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A ilegalidade dos serviços telefônicos de valor adicionado (0900)

01/07/1999 às 00:00

Resumo:


  • Serviços de valor adicionado, como os conhecidos pelos códigos 0900 ou 900, possuem um sobrepreço, de natureza privada, adicionado à tarifa.

  • Principais problemas envolvendo o 0900 incluem a ausência de autorização expressa para cobranças e a cobrança na conta de telefone, que pode resultar na suspensão do serviço.

  • O sistema de cobrança do 0900 não se confunde com o serviço público de telefonia e deveria ser cobrado diretamente pelo fornecedor, sem a possibilidade de cortar a linha do usuário.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Os serviços conhecidos genericamente pelos códigos 0900 ou 900 (há ainda outros códigos, como o 145, etc.) são tecnicamente denominados de "serviços de valor adicionado", e têm como característica um sobrepreço, de natureza privada, que se acrescenta à tarifa.

Os principais vícios do sistema são bem conhecidos, depois de sete anos de abusos e descontrole: não existe o bloqueio gratuito; nenhuma divulgação é feita da possibilidade de bloqueio (levando o consumidor a só pedi-lo quando já sofreu o prejuízo); exige-se que o usuário pague para poder contestar cobrança indevida; nenhum limite é fixado para o valor máximo de cobrança (quanto mais o assinante ligar, melhor), etc. Para não falar na propaganda abusiva e enganosa, explorando a credulidade de menores e pessoas fragilizadas econômica ou sentimentalmente.

De há muito, entidades de defesa do consumidor vêm reclamando garantias como a exclusão da conta de telefone de todos os valores do 0900 quando há contestação (passaria ao provedor interessado o encargo da cobrança), de modo a não ficar o usuário injustamente privado do serviço.

Isso porque hoje, por norma administrativa, a conta telefônica é indivisível, ou seja, não se pode desdobrá-la para pagar só a tarifa. Constatada tecnicamente a "origem" das ligações, tem o usuário duas alternativas: ou paga tudo, ou tem a linha cortada.


Não é difícil, assim, perceber os principais problemas que envolvem o 0900:

a) ausência de autorização expressa - o consumidor, quando adquiriu o telefone, obrigou-se pela tarifa, pura e simples, assumindo, nesse caso, o risco de pagar por ligações não autorizadas. Mas não autorizou nem assumiu o risco de pagar por serviços privados como o tele-sexo ou o disque-amizade, acessados por menores ou terceiros, oferecidos com a mais apelativa propaganda de TV.

Ausente a solicitação prévia do titular da linha (que não se confunde com o ato de discar) o serviço fornecido só pode ser considerado gratuito (Art. 39, III, e parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor).

Não é possível comparar o uso indevido do 0900 com outros casos (p. ex., uma criança que deixa uma torneira aberta) que se encontram dentro da órbita normal de responsabilidade inerente ao serviço público. A solução é o bloqueio prévio, com o desbloqueio por iniciativa do titular da linha - que aí sim, estará se responsabilizando pelo uso indevido.

b) Cobrança na conta de telefone. Sendo o telefone um serviço público, somente pela ausência de pagamento da contraprestação – a tarifa - é que o consumidor pode ser dele privado. É o que se extrai do no artigo 3º, inciso VII, da Lei nº 9.472/97 (Lei Geral das Telecomunicações), verbis:

" Art. 3º. O usuário de serviços de telecomunicações tem direito:
          (...)
          VII - à não suspensão de serviço prestado em regime público, salvo por débito diretamente decorrente de sua utilização ou por descumprimento de condições contratuais."(grifamos)

Ou seja, débito decorrente da utilização do serviço público ou descumprimento de condições inerentes a este. E, para não deixar dúvidas, dispõe o art. 61 da citada Lei que "serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde..."(grifamos).


Como se vê, o 0900 não se confunde com o serviço público de telefonia, mas compartilha indevidamente do mesmo modo coativo de cobrança - ou o usuário paga, ou tem sua linha cortada. A lógica dessa cobrança é a mesma de embutir na conta de luz as prestações do aparelho de televisão. Não pagou, fica sem TV e sem luz...

Tais serviços, na verdade, deveriam ser cobrados pelo próprio fornecedor, através de boleto, cartão de crédito, etc., sem a intermediação do poder administrativo de cortar a linha. O serviço público de telefonia não pode ser o penhor de contratos privados.

Do contrário, valha o conhecido refrão do "locupletemo-nos todos". Ponha-se igualmente todo tipo de cobrança na conta de luz e água. Estará eliminada a inadimplência no Brasil...

Sempre houve a possibilidade de cancelar o valor do 0900 na primeira reclamação. No entanto, tal providência era até pouco tempo o segredo mais bem guardado do Brasil. Como confessou um operador do sistema: "não podemos divulgar isso senão todo mundo vai reclamar".

Por tais razões, foram bloqueados, por decisão da 4ª Vara, os serviços de valor adicionado da TELEFONICA e EMBRATEL, até que sejam adotados os condicionamentos determinados na liminar. Como se verifica, não se trata de proibir o 0900, nem sequer o tele-sexo, mas de eliminar, com medidas simples, as atuais práticas lesivas ao usuário. A resistência das rés e provedores, inclusive em cumprir a ordem judicial, deixa a impressão que a verdadeira lucratividade do sistema deriva não de seu conteúdo de facilidade ou entretenimento, mas da coação que proporciona contra o titular da linha, que jamais aceitou tais "serviços" nem assumiu o risco de perder seu telefone por causa deles.

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Sobre o autor
Duciran Van Marsen Farena

procurador da República em São Paulo (SP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FARENA, Duciran Van Marsen. A ilegalidade dos serviços telefônicos de valor adicionado (0900). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 33, 1 jul. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/740. Acesso em: 23 dez. 2024.

Mais informações

Artigo publicado na Revista da AJUFESP - Associação dos Juízes Federais de São Paulo e Mato Grosso do Sul.

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