrário, incentivam a existência de grupos clandestinos, que, agindo à socapa, depauperam orçamentos de trabalhadores e pequenos empresários e congestionam canais de ligação com outras cidades e outros países. Buscam eles, indeclinavelmente, o lucro fácil, com a quase sempre utilização de instituições filantrópicas que recebem ínfimos valores, enquanto que eles auferem somas extraordinárias com os desserviços impostos ao consumidor desavisado.

Diante destas aberrações, além da propositura da ação civil pública, o membro do Ministério Público pode e deve orientar o consumidor lesado a tomar as medidas judiciais cabíveis, para requerer que a concessionária respectiva: a) faça o bloqueio gratuito dos serviços adicionais (obrigação de fazer); b) desbloqueie o serviço contratado por falta de pagamento das contas de 0900 e outros (obrigação de fazer); c) abstenha-se de emitir qualquer fatura de cobrança de serviço não solicitado (obrigação de não fazer); d) receba os valores referentes aos serviços de telefonia, independentemente do pagamento dos valores referentes aos serviços inespecíficos (obrigação de fazer ou ação de consignação em pagamento); e) desmembre a cobrança dos serviços 900, 145, 0900 e TELESEXO da conta de consumo de ligações telefônicas; f) abstenha-se de interromper os serviços efetivamente contratados, por falta de pagamento dos serviços não contratados (obrigação de não fazer); e g) devolva em dobro, devidamente corrigido e acrescido dos juros legais, tudo o que já foi cobrado e pago indevidamente (repetição de indébito), tudo , sob pena de multa diária, a ser fixada pelo magistrado.

Em caso de ser o consumidor de outra unidade da federação que não a de Mato Grosso do Sul, posto que aqui já foi proposta a competente ação civil pública respectiva, orientar também o usuário a representar ao Ministério Público da cidade dele ou da Capital do Estado para a tomada das medidas necessárias, com o fim de defender, coletivamente, os demais consumidores lesados. É este um ato de cidadania, tendente a tornarem efetivos não só os princípios cristãos do amor ao próximo e da solidariedade humana, mas também o disposto no artigo 3.º da Constituição Federal, que prevê como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil a construção de uma sociedade livre, justa e solidária; a erradicação da pobreza e da marginalização; a redução das desigualdades sociais; e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.


NOTAS
  1. "Artigo 27 - Explorar a credulidade pública mediante sortilégios, predição do futuro, explicação de sonho, ou práticas congêneres: Pena - prisão simples, de 1 (um) a 6 (seis) meses, e multa."

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Sobre o autor
Amilton Plácido da Rosa

Procurador de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROSA, Amilton Plácido. São ilegais os serviços prestados através das linhas 0900 e seus assemelhados. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 30, 1 abr. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/739. Acesso em: 22 nov. 2024.

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